Determinado a dar novos rumos à produção local, o Barão de
Ricasoli viajou para a França e a Alemanha, onde aprendeu novas maneiras de
cultivo, além de importar variedades e experimentar maquinários. Assim, em
1872, ele teria criado a “fórmula” do Chianti e assim escreveu:
“Os resultados obtidos
já nas primeiras experiências confirmam que o vinho recebe do Sangioveto a
principal dose de seu perfume (o que eu particularmente procuro) e um certo
vigor de sensação; do Canajuolo, a amabilidade que tempera a dureza do
primeiro, sem tolher em nada seu perfume; a Malvagia, a qual se pode colocar
menos nos vinhos destinados a envelhecer, tende a diluir o produto das duas
primeiras uvas, não acrescenta sabor, e o torna mais leve e mais prontamente
usável na mesa cotidiana”.
A “fórmula do Chianti” escrita na famosa carta endereçada ao
professor Cesare Studiati da Universidade de Pisa, na qual exaltava os aromas e
a estrutura da Sangiovese, a maciez da Canaiolo e a tendência da Malvasia a
diluir o vinho, fez com que o Barão sugerisse que esta uva não fizesse parte do
corte dos vinhos de guarda da sua região. A receita do Barão era 70%
Sangiovese, 15% Canaiolo e 15% Malvasia Bianca. Em 1967, sua “fórmula” foi
ratificada pela regulamentação da DOC (com acréscimo da Trebbiano).
Renascimento
O Chianti então surgiu como uma versão do “clarete” francês –
sem variedades internacionais, contudo. Foi durante o Risorgimento que ele alcançou a glória, quando Firenze se tornou
capital da Itália e Ricasoli primeiro ministro. No entanto, apesar dos esforços
do barão, com o tempo, a fama do vinho tornou-se ruim, muito devido às
condições econômicas precárias da região, especialmente depois das pragas que
chegaram à viticultura em meados do século XIX e também muito devido ao
contrato de uso das terras entre agricultores e os donos das propriedades.
A mezzadria
(sistema feudal em que os camponeses dividiam a sua colheita com os senhores de
terras) e a agricultura promiscua (diversas culturas em um mesmo terreno)
perdurou na Toscana até praticamente os anos 1970 e atrasou o desenvolvimento
do vinho na região – já que a colheita ia ser dividida, era melhor, para o
agricultor, plantar mais quantidade do que pensar em qualidade.
Clante
A origem do nome Chianti é incerta. Para alguns, ela vem de
clangor, que nada mais é do que o som dos instrumentos metálicos, mais
especificamente das trombetas. No entanto, também pode designar o atrito entre
objetos de metal, como espadas. Daí, acredita-se que o nome possa ter surgido
devido a esse barulho das trombetas de caça ou então das batalhas. Outra
possibilidade, muito mais aceita, é o termo ter vindo da palavra etrusca clante, que significaria água (abundante
na região) ou então seria apenas um nome de família muito comum na área.
O movimento dos vinhos “Super Toscanos” fez com que Chianti
aprimorasse suas normas. Nos anos 1960, alguns produtores estavam desapontados
com os rumos que Chianti havia tomado. Apesar de a DOC ter finalmente
estabelecido uma regra para seus vinhos em 1967 (e talvez por isso também),
muitos passaram a experimentar com novas variedades, especialmente as
francesas, no intuito de produzir um vinho melhor e mais caro (desde o fim da
II Guerra Mundial, Chianti era considerado um vinho simples e barato).
Assim, entre o final dos anos 1960 e começo dos 1970, duas
poderosas famílias decidiram fazer vinhos mesclando Sangiovese com variedades
francesas. Tanto o Marquês Mario Incisa della Rochetta quanto seu sobrinho,
Piero Antinori, lançaram respectivamente Sassicaia e Tignanello, os primeiros
Super Toscanos de que se tem notícia, vinhos que mudariam para sempre o cenário
na região.
O fenômeno houve novas mudanças nas regras, com a introdução
de variedades francesas no blend de Chianti. Dez anos depois, as variedades
brancas foram proibidas em Chianti Classico, que já passava a aceitar
Sangiovese “in pureza”, ou seja, 100%. Hoje, além do Classico, Chianti possui
outras sete sub-regiões, cada uma com regras específicas. As mudanças de regras
foram constantes nos últimos 40 anos. As últimas modificações em Chianti
Classico, por exemplo, ocorreram em 2013, quando, entre outras coisas, criou-se
uma nova classificação, com um nível qualitativo acima dos Riserva: os Gran
Selezione.
Os diferentes Chianti
O simples termo “Chianti” diz muito pouco sobre o vinho.
Muito resumidamente, indica que se trata de um tinto italiano, produzido na
região da Toscana, em uma área que se estende entre as cidades de Florença e
Siena, a partir de, principalmente, Sangiovese. Ainda que Chianti seja uma
Denominação de Origem Controlada e Garantida (DOCG) e, portanto, existam
regulamentações tratando de sua produção, a variedade é grande.
Além da “denominação genérica” Chianti DOCG, há outras
denominações específicas que levam em consideração a proveniência geográfica
das uvas: Chianti Classico (a mais antiga, famosa e tradicional), Chianti Colli
Aretini, Chianti Colli Fiorentini, Chianti Colline Pisane, Chianti Colli
Senesi, Chianti Montalbano, Chianti Montespertoli e Chianti Rufina. Também, os
termos Chianti Superiore (não permitido para Chianti Classico) e Chianti
Riserva servem para nomear vinhos que tenham atendido períodos de
envelhecimento determinados, dentre outros fatores.
E agora finalmente o vinho!
Na taça revela um lindo rubi intenso, brilhante, reluzente,
com reflexos violáceos tendendo para o grená, com lágrimas finas, lentas e em
média intensidade.
No nariz traz a exuberância das frutas vermelhas maduras, bem
frescas com destaque para a groselha, cereja, framboesa e morango, com as notas
amadeiradas que desponta de forma bem discreta, mas que entrega baunilha e um
agradável defumado e mentolado, com toques de tabaco, couro e especiarias, algo
de pimenta preta, diria. A rusticidade da Sangiovese se mostra.
Na boca tem corpo médio, tem vivacidade, personalidade, mas
traz elegância, maciez e muito equilíbrio, pois traz o protagonismo das notas
frutadas, como no aspecto olfativo, em total convergência com a madeira, graças
aos doze meses em barricas de carvalho. Tem taninos doces e domados, com acidez
vibrante, abundante que faz salivar a boca a cada degustação. Tem um final
guloso, com média persistência.
Tradição, história, mesmo que ao custo de guerras, sangue,
mortes, disputas pelo poder político e econômico. As redenções pavimentadas por
todos esses eventos e intenções. O vinho foi e é um veículo de tais
manifestações da sociedade, independente do contexto e cronologia. O que nos
resta, no entanto, é permitir contemplar e entender esses momentos históricos com
o olhar crítico, mas separando-os do prazer, do deleite em degustar um bom e
velho vinho, porque é um elixir ao corpo e a alma, sobretudo daqueles que o
ama. Toscana e a sua região mais importante em todos os aspectos, é sinônimo de
renome no mundo todo por causa de Chianti e de suas grandes e espetaculares
histórias que, de uma forma ou de outra, corroboraram na sua importância e
qualidade que até hoje busca a excelência. O Poggio al Casone Chianti Superiore
foi produzido nas vinhas que circundam a casa de Pierlugi Castellani e é um
vinho encorpado, mas elegante, dada a sua complexidade atribuída ao “Sangue de
Júpiter”, chancelando Chianti como um dos mais emblemáticos vinhos da história.
Tem 12,5% de teor alcoólico.
Sobre a vinícola Castellani:
O negócio de Castellani foi estabelecido em Montecalvoli no
final do século 19 quando Alfred, um viticultor de longa data, decidiu começar
a engarrafar e vender seu vinho. O filho de Alfredo, Duilio, junto com seu
irmão Mario dá início ao período de expansão da empresa. Duilio, homem
meticuloso e diligente, participa ativamente de todas as etapas do trabalho.
A vinha mais importante é aquela situada em Santa Lúcia, no
fértil vale do Arno, onde se produz um vinho tinto vivo e apto para envelhecer
e engarrafado em típicos frascos com palha, conquistando o interesse dos
mercados transalpinos. Nos anos seguintes, o filho primogênito de Duilio,
Giorgio, homem determinado e ambicioso, inicia a exportação em grande escala. A
enchente de 1966 causa grandes danos à vinícola Montecalvoli.
Decide-se então transferir temporariamente o negócio para a
Fazenda Burchino, nas colinas da vila de Terricciola. O irmão de Giorgio,
Roberto, brilhante jornalista do jornal “Il Giornale del Mattino”, de Florença,
corre para ajudar a retirar lama da vinícola da família. Ele então decide ficar
e contribui para a evolução da empresa. Roberto, homem culto e cosmopolita,
inicia uma atividade pioneira em mercados longínquos, tornando-se um dos
defensores do sucesso internacional do Chianti.
A aquisição da vinha Poggio al Casone coincide com a
ampliação da adega da Quinta Travalda em Santa Lúcia. Durante a noite do dia de
Ano Novo em 1982, um incêndio queimou quase completamente as instalações da
empresa. Parece ser o fim. Mas em poucos meses os irmãos Castellani adquirem a
Fazenda Campomaggio e, graças à contribuição de Piergiorgio, filho de Roberto,
o negócio ganha força. As pesquisas vitivinícolas e tecnológicas são promovidas
por especialistas como o enólogo Sabino Russo e o agrônomo Carlo Burroni. Hoje
esta empresa centenária persegue com grande entusiasmo o objetivo de produzir
vinhos, que são a expressão de uma das maiores regiões enológicas do mundo: a
Toscana.
Mais informações acesse:
https://www.castelwine.com/
Referências:
“Blog História com Gosto”: https://historiacomgosto.blogspot.com/2019/11/a-regiao-do-chianti-classico-toscana.html
“Revista Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/todos-os-chianti_10196.html
“Blog Sonoma”: https://blog.sonoma.com.br/chianti/#:~:text=Chianti%20%C3%A9%20um%20tipo%20de,Chianti%20Cl%C3%A1ssico%20a%20mais%20famosa