Eu já comentei em outros textos e inspirações com rótulos
agradáveis que tenho dado prioridade a vinhos com um forte apelo regionalista
principalmente no quesito “castas”. Nada como degustar um vinho que entrega,
com fidelidade, as características mais intensas da sua região, da sua terra,
onde a tipicidade se mostre forte e presente, o famoso “terroir”. Populares em
seus países, mas não tão conhecidas ao redor do mundo, algumas castas, sejam
brancas ou tintas, sobretudo em Portugal, merecem a nossa atenção e o meu
rótulo de hoje revela, mesmo diante da sua simplicidade, a nobreza do
regionalismo de uma região que tanto amo, que foi a minha porta de entrada para
os vinhos lusitanos: Alentejo. Independentes das classificações que os vinhos
carreguem, independente de nomes impactantes que esteja no rótulo, os brancos
alentejanos sempre foram os meus preferidos na terra dos patrícios e os blends,
os cortes, entregam o melhor destes vinhos: frescor, leveza e tipicidade. E não
se enganem amigos leitores, vinho não é status, não deve ser encarados como
posição social ou poder econômico, mas ligado a celebração, ao prazer da
degustação simplesmente, ligado, a quem quiser, a educação cultural.
Então apresentemos o vinho que degustei e gostei que, como
disse, veio do Alentejo e se chama Portal de S. Braz, um branco das castas
Arinto, Antão Vaz e Roupeiro, sem informação de safra. E já que falamos de
regionalismo arraigado, de história e cultura, falemos um pouco das castas que
compõe esse rótulo: Antão Vaz, Arinto e Roupeiro.
Arinto
Uma das mais clássicas castas brancas portuguesas, a Arinto é
originária da região de Bucelas, mas seu cultivo se expandiu para diversas
áreas, como a Bairrada e Vinho Verde. É uma casta versátil, presente na maioria
das regiões vitícolas portuguesas, sendo reconhecida pelo nome Pedernã na
região dos Vinhos Verdes.
Dona de ótima acidez, a uva branca Arinto produz vinhos muito
frescos, com atraentes aromas de frutas cítricas. Os melhores exemplos de
vinhos elaborados com a casta ostentam mineralidade e possui fermentação
realizada em baixas temperaturas, o que garante a alta qualidade dos vinhos da
uva. Sendo considerada uma das melhores variedades portuguesas, a uva Arinto é
utilizada na elaboração de rótulos nobres, inclusive os com maior grau de
envelhecimento. Possuindo maturação tardia, a uva é facilmente reconhecida no
vinhedo por suas características estruturais. Com bagos pequenos e cor verde
amarelada, a uva Arinto possui difícil vinificação, além de possuir
sensibilidade a falta de umidade em solos de cultivo. Seus vinhos possuem ótima
acidez e podem ser achados vinificados no estilo varietal e em corte, com as
uvas Chardonnay e a casta Verdelho. Com complexidade e elegância, acredita-se
que a uva Arinto foi levada para a região de Bucelas na época das cruzadas,
após o retorno de alguns cavalheiros para a região próxima de Lisboa.
Antão Vaz
Pouco se sabe sobre as origens da casta Antão Vaz. Apesar da
aura misteriosa que a rodeia, uma coisa se conhece: a sua filiação alentejana.
E também que viajou pouco. Fora do seu Alentejo natal, apenas a Península de
Setúbal a planta com alguma expressão, e não se encontram sinonímias para ela
noutras regiões – como acontece com tantas outras castas –, comprovando-se
assim a sua falta de apetência emigrante. Consensual, amada igualmente por
viticultores e enólogos, a Antão Vaz é indiscutivelmente o “ex-libris” das
castas brancas alentejanas, o orgulho e alma dos produtores locais.
Particularmente bem adaptada ao clima soalheiro da grande planície, apresenta
excelente resistência à seca e doença. Mais: é consistente, produtiva, e
amadurece de forma homogénea. Tudo condições mais do que suficientes para torná-la
incontornável no cenário dos vinhos brancos alentejanos. Por regra, dá origem a
vinhos estruturados, firmes e encorpados, embora por vezes lhe falte acidez
refrescante e revigorante. Daí a associação comum com as castas Roupeiro e
Arinto, que contribuem com uma acidez mais viva. Se vindimada cedo, pode dar
origem a vinhos vibrantes no aroma e a acidez firme; se deixada na vinha, pode
atingir grau alcoólico elevado e aromas fragrantes, o que a torna boa candidata
ao estágio em madeira. Os vinhos de Antão Vaz apresentam por regra aromas
exuberantes, apresentando-se estruturados e densos no corpo.
Roupeiro
Roupeiro é uma das castas brancas mais utilizadas no
Alentejo. Noutras regiões tem o nome de Síria ou Códega. Casta de uva branca
muito utilizada em Portugal é recomendada nas regiões da Beira Interior com o
nome de Codo ou Síria, no Douro com o nome de Códega e em todo o Alentejo com o
nome de Roupeiro. Produz vinho com aromas primários muito interessantes a flor
e a fruto, mas é sensível à oxidação e o seu vinho deve ser consumido nos anos
imediatamente seguintes à colheita. Em geral, produz vinhos básicos para serem
consumidos jovens, mostrando aromas de frutas cítricas e de caroço, além de
notas florais. Quando bem feito, seu vinho apresenta aromas perfumados de
frutas cítricas, pêssego, melão, loureiro e flores silvestres. Entretanto,
perde rapidamente estes aromas, tornando-se bastante neutra após alguns meses
em garrafa. Pode também oxidar rapidamente, sendo uma opção para vinhos jovens,
de grande saída. Outros sinônimos: Síria, Malvasia Grossa, Dona Branca, Códega etc.
E agora finalmente o vinho!
Na taça apresenta um amarelo dourado e brilhante, um
reluzente e bonito brilhante.
No nariz explode aromas de frutas brancas e cítricas, esta
última garantida pela casta Arinto no corte, tais como maracujá, pera, maçã
verde, abacaxi, além de notas florais.
Na boca é seco, elegante, com bom volume de boca, alguma expressividade
e até mesmo estrutura, entregue pela Antão Vaz, com uma bela acidez que lhe
confere jovialidade e frescor, com um final curto.
Esse passeio pelas histórias das castas, as suas
características corroboram o que é o vinho que degusto: fresco, jovial, mas de
personalidade e que ostenta a cultura de forma veemente e fiel do Alentejo e as
suas castas mais tradicionais e populares, algumas delas que são cultivadas
apenas nessa região, que sintetizam, personificam o apelo regionalista que faz
do vinho especial. Simples sim, básico sim, mas especial. A polêmica fica para
o nome “Private Collection” que, para muitos enófilos mais exigentes poderia
colocar em xeque a qualidade do vinho: Será um equívoco um vinho básico levando
um título, em seu rótulo com o nome de um vinho de alta gama? Talvez seja uma
forma, um tanto quanto torta, de impulsionar o rótulo com um marketing
exacerbado, mas é inegável que o vinho é surpreendentemente bom, um belo rótulo
alentejano branco de que tanto gosto. Tem teor alcoólico de 13%.
Sobre a Adega Cooperativa da Granja (Granja Amareleja):
A Adega Cooperativa da Granja, com mais de 60 anos de
história, beneficia das excelentes condições que o Alentejo oferece para a
produção de vinhos de altíssima qualidade, apreciados em todo o mundo. O grande
reconhecimento da qualidade dos vinhos aqui produzidos aconteceu em 1989 com a
distinção de um vinho “Campeão do Mundo” num concurso que se realizou em
Ljubljana, na ex-Jugoslávia e, desde 2007, a Adega tem vindo a evoluir com a
modernização de toda a linha de produção, mantendo as tradições da região,
nomeadamente com a produção de vinho de talha – tradição herdada do Império
Romano – e a utilização das castas tão características da região.
Mais informações acesse:
https://www.granjaamareleja.pt/
Fontes de pesquisa:
Sobre a Arinto:
Portal “Mistral”: https://www.mistral.com.br/tipo-de-uva/arinto
Portal “Wikivinha”: https://www.vinha.pt/wikivinha/section/casta-vinho/arinto/
Sobre a Antão Vaz:
Portal “Revista de Vinhos”: https://www.revistadevinhos.pt/beber/antao-vaz
Sobre a Roupeiro:
Portal “Dfj Vinhos”: https://dfjvinhos.com/v/roupeiro
Portal “Revista Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/uvas-de-alentejo-em-portugal_11821.html
Portal “Enogourmet”: https://enogourmet.ne10.uol.com.br/posts/as-principais-castas-brancas-do-alentejo