Um misto de grandes experiências sensoriais e culturais! É o
que eu tenho vivido nesses últimos e gloriosos tempos enquanto um simples e
humilde enófilo. A incessante busca, o garimpo pelas novidades se torna
necessário e diria, sem soar dramático, urgente, quando mencionamos o vasto e
inexplorado universo dos vinhos. Nunca pensei, quando comecei a me enamorar
pelos vinhos há cerca de 20 e poucos anos o quanto aprendi e aprendo,
simplesmente degustando uma garrafa de vinho. São culturas, comportamentos,
história pitoresca além é claro, do prazer em ter a minha taça cheia de vinho e
me regozijar de cada gota.
Tenho me interessado, de forma latente nos vinhos evoluídos,
em tempos mais recentes, lendo sobre o assunto, buscando novos rótulos com essa
característica e entendendo o que eles podem nos proporcionar. Como são
especiais! E pensar que, revendo o que degustei no passado, as fotos que
registrei como se fora um livro de fotos de família com registros do passado,
observei, com uma alegria incontida que já degustava, de forma tímida, claro,
alguns vinhos com alguma longevidade, sem saber de sua importância e a sua
proposta. Era muito cru nas histórias dos vinhos que hoje valorizo grandemente.
E essas novidades requer trabalho, pesquisa, tempo e, sobretudo
dinheiro, afinal, ser enófilo no Brasil é padecer com os altos valores dos
rótulos em todas as suas escalas de propostas, mas, em prol do nosso amor,
estamos dispostos a tudo, apesar de ser prudente ter retidão, em alguns
momentos. E esse minha incessante busca chegou a terras brasileiras! Sim, em
terras brasileiras! Quem disse que o Brasil não produz grandes vinhos longevos?
Nessa busca em cheguei na Serra Catarinense. Claro que já
conhecia essa proeminente região produtora de vinho, mas nunca pensei no ápice
de minha ignorância que os vinhos daquelas bandas tivessem um bom potencial de
guarda. Sabia de seus altos valores para a realidade da maioria da população
brasileira, alguma coisa sobre a sua relevância para o cenário vitivinícola
nacional, mas não sabia de sua vocação para a longevidade. Mas é aí que entra o
conceito histórico-cultural da coisa. As características climáticas, as
propostas dos vinhos, tudo influencia para os vinhos longevos. É o famoso
terroir que fala mais alto.
Então com essa trajetória toda cheguei a um vinho com um
ótimo custo X benefício em relação a muitos outros rótulos da Serra Catarinense
e me senti na obrigação de tê-lo em minha adega. Talvez fosse a minha chance e
eu precisava agarrá-la com esmero. Comprei e não levei muito tempo para
degusta-lo. O vinho que degustei e gostei veio da região de São Joaquim, na
Serra Catarinense, no Brasil, e se chama Sanjo Núbio da casta Cabernet
Sauvignon e a safra: 2010! Um vinho com seus 11 anos de vida! Momento único e
admito para poucos! Precisava usufrui-lo respeitosamente e da melhor maneira
possível. Mas antes de falar do vinho e olha que estou ansioso para isso,
falarei um pouco da história dessa região de São Joaquim e a sua importância
para o cenário vinícola brasileiro.
São Joaquim, Serra Catarinense, Brasil
A vitivinicultura no Brasil ficaria restrita a pequenas áreas
em distintos pontos do território nacional até 1875, quando se inicia, no Rio
Grande do Sul a instalação de imigrantes italianos. Concebe-se então, como
marco da indústria vitivinícola brasileira a chegada destes imigrantes
italianos (século XIX) e sua instalação na Serra Gaúcha. Em Santa Catarina, as
primeiras mudas de uva plantadas pelos imigrantes italianos que chegaram, em
1878, na região onde seria fundada a cidade de Urussanga, são as responsáveis
pelo início da vitivinicultura catarinense que conhecida atualmente.
Os italianos trouxeram mudas e sementes de vitis viníferas,
mas elas não se adaptaram à úmida região”. A cultura da uva e o hábito do consumo
do vinho faziam parte do patrimônio cultural acumulado dos imigrantes italianos
oriundos na sua maioria da região do Trento, acostumados a dispor do vinho em
seu ritual à mesa. Diante das condições naturais adversas, foram buscar
videiras que se adaptassem às características climáticas da região de
Urussanga, mesmo que o vinho resultante se apresentasse diferente da bebida já
consumida na Itália. Recorreram então às variedades americanas e híbridas, como
a Isabel, mais resistentes a pragas e ao clima tropical.
Atualmente, a região Meio-Oeste é a maior produtora de vinhos
do estado de Santa Catarina. Foi nela que, na primeira metade do século XX,
italianos que haviam migrado do Rio Grande do Sul deram início à construção da
mais expressiva cadeia vitivinícola de Santa Catarina. A produção da uva e do
vinho no Meio-Oeste catarinense é constituída principalmente de uvas de origem
americana e híbrida. Apenas na década de 70, com a criação em Santa Catarina do
PROFIT (Projeto de Fruticultura de Clima Temperado) é que houve um grande
incentivo para o plantio de castas europeias. Desde o final da década de 1990,
entretanto, vem ocorrendo uma reversão das expectativas no plantio das
variedades de castas europeias, representada por novos plantios, inclusive em
áreas não tradicionais para o cultivo da videira, como é o caso das regiões de
elevada altitude (acima de 950 metros). Assim como ocorreu com o setor
macieiro, as condições geográficas da região do planalto catarinense favorecem
a produção de uvas, especialmente as da variedade vitis viníferas.
A partir de estudos visando o desenvolvimento da
vitivinicultura no planalto serrano, iniciados na década de 1990 pela EPAGRI e
de investimentos de empresas de outras regiões identificados no mesmo período,
a produção de vinhos finos vem crescendo. Além das características
geoclimáticas adequadas para a produção das castas europeias, há que se
considerar também o emprego de sofisticadas técnicas enológicas, bem como as
modernas instalações produtivas. Pode-se também atribuir o início do cultivo de
parreiras e da fabricação de vinhos na serra catarinense à fixação de
descendentes de italianos oriundos da região sul do estado de Santa Catarina
que migraram para o planalto.
O início dos experimentos da EPAGRI e o plantio de 50 plantas
experimentais de uvas Cabernet Sauvignon realizado pela vinícola Monte Lemos
que detém a marca Dal Pizzol foram o incentivo que faltava para que Acari
Amorim, Francisco Brito, Nelson Essenburg e Robson Abdala adquirissem uma
propriedade em São Joaquim, no ano de 1999, dando início a Quinta da Neve.
Em 2000, o empresário Dilor de Freitas adquiriu uma
propriedade no município de Bom Retiro, onde em 2001 iniciou o cultivo de uvas finas.
No ano de 2002, adquiriu sua propriedade de São Joaquim e lançou a construção de
sua vinícola onde localiza-se a sede da Villa Francioni e o centro de
visitações. O empresário Nazário Santos, a partir de uma sociedade com um grupo
de profissionais liberais paulistas, idealizou a Quinta Santa Maria, sendo um
dos pioneiros produtores de vinhos de uvas vitis
viníferas em São Joaquim.
Os novos terroirs de Santa Catarina, localizados em altitudes
que podem chegar a 1.400 metros no Estado que registra as temperaturas mais
baixas do País, têm vantagens para quem planta uvas viníferas. Em regiões mais
frias e altas, o ciclo da videira se desloca para mais tarde, e esse ciclo
longo ajuda a concentrar açúcares e taninos, além de melhorar a sanidade dos
grãos. Atualmente, na região vitivinícola de São Joaquim, já é possível
destacar osmunicípios de São Joaquim, Urubici, Urupema e Bom Retiro.
Ao investigar a vitivinicultura de altitude de São Joaquim,
observa-se a tendência e a existência de significativos acertos no processo de
desenvolvimento do setor. A identificação de recursos naturais raros e diferenciados
se apresenta como um fator capaz de gerar vantagens competitivas, estruturando
a atividade produtiva com o foco na segmentação de mercado.
Através do suporte de
instituições de pesquisa como mecanismo de desenvolvimento de todo o setor
produtivo da uva e do vinho, da articulação entre os recursos disponíveis, dos
maiores investimentos em publicidade e propaganda realizados pelas empresas do
setor e dos projetos que visam o diferencial do produto afirmado pelas indicações
geográficas identifica-se a importância das tipicidades que procedem dos vinhos
finos de altitude, confirmando então, a criação de um produto diferenciado no
país.
E agora finalmente o vinho!
Na taça apresenta um lindo rubi intenso, escuro, com a já
manifestação de discretas tonalidades atijoladas denunciando os seus 11 anos de
safra, com lágrimas em grande profusão finas e que mancham a parede do copo.
No nariz um buquê aromático que entrega frutas vermelhas como
framboesa, ameixa e cereja, com notas amadeiradas, de chocolate, baunilha, couro
e um toque terroso e pimentão. O conceito entre fruta, madeira e especiarias em
pleno equilíbrio.
Na boca é austero, quente, complexo e estruturado, mas macio
e elegante, as frutas dão o ar da graça em harmonia com as notas amadeiradas, com toques de chocolate e baunilha e as especiarias, graças aos 12 meses de passagem por barricas de carvalho (cerca de
50% do vinho) e também pelo tempo de safra, com taninos presentes, porém finos
e domados com uma incrível acidez que certamente garantiria ao vinho mais tempo
de vida, de uma evolução plena e decente. É o que representa o vinho: plenitude
e vivacidade aos 11 de vida! Tem um final persistente e retrogosto frutado.
A busca por novas experiências sensoriais, o garimpo por
novidades, uma nova vida de enófilo sendo descortinada diante de nossos olhos,
a fuga da zona de conforto, tudo isso é sim possível. Como sempre costumo dizer:
o universo dos vinhos é vasto e inexplorado, há muito a ser degustado e essa
sensação de infinidade é que mais me estimular a buscar mais e mais, mesmo que
tardiamente em muitos casos. Nunca é tarde quando se tem um propósito. E os
vinhos da Serra Catarinense estavam em minha rota havia algum tempo. O Núbio
Sanjo Cabernet Sauvignon, no auge dos seus 11 anos de vida, no ápice de sua
longevidade, saciou a minha avidez por conhecer os vinhos de altitude e que
abriu as portas para trilhar o caminho, a estrada dessa proeminente região
brasileira que, a cada dia, vem se tornando o novo expoente da vitivinicultura
de nossas terras. Toda a história dessa região converge com as características
mais marcantes do Núbio Sanjo Cabernet Sauvignon, em todas as suas minúcias, o
que corrobora a tipicidade deste vinho tão peculiar e particular. Um vinho
longevo, intenso, complexo, mas delicado, elegante e austero e fácil de
degustar, afinal o tempo lhe foi gentil e o deixou harmonioso e equilibrado.
1.250 metros de altitude faz desse vinho, ainda vivo e pleno, grandioso no topo
mais alto de sua tipicidade. Tem 13% de teor alcoólico.
Sobre a Sanjo Cooperativa Agrícola de São Joaquim:
Formada originalmente por 34 fruticultores, em sua maioria
imigrantes e descendentes de japoneses oriundos da cooperativa paulista de
Cotia, a Sanjo construiu uma história de sucesso comercial investindo em
qualidade e tecnologia agrícola. Nossa produção alcança mais de 50 mil
toneladas anuais de maçãs, em uma área plantada de 1240 hectares.
No Brasil, as variedades mais consumidas de maçãs são a Gala
e a Fuji. A Sanjo produz ambas em grande volume, comercializadas em todo o
país, e divididas entre as marcas Sanjo, Dádiva, Pomerana e Hoshi, conforme a
categoria. A empresa também comercializa com sucesso a linha de maçãs em
sacolas Sanjo Disney, destinada ao público infantil.
A partir de 2002, aliando os valores da tradição japonesa à
qualidade das uvas francesas e à experiência de enólogos de descendência
italiana, vindos das tradicionais vinícolas da Serra Gaúcha, a Sanjo passou a
investir também com sucesso na produção de vinhos finos de altitude,
contribuindo para o reconhecimento alcançado pelos vinhos produzidos na Serra
Catarinense. São 25,7 hectares das variedades Cabernet Sauvignon, Merlot,
Chardonnay e Sauvignon Blanc, cultivadas com as mais avançadas tecnologias de
produção de uvas para a elaboração de vinhos.
Mais informações acesse:
Referências:
“Revista Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/comecando-por-cima_8143.html
“O Turismo e a Produção de Vinhos Finos na Região de São
Joaquim (SC): Notas Preliminares”: https://www.ucs.br/ucs/eventos/seminarios_semintur/semin_tur_6/arquivos/13/O%20Turismo%20e%20a%20Producao%20de%20Vinhos%20Finos%20na%20Regiao%20de%20Sao%20Joaquim.pdf
“Blog do Jeriel”: https://blogdojeriel.com.br/2010/02/21/nubio-2005-um-bom-cabernet-sauvignon-de-sao-joaquim-santa-catarina/