Não há como negar que, quando falamos de Argentina e Mendoza,
seu principal centro de produção vitivinícola, lembramos da Malbec. Atualmente
essa máxima vem sendo desmistificada e outras castas estão ganhando espaço ou
sempre tiveram respeitabilidade, mas sendo ofuscada pela Malbec, como Cabernet
Sauvignon, Cabernet Franc entre outras tintas.
Mas quando falamos das cepas brancas é a Torrontés que reina
absoluta na terra dos Hermanos. E reina com honras e a fidalguia que mercê. A
casta é especial e a começar pelos seus aromas florais, de frutas tropicais,
cítricas e de tons herbáceos e minerais, com paladar fresco, leve, mas de grande
e marcante personalidade.
E para a tradição da páscoa e sua gastronomia de carnes
brancas, como peixe e bacalhau, decidi retirar um Torrontés da adega, devido a
outra interessante característica da cepa que é a sua acidez vibrante e
salivante.
A casta é ícone e merece uma data tradicional e relevante
para os católicos. Não que eu seja um fervoroso religioso e adepto de seus
dogmas, mas já que estamos inseridos em uma tradição e com uma gastronomia que
estimula a degustação com um vinho harmonizando, por que não aproveitar esse
momento com um bom rótulo?
Então o escolhido, o vinho que degustei e gostei é da icônica
e tradicional Bodegas Norton e se chama Lote Rojo, um 100% Torrontés, da safra
2020. E depois de muito tempo volto a degustar um rótulo desse espetacular
produtor e também, depois de muito tempo, degustar um Torrontés. Ante de tecer
comentários sobre o vinho, vamos de história, vamos falar um pouco da
Torrontés.
Torrontes: a casta emblemática da Argentina
A uva branca Torrontés tornou-se ícone na Argentina, dando
origem a vinhos brancos extremamente potentes e capazes de surpreender inúmeros
paladares. A produção de vinhos a partir da uva Torrontés ocorre, em especial,
na Argentina e, eventualmente, é possível encontrar alguns notáveis exemplares
em regiões da Nova Zelândia e do Chile.
Na Argentina, a Torrontés é encontrada em diversas áreas
vinícolas, com destaque para o Vale de Cafayate, situado ao norte do país, e
Salta. Com vinhedos cultivados em altitudes altíssimas, o vinho Torrontés de
Cafayete é extremamente frutado e saboroso, bem como complexo e delicado, com
corpo leve, tonalidade amarelo claro com reflexos verdes e raramente passa por
barris de carvalho durante sua vinificação.
A casta Torrontés possui ainda três variantes – Mendocina,
Sanjuanina e Riojana –, onde a mais importante é a variedade Torrontés Riojana
por se tratar da única uva Criolla originada na América, que possui um alto
valor enológico e importante relevância comercial na produção de alguns dos
melhores vinhos brancos argentinos.
Os vinhos produzidos a partir da uva Torrontés são alguns dos
vinhos brancos mais aromáticos da Argentina, onde é possível encontrar notas de
ervas e especiarias. Na boca, os exemplares são intensos, com refrescante
acidez e devem ser consumidos ainda jovens.
A maior parte dos vinhos Torrontés não passa por barris de
madeira, proporcionando maior frescor aos exemplares. Além disso, devido a não
utilização de madeira, os vinhos passam a apresentar uma coloração mais clara
que os demais exemplares. Trata-se de uma variedade com bagos grandes, peles
grossas e amadurecimento precoce.
O clima mais frio é ideal para a uva Torrontés, ajudando a
reter seus níveis de acidez natural. Essa casta cresceu rapidamente para se
tornar um ícone dos vinhos brancos argentinos, além de tornar-se uma das
variedades mais cultivadas do país.
A partir de 2012, a Torrontés tornou-se a segunda uva branca
mais cultivada da Argentina, atrás apenas da nativa Pedro Ximenez utilizada na
elaboração de vinhos de mesa simples, destinados ao consumo do mercado local.
E agora finalmente o vinho!
Na taça uma linda cor amarelo palha, límpido, transparente,
brilhante, com tons esverdeados.
No nariz aromas típicos da Torrontés, com destaque para as
notas frutadas, frutas tropicais, de polpas brancas e cítricas, como pera,
limão, lima, um pêssego discreto e arrisco dizer que bananas, além de um
delicado floral trazendo a sensação de frescor e grama cortada, uma agradável
mineralidade.
Na boca traz a confirmação do frescor, da leveza, com algum
volume de boca, que entrega alguma personalidade, mas não evidente, equilibrado,
com as notas frutadas protagonizando, como no aspecto olfativo, uma boa acidez
que saliva, com um final frutado e de média persistência.
Poucas castas brancas são extremamente aromáticas como a
Torrontés. É complexo, mas, ao mesmo tempo é leve e intenso, delicado e com uma
acidez que traz frescor quando o vinho é degustado e são essas percepções
observadas, sentidas neste simples, porém muito saboroso vinho da Bodega
Norton. Tem 13,5% de teor alcoólico.
Sobre a Bodega Norton:
Em 1895 o engenheiro Edmund James Palmer Norton chega à
Argentina para ajudar na construção de uma ferrovia através dos Andes e se
apaixona pelo terroir de Mendoza. Fazendo uma mudança drástica em sua vida, ele
decide fundar sua própria vinha em Luján de Cuyo com vinhas importadas da
França. Em 1919 começam as obras da adega que se conhece hoje. Em 1951 os
vinhos tintos e brancos finos de Norton são aclamados nacionalmente.
Em 1989 o empresário austríaco Gernot Langes-Swarovski se
maravilha com a beleza de Mendoza e vê potencial no desenvolvimento dos vinhos
argentinos. Ele decide comprar a Bodega Norton, a única vinícola tradicional da
região cercada por vinhedos próprios.
Sob a direção de Michael Halstrick, filho de Gernot
Langes-Swarovski, começa uma nova era na vinha, com investimentos e expansão,
tornando a Bodega Norton uma das primeiras a desenvolver um mercado de
exportação.
Em 1994 a Bodega Norton passa a ser sinônimo de Malbec
argentino e é reconhecida com a classificação DOC (denominação de origem
controlada). O renomado enólogo Jorge Riccitelli apresenta o Malbec Norton DOC
ao mercado.
Em 2000 a Bodega Norton torna-se uma das primeiras vinícolas
do país a produzir espumante branco com sua linha Norton Sparkling. Em 2014
Norton lança sua linha Single Vineyard de vinhos de alto padrão chamada LOTE,
um conceito inovador que permite ao consumidor desfrutar dos diversos terroirs
de cada propriedade.
A Bodega Norton se torna uma das vinícolas de exportação mais
importantes da Argentina, exportando vinhos de alta qualidade para mais de 60
países. Em 2017 procurando uma forma de refletir melhor os vinhos de qualidade
e profissionalismo que a Bodega Norton representa, sem falar na sua equipe de
trabalhadores com espírito familiar, a vinícola leva sua marca para um novo
rumo. Uma reforma para celebrar uma longa história como pioneiro do vinho
argentino.
A frase manuscrita "Signature Winemaking" denota a
qualidade e a herança da Bodega Norton, inspirada pelo próprio Edmund Norton e
continuada por mais de 125 anos.
Mais informações acesse:
Referências:
“Mistral”: https://www.mistral.com.br/tipo-de-uva/torrontes
“Aguiar Buenos Aires”: https://aguiarbuenosaires.com/torrontes/