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domingo, 16 de abril de 2023

Granja Amareleja DOC tinto 2020

 

Não é uma grande novidade dizer que os vinhos da gigante e emblemática Alentejo é a minha preferida em Portugal. Não é novidade dizer também que, quando tive os primeiros contatos com os rótulos portugueses, foi com o Alentejo que as cortinas da vitivinicultura lusitana se deu.

O carinho e a predileção não são apenas com a região, com os seus vinhos e tipicidade, com o seu terroir, mas criou-se um vínculo afetivo, até por ter sido os primeiros a inundar as minhas humildes taças.

Evidente que a participação de mercado dos alentejanos no Brasil é grande e a possibilidade de um primeiro contato com esses vinhos é grande, porém, a continuidade das degustações configura-se em predileção, em carinho para com a ensolarada região alentejana.

E o que dizer do caráter de regionalidade? O apelo regional dos seus vinhos é imenso e os produtores parecem fazer questão de evidenciar isso, principalmente pelo fato de ter seus rótulos exportados para todo o mundo. São vinhos locais que ganharam o mundo e não tenha dúvida de que uma condição acarreta na outra.

E o vinho de hoje retrata, além da força da tradição de seu nome, mas também do apelo regional, uma definição clara de um vinho que tem bem definido a essência de sua região, falo da Granja Amareleja.

É tão forte essa relação que o nome do vinho carrega o nome da região. Então sem mais delongas vamos às apresentações do vinho que degustei e gostei veio da sub-região da Granja Amareleja, no Alentejo, em Portugal e se chama Granja Amareleja (GA) DOC com as castas típicas da região Moreto (40%), Aragonez (30%) e Trincadeira (30%) da safra 2020. Para não perder o costume, vamos de histórias do Alentejo e também da sua sub-região, a Granja Amareleja.

Alentejo

Situado na zona sul de Portugal, o Alentejo é uma região essencialmente plana, com alguns acidentes de relevo, não muito elevados, mas que o influenciam de forma marcante. Embora seja caracterizada por condições climáticas mediterrânicas, apresenta nessas elevações, microclimas que proporcionam condições ideais ao plantio da vinha e que conferem qualidade às massas vínicas.

As temperaturas médias do ano variam de 15º a 17,5º, observando-se igualmente a existência de grandes amplitudes térmicas e a ocorrência de verões extremamente quentes e secos.

Mas, graças aos raios do sol, a maturação das uvas, principalmente nos meses que antecedem a vindima, sofre um acúmulo perfeito dos açúcares e materiais corantes na película dos bagos, resultando em vinhos equilibrados e com boa estrutura. Os solos caracterizam-se pela sua diversidade, variando entre os graníticos de "Portalegre", os derivados de calcários cristalinos de "Borba", os mediterrânicos pardos e vermelhos de "Évora", "Granja/Amareleja", "Moura", "Redondo", "Reguengos" e "Vidigueira". Todas estas constituem as 8 sub-regiões da DOC "Alentejo".

História (Passado, presente e futuro)

A história do vinho e da vinha no território que é hoje o Alentejo exige uma narrativa longa, com uma presença continuada no tempo e no espaço, uma gesta ininterrupta e profícua que poucos associam ao Alentejo. Uma história que decorreu imersa em enredos tumultuosos, dividida entre períodos de bonança e prosperidade, entrecortados por épocas de cataclismos e atribulações, numa flutuação permanente de vontades, com longos períodos de trevas seguidos por breves ciclos iluministas e vanguardistas.

É uma história faustosa e duradoura, como o comprovam os indícios arqueológicos presentes por todo o Alentejo, testemunhas silenciosas de um passado já distante, evidências materiais da presença ininterrupta da cultura do vinho e da vinha na paisagem tranquila alentejana. Infelizmente, por ora ainda não foi possível determinar com acuidade histórica quando e quem introduziu a cultura da videira no Alentejo.

Mas ainda assim pode-se afirmar que a história do Alentejo anda de mãos dadas com a história de Portugal e da Península Ibérica, ex-hispânicos, assim como, pertencentes a época de civilizações romana, árabe e cristãs. Em muitos lugares no Alentejo encontrar provas da civilização fenícia existente há 3.000 anos.

Fenícios, celtas, romanos, todos eles deixaram um importante legado da era antes de Cristo, na região que é hoje o Alentejo. Uma terra onde a cultura e tradição caminham lado a lado. Os romanos deixaram nesta região o legado mais importante, escritos, mosaicos, cidades em ruínas, monumentos, tudo deixado pelos romanos, mas não devemos esquecer as civilizações mais antigas que passaram pela zona deixando legados como os monumentos megalíticos, como Antas.

Após os romanos e os visigodos, os árabes, chegaram a esta terra com o cheiro a jasmim, antes da reconquista, que chegaram com a construção de inúmeros castelos, alguns deles construídos sobre mesquitas muçulmanas e a construção de muralhas para proteger a cidade e as cidades que foram crescendo. Desde essa altura até hoje, o Alentejo tem continuado o seu crescimento, um crescimento baseado na agricultura, pecuária, pesca, indústria, como a cortiça e desde o último século até aos nossos dias, com o turismo com uma ampla oferta de turismo rural.

Os gregos, cuja presença é denunciada pelas centenas de ânforas catalogadas nos achados arqueológicos do sul de Portugal, sucederam aos fenícios no comércio e exploração dos vinhos do Alentejo. Por esta época, a cultura da vinha no Alentejo, apesar de incipiente, contava já com quase dois séculos de história. A persistência de uma cultura da vinha e do vinho, desde os tempos da antiguidade clássica, permite presumir, com elevado grau de convicção, que as primeiras variedades introduzidas no território nacional terão arribado a Portugal pelo Alentejo, a partir das variedades mediterrânicas.

É mesmo provável, se atendermos os registros históricos existentes, que a produção alentejana tenha proporcionado a primeira exportação de vinhos portugueses para Roma, a primeira aventura de internacionalização de vinhos portugueses!

A influência romana foi tão peremptória para o desenvolvimento da viticultura alentejana que ainda hoje, dois mil anos após a anexação do território, as marcas da civilização romana continuam a estar patentes nas tarefas do dia-a-dia, visíveis através da utilização de ferramentas do quotidiano, como o Podão, instrumento utilizado intensivamente até a poucos anos. Mas foi no aproveitamento das talhas de barro, prática que os romanos divulgaram e vulgarizaram no Alentejo, que a influência romana deixou as suas marcas mais profundas e até hoje é difundida, dada a devida proporção, por alguns abnegados produtores, e claro, a sua população.

Com a emergência do cristianismo, credo disseminado quase instantaneamente por todo o império romano, e face à obrigatoriedade da presença do vinho na celebração eucarística da nova religião, abriram-se novos mercados e novas apetências para o vinho. A fé católica, ainda que indiretamente, afirmou-se como um fator de desenvolvimento e afirmação da vinha no Alentejo, estimulando o cultivo da videira na região.

Com tantas influências culturais o Alentejo sofreu com algumas crises e a primeira se deu exatamente entre os cristãos e muçulmanos. Embora os mulçumanos tenham se mostrando tolerante com os costumes dos povos conquistados, consentindo na manutenção da cultura da vinha e do vinho, sujeitando-a a duros impostos, mas autorizando a sua subsistência, logo nasceu uma intolerância crescente para com os cristãos e os seus hábitos, manifesta no cumprimento rigoroso e vigoroso das leis do Corão.

Inevitavelmente, a cultura do vinho foi sendo progressivamente negada e a vinha gradualmente abandonada, reprimida pelas autoridades zelosas das regiões ocupadas. Com a invasão muçulmana a vinha sofreu o primeiro revés sério no Alentejo. A longa reconquista cristã da península ibérica, riscada de Norte para Sul, geradora de incertezas e inseguranças, com escaramuças permanentes entre cristãos e muçulmanos, sem definição de fronteiras estáveis, maltratou ainda mais a cultura da vinha, uma espécie agrícola perene que, por forçar à fixação das populações, foi sendo progressivamente abandonada.

Foi só após a fundação do reino lusitano, concorrendo através do poder real e das novas ordens religiosas, que a cultura do vinho regressou com determinação ao Alentejo. Poucos séculos mais tarde, já em pleno século XVI, a vinha florescia como nunca no Alentejo, dando corpo aos ilustres e aclamados vinhos de Évora, aos vinhos de Peramanca, bem como aos brancos de Beja e aos palhetes do Alvito, Viana e Vila de Frades.

Em meados do século XVII, eram os vinhos do Alentejo, a par da Beira e da Estremadura, que gozavam de maior fama e prestígio em Portugal. Desventuradamente foi sol de pouca dura! A crise provocada pela guerra da independência, logo secundada por nova crise despertada pela criação da Real Companhia Geral de Agricultura dos Vinhos do Douro, instituída pelo Marquês de Pombal como justificação para a defesa dos vinhos do Douro em detrimento das restantes regiões, com arranques coercivos de vinhas em muitas regiões, deu matéria para a segunda grande crise do vinho alentejano, mergulhando as vinhas alentejanas no obscurantismo.

A crise foi prolongada. Foi preciso esperar até meados do século XIX para assistir à recuperação da vinha no Alentejo, com a campanha de desbravamento da charneca e a fixação à terra de novas gerações de agricultores. Nasceu então mais uma época dourada para os vinhos do Alentejo, período que infelizmente viria a revelar ser de curta duração. O entusiasmo despertou quando se soube que um vinho branco da Vidigueira, da Quinta das Relíquias, apresentado pelo Conde da Ribeira Brava, ganhou a grande medalha de honra na Exposição de Berlim de 1888, a maior distinção do certame, tendo sido igualmente apreciados e valorizados vinhos de Évora, Borba, Redondo e Reguengos.

Pouco anos mais tarde, decorria o ano de 1895, edificou-se a primeira Adega Social de Portugal, em Viana do Alentejo, pelas mãos avisadas de António Isidoro de Sousa, pioneiro do movimento associativo em Portugal. Desafortunadamente, este período de glória viria a terminar abruptamente. Duas décadas passadas, já na primeira metade do século XX, sobreveio um conjunto de acontecimentos políticos, sociais e econômicos que contribuíram decidida e decisivamente para a degradação da viticultura alentejana.

António Isidoro de Sousa

Ao embate da filoxera, somou-se a primeira das duas grandes guerras mundiais, as crises econômicas sucessivas, e, sobretudo, a campanha cerealífera do estado novo que suspendeu e reprimiu a vinha no Alentejo, apadrinhando a cultura de trigo na região que viria a apelidar como "celeiro de Portugal". A vinha foi sendo sucessivamente desterrada para as bordaduras dos campos, para os terrenos marginais em redor de montes, aldeias e vilas, para as pequenas courelas em redor das povoações, reduzindo o vinho à condição de produção doméstica para autoconsumo. Em poucos anos o vinho no Alentejo, salvo raras exceções, desapareceu enquanto empreendimento empresarial.

Foi sob o patrocínio solene da Junta Nacional do Vinho, já no final da década de 1940, que a viticultura alentejana ganhou a primeira oportunidade de recobro, ainda que de forma titubeante.

O movimento associativo foi preponderante para o ressurgimento da atividade vitícola no Alentejo. Em 1970, sob os auspícios da Comissão de Planeamento da Região Sul, foi anunciado o estudo "Potencialidades das sub-regiões alentejanas", coadjuvado dois anos mais tarde pelo estudo "Caracterização dos vinhos das cooperativas do Alentejo. Contribuição para o seu estudo", do professor Francisco Colaço do Rosário, ensaios acadêmicos determinantes para o reconhecimento regional e nacional do potencial do Alentejo. Associando várias instituições ligadas ao setor e tirando proveito das sinergias criadas, o Alentejo conseguiu estabelecer um espírito de cooperação e entreajuda entre os diversos agentes.

Com a criação do PROVA (Projeto de Viticultura do Alentejo), em 1977, foram criadas as condições técnicas para a implementação de um estatuto de qualidade no Alentejo, enquanto a ATEVA (Associação Técnica dos Viticultores do Alentejo), fundada em 1983, foi arquitetada para promover a cultura da vinha nos diferentes terroirs do Alentejo.

Em 1988 regulamentaram-se as primeiras denominações de origem alentejanas, fundamento para o estabelecimento, em 1989, da CVRA (Comissão Vitivinícola Regional Alentejana), garante da certificação e regulamentação dos vinhos do Alentejo.

Granja Amareleja

A Granja-Amareleja é uma das sub-regiões de Denominação de Origem Protegida do Alentejo. Uma região que sempre colheu os frutos das condições naturais ótimas para a produção de vinho e do azeite. Características únicas que conjugam as particularidades dos terrenos ao clima incomparável do Alentejo que foram sendo aproveitados por todos os povos que por aqui passaram e que foram explorando as potencialidades agrícolas da região, com particular destaque para a produção vitivinícola.

Há quem se apaixone pelas paisagens, há quem prefira o calor intenso, mas os romanos, quando passaram pelas imensas planícies alentejanas, perceberam o valor e as potencialidades da região para a produção daquele que é considerado como um néctar dos deuses.

E todo o Alentejo tem a marca indelével do vinho do Império Romano, feito com uvas de videiras podadas em taça, para se defenderem do calor inclemente do verão, e vinificado em grandes talhas de barro de inspiração mediterrânica. Tudo terá começado no século II com a criação de grandes quintas romanas – as famosas villae – que tinham na produção de vinho uma das suas atividades mais rentáveis.

Os inúmeros vestígios arqueológicos da região testemunham que, desde a técnica de produção das talhas até à vinificação, toda a sabedoria ancestral do vinho de talha continua a ser praticada diariamente e transmitida de geração em geração.

O exemplo do que acontecia na época romana, onde o vinho mais venerado era o branco, ainda hoje o vinho de talha branco continua a ser o mais respeitado e apreciado em todas as aldeias e vilas da Margem Esquerda do Guadiana, mantendo bem vivo o gosto romano na região.

A pesagem das talhas com pez ou cera de abelhas, o desengace e esmagamento manual das uvas com o “ripanço”, a filtração do vinho com caules de junça, a proteção da superfície do vinho com bom azeite, são apenas algumas das muitas práticas de adega ancestrais que continuam a ser utilizadas na região e que fascinam qualquer enófilo culto que visita as adegas locais.

E agora finalmente o vinho!

Na taça apresenta um vermelho intenso, escuro, mas de um reluzente brilho e tonalidades granada e lágrimas finas, em profusão e lentas.

No nariz os aromas, no início, mostraram-se fechados, mas, com o tempo foi se abrindo, mas não revelou tanta intensidade, porém, ainda assim, entregou aromas agradáveis de frutas vermelhas frescas, com destaque para framboesa, morango, cereja e amora. Sentem-se também delicadas notas florais que traz a sensação de frescor, além de especiarias, pimenta, diria, algo de couro, defumado.

Na boca é seco, leve, saboroso, fácil de degustar, redondo, pronto, embora tenha sentido falta da habitual estrutura dos alentejanos. As notas frutadas são percebidas no paladar, como no aspecto olfativo, a madeira também é mais percebida, mas de forma discreta, graças a um pequeno lote do vinho que passou por 8 meses em barricas de carvalho, entregando ainda baunilha. Têm taninos amáveis, ótima acidez que saliva e um final de média persistência.

O Granja Amareleja DOC é um exemplar que homenageia essa sub-região da Denominação de Origem Alentejo, suas pessoas e sua cultura. A casta predominante, a Moreto, uva autóctone da região, quase extinta, que é preservada e enaltecida pela Adega Granja Amareleja, e ao lado da Aragonez e Trincadeira produz um vinho de corpo médio, notas de frutas vermelhas maduras e muito frescor. Um vinho voluptuoso, de personalidade como tem de ser um belo e legítimo alentejano. Tem 14% de teor alcoólico.

Sobre a Adega Granja Amareleja:

A Cooperativa Agrícola de Granja foi fundada em 1952 com o objetivo de rentabilizar as explorações agrícolas dos seus associados e desenvolver a economia local. No início as suas atividades centravam-se na disponibilização aos sócios de máquinas e equipamentos agrícolas diversos, na ceifa e moagem de cereais, tendo para isso moinho próprio, de que ainda hoje existem as ruínas na vizinhança das instalações, ou azenhas localizadas nas margens do rio.

Instalou, ainda, um lagar de azeite que, desde o início, vem produzindo azeite de excelência. Desde 2001 o processo é feito com equipamento moderno, conservando-se a instalação primitiva. O azeite lá produzido tem sido reconhecido pela sua elevada qualidade e já conquistou uma medalha de prata a nível nacional.

Entretanto surge a preparação de aguardente de figo, sendo uma das quatro instalações existentes no país. Desta instalação existem, ainda, as caldeiras e destiladores, apenas para manter a memória porque hoje este fabrico cessou, bem como a atividade na área dos cereais e parque de máquinas.

Em 1965 a Cooperativa expandiu a sua atividade para a área do vinho, acompanhando o desenvolvimento e instalação da vinha no Alentejo. No primeiro ano, limitou-se a fazer a fermentação dos mostos e a preparação dos vinhos, obtidos na Adega Cooperativa da Amareleja a partir das uvas dos associados.

No fabrico do vinho têm vindo a ser feitos grandes investimentos, resultando em vinhos de grande prestígio, medalhados a nível internacional e classificados com Denominação de Origem Controlada Alentejo.

Também o investimento no lagar de azeite tem originado azeites quase todos classificados como Extra Virgem, obtidos de azeitonas frescas e sem qualquer adição de produtos químicos, numa mistura de variedades, onde se destaca a galega, para a produção de azeites que vão dos menos amargos aos mais intensos.

Mais informações acesse:

https://www.granjaamareleja.pt/

Referências:

“Clube dos Vinhos Portugueses”: https://www.clubevinhosportugueses.pt/turismo/roteiros/vinhos-da-sub-regiao-da-vidigueira-denominacao-de-origem-alentejo/

“Rota dos Vinhos de Portugal”: http://rotadosvinhosdeportugal.pt/enoturismo/alentejo-2/borba/

“Clube dos Vinhos Portugueses”: https://www.clubevinhosportugueses.pt/turismo/roteiros/vinhos-da-sub-regiao-da-vidigueira-denominacao-de-origem-alentejo/

“Rota dos Vinhos de Portugal”: http://rotadosvinhosdeportugal.pt/enoturismo/alentejo-2/borba/

“Vinhos do Alentejo”: https://www.vinhosdoalentejo.pt/pt/vinhos/historia-dos-vinhos/

“Adega Granja Amareleja”: https://www.granjaamareleja.pt/historia/














sábado, 24 de outubro de 2020

Alandra tinto 2019

 

Nós, simples enófilos, costumamos falar, em profusão, em termos como tipicidade, DNA do vinho, terroir, a terra que o vinho é produzido, a região tem muito ou pelo menos deveria ter entre nós grande importância na escolha de um vinho, por exemplo, e nos nossos conceitos de preferência de rótulos. E quando falamos em região, não podemos negligenciar, é claro, das suas cepas, das suas castas. Atualmente eu estou imergindo fundo no garimpo de novas regiões e principalmente de novas castas, castas essas com um grande apelo regionalista, o que consequentemente reforça o conceito de terra, de terroir, de tipicidade, de cultura, de história, do comportamento de um povo, de uma sociedade com vocação para a feitura, para a produção dessa bebida poética e inspiradora chamada VINHO.

E esse vinho que degustei e gostei vem de um país e região que dispensam maiores comentários pela sua importância e história para a vitivinicultura mundial, mas que, sim, vale e muito ser contada com requintes de detalhes para enaltecer e estimular a degustação do vinho que, mesmo dentro de uma garrafa, na limitação de uma garrafa, expressa e sintetiza a gigante cultura de um país e uma região como Portugal e o Alentejo, respectivamente. E esse vinho, apesar de uma proposta básica, de um vinho básico, de entrada, entrega, com fidelidade, essas características que me agrada e que aqui foram mencionadas, pois tem um forte apelo regional, mesmo não apresentando nenhuma classificação como o “vinho regional” ou o famoso “DOC”, tem inserido em sua proposta esse aspecto tão marcante, nos vinhos portugueses: a força regionalista e cultural. Falo do Esporão Alandra tinto, composto pelas castas autóctones Moreto (15%), Castelão (40%) e Trincadeira (45%). Então já que estamos falando de regionalismos e castas autóctones, por que não falemos sobre as cepas que compõe este vinho?

Moreto

A casta Moreto é característica da zona do Alentejo, sendo bastante cultivada nas zonas de Reguengos, Redondo e Granja-Amareleja. Pensa-se que terá sido introduzida na região, por volta do século XIX, quando se assistiu a um grande desenvolvimento da vitivultura no Alentejo. Esta casta apresenta cachos de tamanho pequeno e bagos de tamanho médio e arredondados. É uma casta bastante produtiva e de maturação tardia. Os vinhos produzidos com a casta Moreto são normalmente pouco encorpados e apresentam pouca cor, por isso é utilizada em vinhos de lote. Normalmente é lotada com as castas Trincadeira, Aragonez e Tinta Caiada. Casta produtiva, de maturação tardia, com baixos teores de açúcares, pelo que é geralmente a última casta a ser vindimada. Casta de elevada robustez e produtividade, indicada para zonas de calor extremo.

Castelão

Uma das formadoras da identidade dos vinhos portugueses, a Castelão é de suma importância para a vinicultura de Portugal. Esta cepa está entres as variedades mais amplamente cultivadas, estando entre as 250 uvas nativas de Portugal.

Periquita?

O mundo do vinho é repleto de confusões de ordem taxonômicas. Uma uva tem nomes diferentes dependendo da época ou localidade, mas no caso da uva Castelão, o fato é ainda mais curioso. Esta confusão acontece na relação entre Castelão e Periquita: muitas fontes (incluindo a Wikipédia) parecem pensar que Periquita é simplesmente um sinônimo de Castelão, mas isso está errado. Periquita é um nome do produto (ou marca, se assim você preferir), propriedade da vinícola José Maria da Fonseca. As misturas de Periquita sempre contiveram a uva Castelão, mas a maioria também contém quantidades variadas de outras uvas (aparentemente, apenas o vinho da Vinícola Fonseca chamada Periquita Clássica é 100% Castelão). A Castelão também já foi amplamente conhecida como Castelão Francês, mas quando Portugal reforçou suas leis do vinho, o nome oficial tornou-se simplesmente Castelão. Os melhores vinhos feitos com uva Castelão são oriundos da região de Setúbal, ao sul de Lisboa. Lá, especificamente, existe um terroir excelente para a produção de vinhos mais concentrados. É no sul de Portugal, abarcando também o Alentejo, aonde a maior parte da produção da uva Castelão é feita. Apesar disso, uma pequena parcela é plantada na parte central, na região do Douro, e estas são utilizadas no vinho do Porto. Nos vinhedos onde nascem as uvas Castelão, encontram-se cachos pequenos com bagos escuros, e com a casca grossa e em grande quantidade, principalmente se comparada à polpa. É sabido que em Portugal os vinhos varietais são raros. Então é mais comum serem encontrados cortes de Castelão misturados com Aragonês e Trincadeira, os quais permitem que o vinho resultante seja mais acessível e suave.

Trincadeira

A Trincadeira pode não ser muito conhecida, mas é outra uva da família das Vitis vinifera, cultivada essencialmente no Alentejo, na região do Douro e no Ribatejo. Também é conhecida como Trincadeira Preta ou Tinta Amarela (principalmente na região do Douro), e está presente principalmente nas regiões secas e quentes. Embora seja uma das pérolas da vitivinicultura portuguesa, a Uva Trincadeira é frequentemente evitada pelos produtores e enólogos por ser uma uva de difícil trato, por assim dizer. Suas cepas são de uma delicadeza tal que qualquer mínima demora em colhê-la na hora certa pode resultar no apodrecimento de seus cachos e em uma enorme perda de safra. Não é algo estranho que as uvas assumam características diferentes quando cultivadas em terroir distintos. Mas, a Trincadeira possui um temperamento ainda mais peculiar e isso reflete até nas diferentes nomenclaturas que pode assumir. Por exemplo, quando cultivada em Tejo e Alentejo, é chamada de Trincadeira Preta. Já, pelas paragens emolduradas do rio Douro, é chamada de Tinta-amarela. É Mortágua em Torres Vedras, em Arruda é Preto Martinho e Cravo Preto em Algarve. Ironicamente, a quantidade de nomes que possui a uva Trincadeira parece convergir com seu perfil instável, frágil e seu constante transtorno de personalidade. Se por um lado a prematuridade da colheita a deixa sem sabor, a mínima demora reflete na falta de acidez ou rápido apodrecimento dos cachos. É uma uva com bastante potencial para o amadurecimento, especialmente quando no apreciadíssimo barril de carvalho francês. Sua relação com o estágio em madeira é extremamente positiva, podendo revelar vinhos de alta complexidade e qualidade.

E finalmente o vinho!

Na taça tem um lindo vermelho rubi escuro, intenso, com reflexos violáceos que garante um reluzente brilho, com poucas lágrimas finas e de média persistência.

No nariz traz uma explosão aromática de frutas vermelhas como amora, framboesa e morango, com muito frescor.

Na boca é seco, com nuances frutadas, com boa presença de boca, um bom volume de boca que faz desse vinho, apesar de jovem, expressivo e exuberante, com taninos aveludados e macios, com uma baixa acidez e um final de média persistência.

Um vinho de estilo jovem, um cara de moderno, despretensioso e que certamente pode agradar aos paladares mais inexperientes, que está começando no universo do vinho e para aqueles mais calejados que quer um vinho mais informar ou receber amigos. Digo-lhes que é um vinho saboroso, gostoso e revisitando os meus arquivos de degustação, lembrei que degustei o Alandra tinto a três anos atrás, da safra 2015 e tenho na memória que sempre foi essa a proposta do rótulo: simples, mas nobre na sua proposta e importante no aspecto regional e cultural. Tem teor alcoólico de 13%.


Sobre a Herdade do Esporão:

A Herdade do Esporão está localizada em Reguengos de Monsaraz, cidade situada no Alentejo, região do centro-sul de Portugal que, apesar de ter uma produção bastante recente, com pouco mais de 40 anos, é a maior exportadora de vinhos de Portugal e uma das maiores do mundo. A Herdade tem 700 hectares de vinhas e olivais, além de alguns pomares e hortas. As cerca de 40 castas produzem uma variada gama de brancos, rosés e tintos, além de um excelente espumante e uma peculiar colheita tardia. Já as 4 variedades de azeitona dão origem a um dos mais famosos e prestigiados azeites no mercado internacional.

A Herdade conta com uma vastíssima programação de enoturismo, especialmente interessante no verão (junho a setembro), mas suficientemente variada para atrair novos fãs em qualquer época do ano. Aliás, o refinado restaurante da vinícola conta com cardápios distintos para cada estação. São duelos entre o Douro e o Alentejo, verticais, elaboração do próprio blend, refeições harmonizadas, até passeios de um dia inteiro entre as maravilhas naturais da linda propriedade. 

Mais informações acesse:

https://www.esporao.com/pt-pt/

Fontes:

Sobre a casta Moreto:

Site Vida Rural: https://www.vidarural.pt/insights/castas-portugal-moreto/

Site Vinho Virtual: https://www.vinhovirtual.com.br/uvas-209-Moreto

Sobre a casta Castelão:

Site Enologuia: https://www.enologuia.com.br/uvas/250-uva-castelao-portuguesa-com-certeza

Sobre a casta Trincadeira:

Site Enologuia: https://enologuia.com.br/uvas/232-uva-trincadeira-delicada-e-temperamental

Site Blogs dos Vinhos: https://blogdosvinhos.com.br/conheca-a-uva-trincadeira/