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sexta-feira, 2 de fevereiro de 2024

Castellani Chianti Riserva 2018

 



Vinho: Chianti Riserva

Casta: Sangiovese (80%), Canaiolo (10%) e Cabernet Sauvignon (10%)

Safra: 2018

Região: Toscana

País: Itália

Produtor: Castellani

Teor Alcoólico: 12,5%

Estágio: 24 meses em barricas de carvalho

 

Análise:

Visual: mostra um rubi intenso, quase escuro, com halos granada, com lágrimas finas, lentas e em profusão.

Nariz: discreta nota amadeirada, algo de defumado, terra molhada, couro, tabaco, estrebaria, especiarias, frutas vermelhas maduras.

Boca: é intenso, apresentando média estrutura, com as notas frutadas replicadas como no aspecto olfativo, madeira discreta em sinergia com a fruta, especiado, defumado, entregando ainda chocolate e leve tostado, final médio.

 

Produtor:

https://www.castelwine.com/


sexta-feira, 21 de julho de 2023

Rifugio del Vescovo Chianti Riserva Sangiovese e Merlot 2018

 

Definitivamente a Itália é o país dos vinhos clássicos! Não há nenhum outro centro vitivinícola que produz, em larga escala e com tanta qualidade, vinhos do naipe de um Barolo, Brunello di Montalcino, Amarone, Ripasso e tantos outros.

Vinhos longevos, vinhos de marcante personalidade, vinhos potentes, poderosos e de plenitude jamais vista, jamais sentida em taça. Incluiria entre esses nomes, porém fora da Itália, Bordeaux.

Vinhos que não precisam de demasiadas apresentações, tanto que muitos deles carregam o nome de sua região, típico do Velho Mundo. Não há a apresentação das suas clássicas castas, não há detalhes, não há quase nada, apenas as regiões ostentando em letras garrafais o seu nome, a sua tradição.

Porém atualmente, atendendo aos anseios do mercado consumidor mais jovem e que está se interessando por vinhos, alguns produtores dessas regiões têm divulgado as castas e trazendo um contorno mais “moderno” no primeiro contato que o enófilo tem pelo vinho: o visual.

Mas diante desse exército de clássicos que a Itália tem em seu front há outro, igualmente importante, que até hoje não goza de tanta reputação quanto os Brunellos e Barolos da vida. Falo do Chianti. O passado de guerras, de incertezas de seus criadores, de seus desbravadores, contornou a tortuosa, mas cativante história dos Chiantis.

O primeiro Chianti que tive o prazer de degustar foi o Castellani Chianti Riserva 2015 e logo depois o Poggio Al Casone Chianti Superiore 2019 também do tradicional produtor Castellani. Vinhos com excelente custo X benefício que desmistifica o histórico de Chiantis com altos valores e um tanto quanto inalcançável de se ter em adega. E não se enganem, são ótimos vinhos!

Mas não decidi parar por aqui! Gostaria de buscar novas experiências com os velhos Chiantis, conhecer novos rótulos e produtores e eis que, de forma totalmente despretensiosa, navegando no site de um famoso site de vendas de vinhos, observei, em destaque, um Chianti Riserva que estava na incrível faixa dos R$ 45! Não acreditei de imediato e decidi rever e sim, um Chianti Riserva por um ótimo preço.

Mesmo ainda com algum receio, afinal o preço estava muito baixo, decidi compra-lo, afinal, caso não gostasse dele o gasto, o “impacto” não seria tão alto no bolso já combalido de dinheiro. Mas decidi degusta-lo o quanto antes, estava tomado por uma incomum curiosidade e até mesclada a uma ansiedade.

Então sem mais delongas vamos às apresentações desse surpreendente vinho! Uma gratíssima surpresa a um valor avassalador, que se chama Rifugio del Vescovo, um Chianti Riserva, composto pelas castas Sangiovese e Merlot, da safra 2018. Para não perder o costume, vamos de história, vamos de Chianti.

Chianti, Toscana

Desde a queda de Roma até o Risorgimento, por volta de 1850, o esfacelamento dos estados italianos em pequenas repúblicas e reinos ditou a vida de sua população e também o tom de seus vinhos. Foi nesse longo período conturbado que nasceu um dos vinhos mais famosos da Itália, o Chianti.

Geograficamente falando, Chianti é uma terra montanhosa que se estende por cerca de 60 km a 70 km na sua extensão, cujo ponto mais alto é Monte San Michele, a 893 metros. Existem 5 rios que cruzam e definem a área com: os rios Pesa, Greve, Ombrone, Staggia e Arbia.

Chianti

O começo da história remonta ao século XIII, quando os Médici dominavam a cidade de Firenze (Florença), na Toscana, e lá criaram uma das repúblicas mais influentes de seu tempo – basta lembrar que eles foram patronos das artes que culminaram com o Renascimento. Em meados do século XIII, os fiorentinos eram uma potência e viviam guerreando com vizinhos.

Para garantir uma boa defesa de suas terras, eles as dividiram em ligas militares de cidades. Uma delas, criada em 1384, foi a Lega del Chianti, que compreendia as vilas de Radda, Gaiole e Castellina (até hoje o centro da região que se denomina Chianti Classico), e durou até 1774, atuando ativamente durante as batalhas entre Firenze e Siena.

Aliás, a principal lenda em torno do vinho de Chianti vem dessas longas disputas medievais entre fiorentinos e sieneses. Acredita-se que, um dia, cansados de guerrear, os governantes das duas cidades decidiram por um outro tipo de disputa para estipular sob qual bandeira ficaria a região.

Assim, concordaram que dois cavaleiros sairiam ao cantar do primeiro galo da madrugada, um partindo de Firenze em direção à Siena e o outro no sentido contrário. Onde eles se encontrassem, seria demarcado o limite dos domínios.

Assim nasceu a lenda do Gallo Nero, o galo negro que até hoje serve de emblema dos vinhos de Chianti Classico. Diz-se que os sieneses escolheram um belo e forte galo branco para dar o sinal ao seu cavaleiro. Já os fiorentinos teriam escolhido um galo negro raquítico, que ficou confinado sem comida.

Por isso, o galo de Firenze teria acordado mais cedo, ainda durante a noite, faminto, e começado a cantar, fazendo com que seu cavaleiro tivesse grande vantagem sobre o rival de Siena, cujo galo só acordaria para cantar já nos primeiros raios de sol da manhã.

Assim, dos pouco mais de 60 quilômetros que separam as duas cidades, o cavaleiro sienês conseguiu percorrer somente cerca de 12 antes de encontrar o oponente nas proximidades de Fonterutoli, pouco ao sul de Castellina.

Em 1716, Cosimo III de Médici delimitou a região para a produção dos vinhos de Chianti. Lendas à parte, a verdade é que a demarcação da área de Chianti como pertencente à Firenze ocorreu em um tratado de 1203. Na época, os fiorentinos eram leais ao Papa e Siena, ao Sacro-Império Romano.

Primeira Denominação de Origem

As primeiras documentações que tratam do vinho de Chianti remontam a 1398 e o descrevem como um vinho branco vendido pelo comerciante Francesco di Marco Datini. No entanto, o nome do vinho ficaria definitivamente gravado na história a partir de 1716, quando Cosimo III de Médici, o penúltimo de sua família a ser Grão-Duque da Toscana, apontou que as três cidades da Lega del Chianti, mais uma parte da Vila de Greve, estavam aptas a produzir o vinho de nome Chianti.

Francesco di Marco Datini

Esta teria sido a primeira demarcação territorial, ou seja, a primeira Denominação de Origem, conhecida no mundo (os portugueses, porém, alegam que a primeira DO teria sido instituída pelo Marquês de Pombal em 1756, quando estabeleceu os marcos pombalinos na região que produzia o Vinho do Porto).

Apesar de o reinado de Cosimo III ter sido desastroso para a região, que se viu diante de uma enorme crise econômica e social, a demarcação durou até 1932, quando a área foi gradualmente expandida (a última expansão seria em 1967).

No entanto, mesmo demarcado, sabe-se que o vinho de Chianti obedecia a poucas regras. Historiadores apontam que, na época, uma das principais uvas usadas na produção do vinho era a Canaiolo, a mais cultivada na região, juntamente com a Sangiovese, Mammolo e Marzemino. Seria somente durante o Risorgimento italiano no século XIX, que o vinho tomaria uma forma, muito próxima do que tem hoje.

O grande nome por trás do estabelecimento de Chianti e também um dos principais responsáveis pela unificação italiana em 1961 foi o barão Bettino Ricasoli, cuja origem familiar remonta aos tempos de Carlos Magno. O “Barão de Ferro” (alcunha conquistada por sua intransigência moral e econômica) foi um dos grandes pilares da unificação de seu país com sua atuação política no Ducado da Toscana. Não à toa, ele chegou a ser primeiro ministro italiano quando o rei Vitório Emanuele assumiu o poder.

Barão Bettino Ricasoli

Além de ser a criadora do Chianti, a família Ricasoli produz vinhos desde o ano 1141, quando adquiriu o legendário Castello de Brolio. Essa longa história faz da Barone Ricasoli a vinícola mais antiga da Itália e a segunda mais antiga do mundo. O Castello de Brolio estava em ruínas à época.

Determinado a dar novos rumos à produção local, o Barão de Ricasoli viajou para a França e a Alemanha, onde aprendeu novas maneiras de cultivo, além de importar variedades e experimentar maquinários. Assim, em 1872, ele teria criado a “fórmula” do Chianti e assim escreveu:

“Os resultados obtidos já nas primeiras experiências confirmam que o vinho recebe do Sangioveto a principal dose de seu perfume (o que eu particularmente procuro) e um certo vigor de sensação; do Canajuolo, a amabilidade que tempera a dureza do primeiro, sem tolher em nada seu perfume; a Malvagia, a qual se pode colocar menos nos vinhos destinados a envelhecer, tende a diluir o produto das duas primeiras uvas, não acrescenta sabor, e o torna mais leve e mais prontamente usável na mesa cotidiana”.

A “fórmula do Chianti” escrita na famosa carta endereçada ao professor Cesare Studiati da Universidade de Pisa, na qual exaltava os aromas e a estrutura da Sangiovese, a maciez da Canaiolo e a tendência da Malvasia a diluir o vinho, fez com que o Barão sugerisse que esta última uva não fizesse parte do corte dos vinhos de guarda da sua região. A receita do Barão era 70% Sangiovese, 15% Canaiolo e 15% Malvasia Bianca. Em 1967, sua “fórmula” foi ratificada pela regulamentação da DOC (com acréscimo da Trebbiano).

Renascimento

O Chianti então surgiu como uma versão do “clarete” francês – sem variedades internacionais, contudo. Foi durante o Risorgimento que ele alcançou a glória, quando Firenze se tornou capital da Itália e Ricasoli primeiro ministro.

No entanto, apesar dos esforços do barão, com o tempo, a fama do vinho tornou-se ruim, muito devido às condições econômicas precárias da região, especialmente depois das pragas que chegaram à viticultura em meados do século XIX e também muito devido ao contrato de uso das terras entre agricultores e os donos das propriedades.

A mezzadria (sistema feudal em que os camponeses dividiam a sua colheita com os senhores de terras) e a agricultura promiscua (diversas culturas em um mesmo terreno) perdurou na Toscana até praticamente os anos 1970 e atrasou o desenvolvimento do vinho na região – já que a colheita ia ser dividida, era melhor, para o agricultor, plantar mais quantidade do que pensar em qualidade.

Clante

A origem do nome Chianti é incerta. Para alguns, ela vem de clangor, que nada mais é do que o som dos instrumentos metálicos, mais especificamente das trombetas. No entanto, também pode designar o atrito entre objetos de metal, como espadas.

Daí, acredita-se que o nome possa ter surgido devido a esse barulho das trombetas de caça ou então das batalhas. Outra possibilidade, muito mais aceita, é o termo ter vindo da palavra etrusca clante, que significaria água (abundante na região) ou então seria apenas um nome de família muito comum na área.

Os “Super Toscanos”

O movimento dos vinhos “Super Toscanos” fez com que Chianti aprimorasse suas normas. Nos anos 1960, alguns produtores estavam desapontados com os rumos que Chianti havia tomado.

Apesar de a DOC ter finalmente estabelecido uma regra para seus vinhos em 1967 (e talvez por isso também), muitos passaram a experimentar com novas variedades, especialmente as francesas, no intuito de produzir um vinho melhor e mais caro (desde o fim da II Guerra Mundial, Chianti era considerado um vinho simples e barato).

Assim, entre o final dos anos 1960 e começo dos 1970, duas poderosas famílias decidiram fazer vinhos mesclando Sangiovese com variedades francesas. Tanto o Marquês Mario Incisa della Rochetta quanto seu sobrinho, Piero Antinori, lançaram respectivamente Sassicaia e Tignanello, os primeiros Super Toscanos de que se tem notícia, vinhos que mudariam para sempre o cenário na região.

Com esse fenômeno houve novas mudanças nas regras, com a introdução de variedades francesas no blend de Chianti. Dez anos depois, as variedades brancas foram proibidas em Chianti Classico, que já passava a aceitar Sangiovese “in pureza”, ou seja, 100%.

Hoje, além do Classico, Chianti possui outras sete sub-regiões, cada uma com regras específicas. As mudanças de regras foram constantes nos últimos 40 anos. As últimas modificações em Chianti Classico, por exemplo, ocorreram em 2013, quando, entre outras coisas, criou-se uma nova classificação, com um nível qualitativo acima dos Riserva: os Gran Selezione.

Os diferentes Chianti

O simples termo “Chianti” diz muito pouco sobre o vinho. Muito resumidamente, indica que se trata de um tinto italiano, produzido na região da Toscana, em uma área que se estende entre as cidades de Florença e Siena, a partir de, principalmente, Sangiovese. Ainda que Chianti seja uma Denominação de Origem Controlada e Garantida (DOCG) e, portanto, existam regulamentações tratando de sua produção, a variedade é grande.

Além da “denominação genérica” Chianti DOCG, há outras denominações específicas que levam em consideração a proveniência geográfica das uvas: Chianti Classico (a mais antiga, famosa e tradicional), Chianti Colli Aretini, Chianti Colli Fiorentini, Chianti Colline Pisane, Chianti Colli Senesi, Chianti Montalbano, Chianti Montespertoli e Chianti Rufina. Também, os termos Chianti Superiore (não permitido para Chianti Classico) e Chianti Riserva servem para nomear vinhos que tenham atendido períodos de envelhecimento determinados, dentre outros fatores.

E agora finalmente o vinho!

Na taça revela um rubi com intensidade, mas não é escuro, traz reflexos granada com algum brilho. Tem poucas lágrimas que bem finas e rápidas logo dissipam das paredes do copo.

No nariz é extremamente aromático, perfumado, que traz frescor, aos cinco anos o vinho ainda mostra toda plenitude, corroborado pelas notas frutadas, de frutas negras, com destaque para a amora, a ameixa. A madeira está igualmente presente, com toques vivos de carvalho, de baunilha, de leve tosta, os 15 meses em barricas faz o seu papel, porém bem integrado. Herbáceo, tabaco, couro, defumado, terra molhada faz jus a predominância da Sangiovese.

Na boca é seco, vivaz, com alguma intensa, complexidade, mas é sedoso, fácil de degustar, garantido pelo percentual da Merlot. É volumoso, cheio, entregando personalidade, que o torna também bem saboroso. As notas frutadas se faz presente, protagoniza em sinergia com a madeira, como no aspecto olfativo, com taninos gordos, presentes, mas domados, com uma instigante e salivante acidez. Tem um final persistente e de retrogosto frutado.

Tradição, história, mesmo que ao custo de guerras, sangue, mortes, disputas pelo poder político e econômico. As redenções pavimentadas por todos esses eventos e intenções. O vinho foi e é um veículo de tais manifestações da sociedade, independente do contexto e cronologia. O que nos resta, no entanto, é permitir contemplar e entender esses momentos históricos com o olhar crítico, mas separando-os do prazer, do deleite em degustar um bom e velho vinho, porque é um elixir ao corpo e a alma, sobretudo daqueles que o ama. Vinhos de extremo caráter regional e de personalidade, aliado a maciez e facilidade de degustação, dada a sua elegância. O Rifugio del Vescovo Chianti Riserva traz a complexidade e rusticidade do “Sangue de Júpiter”, como é chamada a Sangiovese, com a maciez da Merlot, chancelando Chianti como um dos vinhos mais emblemáticos da história. Tem 13% de teor alcoólico.

Sobre a Vinícola Cooperativa Colli Fiorentini:

A Adega Cooperativa Colli Fiorentini tem associados cerca de 350 famílias de agricultores que contribuem para o seu crescimento, tida como a maior produtora de vinhos Chianti do mundo.

A Adega Cooperativa Colli Fiorentini tem seu centro de produção no vale banhado pelo Riacho Virginio, no município de Montespertoli, na província de Florença. Todos os produtos da Cantina Sociale Colli Fiorentini são comercializados nos pontos de venda VALVIRGINIO localizados em toda a Toscana.

Foi a primeira vinícola cooperativa toscana a adotar desde 2011 medidas para proteger o contexto natural e o meio ambiente do qual é parte integrante, instalando um gerador fotovoltaico com potência de 318 kW dividido em duas seções.

Há quase 51 anos, desde 1972, conservam e protegem cerca de 1.500 hectares da paisagem toscana, mantendo viva as tradições desta importante região que distingue cada família toscana no seu território.

Após mais de 40 anos, mais de 850 empresas, localizadas nas áreas de produção de Chianti Classico DOCG, Tuscan IGT e Tuscan IGP Oil, entregam suas safras aos locais de produção da Cooperativa.

Mais informações acesse:

https://www.collifiorentini.it/index.html

Referências:

“Blog História com Gosto”: https://historiacomgosto.blogspot.com/2019/11/a-regiao-do-chianti-classico-toscana.html

“Revista Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/todos-os-chianti_10196.html

“Blog Sonoma”: https://blog.sonoma.com.br/chianti/#:~:text=Chianti%20%C3%A9%20um%20tipo%20de,Chianti%20Cl%C3%A1ssico%20a%20mais%20famosa 













sexta-feira, 19 de maio de 2023

Poggio Al Casone Chianti Superiore 2019

 

Definitivamente a Itália é o país dos vinhos clássicos! Não há nenhum outro centro vitivinícola que produz, em larga escala e com tanta qualidade, vinhos do naipe de um Barolo, Brunello di Montalcino, Amarone, Ripasso e tantos outros. 

Vinhos longevos, vinhos de marcante personalidade, vinhos potentes, poderosos e de plenitude jamais vista, jamais sentida em taça. Incluiria entre esses nomes, porém fora da Itália, Bordeaux.

Vinhos que não precisam de demasiadas apresentações, tanto que muitos deles carregam o nome de sua região, típico do Velho Mundo. Não há a apresentação das suas clássicas castas, não há detalhes, não há quase nada, apenas as regiões ostentando em letras garrafais o seu nome, a sua tradição.

Porém atualmente, atendendo aos anseios do mercado consumidor, alguns produtores dessas regiões divulguem nos seus rótulos ou em seus sites e redes sociais as castas que compões seus clássicos, entre outras informações que nunca foram, em seus rótulos, divulgados.

Mas diante desse exército de clássicos que a Itália tem em seu front há outro, igualmente importante, que até hoje não goza de tanta reputação quanto os Brunellos e Barolos da vida. Falo do Chianti.

Percebo como difícil definir o motivo pelo qual exista essa rejeição, mas acredito que seja pelo fato, entre outras definições, da diversidade de valores de várias “versões” que temos do Chianti, que vai no simples rótulo de entrada aos “Riservas”, “Superiore” e o “Gran Selezione”.

Isso gera certo questionamento quanto a qualidade dos rótulos que ostentam “Chianti”. Mas temos que entender que as propostas, as características existem, afinal é muito bom, muito relevante ter Chiantis para todos os bolsos. Não temos que nos equivocar e esquecer que esses questionamentos vêm desde os primórdios da bebida.

Eu me recordo, contudo, que, como o Barolo e Brunello di Montalcino, por exemplo, jamais teria acesso a um rótulo de Chianti por ser também um clássico italiano, sequer entendia dessa escala de propostas desse tipo de vinho, nos mais variados preços, pois criei uma espécie de barreira, colocando um empecilho para tê-los em minha adega.

Até quando tive o prazer de comprar o meu primeiro Chianti, o Castellani Chianti Riserva 2015. E o comprei a um valor incrivelmente baixo para um “Riserva”, cerca dos R$ 45,00! Não podia hesitar, o comprei. E ficou por alguns anos na adega, precisava degusta-lo em um momento importante, especial. E que vinho espetacular! A Sangiovese em seu estado mais genuíno, não é à toa que é a mais emblemática cepa da Itália.

Mas eu não queria ficar apenas nesse rótulo e busquei outras alternativas que pudesse aliar preço e qualidade e descobri outro também da Castellani, mas que ostenta outro termo, o “Superiore”. Embora essas nomenclaturas tragam certa confusão, principalmente entre os iniciantes no universo do vinho, as diferenças entre “Riserva”, “Superiore” e “Gran Selezione”, a diferença se dá basicamente no tempo em que os vinhos passam por barricas de carvalho. No caso do “Superiore”, indica que o vinho passou doze meses por madeira e apresenta graduação alcoólica maior que o típico do Chianti, sendo vinhos mais encorpados, com acidez mais macia.

Então sem mais delongas vamos às apresentações! O vinho que degustei e gostei veio da emblemática região italiana da Toscana e se chama Poggio al Casone, um Chianti Superiore, composto pelas castas Sangiovese (90%) e Cannaiolo (10%) da safra 2019. Para não perder o costume, vamos de história, vamos de Chianti.

Chianti, Toscana

Desde a queda de Roma até o Risorgimento, por volta de 1850, o esfacelamento dos estados italianos em pequenas repúblicas e reinos ditou a vida de sua população e também o tom de seus vinhos. Foi nesse longo período conturbado que nasceu um dos vinhos mais famosos da Itália, o Chianti.

Geograficamente falando, Chianti é uma terra montanhosa que se estende por cerca de 60 km a 70 km na sua extensão, cujo ponto mais alto é Monte San Michele, a 893 metros. Existem 5 rios que cruzam e definem a área com: os rios Pesa, Greve, Ombrone, Staggia e Arbia.

Chianti

O começo da história remonta ao século XIII, quando os Médici dominavam a cidade de Firenze (Florença), na Toscana, e lá criaram uma das repúblicas mais influentes de seu tempo – basta lembrar que eles foram patronos das artes que culminaram com o Renascimento. Em meados do século XIII, os fiorentinos eram uma potência e viviam guerreando com vizinhos.

Para garantir uma boa defesa de suas terras, eles as dividiram em ligas militares de cidades. Uma delas, criada em 1384, foi a Lega del Chianti, que compreendia as vilas de Radda, Gaiole e Castellina (até hoje o centro da região que se denomina Chianti Classico), e durou até 1774, atuando ativamente durante as batalhas entre Firenze e Siena.

Aliás, a principal lenda em torno do vinho de Chianti vem dessas longas disputas medievais entre fiorentinos e sieneses. Acredita-se que, um dia, cansados de guerrear, os governantes das duas cidades decidiram por um outro tipo de disputa para estipular sob qual bandeira ficaria a região. Assim, concordaram que dois cavaleiros sairiam ao cantar do primeiro galo da madrugada, um partindo de Firenze em direção à Siena e o outro no sentido contrário. Onde eles se encontrassem, seria demarcado o limite dos domínios.

Assim nasceu a lenda do Gallo Nero, o galo negro que até hoje serve de emblema dos vinhos de Chianti Classico. Diz-se que os sieneses escolheram um belo e forte galo branco para dar o sinal ao seu cavaleiro. Já os fiorentinos teriam escolhido um galo negro raquítico, que ficou confinado sem comida. Por isso, o galo de Firenze teria acordado mais cedo, ainda durante a noite, faminto, e começado a cantar, fazendo com que seu cavaleiro tivesse grande vantagem sobre o rival de Siena, cujo galo só acordaria para cantar já nos primeiros raios de sol da manhã.

Assim, dos pouco mais de 60 quilômetros que separam as duas cidades, o cavaleiro sienês conseguiu percorrer somente cerca de 12 antes de encontrar o oponente nas proximidades de Fonterutoli, pouco ao sul de Castellina.

Em 1716, Cosimo III de Médici delimitou a região para a produção dos vinhos de Chianti. Lendas à parte, a verdade é que a demarcação da área de Chianti como pertencente à Firenze ocorreu em um tratado de 1203. Na época, os fiorentinos eram leais ao Papa e Siena, ao Sacro-Império Romano.

Primeira Denominação de Origem

As primeiras documentações que tratam do vinho de Chianti remontam a 1398 e o descrevem como um vinho branco vendido pelo comerciante Francesco di Marco Datini. No entanto, o nome do vinho ficaria definitivamente gravado na história a partir de 1716, quando Cosimo III de Médici, o penúltimo de sua família a ser Grão-Duque da Toscana, apontou que as três cidades da Lega del Chianti, mais uma parte da vila de Greve, estavam aptas a produzir o vinho de nome Chianti.

Francesco di Marco Datini

Esta teria sido a primeira demarcação territorial, ou seja, a primeira Denominação de Origem, conhecida no mundo (os portugueses, porém, alegam que a primeira DO teria sido instituída pelo Marquês de Pombal em 1756, quando estabeleceu os marcos pombalinos na região que produzia o Vinho do Porto).

Apesar de o reinado de Cosimo III ter sido desastroso para a região, que se viu diante de uma enorme crise econômica e social, a demarcação durou até 1932, quando a área foi gradualmente expandida (a última expansão seria em 1967).

No entanto, mesmo demarcado, sabe-se que o vinho de Chianti obedecia a poucas regras. Historiadores apontam que, na época, uma das principais uvas usadas na produção do vinho era a Canaiolo, a mais cultivada na região, juntamente com a Sangiovese, Mammolo e Marzemino. Seria somente durante o Risorgimento italiano no século XIX, que o vinho tomaria uma forma, muito próxima do que tem hoje.

O grande nome por trás do estabelecimento de Chianti e também um dos principais responsáveis pela unificação italiana em 1961 foi o barão Bettino Ricasoli, cuja origem familiar remonta aos tempos de Carlos Magno. O “Barão de Ferro” (alcunha ganha por sua intransigência moral e econômica) foi um dos grandes pilares da unificação de seu país com sua atuação política no Ducado da Toscana. Não à toa, ele chegou a ser primeiro ministro italiano quando o rei Vitório Emanuele assumiu o poder.

Bettino Ricasoli

Além de ser a criadora do Chianti, a família Ricasoli produz vinhos desde o ano 1141, quando adquiriu o legendário Castello de Brolio. Essa longa história faz da Barone Ricasoli a vinícola mais antiga da Itália e a segunda mais antiga do mundo. O Castello de Brolio estava em ruínas na época.

Determinado a dar novos rumos à produção local, o Barão de Ricasoli viajou para a França e a Alemanha, onde aprendeu novas maneiras de cultivo, além de importar variedades e experimentar maquinários. Assim, em 1872, ele teria criado a “fórmula” do Chianti e assim escreveu:

“Os resultados obtidos já nas primeiras experiências confirmam que o vinho recebe do Sangioveto a principal dose de seu perfume (o que eu particularmente procuro) e um certo vigor de sensação; do Canajuolo, a amabilidade que tempera a dureza do primeiro, sem tolher em nada seu perfume; a Malvagia, a qual se pode colocar menos nos vinhos destinados a envelhecer, tende a diluir o produto das duas primeiras uvas, não acrescenta sabor, e o torna mais leve e mais prontamente usável na mesa cotidiana”.

A “fórmula do Chianti” escrita na famosa carta endereçada ao professor Cesare Studiati da Universidade de Pisa, na qual exaltava os aromas e a estrutura da Sangiovese, a maciez da Canaiolo e a tendência da Malvasia a diluir o vinho, fez com que o Barão sugerisse que esta uva não fizesse parte do corte dos vinhos de guarda da sua região. A receita do Barão era 70% Sangiovese, 15% Canaiolo e 15% Malvasia Bianca. Em 1967, sua “fórmula” foi ratificada pela regulamentação da DOC (com acréscimo da Trebbiano).

Renascimento

O Chianti então surgiu como uma versão do “clarete” francês – sem variedades internacionais, contudo. Foi durante o Risorgimento que ele alcançou a glória, quando Firenze se tornou capital da Itália e Ricasoli primeiro ministro. No entanto, apesar dos esforços do barão, com o tempo, a fama do vinho tornou-se ruim, muito devido às condições econômicas precárias da região, especialmente depois das pragas que chegaram à viticultura em meados do século XIX e também muito devido ao contrato de uso das terras entre agricultores e os donos das propriedades.

A mezzadria (sistema feudal em que os camponeses dividiam a sua colheita com os senhores de terras) e a agricultura promiscua (diversas culturas em um mesmo terreno) perdurou na Toscana até praticamente os anos 1970 e atrasou o desenvolvimento do vinho na região – já que a colheita ia ser dividida, era melhor, para o agricultor, plantar mais quantidade do que pensar em qualidade.

Clante

A origem do nome Chianti é incerta. Para alguns, ela vem de clangor, que nada mais é do que o som dos instrumentos metálicos, mais especificamente das trombetas. No entanto, também pode designar o atrito entre objetos de metal, como espadas. Daí, acredita-se que o nome possa ter surgido devido a esse barulho das trombetas de caça ou então das batalhas. Outra possibilidade, muito mais aceita, é o termo ter vindo da palavra etrusca clante, que significaria água (abundante na região) ou então seria apenas um nome de família muito comum na área.

O movimento dos vinhos “Super Toscanos” fez com que Chianti aprimorasse suas normas. Nos anos 1960, alguns produtores estavam desapontados com os rumos que Chianti havia tomado. Apesar de a DOC ter finalmente estabelecido uma regra para seus vinhos em 1967 (e talvez por isso também), muitos passaram a experimentar com novas variedades, especialmente as francesas, no intuito de produzir um vinho melhor e mais caro (desde o fim da II Guerra Mundial, Chianti era considerado um vinho simples e barato).

Assim, entre o final dos anos 1960 e começo dos 1970, duas poderosas famílias decidiram fazer vinhos mesclando Sangiovese com variedades francesas. Tanto o Marquês Mario Incisa della Rochetta quanto seu sobrinho, Piero Antinori, lançaram respectivamente Sassicaia e Tignanello, os primeiros Super Toscanos de que se tem notícia, vinhos que mudariam para sempre o cenário na região.

O fenômeno houve novas mudanças nas regras, com a introdução de variedades francesas no blend de Chianti. Dez anos depois, as variedades brancas foram proibidas em Chianti Classico, que já passava a aceitar Sangiovese “in pureza”, ou seja, 100%. Hoje, além do Classico, Chianti possui outras sete sub-regiões, cada uma com regras específicas. As mudanças de regras foram constantes nos últimos 40 anos. As últimas modificações em Chianti Classico, por exemplo, ocorreram em 2013, quando, entre outras coisas, criou-se uma nova classificação, com um nível qualitativo acima dos Riserva: os Gran Selezione.

Os diferentes Chianti

O simples termo “Chianti” diz muito pouco sobre o vinho. Muito resumidamente, indica que se trata de um tinto italiano, produzido na região da Toscana, em uma área que se estende entre as cidades de Florença e Siena, a partir de, principalmente, Sangiovese. Ainda que Chianti seja uma Denominação de Origem Controlada e Garantida (DOCG) e, portanto, existam regulamentações tratando de sua produção, a variedade é grande.

Além da “denominação genérica” Chianti DOCG, há outras denominações específicas que levam em consideração a proveniência geográfica das uvas: Chianti Classico (a mais antiga, famosa e tradicional), Chianti Colli Aretini, Chianti Colli Fiorentini, Chianti Colline Pisane, Chianti Colli Senesi, Chianti Montalbano, Chianti Montespertoli e Chianti Rufina. Também, os termos Chianti Superiore (não permitido para Chianti Classico) e Chianti Riserva servem para nomear vinhos que tenham atendido períodos de envelhecimento determinados, dentre outros fatores.

E agora finalmente o vinho!

Na taça revela um lindo rubi intenso, brilhante, reluzente, com reflexos violáceos tendendo para o grená, com lágrimas finas, lentas e em média intensidade.

No nariz traz a exuberância das frutas vermelhas maduras, bem frescas com destaque para a groselha, cereja, framboesa e morango, com as notas amadeiradas que desponta de forma bem discreta, mas que entrega baunilha e um agradável defumado e mentolado, com toques de tabaco, couro e especiarias, algo de pimenta preta, diria. A rusticidade da Sangiovese se mostra.

Na boca tem corpo médio, tem vivacidade, personalidade, mas traz elegância, maciez e muito equilíbrio, pois traz o protagonismo das notas frutadas, como no aspecto olfativo, em total convergência com a madeira, graças aos doze meses em barricas de carvalho. Tem taninos doces e domados, com acidez vibrante, abundante que faz salivar a boca a cada degustação. Tem um final guloso, com média persistência.

Tradição, história, mesmo que ao custo de guerras, sangue, mortes, disputas pelo poder político e econômico. As redenções pavimentadas por todos esses eventos e intenções. O vinho foi e é um veículo de tais manifestações da sociedade, independente do contexto e cronologia. O que nos resta, no entanto, é permitir contemplar e entender esses momentos históricos com o olhar crítico, mas separando-os do prazer, do deleite em degustar um bom e velho vinho, porque é um elixir ao corpo e a alma, sobretudo daqueles que o ama. Toscana e a sua região mais importante em todos os aspectos, é sinônimo de renome no mundo todo por causa de Chianti e de suas grandes e espetaculares histórias que, de uma forma ou de outra, corroboraram na sua importância e qualidade que até hoje busca a excelência. O Poggio al Casone Chianti Superiore foi produzido nas vinhas que circundam a casa de Pierlugi Castellani e é um vinho encorpado, mas elegante, dada a sua complexidade atribuída ao “Sangue de Júpiter”, chancelando Chianti como um dos mais emblemáticos vinhos da história. Tem 12,5% de teor alcoólico.

Sobre a vinícola Castellani:

O negócio de Castellani foi estabelecido em Montecalvoli no final do século 19 quando Alfred, um viticultor de longa data, decidiu começar a engarrafar e vender seu vinho. O filho de Alfredo, Duilio, junto com seu irmão Mario dá início ao período de expansão da empresa. Duilio, homem meticuloso e diligente, participa ativamente de todas as etapas do trabalho.

A vinha mais importante é aquela situada em Santa Lúcia, no fértil vale do Arno, onde se produz um vinho tinto vivo e apto para envelhecer e engarrafado em típicos frascos com palha, conquistando o interesse dos mercados transalpinos. Nos anos seguintes, o filho primogênito de Duilio, Giorgio, homem determinado e ambicioso, inicia a exportação em grande escala. A enchente de 1966 causa grandes danos à vinícola Montecalvoli.

Decide-se então transferir temporariamente o negócio para a Fazenda Burchino, nas colinas da vila de Terricciola. O irmão de Giorgio, Roberto, brilhante jornalista do jornal “Il Giornale del Mattino”, de Florença, corre para ajudar a retirar lama da vinícola da família. Ele então decide ficar e contribui para a evolução da empresa. Roberto, homem culto e cosmopolita, inicia uma atividade pioneira em mercados longínquos, tornando-se um dos defensores do sucesso internacional do Chianti.

A aquisição da vinha Poggio al Casone coincide com a ampliação da adega da Quinta Travalda em Santa Lúcia. Durante a noite do dia de Ano Novo em 1982, um incêndio queimou quase completamente as instalações da empresa. Parece ser o fim. Mas em poucos meses os irmãos Castellani adquirem a Fazenda Campomaggio e, graças à contribuição de Piergiorgio, filho de Roberto, o negócio ganha força. As pesquisas vitivinícolas e tecnológicas são promovidas por especialistas como o enólogo Sabino Russo e o agrônomo Carlo Burroni. Hoje esta empresa centenária persegue com grande entusiasmo o objetivo de produzir vinhos, que são a expressão de uma das maiores regiões enológicas do mundo: a Toscana.

Mais informações acesse:

https://www.castelwine.com/

Referências:

“Blog História com Gosto”: https://historiacomgosto.blogspot.com/2019/11/a-regiao-do-chianti-classico-toscana.html

“Revista Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/todos-os-chianti_10196.html

“Blog Sonoma”: https://blog.sonoma.com.br/chianti/#:~:text=Chianti%20%C3%A9%20um%20tipo%20de,Chianti%20Cl%C3%A1ssico%20a%20mais%20famosa












sábado, 30 de julho de 2022

Famiglia Castellani Chianti Riserva 2015

 

Clássico! Quando degustamos história engarrafada! Quando degustamos o mais puro e genuíno conhecimento. A cultura e o vinho andando juntas em prol do deleite humano. Merecemos? Me conduzo à reflexão, às vezes, e me pergunto se merecemos degustar vinhos tão especiais que trafegam pela história em seus enredos mais tenebrosos, sombrios, solares em outros momentos.

Quis o tempo ser benfeitor comigo, apesar de longo e por vezes tortuoso, para me proporcionar a degustação de um clássico italiano que atravessou o tempo e que personifica a cultura vitivinícola de um país tido como referência da produção de vinhos do planeta, então, o vinho de hoje definitivamente é sinônimo de vinho!

Não há como negligenciar que somente a Itália consegue a proeza de produzir verdadeiros clássicos! Nomes de peso que reverencia o conceito da poesia líquida no mundo. Barolo, Brunello di Montalcino, Amarone, Valpolicella Ripasso...

A lista parece ser infindável, bem como as suas castas, as suas variedades autóctones, que sintetiza, de forma singular, cada pedaço de terra, cada terroir. A tipicidade se faz viva e plena e narra a história da Itália.

Sempre olhei com reverência a esses vinhos, mas com uma distância quase que intransponível, algo nos separava, talvez a questão financeira fosse o fator primordial, predominante, porém não era apenas isso. Não sei, nunca soube traduzir em palavras os motivos pelas quais jamais conseguiria degustar os clássicos italianos: a incapacidade de entende-los, de descrevê-los, de inseri-los, por consequência, em minha realidade de simples e humilde enófilo.

Teria eu me subestimado? Será que a gente, com a preocupação de “institucionalizar” determinados rótulos e propostas de vinhos e regiões, busca afirmação e entendimento demasiado de algo tão heterogêneo no que tange às percepções? Da diversidade busca-se a avidez pela particularidade, para entender.

Conhecer, entender não é demérito para ninguém, pelo contrário, mas transformar disso em obsessão, beira, penso, ao patológico. Acredito que tenha superado esse obstáculo, embora a razão ou pelo menos uma das razões de ser deste blog seja a descrição organoléptica de cada rótulo degustado, mas nunca criar um muro por achar que determinados rótulos, sejam eles excepcionais, simples, complexos, entre outros, não sejam possíveis de inundar as nossas taças.

Depois de superado esse obstáculo, me coloquei a garimpar e busquei aqueles mais conhecidos, populares, apesar de clássico: CHIANTI.

Com o transborde de opções de Chianti que temos ofertados no Brasil a minha missão parecia ser impossível para encontrar aquele rótulo que me arrebatasse, mas sem destruir o meu orçamento. Continuei a buscar, o caminho era longo e árduo, mas a oportunidade surgiu da forma, como sempre, mais despretensiosa possível. E veio um Chianti Riserva! Há cerca de dois anos, no Brasil, como qualquer produto, inflaciona, sobretudo o vinho, o rótulo escolhido, de um produtor emblemático, encontrei um Chianti Riserva, pasmem, a R$ 44,90 com alguns cupons de desconto e fretes grátis.

Claro que, de imediato, vem a incredulidade da procedência, mas não hesitei muito e fiz a tão aguardada aquisição. Mas mais aguardada era a degustação! Descansou por mais dois anos na adega e gostaria que ficasse um pouco mais, mas a ansiedade gritou mais alto!

E o dia tão esperado chegou! O ápice de um momento tão aguardado, o rompimento de alguns tabus particulares, fantasmas exorcizados. O vinho inunda a taça, o ritual se faz e que maravilha! Que especial! O vinho que degustei e gostei veio da emblemática e tradicional Toscana, da região de Chianti, e se chama Famiglia Castellani Chianti Riserva composto pelas castas Sangiovese (85%), Canaiolo (10%) e Cabernet Sauvignon (5%) da safra 2015. E como não pode faltar história e Chianti transborda história, vamos à viagem para a região de Chianti.

Chianti, Toscana

Desde a queda de Roma até o Risorgimento, por volta de 1850, o esfacelamento dos estados italianos em pequenas repúblicas e reinos ditou a vida de sua população e também o tom de seus vinhos. Foi nesse longo período conturbado que nasceu um dos vinhos mais famosos da Itália, o Chianti.

Geograficamente falando, Chianti é uma terra montanhosa que se estende por cerca de 60 km a 70 km na sua extensão, cujo ponto mais alto é Monte San Michele, a 893 metros. Existem 5 rios que cruzam e definem a área com: os rios Pesa, Greve, Ombrone, Staggia e Arbia.


Chianti

O começo da história remonta ao século XIII, quando os Médici dominavam a cidade de Firenze (Florença), na Toscana, e lá criaram uma das repúblicas mais influentes de seu tempo – basta lembrar que eles foram patronos das artes que culminaram com o Renascimento. Em meados do século XIII, os fiorentinos eram uma potência e viviam guerreando com vizinhos.

Para garantir uma boa defesa de suas terras, eles as dividiram em ligas militares de cidades. Uma delas, criada em 1384, foi a Lega del Chianti, que compreendia as vilas de Radda, Gaiole e Castellina (até hoje o centro da região que se denomina Chianti Classico), e durou até 1774, atuando ativamente durante as batalhas entre Firenze e Siena.

Aliás, a principal lenda em torno do vinho de Chianti vem dessas longas disputas medievais entre fiorentinos e sieneses. Acredita-se que, um dia, cansados de guerrear, os governantes das duas cidades decidiram por um outro tipo de disputa para estipular sob qual bandeira ficaria a região. Assim, concordaram que dois cavaleiros sairiam ao cantar do primeiro galo da madrugada, um partindo de Firenze em direção à Siena e o outro no sentido contrário. Onde eles se encontrassem, seria demarcado o limite dos domínios.

Assim nasceu a lenda do Gallo Nero, o galo negro que até hoje serve de emblema dos vinhos de Chianti Classico. Diz-se que os sieneses escolheram um belo e forte galo branco para dar o sinal ao seu cavaleiro. Já os fiorentinos teriam escolhido um galo negro raquítico, que ficou confinado sem comida. Por isso, o galo de Firenze teria acordado mais cedo, ainda durante a noite, faminto, e começado a cantar, fazendo com que seu cavaleiro tivesse grande vantagem sobre o rival de Siena, cujo galo só acordaria para cantar já nos primeiros raios de sol da manhã.

Assim, dos pouco mais de 60 quilômetros que separam as duas cidades, o cavaleiro sienês conseguiu percorrer somente cerca de 12 antes de encontrar o oponente nas proximidades de Fonterutoli, pouco ao sul de Castellina.

Em 1716, Cosimo III de Médici delimitou a região para a produção dos vinhos de Chianti. Lendas à parte, a verdade é que a demarcação da área de Chianti como pertencente à Firenze ocorreu em um tratado de 1203. Na época, os fiorentinos eram leais ao Papa e Siena, ao Sacro-Império Romano.

Primeira Denominação de Origem

As primeiras documentações que tratam do vinho de Chianti remontam a 1398 e o descrevem como um vinho branco vendido pelo comerciante Francesco di Marco Datini. No entanto, o nome do vinho ficaria definitivamente gravado na história a partir de 1716, quando Cosimo III de Médici, o penúltimo de sua família a ser Grão-Duque da Toscana, apontou que as três cidades da Lega del Chianti, mais uma parte da vila de Greve, estavam aptas a produzir o vinho de nome Chianti.

Francesco di Marco Datini

Esta teria sido a primeira demarcação territorial, ou seja, a primeira Denominação de Origem, conhecida no mundo (os portugueses, porém, alegam que a primeira DO teria sido instituída pelo Marquês de Pombal em 1756, quando estabeleceu os marcos pombalinos na região que produzia o Vinho do Porto). Apesar de o reinado de Cosimo III ter sido desastroso para a região, que se viu diante de uma enorme crise econômica e social, a demarcação durou até 1932, quando a área foi gradualmente expandida (a última expansão seria em 1967).

No entanto, mesmo demarcado, sabe-se que o vinho de Chianti obedecia a poucas regras. Historiadores apontam que, na época, uma das principais uvas usadas na produção do vinho era a Canaiolo, a mais cultivada na região, juntamente com a Sangiovese, Mammolo e Marzemino. Seria somente durante o Risorgimento italiano no século XIX, que o vinho tomaria uma forma, muito próxima do que tem hoje.

O grande nome por trás do estabelecimento de Chianti e também um dos principais responsáveis pela unificação italiana em 1961 foi o barão Bettino Ricasoli, cuja origem familiar remonta aos tempos de Carlos Magno. O “Barão de Ferro” (alcunha ganha por sua intransigência moral e econômica) foi um dos grandes pilares da unificação de seu país com sua atuação política no Ducado da Toscana. Não à toa, ele chegou a ser primeiro ministro italiano quando o rei Vitório Emanuele assumiu o poder.

Barão Bettino Ricasoli

Além de ser a criadora do Chianti, a família Ricasoli produz vinhos desde o ano 1141, quando adquiriu o legendário Castello de Brolio. Essa longa história faz da Barone Ricasoli a vinícola mais antiga da Itália e a segunda mais antiga do mundo. O Castello de Brolio estava em ruínas na época. Determinado a dar novos rumos à produção local, o Barão de Ricasoli viajou para a França e a Alemanha, onde aprendeu novas maneiras de cultivo, além de importar variedades e experimentar maquinários. Assim, em 1872, ele teria criado a “fórmula” do Chianti e assim escreveu:

“Os resultados obtidos já nas primeiras experiências confirmam que o vinho recebe do Sangioveto a principal dose de seu perfume (o que eu particularmente procuro) e um certo vigor de sensação; do Canajuolo, a amabilidade que tempera a dureza do primeiro, sem tolher em nada seu perfume; a Malvagia, a qual se pode colocar menos nos vinhos destinados a envelhecer, tende a diluir o produto das duas primeiras uvas, não acrescenta sabor, e o torna mais leve e mais prontamente usável na mesa cotidiana”.

A “fórmula do Chianti” escrita na famosa carta endereçada ao professor Cesare Studiati da Universidade de Pisa, na qual exaltava os aromas e a estrutura da Sangiovese, a maciez da Canaiolo e a tendência da Malvasia a diluir o vinho, fez com que o Barão sugerisse que esta uva não fizesse parte do corte dos vinhos de guarda da sua região. A receita do Barão era 70% Sangiovese, 15% Canaiolo e 15% Malvasia Bianca. Em 1967, sua “fórmula” foi ratificada pela regulamentação da DOC (com acréscimo da Trebbiano).

Renascimento

O Chianti então surgiu como uma versão do “clarete” francês – sem variedades internacionais, contudo. Foi durante o Risorgimento que ele alcançou a glória, quando Firenze se tornou capital da Itália e Ricasoli primeiro ministro. No entanto, apesar dos esforços do barão, com o tempo, a fama do vinho tornou-se ruim, muito devido às condições econômicas precárias da região, especialmente depois das pragas que chegaram à viticultura em meados do século XIX e também muito devido ao contrato de uso das terras entre agricultores e os donos das propriedades.

A mezzadria (sistema feudal em que os camponeses dividiam a sua colheita com os senhores de terras) e a agricultura promiscua (diversas culturas em um mesmo terreno) perdurou na Toscana até praticamente os anos 1970 e atrasou o desenvolvimento do vinho na região – já que a colheita ia ser dividida, era melhor, para o agricultor, plantar mais quantidade do que pensar em qualidade.

Clante

A origem do nome Chianti é incerta. Para alguns, ela vem de clangor, que nada mais é do que o som dos instrumentos metálicos, mais especificamente das trombetas. No entanto, também pode designar o atrito entre objetos de metal, como espadas. Daí, acredita-se que o nome possa ter surgido devido a esse barulho das trombetas de caça ou então das batalhas. Outra possibilidade, muito mais aceita, é o termo ter vindo da palavra etrusca clante, que significaria água (abundante na região) ou então seria apenas um nome de família muito comum na área.

Movimento dos vinhos “Super Toscanos” fez com que Chianti aprimorasse suas normas. Nos anos 1960, alguns produtores estavam desapontados com os rumos que Chianti havia tomado. Apesar de a DOC ter finalmente estabelecido uma regra para seus vinhos em 1967 (e talvez por isso também), muitos passaram a experimentar com novas variedades, especialmente as francesas, no intuito de produzir um vinho melhor e mais caro (desde o fim da II Guerra Mundial, Chianti era considerado um vinho simples e barato).

Assim, entre o final dos anos 1960 e começo dos 1970, duas poderosas famílias decidiram fazer vinhos mesclando Sangiovese com variedades francesas. Tanto o Marquês Mario Incisa della Rochetta quanto seu sobrinho, Piero Antinori, lançaram respectivamente Sassicaia e Tignanello, os primeiros Super Toscanos de que se tem notícia, vinhos que mudariam para sempre o cenário na região. “O fenômeno houve novas mudanças nas regras, com a introdução de variedades francesas no blend de Chianti. Dez anos depois, as variedades brancas foram proibidas em Chianti Classico, que já passava a aceitar Sangiovese “in pureza”, ou seja, 100%. Hoje, além do Classico, Chianti possui outras sete sub-regiões, cada uma com regras específicas. As mudanças de regras foram constantes nos últimos 40 anos. As últimas modificações em Chianti Classico, por exemplo, ocorreram em 2013, quando, entre outras coisas, criou-se uma nova classificação, com um nível qualitativo acima dos Riserva: os Gran Selezione.

Os diferentes Chianti

O simples termo “Chianti” diz muito pouco sobre o vinho. Muito resumidamente, indica que se trata de um tinto italiano, produzido na região da Toscana, em uma área que se estende entre as cidades de Florença e Siena, a partir de, principalmente, Sangiovese. Ainda que Chianti seja uma Denominação de Origem Controlada e Garantida (DOCG) e, portanto, existam regulamentações tratando de sua produção, a variedade é grande.

Além da “denominação genérica” Chianti DOCG, há outras denominações específicas que levam em consideração a proveniência geográfica das uvas: Chianti Classico (a mais antiga, famosa e tradicional), Chianti Colli Aretini, Chianti Colli Fiorentini, Chianti Colline Pisane, Chianti Colli Senesi, Chianti Montalbano, Chianti Montespertoli e Chianti Rufina. Também, os termos Chianti Superiore (não permitido para Chianti Classico) e Chianti Riserva servem para nomear vinhos que tenham atendido períodos de envelhecimento determinados, dentre outros fatores.

E agora finalmente o vinho!

Na taça revela um lindo e brilhante vermelho rubi com tons granada, conferido pela longa passagem por barricas de carvalho, com lágrimas em profusão, finas e lentas.

No nariz traz as frutas vermelhas maduras, com destaque para ameixa e cereja, mas discretamente, além de um toque terroso, de terra molhada, algo de folhas secas, com notas de especiarias (pimenta preta) e amadeiradas, percebendo o tabaco, couro e café, afinal os longos 24 meses em barricas de carvalho atestam tais características.

Na boca toda a pujança da Sangiovese no blend, com a fruta vermelha madura igualmente discreta, como percebida no aspecto olfativo, sendo ainda seco, volumoso, cheio e quente, garantido pela presença do álcool, mas sem agredir e pela acidez vivaz, com taninos marcantes, mas domados e integrados, com a madeira, embora discreta, protagonizando entregando notas de chocolate, torrefação, de defumado e caramelo. Tem um final longo e persistente.

Tradição, história, mesmo que ao custo de guerras, sangue, mortes, disputas pelo poder político e econômico. As redenções pavimentadas por todos esses eventos e intenções. O vinho foi e é um veículo de tais manifestações da sociedade, independente do contexto e cronologia. O que nos resta, no entanto, é permitir contemplar e entender esses momentos históricos com o olhar crítico, mas separando-os do prazer, do deleite em degustar um bom e velho vinho, porque é um elixir ao corpo e a alma, sobretudo daqueles que o ama. Toscana e a sua região mais importante em todos os aspectos, é sinônimo de renome no mundo todo por causa de Chianti e de suas grandes e espetaculares histórias que, de uma forma ou de outra, corroboraram na sua importância e qualidade que até hoje busca a excelência. O Chianti Riserva da Famiglia Castellani definitivamente carrega esses preceitos, como um produtor de igual tradição e história. Um vinho encorpado, de personalidade, dada a sua complexidade atribuída ao “Sangue de Júpiter” chancelando Chianti como um dos mais emblemáticos vinhos da história. Tem 12,5% de teor alcoólico.

Sobre a vinícola Castellani:

O negócio de Castellani foi estabelecido em Montecalvoli no final do século 19 quando Alfred, um viticultor de longa data, decidiu começar a engarrafar e vender seu vinho. O filho de Alfredo, Duilio, junto com seu irmão Mario dá início ao período de expansão da empresa. Duilio, homem meticuloso e diligente, participa ativamente de todas as etapas do trabalho.

A vinha mais importante é aquela situada em Santa Lúcia, no fértil vale do Arno, onde se produz um vinho tinto vivo e apto para envelhecer e engarrafado em típicos frascos com palha, conquistando o interesse dos mercados transalpinos. Nos anos seguintes, o filho primogênito de Duilio, Giorgio, homem determinado e ambicioso, inicia a exportação em grande escala. A enchente de 1966 causa grandes danos à vinícola Montecalvoli.

Decide-se então transferir temporariamente o negócio para a Fazenda Burchino, nas colinas da vila de Terricciola. O irmão de Giorgio, Roberto, brilhante jornalista do jornal “Il Giornale del Mattino”, de Florença, corre para ajudar a retirar lama da vinícola da família. Ele então decide ficar e contribui para a evolução da empresa. Roberto, homem culto e cosmopolita, inicia uma atividade pioneira em mercados longínquos, tornando-se um dos defensores do sucesso internacional do Chianti.

A aquisição da vinha Poggio al Casone coincide com a ampliação da adega da Quinta Travalda em Santa Lúcia. Durante a noite do dia de Ano Novo em 1982, um incêndio queimou quase completamente as instalações da empresa. Parece ser o fim. Mas em poucos meses os irmãos Castellani adquirem a Fazenda Campomaggio e, graças à contribuição de Piergiorgio, filho de Roberto, o negócio ganha força. As pesquisas vitivinícolas e tecnológicas são promovidas por especialistas como o enólogo Sabino Russo e o agrônomo Carlo Burroni. Hoje esta empresa centenária persegue com grande entusiasmo o objetivo de produzir vinhos, que são a expressão de uma das maiores regiões enológicas do mundo: a Toscana.

Mais informações acesse:

https://www.castelwine.com/

Referências:

“Blog História com Gosto”: https://historiacomgosto.blogspot.com/2019/11/a-regiao-do-chianti-classico-toscana.html

“Revista Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/todos-os-chianti_10196.html

“Blog Sonoma”: https://blog.sonoma.com.br/chianti/#:~:text=Chianti%20%C3%A9%20um%20tipo%20de,Chianti%20Cl%C3%A1ssico%20a%20mais%20famosa