Como sempre costumo dizer e o farei até o fim dos meus dias:
Vinho é celebração, é estar com os melhores amigos para uma boa conversa
informal e descontraída, é conhecimento, é a degustação na sua mais fiel e
genuína concepção. Um grande amigo, de longa data, de uns tempos para cá,
aderiu ao universo da vinho de uma forma intensa e incondicional e quando tomei
conhecimento de sua decisão, fui tomado por uma incontida alegria. Além de
nossas edificantes conversas sobre vários assuntos do cotidiano, iremos incluir
o universo do vinho em nossas realidades.
E não contente apenas com a sua inserção no mundo do vinho e
seus rótulos, decidimos consolidar com encontros regados a bebida de Baco e
Dionísio e muitas conversas. A solidificação da nossa amizade e as viagens mais
do que prazerosas nas histórias que permeiam os vinhos que degustamos e
certamente gostamos. Nasce a “Confraria Marginal”. Somos apenas nós dois, um
pequeno e discreto número, mas significativo na sua relevância e mais
contundente, forte e que será eterno enquanto durar, já dizia o trecho daquela
música tupiniquim. E agora vem aquela pergunta que o nobre leitor deve se
perguntar neste momento: Mas por que “Confraria Marginal”?
Não somos convencionais, não usamos vinho para escorar status
econômico, não usamos o vinho como fator de subjugação, amamos o vinho pelo que
ele é, pelo fator cultural, pela busca do conhecimento e sobretudo pelo fator
sensorial e as suas gratas experiências, então somos marginais, estamos à
margem desses conceitos tortos e posturas lamentáveis, mas sonhamos com uma
quebra de paradigmas nessa triste cultura.
E depois da especial degustação inaugural da primeira e
estabelecida Confraria Marginal, o Domainde Cambos Cuvée Jean D’Augergne da
safra 2017, vem agora, para fechar com honraria e dignidade um vinho de uma das
minhas mais novas regiões favoritas: Languedoc-Roussillon, não poderia faltar
um rótulo desse especial pedaço de terra da França. Uma região que não tem a
badalação de Bordeaux ou Vale do Rhône, por exemplo, inclusive tem vinhos cujo
valor é baixo em comparação a essas regiões, o que pode minimizar a sua
relevância para a vitivinicultura francesa, mas são vinhos altamente
competitivos em relação aos grandes e tradicionais terroirs franceses com
vinhos de atraentes custo X benefício.
O vinho que degustei e gostei, como disse, com alegria e
orgulho veio do Languedoc-Roussillon, na França e se chama Domaine de Cibadiès
Pegasus da casta Sauvignon Blanc da safra 2019. Não quero, pelo menos ainda,
falar sobre o vinho, mas quando o desarrolhei fui tomado por uma atônita
revelação: Um Sauvignon Blanc totalmente diferente, totalmente atípico dos que
costumamos degustar do Chile ou da Nova Zelândia, por exemplo, cujos vinhos são
mais ácidos ou com alguma estrutura. Mas falemos um pouco da velha e necessária
Languedoc-Roussillon, afinal, nunca é redundante falar do que gostamos.
“Pays D’Oc” ou simplesmente os vinhos do Languedoc-Roussillon
Com vinhedos cultivados desde o ano 125 a.C., Languedoc-Roussillon
é uma das regiões vinícolas mais importantes da França, responsável por ¼ de
todo o vinho produzido no país. Na opinião de vários autores, como a inglesa
Jancis Robinson, a região origina algumas das melhores relações qualidade e
preço de toda a França. Boa parte da produção é dedicada aos famosos e
saborosos “Vin de Pays d’Oc”, contando ainda com importantes AOC (Apelação de
Origem Controlada) como Minervois, Fitou, Corbières e Coteaux du Langedoc.
Quando elaborados pelos melhores produtores, são vinhos cheios de fruta e
sabor, com boa complexidade, corpo e um delicioso acento regional, perfeitos
para acompanhar as refeições. Languedoc-Roussillon é uma vasta área
vitivinícola, que traz um acentuado toque mediterrâneo e um rico histórico de
cultivo de vinhas e produção de vinhos, um ciclo que teve início há mais de
2.000 anos com as colônias gregas e romanas.
Um cauteloso processo de subdivisão de Languedoc-Roussillon
em terroirs reconhecidamente distintos está em andamento há alguns anos,
originando as apelações Clairette du Languedoc, La Clape, Picpoul de Pinet,
entre outras. Algumas encontram-se bem estabelecidas, com anos de certificação,
outras estão conquistando aos poucos seu espaço perante o mundo do vinho. Com
um solo bastante fértil, as uvas tintas encontradas com maior facilidade na
região francesa são a Syrah, Grenache, Cinsault, Carignan, Merlot e Cabernet
Sauvignon. Entre as variedades brancas, encontram-se Rolle, Clairette, Terret,
Boubolenc, Muscat, Maccabéo, Sauvignon Blanc, Chardonnay, Picpoul, Marsanne e
Viognier. A diversidade de vinhos encontrada na região francesa é imensa. Os
exemplares tintos vãos desde os frutados até os encorpados, e estão sendo cada
vez mais produzidos com sucesso. Os vinhos brancos podem ser mais complexos ou
nítidos, variando entre os doces e oxidados até leves e secos.
Languedoc-Roussillon produz também magníficos vinhos de sobremesa e espumantes
de muito prestígio; seus rosés são intensos, pálidos e muito perfumados. A tradição
de Languedoc-Roussillon estende-se por anos, e a região é dona de constante
evolução e muita variedade. A região tornou-se uma respeitada produtora, dando
origem a vinhos de qualidade e prestígio perante todo o mundo. Atualmente o
Languedoc vem se tornando tão excitantes para vinhos tintos robustos e frutados
a preços convidativos. De trinta anos para cá vinicultores pioneiros ajudaram a
elevar a qualidade para novos níveis. As uvas Syrah, Grenache e Mourvèdre
ocuparam o lugar da Carignan e a procura pela qualidade reduziu a primazia dos
vinhos populares. No período de 1982 a 1993, sub-regiões como Faugères,
Minervois e Limoux enquadram-se como Denominação de Origem Controlada.
Corbières, o vinhedo mais amplo da França Meridional, corre atrás com tintos
apimentados da Grenache.
E agora finalmente o vinho!
Na taça revela um amarelo brilhante e reluzente tendendo para
um dourado com discretas formações de finas lágrimas que logo se dispersam.
No nariz sente-se uma explosão aromática de frutas brancas, cítricas
e tropicais e um curioso e interessante dulçor, talvez pêssego em calda, com
notas de pera, maçã verde e abacaxi.
Na boca é jovem, fresco e saboroso, as notas frutadas se
reproduzem no paladar como no aspecto olfativo, um bom volume de boca, uma acidez
agradável, que traz a sensação de leveza e elegância, com um bom final de boca
e retrogosto frutado.
A nossa primeira confraria estabelecida e temática foi
fantástica! Fizemos uma pequena viagem por algumas das mais emblemáticas terras
francesas por intermédio de generosas taças de vinhos, contemplando agradáveis
rótulos. Languedoc-Roussillon continua me surpreendendo positivamente com seus
belíssimos rótulos com seu excepcional custo X benefício comprovando
definitivamente que vinho francês para ser bom não precisa necessariamente ser
caro! O Languedoc-Roussillon nos brinda com essa máxima. E além do fator
monetário esse rótulo me surpreendeu de uma forma inacreditável. Esta fora da
realidade dos Sauvignon Blanc que degustamos no Chile, tido como os melhores do
mundo. Tem um aroma e paladar adocicado sem soar enjoativo, uma acidez
instigante que quando preenche pela boca se faz presente, se intensifica, mas
quando engolimos o vinho se fecha, dando lugar a um final persistente e
frutado. Um belo vinho diferente! Tem 12,5% de teor alcoólico.
Sobre a Vignobles
Bonfils:
Localizada no Sul da França, a Vinhedos Bonfils é resultado
de uma história de lutas e conquistas de homens e mulheres que há 5 gerações,
trabalham pela paixão de promover a excelência do bom vinho. Uma família unida
pela determinação e paixão por desafios desde o século XVII. Tudo começou em
1870 com o jovem professor Joseph Bonfils quando ao participar do “Commune
Paris” – movimento contrário ao regime político francês da época – foi exilado
na Argélia. Lá ele conheceu Honorine Duvaux, que veio a tornar-se sua esposa e
a ser a primeira mulher a receber uma medalha de honra ao mérito agrícola. É
Honorine que monta uma fazenda agrícola com muitas vinhas e planta
incansavelmente, iniciando uma plantação de mais de 6 hectares de vinhas. A
fazenda gerou resultado até a declaração da independência da Argélia, quando a
propriedade do casal foi nacionalizada e foram forçados a voltar para a França.
Joseph e Honorine recomeçaram a plantação de vinhedos aos pés
do Mont Ventoux e Dentelles de Montmirail, sem saber que estavam começando uma
história que seria perpetuada por gerações. O filho do casal, Abel, desde
criança continuou a tradição da família e logo passou a introduzir o filho Jean
Michel Bonfins, nas vinhas e adegas da família. Jean seguiu os passos dos avôs
e de seu pai, que se instalaram perto de Béziers, onde se deu a construção da
Vignobles Bonfils, que trazia a marca da força da fabricação artesanal de
vinhos. Depois disso, Jean Bonfins, aproveitando todas as oportunidades que
surgiam, fez crescer o patrimônio da família e comprou de volta as vinhas de
Languedoc, que no passado pertenciam aos seus avôs, somando assim 10 hectares
de plantação de uvas bem selecionas e especiais. Em 1978 comprou os terrenos do
Domaine de Cibadiés e Capestang No Hérault, atual sede da Vignobles Bonfils.
Logo depois, em 1990, o filho de Jean Bonfins, Laurent Bonfins, com apenas 25
anos de idade e recém-formado, assumiu o comando do Cibadiés Domain. Com a
ajuda de seus irmãos Olivier e Jerome, um na supervisão e auxiliando na
administração das vinícolas e outro na direção e gerência de marketing da
Vignobles Bonfils, uniram experiência e competência para tomarem as principais
decisões e impulsionarem ainda mais os negócios.
As vinhas da família Bonfils estão localizadas em terrenos
que oferecem ótimas condições de solo e clima que favorece a qualidade das uvas
atendendo as exigências do mercado, mas principalmente a marcante preocupação
da família. As videiras são cultivadas seguindo rigorosos padrões que vão desde
analise das condições do solo até a seleção de tamanho e estado de maturação da
fruta. Sendo feita a colheita manual em algumas áreas, há também a preocupação
que os frutos não recebam excessivo calor do sol e onde são observados todos os
cuidados com os impactos ambientais. As adegas são equipadas com equipamentos
modernos de ultima geração que contrastam com arquitetura original. Todos estes
cuidados dão origem a vinhos autênticos, de excelente qualidade, de sabor
exótico e incomparável. Os vinhos da Bonfils são orgânicos, ou seja, não
recebem adição de produtos químicos ou influencia de maquinário pesado sendo
distribuídos em 35 países e tendo reputação premiadíssima. O que provém da
ideia impressa nas palavras do próprio Jean Michel Bonfils: “Não há nenhum
grande vinho sem um bom vinhedo e sem respeito pela terra que a alimenta”.
Atualmente, os vinhedos Bonfils são constituídos por mais
1800 hectares distribuídos em 23 vinícolas (incluindo 3 castelos) e oferecem 16
castas diferentes de uvas especiais e selecionadas garantindo a alta qualidade
dos vinhos. À frente da vinícola hoje estão: Olivier, Jerome, Laurent e
Christian Bonfils, membros da 5ª geração da família, formados em
Borgonha/França, onde adquiriram vasta experiência em viticultura e enologia.
Conseguem mesclar castas e aproveitas as expressões minerais dos solos onde
cultiva de forma memorável, o que leva seus vinhos a exprimirem sabores únicos.
Eles se valem da paixão e respeito incondicional pela terra, passada de geração
em geração, levando em mente a ideia de cultivar vinhas com uvas da mais alta
qualidade, respeitando o terroir em sua máxima expressão.
Mais informações acesse:
Referências:
“Clube dos Vinhos”: https://www.clubedosvinhos.com.br/vignobles-bonfils-tradicao-e-amor-pela-terra/
“Vem da Uva”: https://www.vemdauva.com.br/o-que-e-vin-de-pays/
“Revista Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/o-vinho-de-languedoc_8053.html
“Mistral”: https://www.mistral.com.br/regiao/languedoc-roussillon