domingo, 12 de setembro de 2021

Señorio de Ayud tinto 2018

 

Costumo dizer de forma entusiasmada e demasiada que o universo do vinho é vasto e inexplorado. Há muito a se caminhar e nunca chegar, nunca concluir, porque é uma diversidade de informações, de grandes e novas experiências que te proporciona seguir a estrada do conhecimento que, para o nosso deleite, nunca terá fim. É isso! É a confirmação de que ninguém detém o pleno conhecimento, a perfeição da sapiência, da onisciência no mundo do vinho.

Mesmo com algumas décadas degustando vinho, eu consigo me permitir degustar novidades, ter novas e diria, sem medo, experiências sensoriais de extrema relevância e consistência. E, desta vez, tive a alegria, o prazer de degustar um vinho, espanhol, oriundo das terras da Catalunha, cujo blend são de castas francesas, das mais famosas e importantes: Cabernet Sauvignon e Syrah.

Sempre vi alguns rótulos espanhóis sendo ofertados, não com a proporção de uma Tempranillo, com a casta Cabernet Sauvignon ou Syrah, seja no “formato” varietal ou brilhando em blends com algumas castas autóctones ou emblemáticas da Espanha, mas nunca tive, por vários motivos, a oportunidade de degustar. Mas desta vez a oportunidade chegou com o protagonismo de duas castas divididas de forma igualitária: 50% para cada uma delas. É a possibilidade única de ter em nosso paladar e olfato as percepções de cada uma, cada uma com sua peculiaridade, com as suas marcantes características.

A adaptação dessas duas castas francesas na Espanha é latente, evidente e que trafega em vinhos mais diretos, básicos e jovens aos mais complexos e estruturados. Penso que o vinho que degustei e gostei de hoje navega nas duas propostas: Entrega maciez, a fruta, tão evidente e essencial nas duas castas, mas a robustez, a estrutura e diria alguma complexidade que é de realidade da velha e única Cabernet Sauvignon e a gigante Syrah.

Bem, sem mais delongas apresentemos o vinho: Señorio de Ayud, da região da Calatayud, província de Zaragoza, na tradicional região dos castelos medievais, Aragão, composto pelo blend Cabernet Sauvignon (50%) e Syrah (50%) e a safra é 2018. E para não perder o costume, já que falamos do caminho do conhecimento e da inquietação da busca do saber, falemos da região da Calatayud.

Calatayud

Calatayud é uma denominação de origem dos vinhos produzidos no entorno da região de mesmo nome, localizada a oeste da província de Zaragoza. O nome consiste em 46 municípios, dos quais o município de Calatayud é a sede principal. A área é irrigada por vários rios como o Jalón , Jiloca , Piedra, Mesa, Ribota e Manubles.

O cultivo da vinha na região traz registros desde o século II a.C. A civilização romana desenvolveu colheitas e, após um período de abandono pelos muçulmanos, os cristãos novamente deram-lhe importância como cultura colonizadora. No final do século XII os monges cistercienses promoveram a plantação da vinha com a fundação do Mosteiro de Pedra. Com a chegada da filoxera na França, os vinhedos cresceram para mais de 44.000 ha., processo favorecido pelas comunicações ferroviárias de Calatayud, que permitia a exportação. Na década de 1960 foram criadas cooperativas e obtiveram a denominação de origem em 1990. O DO Calatayud é a denominação de vinho aragonesa mais jovem e é identificada pela qualidade de seus vinhos e as condições extremas de seus vinhedos.


DO Aragão

O clima do Calatayud DOP é caracterizado por sua continentalidade, com invernos frios e verões quentes. A temperatura média anual é de 13,1 ° C, com grandes diferenças entre a noite e o dia durante o período de amadurecimento, de 5 a 7 meses de geadas, as temperaturas e as chuvas variam desde o fundo da cava com temperaturas amenas e chuvas baixas, até temperaturas mais baixas e chuvas ligeiramente mais altas, à medida que se sobe com uma precipitação média de 300 a 550 mm.

O terreno é ondulado, com a maior parte da videira assentando em solos rochosos, soltos, pobres em nutrientes e com uma elevada proporção de calcário. Eles têm boa permeabilidade e são saudáveis, favorecendo a produção de vinhos bastante intensos, encorpados, com alta graduação alcoólica e forte coloração.

A região de Calatayud dá origem aos chamados vinhos de altura. Os vinhedos estão plantados de 500 a 1040 metros de altitude, na parte mais ocidental de Zaragoza, próximo a Madrid.

Predomina o cultivo da Garnacha em vinhas com mais de 50 anos, que hoje ocupam 54% de toda a área de plantio da região. Sem dúvida, é a mais representativa do local. Em segundo lugar, fica a Tempranillo, com 21% da área, além da Cabernet Sauvignon, Syrah, Merlot, Mazuela e Monastrell. Algumas variedades brancas também são cultivadas por lá, como Gewurztraminer, Viura, Malvasia, Moscatel e Chardonnay, mas representam menos de 10% do cultivo.

Uma curiosidade: Os primeiros habitantes da cidade, os celtíberos, se assentaram a 4 km da atual cidade de Calatayud, num povoado denominado Bílbilis, que foi posteriormente conquistada pelos romanos, transformando-se numa importante cidade.

Até hoje, os nascidos em Calatayud são chamados de bilbilitanos. No entanto, Calatayud “aparece no mapa” com a chegada dos árabes em 716, quando foi construído o Castelo de Qual at Ayub, que deu o nome à cidade. No século XI, Calatayud transformou-se numa das maiores cidades da Taifa de Zaragoza. Foi reconquistada em 1120 pelo rei Alfonso I “El Batallador”, quando então recebeu o foro.

Desde 2006 celebram-se as festas chamadas “Las Alfonsadas“, quando a cidade volta a ter um aspecto medieval, recriando os acontecimentos que sucederam durante o processo da reconquista. A necessidade de repovoamento do território depois de reconquistada fez com que o foro da cidade fosse respeitoso com as minorias. A partir de então, passaram a conviver junto com os cristãos, os judeus e os mouros.

E agora finalmente o vinho!

Na taça revela um vermelho rubi intenso, quase escuro, com reflexos violáceos que confere um lindo brilho, além de lágrimas finas, lentas e em profusão.

No nariz é muito aromático e protagoniza as frutas vermelhas bem maduras, com destaque para a groselha e a cereja, com notas de especiarias, amadeiradas, mas bem discretas e em equilíbrio com a fruta, dando espaço às características das castas, com toques de tosta, graças aos 5 meses de passagem por barricas de carvalho.

Na boca apresenta certa estrutura, médio corpo, um bom volume de boca, um vinho quente, alcoólico, mas em perfeita harmonia com o conjunto do vinho, a madeira e as notas tostadas são perceptíveis, além da fruta que traz maciez e frescor. Os taninos estão bem domados, quase macios, graças aos 5 meses que “descansou” na garrafa antes de sair da bodega, com uma acidez correta e equilibrada, com um final longo e persistente.

Mais um capítulo especial escrito em minha jornada de enófilo, mais uma página escrita com maestria e que se personificou nos meus sentidos, nas minhas experiências sensoriais. Foi tão prazeroso degustar um corte tão marcante, tão cheio de personalidade como a Cabernet Sauvignon e Syrah na sua versão espanhola que figura de forma latente e importante naquele país. Essa adaptação de castas francesas às terras da Espanha mostra esse intercâmbio cultural, mas que, ao mesmo tempo se configura a tipicidade da terra tão abençoada da Calatayud: o global nunca foi tão regional. Uma jovem região vinícola para mundo, mas tradicional e história desde à época dos romanos, os primeiros viticultores da região. Um vinho especial, de marcante personalidade, complexo, mas macio, fácil de degustar, frutado e intenso. Que possamos sempre degustar vinhos dessa região. Tem 14,5% de teor alcoólico muito bem integrado ao conjunto do vinho.

Sobre as Bodegas Langa:

As vinícolas Langa estão localizadas nas proximidades de Calatayud. Esta adega, propriedade desde o seu início pela família Langa, é uma referência no mundo do vinho nesta área vitivinícola. Não em vão, tem mais de 150 anos de história e os Langas são os fundadores do DOP Calatayud .

Além disso, é uma vinícola histórica do Cava. Assim, poderá desfrutar não só da sua excelente Grenache, mas também de alguns cavas muito especiais. A adega está situada num espaço emblemático, aos pés da Sierra Vicor, local sagrado para os celtiberos e fonte de inspiração do poeta clássico de Bilbao, Marco Valerio Marcial.

Bodegas Langa oferece três experiências interessantes de enoturismo:

Toda Adega: consiste numa visita guiada à adega do Langa e uma prova de três vinhos de qualidade. É realizado em grupos de no máximo 50 pessoas e tem duração de 1 hora e 30 minutos.

Total Wine Tourism: acrescente à experiência “all winery” uma visita às vinhas, orientada pelo Diretor Técnico, que ensinará a distinguir entre as diferentes castas, sistemas de condução etc. É destinado a grupos de no máximo 8 pessoas e tem duração de 2 horas.

Vinho, História e Gastronomina: como o próprio nome indica, à visita à adega e degustação de três vinhos se soma uma visita guiada ao histórico Calatayud (introdução e passado romano da cidade, complexo jesuíta e interior da igreja de San Juan el Real (pinturas de Goya - desde que não interfiram nos horários de culto), Igreja de San Pedro de los Francos (exterior) e Palácio de Barón de Warsage, Igreja Colegiada de Santa María, Igreja de San Andrés (opcional, dependendo durante a visita), Praça do Mercado e Mesón de la Dolores Por fim, prova-se uma refeição típica de Bilbao. Os grupos são de no máximo 50 pessoas.

Mais informações acesse:

https://www.bodegas-langa.com/

Referências:

“Vino Aragones”: https://www.vinoaragones.com/bodegas-langa/

“Heraldo Gastronomia”: https://www.heraldo.es/noticias/gastronomia/2015/08/13/un-repaso-detallado-por-la-historia-de-la-d-o-calatayud-294707.html?autoref=true

“Wikipedia”: https://ca.wikipedia.org/wiki/Calatayud_(vi)

Portal “Um brasileiro na Espanha”: https://umbrasileironaespanha.wordpress.com/2015/11/22/calatayud-comunidade-de-aragon/ 


 




sábado, 11 de setembro de 2021

Baron du Tertre Malbec 2016

 

Quando degustei, pela primeira vez, um Malbec da região francesa de Cahors, o que convenhamos não é algo habitual, prometi que buscaria novas opções, novos rótulos para continuar seguindo o meu precoce caminho pela região que, de fato, é a mãe da Malbec que se notabilizou em terras argentinas, do outro lado do Oceano Atlântico.

Na realidade não foi sequer um Malbec puro, genuíno, ou seja, um Malbec 100%, mas um corte com a casta Merlot. Havia a predominância da Malbec, mas não era um Malbec pleno, cheio, integral. Precisava, além de providenciar mais um rótulo da região francesa de Cahors, de um Malbec 100%!

Depois da experiência muito interessante, diria atípica, mais emblemática da degustação do Carte Noire Malbec e Merlot da safra 2013, eu ansiava por mais um rótulo, era preciso. As minhas humildes percepções sensoriais clamavam por mais um momento como esse.

E um se apresentou para mim, diante dos meus olhos, da forma mais despretensiosa possível. Parece que dessa forma tem uma mágica, uma forma especial e peculiar. E para variar muito me interessou. Porém para ter apenas uma noção básica do que eu estava adquirindo, pesquisei algumas referências sobre o rótulo e pouco encontrei de relevante apenas algumas descrições curtas e soltas nesses perniciosos aplicativos de vinhos.

Mas descobri o site do produtor: Chateau Laur. Não vou, pelo menos ainda, tecer detalhes sobre a vinícola, mas li que a mesma tem uma posição de destaque e importância na produção de grandes Malbecs na região de Cahors e isso me encheu de entusiasmo para comprar esse rótulo. Quem sabe com esse dado tão relevante, os medos e possíveis preconceitos se dissipem?

Foi o que aconteceu! Fui tomado por um entusiasmo tão grande que comprei sem muitas hesitações o tão esperado rótulo. Ah esse rótulo é sim, um Malbec na sua versão integral! O momento tão esperado chegou!

Mais uma vez o sudoeste francês, a região de Cahors inundará a minha simples e humilde taça. Um momento especial, haja vista que a região vizinha a famosa Bordeaux, não figura com tantas vezes, nas mesas dos brasileiros, tão diferente da tão disseminada Malbec dos hermanos.

Então sem mais delongas a rolha espocou, aquele barulho agradável que inaugura o ritual da degustação, o líquido inunda a taça de forma implacável, os sentidos aguçados e a degustação acontece e...

O vinho que degustei e gostei veio de Cahors, no sudoeste francês, e se chama Baron Du Tertre Réserve, da casta Malbec e a safra é 2016. Um vinho estupendo, delicioso, um Malbec atípico, que não revela alguns toques óbvios do mais famoso, os argentinos. Mas para entender melhor essa nuances, antes de quaisquer juízos de valor intolerantes, convém conhecer um pouco da história de Cahors e do seu Malbec.

Cahors, o berço da Malbec

De Cahors na França vem a famosa uva Malbec muito plantada na Argentina e hoje uva símbolo de lá.  Mas ela não é argentina. A uva Malbec é alóctone da Argentina e autóctone de Cahors. Sim Cahors é o seu verdadeiro berço, onde ela nasceu e recebeu o nome de Côt. Pelo que contam os registros de época, as primeiras plantações de Malbec, uva conhecida na região como “Côt” datam de 92 d.C.

O vinho é frequentemente citado como o mais antigo da Europa e foi conhecido devido a sua cor intensa como o vinho “negro” de Cahors. Os vinhos de Cahors desde a idade média são longevos e escuros com forte personalidade. As plantações ocupam atualmente cerca de 4.300 hectares, sendo a produção máxima permitida de 50 hectolitros por hectare.

Na região, a uvas permitidas para vinhos tintos são a Côt (Malbec), a Tannat, a Cabernet Franc e a Gamay em Coteaux du Quercy. Cahors permanece com a marca da antiga Côt que se revela em personalidade forte insistente, arrojada e com expressão mais rústica, compensando em longevidade.

Oferece assim, robustez, estrutura e boa guarda. A uva é liberada para os cortes de Bordeaux, mas pouco utilizada por lá, hoje em dia.A região de Cahors fica a cerca de 230 KM de Bordeaux no departamento de Lot, na região Sud-Est da França fazendo fronteira com o departamento da Dordogne.

Cahors

Cahors sofreu forte influência de seu poderoso vizinho, Bordeaux, em sua dramática história. O vinhedo foi criado pelos romanos e, durante a Idade Média, seu prestígio teve expressivo crescimento. O casamento de Eleanor de Aquitânia com Henrique II, rei da Inglaterra, abriu as portas do grande mercado consumidor inglês, antes dominado pelos vinhos de Bordeaux.

No entanto, os poderosos produtores e comerciantes bordaleses, sentindo-se ameaçados, mobilizaram-se para pressionar Londres e conseguiu arrancar do rei da Inglaterra alguns privilégios exorbitantes, o que resultou num duro golpe para os produtores gascões. Além de sofrerem pesada taxação, os vinhos do sudoeste só podiam chegar à capital inglesa depois que toda a produção bordalesa estivesse vendida.

Tal regra durou cinco séculos (foi interrompida apenas em três curtos períodos) e o vinho da região sentiu o golpe. Esta conduta só foi abolida em 1776, pelo liberal ministro de finanças de Luís XVI, Jacques Turgot, quando se iniciou um novo ciclo dourado dos fermentados de Cahors.

Jacques Turgot

Apesar da Revolução Francesa e das guerras do Império já no século XIX, 75% do vinho da região era exportado e um terço das terras agriculturáveis eram dedicadas à vinha, que cobria a impressionante área de 40 mil hectares. A região enfrentou bem a praga do oídio (de 1852 a 1860) e a superfície plantada subiu ainda mais, chegando a 58 mil ha. Para se ter uma ideia da queda que viria mais tarde, a área do vinhedo de Cahors hoje é de apenas 4.200 ha.

Mas o território teve pior sorte ao enfrentar a filoxera no final do século XIX. Como se sabe, todos os vinhedos atacados no mundo tiveram de ser replantados, desta vez, de forma enxertada. Então, as vinhas de Malbec reagiram muito mal a esta nova situação, dando origem a fermentados medíocres, com qualidade muito abaixo da que tinha anteriormente.

Apenas no final dos anos 1940, depois de muita pesquisa, chegou-se ao clone 587 da Malbec, que teve muito boa adaptação. Assim se retomou, então, sua marcha ascendente até chegarmos a 1971, quando Cahors é declarada região AOC (Appellation d'Origine Contrôlée, denominação de origem controlada).

As normas dessa denominação determina que o vinho deve ser composto de, pelo menos, 70% de Malbec, sendo o restante feito com a tânica Tannat e a macia Merlot. A Cabernet Sauvignon e a Cabernet Franc não são permitidas. O vinho é bastante escuro e encorpado, com boa fruta e mais austero e seco do que o Malbec argentino. Dependendo da sub-região, pode ser mais leve e para consumo mais precoce, ou mais estruturado e passível de longa guarda.

E agora finalmente o vinho!

Na taça revela um vermelho rubi intenso, quase escuro, com reflexos violáceos que trazia um brilho bonito, com lágrimas finas e que logo se dissipavam das paredes do copo.

No nariz é pouco aromático, apenas uma discreta nota de frutas pretas, talvez groselha negra ou amora, com toques de especiarias, alguma rusticidade típica da região berço da Malbec, Cahors.

Na boca é seco, de médio corpo, um pouco alcoólico, mas bem equilibrado com o conjunto do vinho, pouco ou quase nada frutado, com a presença rústica graças as notas terrosas, de couro, tabaco e de especiarias, algo de pimenta, talvez. Os taninos são estruturados e marcantes, com uma boa acidez e um final de média persistência.

Mais uma página escrita em minha história de enófilo. E foi um capítulo consistente e especial na minha caminhada no vasto, inexplorado e incrível universo dos vinhos. Degustar um Malbec de Cahors é especial! Não é todo dia, não é habitual, é diferente, é diria uma sensação indescritível. Os sentidos agradecem as reações sensoriais, as experiências se revelam únicas, singulares. É claro que as percepções são pessoais, cada um se identifica com aquilo que te faz bem, que te traga prazer, óbvio, mas é preciso entender as nuances, as propostas que cada vinho entrega, com o seu terroir, as características marcantes de sua terra e de sua cultura. O Baron Du Tertre Réserve trazem notas mais rústicas, e não o frutado típico do vinho argentino, os taninos mais intensos, poderosos, até um pouco mais adstringentes. E são essas nuances que faz do mundo do vinho algo apaixonante e especial. Um belo vinho, um vinho especial, um vinho de personalidade, um vinho que ficará marcado! E que muitos outros vinhos de Cahors encha de história novas páginas da minha caminhada de um simples, mas feliz, enófilo. Tem 13% de teor alcoólico.

Sobre o Chateau Laur:

Desde que fundou as suas atividades em 1881, é nas altas colinas de Floressas, berço ancestral da vinha de Cahors, que a família Laur se anima por uma ambição constante há seis gerações: produzir vinhos de qualidade.

Hoje, três gerações trabalham juntas, sendo que enquanto os mais velhos trazem o método tradicional, os mais novos melhoram o cuidado contínuo com as vinhas e as colheitas. “Château Laur” é uma propriedade de 46 hectares com vinhas que se beneficiam de um terroir de excelência composto por solos argilosos – calcários ferruginosos intrincados, bem como uma exposição ideal que garante um sol privilegiado à vinha.

A família Laur acumulou o know-how de gerações no trabalho com a Malbec, casta única e histórica da AOC Cahors, e assim produzir com excelência os varietais da casta. No momento em que atingem a maturidade ideal, as uvas são colhidas delicadamente e curadas rapidamente para preservar o máximo de aroma e garantir um perfeito estado sanitário da vindima.

A vinícola exerce um controle tradicional das temperaturas para as macerações preferenciais em macerações frias assim como as macerações quentes no final da fermentação. Cada parcela e cada videira são vinificados separadamente para assim criar o conjunto mais harmonioso e mais elegante. O vinho é envelhecido em prestigiadas barricas de carvalho francês de tal forma que obtém um casamento harmonioso e complexo entre os aromas do terroir e os libertados pelos finos grãos da barrica (notas de tosta, chocolate, baunilha, outros).

A riqueza e a diversidade dos terroirs incentivaram a família a criar vários cuvées onde cada um expressa uma tipicidade, um carácter assim como uma expressão de terroir diferente. O “L’hor” cuvée, o cuvée confidencial da propriedade, é um dos mais belos exemplos da denominação e é um dos locais certamente obrigatórios quando se fala sobre os grandes rótulos. 

Mais informações acesse:

https://vignobles-laur.fr/en/chateau-laur-wines/

Referências:

Portal “Enoestilo”: https://www.enoestilo.com.br/cahors-o-berco-malbec-2000-anos-de-historia/ e https://www.enoestilo.com.br/mapas-vinho-dicas-regiao-de-cahors/

“Revista Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/cahors-outra-terra-da-malbec_439.html




 

 


segunda-feira, 6 de setembro de 2021

Nzinga Cape Red 2018

História, degustações, celebrações, experiências sensoriais... Sempre enalteço essas palavras quando penso ou falo sobre vinhos. Não há como dissociar, como falar, de forma isolada, sobre essas questões quando falamos sobre vinho. Claro que há pessoas que não ligam muito para a história do vinho, do rótulo que está degustando, tais como as castas, as regiões etc.

Respeitamos essas decisões, mas penso como enófilo, que ter acesso a história, por exemplo, de um vinho, pode ser preponderante para a decisão de compra e melhor: criar uma identidade com o tipo de vinho que gosta, ajuda a você a chegar ao vinho que gostaria de degustar no momento ou a construção de suas predileções para com determinadas propostas da poesia líquida.

Alguns vinhos confesso, me chamam a atenção pelo aspecto visual, pelo que apresenta nos seus rótulos. Algumas manifestações do marketing certamente explicam tal fenômeno, mas é deveras cuidadoso levar isso a ferro e fogo no quesito vinho. Nem todos os vinhos entregam ao degustador qualidade pelo fato de ostentar um bonito rótulo, pelo que ele necessariamente diz, mas, por outro lado, pode ser relevante para entendê-lo, daí a importância de se estudar o que o rótulo quer transmitir.

Quando vi o rótulo de um vinho sul-africano logo me chamou a atenção, me atraiu pela beleza e pelo nome que me parecia muito peculiar. Mas não fiquei restrito ao que ele dizia e logo comecei a garimpar o que ele queria traduzir no rótulo e o que poderia me proporcionar de especial. As informações, aos poucos, mesmo que limitadas, foram surgindo e isso foi atraindo a minha atenção.

E de posse de algumas informações, bem como alguns detalhes do vinho propriamente dito, tais como castas, safra etc, decidi compra-lo, afinal, nada mais importante e especial celebrar o amor ao vinho por vinhos da África do Sul tão constantes hoje em nossa realidade, o que era inviável há 20 anos, quando ainda era apenas uma distante possibilidade de tê-los em nossa adega.

E quando o vinho finalmente foi aberto, mais uma vez, não fui decepcionado. Então vos apresento o vinho que degustei e gostei e que veio da toda poderosa região de Western Cape, e se chama Nzinga Cape Red, um excelente blend composto pelas castas Cabernet Sauvignon (68%), Merlot (18%) e Syrah (14%) da safra 2018.

Ah e já que falei das “atrações” que podem gerar interesse e que estão contidas nos rótulos dos vinhos, de cara, quando o vi pela primeira vez, o nome “Nzinga” me atraiu, me interessou e o que, após, a compra, no seu contra rótulo o produtor diz que o significado da palavra é:

 “Nzinga é um nome da África Central que significa ‘beleza e coragem’”.

Mas em uma pesquisa mais aprofundada vi que “Nzinga” era um nome de uma princesa africana, a Princesa Nzinga, que foi uma forte figura que fez oposição ao lucrativo comércio de escravos no século XVII. Leia mais em: “Nzinga, a rainha negra que combateu os traficantes portugueses”.

Mas antes de falar desse vinhaço, falemos da região de onde é oriundo, da toda poderosa Western Cape, uma dos maiores produtores de vinho da África do Sul.

Western Cape: a toda poderosa região vinícola sul africana

Localizada a sudoeste da África do Sul, tendo a Cidade do Cabo como ponto central, Western Cape é a principal região vitivinícola do país, responsável por cerca de 90% da produção vinícola do país.

Boa parte da indústria do vinho sul-africana se concentra nessa área e microrregiões como Stellenbosch e Paarl são alguns de seus principais destaques. Com terroir bastante diversificado, a combinação do clima mediterrâneo, da geografia montanhosa, das correntes de ar fresco vindas do Oceano Atlântico e da variedade de uvas permite que Western Cape seja considerada uma verdadeira potência da produção de vinhos no país.

Suas regiões vinícolas estendem-se por impressionantes 300 quilômetros a partir da Cidade do Cabo até a foz do rio Olifants ao norte, e cerca de 360 quilômetros até a Baía Mossel, a leste – para entender essa grandiosidade, vale saber que regiões vinícolas raramente se estendem por mais de 150 quilômetros.

 

Western Cape

O clima fresco e chuvoso também favorece o plantio e a colheita por toda a região. Entre os grandes destaques de Western Cape estão as uvas Pinotage, Cabernet Sauvignon e Shiraz, que dão origem a excelentes varietais e blends. Entre os brancos – que, por si só, têm grande reconhecimento mundial –, brilham a Chenin Blanc, uva mais cultivada do país, a Chardonnay e a Sauvignon Blanc.

As primeiras vinhas plantadas na região remetem ao século XVII, trazidas por exploradores europeus que se fixaram por lá. Durante vários séculos, fatores como o estilo rudimentar de produção, o Apartheid e a falta de investimentos mantiveram a cultura vitivinícola sul-africana limitada ao próprio país.

Somente no início do século XX, com a formação da cooperativa KWV, que a África do Sul começou a responder por todo o controle de qualidade do vinho que se produzia por lá, e seus rótulos passaram a chamar a atenção do mercado internacional, dando início a um processo de exportação que conta, inclusive, com selos de qualidade específicos para a atividade.

A proximidade da Cidade do Cabo facilita o acesso dos visitantes às inúmeras rotas vinícolas e turísticas de Western Cape, que incluem experiências como caminhadas, degustações por suas muitas bodegas, além de ótimos restaurantes e hospedagens em suas pequenas e aconchegantes cidades, a maioria em estilo europeu.

E agora finalmente o vinho!

Na taça entrega um vermelho rubi intenso, quase escuro, com brilhantes reflexos violáceos, com uma razoável quantidade de lágrimas finas e que logo se dissipavam das paredes do copo.

No nariz uma explosão de frutas negras como ameixa e amora e frutas vermelhas como groselha e cereja, uma compota de frutas que traz jovialidade, frescor e até personalidade ao vinho, isso graças aos 10 meses em tanques inox, privilegiando as características de cada cepa sendo evidenciado também no paladar. Notas de especiarias também são percebidas.

Na boca é saboroso, marcante, por ser muito frutado, com as nuances bem definidas das castas que compõe o blend, onde a personalidade da Cabernet Sauvignon é perceptível, bem como a maciez da Merlot e os agradáveis e discretos toques apimentados e herbáceos garantidos pela Syrah. Têm taninos sedosos, boa acidez e um final cheio e prolongado.

História, celebração, degustações, nomes que pode parecer um tanto quanto deslocado para muitos, mas que pode revelar rótulos especiais para quem tem apreço pelas taças sempre cheias. Nzinga Cape Red traz uma versão sul africana de um vinho fresco, frutado, mas especial por sua simplicidade, por ser direto, jovem, harmonioso e com uma incrível capacidade de harmonização, sendo muito versátil. A incrível capacidade dos vinhos sul africanos onde mesmo sendo jovial, frutado e direto, revela uma marcante personalidade. Personalidade esta, acredito, que já começa no seu interessante blend: A personalidade entregue pela Cabernet Sauvignon, a maciez da Merlot e as especiarias da Syrah. Um vinho que expressa toda a tipicidade da África do Sul, do terroir de Western Cape. Um vinho belo, saboroso, delicado e intenso. Tem 13,5% de teor alcoólico.

Sobre a Marianne Wine Estate & Guesthouse:

Originário de Bordeaux, a família possui 3 propriedades vinícolas, se aproximando da África do Sul graças as suas várias viagens pelo mundo, aportando no sul da África.

O sonho era combinar o Velho e o Novo Mundo para fazer vinhos próximos da da visão de perfeição dos produtores. Portanto, decidiram comprar a Marianne Wine Estate & Guesthouse, uma vinícola boutique de 32 hectares (incluindo 24 em vinhas) localizada no vale Simonsberg em 2004.

A colheita manual, a seleção das melhores uvas, o envelhecimento em carvalho francês e acácia, combinados com um "savoir-faire" francês do enólogo sul-africano Jos Van Wyk, irão levá-lo a explorar alguns dos melhores vinhos produzidos na região.

Mais informações acesse:

http://www.mariannewines.com/

Referências:

“Vinho Capital”: https://vinhocapital.com/tag/wine/page/3/

“Wine”: https://www.wine.com.br/winepedia/enoturismo/western-cape-a-gigante-sul-africana/?doing_wp_cron=1611015613.7245669364929199218750#:~:text=Localizada%20a%20sudoeste%20da%20%C3%81frica,alguns%20de%20seus%20principais%20destaques.

“Portal Geledés”: https://www.geledes.org.br/nzinga-a-rainha-negra-que-combateu-os-traficantes-portugueses/ 


 

domingo, 5 de setembro de 2021

Miolo Family Vineyards Cabernet Franc 2019

 

Eu já falei, até de forma deliciosamente demasiada, da importância da vinícola Miolo para a minha história, a minha trajetória no universo dos vinhos. A construção contínua do enófilo Bruno tem, sem sombra de dúvida, como sustentáculo, como pilar, a Miolo.

Aquela transição dos famosos vinhos de mesa, de uvas americanas, dos garrafões para os vinhos finos. Os receios, os medos... Será que vou gostar desses vinhos secos? Será que valerá a pena investir um pouco mais caro, com o dinheiro que não tem, nesses vinhos e a decepção bater como um tsunami nas minhas estruturas sensoriais? Muita coisa passou na minha cabeça naquela época, a pouco mais de 20 anos e cá estou materializando esse momento importante em minha vida vínica.

Mas não vou entrar nesse detalhe que, em algumas resenhas deste humilde blog, teci com todo o carinho e nostalgia, mas falar de uma casta que também foi de extrema importância para esse momento em minha vida enófila: A Cabernet Franc.

A Cabernet Franc, apesar de ser oriunda de terras francesas, ganhou muita popularidade no Brasil nos anos 1970 e parte dos anos 1980, gozando de um triste declínio nos anos seguintes, mas que na virada da década de 1990 e 2000 figurou com importância na minha vida.

Quando dessa minha transição, juntamente com a Merlot, a Cabernet Franc foi muito importante para moldar as minhas estruturas sensoriais, mas ainda assim, não foi tão permanente quanto a casta, igualmente excepcional, Merlot. Degustava um rótulo da Cabernet Franc, me arrebatava, adorava, depois ficava algum tempo sem degustar e quando desarrolhava uma, era maravilhoso. Lembro, com muita alegria e nostalgia quando degustei o meu primeiro: quem está na faixa dos 40 anos deve lembrar-se do Chateau Duvalier e do seu Cabernet Franc! Ah foi o meu primeiro!

Chateau Duvalier Cabernet Franc

Depois fui degustando um ou outro até que ele se afastou de minha vida enófila. Até que em 2017 estava em um evento de degustação destinado aos rótulos brasileiros e avistei, em um stand, uma vinícola mineira, com alguns rótulos e entre eles tinha um da casta Cabernet Franc que me levou de volta para o passado. Era o Dom de Minas Cabernet Franc 2014 e que vinho legal! E depois dessa degustação mais um hiato!

Mas quando recebi, de um clube de vinhos de uma loja de e-commerce famoso, alguns rótulos, adivinhe, da Miolo, uma edição especial, da casta Cabernet Franc e isso muito me animou. A safra denuncia ser de um jovial vinho e que aguentaria um pouco mais, porém, dada a minha expectativa, precisava rememorar tempos bons do meu início enófilo e degustar, novamente, um Cabernet Franc brasileiro!

Dos 2 rótulos que recebi, o Miolo Family Vineyard Touriga Nacional da safra 2019, já fora degustado e o retorno foi espetacular, o que me estimulou a degustar o Miolo Family Vineyard Cabernet Franc também da safra 2019. Opa, já apresentei o “artista do espetáculo”, do vinho que degustei e gostei. Que vinho especial! Delicioso, fácil de degustar, de marcante personalidade.

A Cabernet Franc foi plantada em 1978, em espaldeira, no vinhedo Almadén, na Campanha Gaúcha, região que se destaca pelo grande potencial no setor vitivinícola, em especial aos vinhos tintos, tendo recebido a Indicação geográfica ainda em 2020.

Mas não falarei, pelo menos ainda do vinho, mas da história de sua região, Campanha Gaúcha, região esta, responsável pela recuperação da Cabernet Franc no Brasil e da história da casta em nossas terras.

Cabernet Franc

É praticamente unânime dizer que esta variedade de uva seja nativa da icônica região de Bordeaux, considerando que lá ela participa da composição de vinhos raros, únicos e de considerável valor agregado. Frequentemente está mais presente em blends com outras uvas, principalmente com a Cabernet Sauvignon e a Merlot. Junto com as duas, forma o famoso “corte bordalês”, celebrizado na região que lhe cedeu o nome.

Possui parentesco com a Cabernet Sauvignon e com a Merlot. É um pai/mãe da Cabernet Sauvignon. Uma das principais características dos vinhos com a Cabernet Franc são os aroma herbáceos e vegetais. Em climas mais frios produz vinhos com aromas de frutas frescas, como cereja e morango, já em climas mais quentes, os aromas tendem a morangos maduros e framboesa negra.

Em comparação à Cabernet Sauvignon, pode-se observar que a Cabernet Franc tem a casca mais fina, além de menor acidez, mais intensidade de aromas e menos taninos. Ainda é uma uva resistente, amadurece antes da Cabernet Sauvignon (aproximadamente uma semana mais cedo) – o que a torna muito bem adaptável a regiões mais frias, a exemplo do Vale do Loire, os vinhos desta variedade são mais interessantes quando o solo é composto por areia, calcário e argila, não apresentam coloração muito profunda, podendo ter corpo leve ou médio, ótimo frescor e textura macia e seus aromas são bastante característicos, remetendo a frutas como framboesa e groselha, bem como a pimenta e leves toques vegetais e algumas variedades ainda contam com notas de violeta.

A sua coloração é mais inclinada para o vermelho rubi, de média intensidade, sendo também de corpo leve ou médio. Outro ponto interessante é sua habilidade em preservar a acidez da fruta, trazendo frescor ao produto final.

Cabernet Franc no Brasil

A história da Cabernet Franc no Brasil vem de longa data. De fato, foi introduzida no Rio Grande do Sul pela Estação Agronômica de Porto Alegre, por volta de 1900. Nos anos 1920, os Irmãos Maristas já a cultivavam comercialmente em Garibaldi. A grande difusão da cepa, contudo, ocorreu nas décadas de 1970 e 1980, tornando-se a base dos vinhos finos tintos brasileiros nesse período. Mais tarde, acabou sendo relegada a segundo plano e gradualmente substituída pela Cabernet Sauvignon e pela Merlot. Até poucos anos atrás, chegou a ser vendida pelo preço de uva comum.

Não obstante, é uma planta vigorosa, de média maturação, que se adapta bem a solos calcários. E mais, a vinha de Cabernet Franc floresce e amadurece seus frutos mais cedo do que outras variedades. Assim, ela se adapta bem às condições da Serra Gaúcha onde, sabidamente, há anos em que o amadurecimento é mais complicado devido às condições climáticas, principalmente quando se tem incidência de chuva próxima à época de colheita. Fato é que, em vinhedos trabalhados com atenção e cuidado, conseguem-se uvas de boa qualidade, com potencial para produzir vinhos com tipicidade e de padrão excepcional.

Gráficos da Embrapa mostram que, em 1985, produziu-se pouco mais de 10 mil toneladas de Cabernet Franc e que, em 2001, esse número havia caído para aproximadamente 2,5 mil toneladas. Os números refletem o que aconteceu com a cepa no Brasil: as vinhas foram praticamente erradicadas no Rio Grande do Sul – tanto na Serra Gaúcha, quanto na Campanha – e depois reintroduzidas gradativamente, através de outros clones mais saudáveis.

A boa notícia é que essas novas vinhas já vêm produzindo, e produzindo bem. Atualmente, temos poucos, mas muito bons, rótulos dessa variedade sendo feitos no sul, tanto no Vale dos Vinhedos, quanto na Campanha Gaúcha, em Flores da Cunha e, principalmente, em Pinto Bandeira. O melhor de tudo é que a Cabernet Franc tem sido aproveitada para vinhos em um estilo mais concentrado e de fruta mais madura.

Campanha Gaúcha

Entre o encontro de rios como Rio Ibicuí e o Rio Quaraí, forma-se o do Rio Uruguai, divisa entre o Brasil, Argentina e Uruguai. Parte da Campanha Gaúcha também recebe corpo hídrico subterrâneo, o Aquífero Guarani representa a segunda maior fonte de água doce subterrânea do planeta, dele estando 157.600 km2 no Rio grande do Sul. A Campanha Gaúcha se espalha também pelo Uruguai e pela Argentina garante uma cumplicidade com os hermanos do outro lado do Rio Uruguai. Os costumes se assemelham e os elementos locais emprestam rusticidade original: o cabo de osso das facas, o couro nos tapetes, a tesoura de tosquia que ganha novas utilidades.

Campanha Gaúcha

No verão, entre os meses de dezembro a fevereiro, os dias ficam com iluminação solar extensa, contendo praticamente 15 horas diárias de insolação, o que colabora para a rápida maturação das uvas e também ajuda a garantir uma elevada concentração de açúcar, fundamental para a produção de vinhos finos de alta qualidade, complexos e intensos.

As condições climáticas são melhores que as da Serra Gaúcha e tem-se avançado na produção de uvas europeias e vinhos de qualidade. Com o bom clima local, o investimento em tecnologia e a vontade das empresas, a região hoje já produz vinhos de grande qualidade que vêm surpreendendo a vinicultura brasileira.

Há mais de 150 anos, antes mesmo da abolição da escravatura, a fronteira Oeste do Rio Grande do Sul já produzia vinhos de mesa que eram exportados para os países do Prata (Uruguai, Argentina e Paraguai) e vendidos no Brasil.

A primeira vinícola registrada do Brasil ficava na Campanha Gaúcha. Com paredes de barro e telhado de palha, fundada por José Marimon, a vinícola J. Marimon & Filhos iniciou o plantio de seus vinhedos em 1882, na Quinta do Seival, onde hoje fica o município de Candiota.

E o mais interessante é que, desde o início da elaboração de vinhos na região, os vinhos da Campanha Gaúcha comprovam sua qualidade recebendo medalha de ouro, conforme um artigo de fevereiro de 1923, do extinto jornal Correio do Sul de Bagé.

E agora o vinho!

Na taça revela um intenso vermelho rubi, brilhante, com reflexos violáceos, com uma boa concentração de lágrimas finas.

No nariz o destaque fica para explosão de aromas frutados, de frutas vermelhas, tais como morango, framboesa, morango e ameixa, com discretas notas amadeiradas, graças aos 6 meses de passagem por barricas de carvalho, em um pleno equilíbrio, além de toques herbáceos, de especiarias, meio apimentados, diria.

Na boca é delicado, com uma textura macia, cheio, um bom volume de boca, mostrando certa estrutura, mas muito fácil de degustar, as notas frutadas são evidentes o que corrobora o seu frescor, graças também a sua equilibrada acidez, com taninos domados. A madeira também é percebida, como no aspecto olfativo, bem como as especiarias, destaque para um fundo herbáceo. Tem um final persistente e frutado.

Um vinho que trouxe momentos nostálgicos maravilhosos, mas que, no atual momento, me proporcionou o que há de melhor para as minhas experiências sensoriais: Um vinho intenso, de personalidade, mas fácil de degustar, por ser extremamente elegante, frutado e com alguma complexidade, que a breve passagem por barricas de carvalho proporcionou. Depois de algum hiato, a Cabernet Franc trouxe à tona para os meus sentidos o quão importante foi para a minha história vínica, entregando o que eu já esperava, mas com aquele “tempero” de novidade que me embriagou de prazer. História, degustações, celebrações, tudo mesclado pela poesia líquida enchendo a taça e a minha satisfação. Que venham mais e mais degustações da delicada Cabernet Franc! Tem 13,5% de teor alcoólico muito evidente, mas muito bem integrado ao conjunto do vinho.

Sobre a Vinícola Miolo:

A história da família Miolo no Brasil começa em 1897. Entre os milhares de imigrantes italianos que vieram ao país em busca de oportunidades, estava Giuseppe Miolo, um jovem que já tinha nas veias a paixão pela uva e pelo vinho, vindo da localidade de Piombino Dese, no Vêneto. Ao chegar ao Brasil, Giuseppe foi para Bento Gonçalves, município recém-formado por imigrantes italianos. Entregou suas economias em troca de um pedaço de terra no vale dos vinhedos, chamado Lote 43. Já em 1897, o imigrante começou a plantar uvas, dando início a tradição vitícola da família no Brasil.

Na década de 70, a família foi pioneira no plantio de uvas finas, fazendo com que os netos de Giuseppe Miolo, Darcy, Antônio e Paulo, ficassem muito conhecidos na região pela qualidade de suas uvas. No final da década de 80, uma crise atingiu as cantinas dificultando a comercialização de uvas finas e forçando a família Miolo, a partir de 1989, a produzir o seu próprio vinho para a venda a granel para outras vinícolas. Surge a Vinícola Miolo, com apenas 30 hectares de vinhedos. Em 1992 a primeira garrafa assinada pela família foi um Merlot safra 1990, que na partida inicial teve 8 mil garrafas produzidas. Em 1994 é lançado o Miolo Seleção, que logo se torna o vinho mais distribuído da Miolo.

A paixão pela vitivinicultura e o desejo de levar mundo afora o vinho fino brasileiro foi o que inspirou a família Miolo a tomar a decisão de expandir o negócio. Inicia-se em 1998 o Projeto Qualidade. Desde então o crescimento da empresa foi significativo: com investimentos constantes na terra, tecnologia, recursos humanos e no próprio consumidor, iniciou-se também o Projeto de Expressão do terroir brasileiro.

Instalado na Estância Fortaleza do Seival, localizada no Sul do Brasil, no município de Candiota, próximo à divisa com o Uruguai, o “Projeto Seival”, nos anos 2000. Em 2001 a Família Miolo juntamente com a família Benedetti (Lovara) iniciam o projeto Terranova no Vale do São Francisco, adquirindo a antiga propriedade do Sr. Mamoro Yamamoto chamada Fazenda Ouro Verde. Em 2009 a Família Miolo, juntamente com a família Benedetti e a família Randon, adquirem a Vinícola Almadén pertencente a Pernod Ricard. Sendo também uma das mais importantes do segmento de vinhos no mercado nacional, introduzindo a colheita mecânica, pioneira no Brasil.

Mais informações acesse:

https://www.miolo.com.br/

Referências:

“Wine”: https://www.wine.com.br/winepedia/sommelier-wine/serie-uvas-cabernet-franc/

“Blog Famiglia Valduga”: https://blog.famigliavalduga.com.br/cabernet-franc-day-o-que-voce-precisa-saber-sobre-o-assunto/

“Werle Comercial”: https://www.werlecomercial.com.br/falando-de-uva-tudo-sobre-a-cabernet-franc

“Vinho Básico”: https://www.vinhobasico.com/2017/01/30/cabernet-franc/

“Revista Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/cabernet-franc_10078.html

“Academia do Vinho”: https://www.academiadovinho.com.br/__mod_regiao.php?reg_num=CAMPANHA

“Vinhos da Campanha”: https://www.vinhosdacampanha.com.br/campanha-gaucha/












sexta-feira, 3 de setembro de 2021

Fazenda Santa Rita Pinot Noir 2017

 

O natal é um ótimo período do ano para harmonizar vinhos! São tantas opções, são tantos pratos, dos mais diversos que você pode escolher vinhos de todas as propostas: dos mais doces aos mais encorpados, dos secos aos frutados. A lista é grande! Porém, contudo, entretanto, todavia, a diversidade é tamanha que às vezes geram dúvidas e questionamentos quanto às famosas harmonizações enogastronômicas.

Digo isso porque, confesso não ser muito bom nas harmonizações, o mínimo que sei são as harmonizações com os queijos e olha lá, fazendo, muita das vezes, com o apoio de informações coletadas na grande rede.

Quando chega o período natalino e de ano novo é sempre aquele dilema, aquela dúvida recorrente de qual vinho escolher para harmonizar com essa infinidade de comidas que a nossa mãe ou a nossa avó, exageradas como são, faz e entope as mesas faltando espaço na maior parte das vezes, na mesa e na barriga também.

Depois de alguns erros, equívocos da minha parte, ao escolher determinados rótulos, e digo isso não porque há algo estabelecido por formadores de opinião que determina que o prato “A” é perfeito para o vinho “B”, pois sempre escolhi os vinhos que achavam ser interessante para alguns pratos natalinos, eu encontrei um denominador comum, um vinho versátil, um coringa para essas ocasiões festivas. E bingo! Foram os rótulos da casta Pinot Noir.

Pinot Noir, uma casta frutada, delicada, leve tem tudo a ver, pelo menos para mim, com o período natalino, a começar pelo tempo: No natal estamos no verão e nada mais adequado degustar um Pinot Noir mais refrescado, até geladinho. É interessante também com os tradicionais pratos, como: Peru, Chester, as aves, carne branca. Essa conclusão eu cheguei, modéstia à parte, sozinho, com todo respeito aos profissionais da área, como os somelliers, tão importantes nessa hora.

Então naquele natal de 2019, olhei para a adega sem a dúvida dos natais passados, com aquele pergunta cheia de drama e dilema: Que vinho degustar nesse natal? Resolvi olhar com mais carinho para os Pinots!

E escolhi um nacional, de uma região que naquela época, pelo menos para mim, era nova do Rio Grande do Sul, mais precisamente da cidade de Campos de Cima da Serra. O vinho que degustei e gostei se chama Fazenda Santa Rita e a casta é a Pinot Noir da safra 2017. Tudo era novo: a região, o rótulo que eu havia conhecido em um evento de degustação famoso, então o momento foi singular.

Então já que falei de novidades, vamos contar um pouco a história de Campos de Cima da Serra e do crescimento exponencial dessa região para o cenário vitivinícola do Brasil e depois o vinho e as minhas impressões que foram das melhores possíveis.

Campos de Cima da Serra

Por muito tempo, a região dos Campos de Cima da Serra ficou à sombra da Serra Gaúcha. A predominância do cultivo de variedades híbridas e o clima frio e ventoso eram encarados como entraves para o desenvolvimento de grandes vinhedos. Atualmente, no entanto, o cenário é o oposto. A baixa temperatura e a incidência constante do vento foram transformadas em diferenciais, pois propiciam uma maturação mais longa e condições para que as uvas viníferas apresentem excelente sanidade. As iniciativas de empresários que se aventuraram em elaborar vinhos na região foram recompensadas com grandes rótulos, hoje nacionalmente conhecidos por sua qualidade.

A Vitivinicultura na região dos Campos de Cima da Serra é recente, iniciou com pesquisas realizadas pela Embrapa Uva e Vinho, que desde 2004 conduz experimentos nas áreas de viticultura e enologia na região, tem indicado condições favoráveis devido ao solo e o clima. Ainda em fase de crescimento, destacam-se municípios como Campestre da Serra, Monte Alegre dos Campos, Ipê e Vacaria. Até então, o que víamos eram esplêndidas maçãs, sobretudo plantadas em Vacaria: "maçãs da Serra Gaúcha para a sua mesa!", um slogan bem conhecido localmente.

Campos de Cima da Serra ao norte

Naturalmente tem naquelas terras, devido ao fato de ser um pouco mais frio, um terreno propício para ciclos vegetativos mais longos e aos vinhos com menor teor alcoólico, acidez mais alta e boa estabilidade de cor e bom perfil aromático (os dois últimos graças à boa amplitude térmica).

Recordando a teoria: a cada 100 metros de altitude a temperatura média decresce em torno de 0,5 graus e corresponde a um retardo de 2-3 dias no período de crescimento da planta. Isso, comparativamente, coloca a região de Campos de Cima mais próxima de um clima de Bordeaux, ao contrário da Serra Gaúcha. Mas, há uma boa insolação sem dúvidas! Aliás, turisticamente, dali pode-se iniciar, rumo ao litoral, a conhecida "Rota do Sol"!

Como os ciclos da planta são longos, há colheitas de uvas tardias como a Cabernet Sauvignon no mês de abril, fato que traduz uma maturação lenta e que associada à já citada amplitude térmica (com variações de 15 graus em média, entre dia-noite) propicia vinhos mais harmônicos, com bom equilíbrio geral entre corpo-álcool-acidez.

Dentre as uvas principais temos as tintas Ancelotta, Cabernet Franc, Cabernet Sauvignon, Merlot, Tannat e Pinot Noir. Esta última, tem tido bom destaque, sobretudo no munícipio de Muitos Capões. As brancas mais cultivadas são Chardonnay, Moscato Branco, Glera (Prosecco), Trebbiano e a de melhor potencial de qualidade, a Viognier.

As videiras estão situadas principalmente em três municípios: Vacaria, Muitos Capões e Monte Alegre dos Campos. As uvas Pinot Noir e Chardonnay (uvas utilizadas na elaboração de espumantes)são muito cultivadas na região que apresenta clima temperado, com boa amplitude térmica. Por conta das baixas temperaturas, as videiras têm um ciclo vegetativo mais longo, brotam mais tarde. Consequentemente, a colheita é mais tardia, quase no início do outono.

Pode-se resumir que a região de Campos de Cima da Serra aporta e acrescenta um toque a mais de sutilezas climáticas, permitindo a diversificação de estilos de vinhos do Rio Grande do Sul como um todo e, por sua bela paisagem natural, pode se tornar um novo polo turístico, a contrapartida lúdica no trabalho de informação e educação sobre vinhos aos consumidores.

E agora o vinho!

Na taça revela um vermelho rubi de pouca intensidade, típico dos vinhos da casta Pinot Noir, mas com um excepcional brilho, que exaltam os tons violáceos com algumas poucas finas e lágrimas que logo se dissipavam das paredes do copo.

No nariz a predominância das frutas faz do vinho leve, fresco, mas intenso, marcante, graças a essa qualidade aromática, predominando as notas de morango, framboesa e aquele toque floral, de flores vermelhas.

Na boca é um vinho leve, fresco, equilibrado, delicado, elegante, as notas frutadas se repetem, com uma excelente e instigante acidez que corrobora a sua condição de frescor, com taninos redondos e domados, quase imperceptíveis, com um final frutado e prolongado.

Um vinho harmônico, saboroso, que enche a boca, mas que se revela delicado e muito elegante como todo e qualquer rótulo que ostente a casta Pinot Noir. Um vinho de excelente custo x benefício, especial, que caiu como uma luva nas harmonizações natalinas. Consegui degustar tudo com um único vinho e ficou maravilhoso, fantástico. Um vinho versátil e delicioso. Que venham vários natais e vários Pinots celebrando esse momento familiar e celebrando também a degustação de grandes rótulos. Tem 12,5% de teor alcoólico.

Sobre a vinícola Família Lemos de Almeida

“Somos Raízes, somos Família. Enaltecendo nossas origens lusitanas, agora somos a Vinícola Família Lemos de Almeida. Na cidade de Muitos Capões, estruturados em uma encantadora Vila Açoriana, atuamos com excelência na produção de vinhos finos de castas francesas e portuguesas”.

Foi em 2005, vislumbrando o terroir da região, favorável devido ao solo e clima, que iniciaram a implantação da infraestrutura para produção de uvas. No ano de 2009, plantaram as primeiras mudas de origem Francesa, que deram início à primeira vinificação em 2012.

Conduzida pelo seu fundador e proprietário, Agamenon Lemos de Almeida, juntamente com a filha Bibiana Lemos de Almeida, a Vinícola mantém sua característica de propriedade familiar. Única vinícola com características açorianas no Brasil, a Família Lemos de Almeida aposta na inovação. Focada no enoturismo, e instalada em uma encantadora Vila Açoriana celebra a arte, a arquitetura, a história e a cultura açorianas e recebe seus visitantes em uma área de 12 hectares onde são cultivadas variedades de uvas francesas e portuguesas.

Hoje, a Vinícola Família Lemos de Almeida, produz 100% dos seus vinhos a partir de vinhedos próprios e atinge 100 mil garrafas por ano, tornando-se notória pela premiada qualidade.

Mais informações acesse:

http://www.familialemosdealmeida.com.br/