Estágio: 12 meses em barricas
de carvalho francês e americano.
Análise:
Visual: apresenta vivaz
coloração rubi, de média intensidade, com reflexos granada, denotando boa
evolução, com lágrimas finas, lentas, densas, viscosas e em profusão.
Nariz: aromas frescos de
frutas vermelhas, o que surpreende pelos seus já seis anos de vida, com notas
discretas e agradáveis de carvalho, com notas balsâmicas e de especiarias, com
destaque para a pimenta, ervas finas.
Boca: traz estrutura e
personalidade, mas a sedosidade típica da cepa, um vinho extremamente
equilibrado que entrega maciez e volume de boca, simultaneamente. As notas
frutadas são percebidas, os taninos ainda vivos, marcados, mas dóceis, a acidez
surpreende por ser vibrante e salivante corroborando seu frescor. As notas
amadeiradas, um pouco mais evidente, em relação ao aspecto olfativo, entrega caramelo
e chocolate. Final longo.
Definitivamente os vinhos da Salton fazem parte da minha
história de simples e reles enófilo. Sempre costumo falar da Vinícola Miolo,
mas a Salton tem o seu pedaço importante em minha vida afetiva e emocional com
os vinhos.
Mas não apenas afetivo e emocional, mas também no quesito da
qualidade, principalmente. Afinal é o que vale! A afeição e o carinho a um
vinho e/ou produtor se constroem com a qualidade e a tipicidade de seus
rótulos, afinal.
E faz algum tempo que não aprecio os rótulos da Salton e hoje
o retorno às suas degustações será premiada com rótulos, ditos, “premium” da
vinícola: a linha “Domênico”, que carrega o nome de seu fundador, então esperemos
algo de bom, muito bom nessa nova linha de vinhos da gigante Salton.
Além da linha “Domênico”, que vislumbra novidades na linha
“Premium” da Salton, ela também visa privilegiar uma região que está em franca
ascendência entre os terroirs brasileiros, a Campanha Gaúcha, tanto que faz
questão de carregar seu nome no vinho.
Como falei a linha “Domênico” faz homenagem a Antônio
Domênico Salton, imigrante que iniciou a história da empresa há mais de cem
anos. Segundo Maurício Salton, presidente da Salton, esta é a primeira
“marca-conceito” da Salton e vem sendo trabalhada pelos jovens enólogos da quarta
geração da família. O que entusiasma, apesar do caráter “industrial” da
vinícola, dado o seu tamanho no mercado, ela mostra que ainda é familiar,
enaltecendo o seu passado.
Então sem mais delongas vamos às apresentações! O vinho que
degustei e gostei veio, como disse, da Campanha Gaúcha e se chama Domênico
Campanha, composto pelo inusitado e excelente corte de Marselan (76%) e Tannat
(24%) da safra 2017. Para não perder o costume vamos também de histórias, vamos
de Campanha Gaúcha.
Campanha Gaúcha
Entre o encontro de rios como Rio Ibicuí e o Rio Quaraí,
forma-se o do Rio Uruguai, divisa entre o Brasil, Argentina e Uruguai. Parte da
Campanha Gaúcha também recebe corpo hídrico subterrâneo, o Aquífero Guarani
representa a segunda maior fonte de água doce subterrânea do planeta, dele
estando 157.600 km2 no Rio grande do Sul.
A Campanha Gaúcha se espalha também pelo Uruguai e pela
Argentina garante uma cumplicidade com os “hermanos”
do outro lado do Rio Uruguai. Os costumes se assemelham e os elementos locais
emprestam rusticidade original: o cabo de osso das facas, o couro nos tapetes,
a tesoura de tosquia que ganha novas utilidades.
Campanha Gaúcha
No verão, entre os meses de dezembro a fevereiro, os dias
ficam com iluminação solar extensa, contendo praticamente 15 horas diárias de
insolação, o que colabora para a rápida maturação das uvas e também ajuda a
garantir uma elevada concentração de açúcar, fundamental para a produção de
vinhos finos de alta qualidade, complexos e intensos.
As condições climáticas são melhores que as da Serra Gaúcha e
tem-se avançado na produção de uvas europeias e vinhos de qualidade. Com o bom
clima local, o investimento em tecnologia e a vontade das empresas, a região
hoje já produz vinhos de grande qualidade que vêm surpreendendo a vinicultura
brasileira.
A mais de 150 anos, antes mesmo da abolição da escravatura, a
fronteira Oeste do Rio Grande do Sul já produzia vinhos de mesa que eram
exportados para os países do Prata (Uruguai, Argentina e Paraguai) e vendidos
no Brasil.
A primeira vinícola registrada do Brasil ficava na Campanha
Gaúcha. Com paredes de barro e telhado de palha, fundada por José Marimon, a
vinícola J. Marimon & Filhos iniciou o plantio de seus vinhedos em 1882, na
Quinta do Seival, onde hoje fica o município de Candiota.
E o mais interessante é que, desde o início da elaboração de
vinhos na região, os vinhos da Campanha Gaúcha comprovam sua qualidade
recebendo medalha de ouro, conforme um artigo de fevereiro de 1923, do extinto
jornal Correio do Sul de Bagé.
IP (Indicação de Procedência) da Campanha Gaúcha
Em 2020 a Campanha Gaúcha ganhou reconhecimento de Indicação
de Procedência (IP) para seus vinhos. Aprovada pelo Inpi na modalidade de I.P.,
a designação vem sendo utilizado pelas vinícolas da região a partir do ano de
2020 para os vinhos finos, tranquilos e espumantes, em garrafa.
A Indicação Geográfica (IG) foi o resultado de mais de 5 anos
de pesquisa, discussões e estudos de um grupo interdisciplinar coordenados pela
Embrapa Uva e Vinhos do Rio Grande do Sul.
Além disso, os vinhos devem ser elaborados a partir das 36
variedades de vitis viníferas permitidas pelo regulamento, plantados em sistema
de condução em espaldeira e respeitando os limites máximos de produtividade por
hectare e os padrões de qualidade das frutas que seguirão para a vinificação.
Finalmente, os vinhos precisam ser avaliados e aprovados sensorialmente às
cegas por uma comissão de especialistas.
Esta é uma delimitação localizada no bioma Pampa do estado do
Rio Grande do Sul, região vitivinícola que começou a se fortalecer na década de
1980, ganhando novo impulso nos anos 2000, com o crescimento do número de
produtores de uva e de vinho, expandindo a atividade para diversos municípios
da região.
A área geográfica delimitada totaliza 44.365 km2. A IP
abrange, em todo ou em parte, 14 municípios da região: Aceguá, Alegrete, Bagé,
Barra do Quaraí, Candiota, Dom Pedrito, Hulha Negra, Itaqui, Lavras do Sul,
Maçambará, Quaraí, Rosário do Sul, Santana do Livramento e Uruguaiana.
A Campanha Gaúcha está situada entre os paralelos 29º e 31º
Sul e trata-se de uma zona ensolarada, com as temperaturas mais elevadas e o
menor volume de chuvas entre as regiões produtoras do Sul do Brasil.
Ao mesmo tempo, as parreiras – predominantemente plantadas em
sistema de espaldeira – foram estabelecidas em grandes extensões de planície
(altitude entre 100 e 360 m.) com encostas de baixa declividade, o que favorece
a mecanização das colheitas, reduz os custos e potencializa a escala produtiva.
Uma característica importante é o solo basáltico e arenoso, com boa drenagem,
que somada aos outros fatores propicia a ótima qualidade das uvas.
Esta foi uma conquista para a região, que pode refletir em
uma garantia da qualidade de seus produtos. Fica a torcida para que, após muito
tempo de consistência de qualidade e de uma real identificação da tipicidade, a
Campanha Gaúcha possa ter o reconhecimento de uma Denominação de Origem (DO).
Leia aqui na íntegra o regulamento de uso da IP da Campanha Gaúcha.
Na taça revela um lindo e brilhante rubi com entornos
violáceos, com uma bela profusão de lágrimas finas e lentas que desenham as
bordas do copo.
No nariz traz um aroma exuberante de frutas frescas, de
frutas vermelhas com destaque para morangos, amoras, framboesas e groselhas,
além de um floral, de violeta que corrobora a sua condição de frescor mesmo que
aos seis anos de garrafa. Tem sutis notas de baunilha, especiarias e carvalho
graças aos 21 meses em barricas de carvalho que o Tannat passou.
Na boca é extremamente elegante, seco, macio, redondo, mas
com alguma estrutura e complexidade, tudo isso envolto em notas frutadas
evidentes, quase que em compota, a fruta tem protagonismo como no olfativo. A
madeira protagoniza trazendo a baunilha, o mentolado, o couro, com taninos bem
sedosos, mas vivazes, bem como a sua acidez que, embora correta, equilibrada, é
salivante, com um final guloso e persistente.
Não é apenas uma nomenclatura, algo que designa qualidade que
fomenta interesses ou dita regras de etiqueta social, mas a tipicidade, a
qualidade de um rótulo que expressa fielmente o terroir da Campanha Gaúcha e
toda a sua ascendência, o prestígio de uma região. Definitivamente trata-se de
um belíssimo vinho! Tem 13% de teor alcoólico.
Sobre a Vinícola Salton:
Antônio Domênico Salton veio para o Brasil em 1878 e junto
com seus filhos fundou em 1910 a vinícola que é reconhecida por ser a maior
produtora brasileira de espumantes e top 3 entre as produtoras de vinho no
Brasil!
Nos anos 1980 o forte da empresa era a produção e venda de conhaque.
O vinho deixava a desejar e para mudar essa realidade foi contratado o enólogo
Lucindo Copat, um dos fundadores da Vinícola Aurora. Novos equipamentos foram
comprados e a produção foi modernizada.
Outro marco foi a criação em 1995 do projeto que resultaria
em 2002 no Salton Talento e na nova unidade no distrito de Tuiuty, que trouxe
tecnologia de ponta para a empresa. No ano de 2019 a empresa inaugurou a bela
Enoteca Salton na capital paulista. Local que mais do que pronto para a compra
de vinhos, serve como um ponto para degustar os sabores que a Salton tem.
Na extensa lista de conquistas destes mais de 100 anos de
história comemora o fato de ser familiar e 100% brasileira. Com a terceira
geração à frente da empresa, tanto na Unidade em Bento Gonçalves quanto em São
Paulo, revela em seus quadros a quarta geração Salton, que promete o mesmo
empenho e dedicação com que a empresa foi comandada até agora.
Significado de
paradoxo: pensamento, proposição ou argumento que contraria os princípios
básicos e gerais que costumam orientar o pensamento humano, ou desafia a
opinião consabida, a crença ordinária e compartilhada pela maioria.
Agora vem a pergunta que não quer calar: Por que raios
coloquei o significado de paradoxo inaugurando essa resenha? Talvez para fazer
menção a alguma coisa relacionada ao vinho que degustarei esta noite
tradicional de sábado.
Mas não é somente isso! “Pensamento, proposição ou argumento
que contraria os princípios básicos e gerais que costumam orientar o pensamento
humano, ou desafia a opinião consabida!” Vou explicar trazendo para a realidade
do universo do vinho ou mais precisamente para apenas o vinho em questão: É
possível degustar um vinho que seja fácil de degustar sem ser aquele vinho
inexpressivo, tendo, pelo contrário, personalidade marcante? É possível?
Pois direi que sim, é muito possível degustar um vinho como
esse! Sempre? Não sei dizer, mas tive algumas experiências surpreendentes
adequando-se a este caso! É como fugir do padrão, é como fugir do óbvio! Vinhos
gostosos, saborosos, arrojados, descomplicados, mas que gozam de marcante
personalidade, estrutura e fogem do linear e agrada, de forma democrática, a
todos as percepções e predileções do enófilo para com o vinho.
Ah mas vinhos de personalidade não podem ser considerados
fáceis de degustar! Esses comentários demasiados arcaicos definitivamente são
um desserviço para a disseminação da cultura do vinho. A máxima agora é fugir
de padrões.
E degustando essa linha da gigante Vinícola Salton, o que já
é sinônimo de história e qualidade, me trouxe a reflexões, mais uma vez, desse
tipo, e não tão somente pelo nome que carrega em seu rótulo, mas pelo que tem
dentro daquela garrafa, a começar também pelo fato de ser oriundo da Campanha
Gaúcha que, a cada dia, vem entregando, de forma singular, vinhos excelentes e
de tipicidade revelando o que sempre foi: uma região tradicional, importante,
mas que tem trazido gratas e arrojadas novidades.
O vinho que degustei e gostei vem, como disse, da região
brasileira da Campanha Gaúcha, e se chama, claro, Salton Paradoxo da casta
Merlot (100%) da safra 2017. E não só pelo nome, pela sua definição, mas também
pelo fato de que o Brasil está produzindo, cada vez mais, Merlots fantásticos,
maravilhosos, de caráter, versáteis e que não se resume apenas à Serra Gaúcha,
mas em todos os terroirs deste país varonil.
Então já que estamos falando de regiões, não custa nada falar
um pouco mais da Campanha Gaúcha e da sua importância para o cenário
vitivinícola brasileiro.
Campanha Gaúcha
Entre o encontro de rios como Rio Ibicuí e o Rio Quaraí,
forma-se o do Rio Uruguai, divisa entre o Brasil, Argentina e Uruguai. Parte da
Campanha Gaúcha também recebe corpo hídrico subterrâneo, o Aquífero Guarani
representa a segunda maior fonte de água doce subterrânea do planeta, dele
estando 157.600 km2 no Rio grande do Sul. A Campanha Gaúcha se espalha também
pelo Uruguai e pela Argentina garante uma cumplicidade com os hermanos do outro
lado do Rio Uruguai. Os costumes se assemelham e os elementos locais emprestam
rusticidade original: o cabo de osso das facas, o couro nos tapetes, a tesoura
de tosquia que ganha novas utilidades.
No verão, entre os meses de dezembro a fevereiro, os dias
ficam com iluminação solar extensa, contendo praticamente 15 horas diárias de
insolação, o que colabora para a rápida maturação das uvas e também ajuda a
garantir uma elevada concentração de açúcar, fundamental para a produção de
vinhos finos de alta qualidade, complexos e intensos.
As condições climáticas são melhores que as da Serra Gaúcha e
tem-se avançado na produção de uvas europeias e vinhos de qualidade. Com o bom
clima local, o investimento em tecnologia e a vontade das empresas, a região
hoje já produz vinhos de grande qualidade que vêm surpreendendo a vinicultura
brasileira.
Há mais de 150 anos, antes mesmo da abolição da escravatura,
a fronteira Oeste do Rio Grande do Sul já produzia vinhos de mesa que eram
exportados para os países do Prata (Uruguai, Argentina e Paraguai) e vendidos
no Brasil.
A primeira vinícola registrada do Brasil ficava na Campanha
Gaúcha. Com paredes de barro e telhado de palha, fundada por José Marimon, a
vinícola J. Marimon & Filhos iniciou o plantio de seus vinhedos em 1882, na
Quinta do Seival, onde hoje fica o município de Candiota.
E o mais interessante é que, desde o início da elaboração de
vinhos na região, os vinhos da Campanha Gaúcha comprovam sua qualidade
recebendo medalha de ouro, conforme um artigo de fevereiro de 1923, do extinto
jornal Correio do Sul de Bagé.
E agora finalmente o vinho!
Na taça entrega um vermelho rubi intenso, brilhante e com
reflexos violáceos, com lágrimas finas e em média intensidade.
No nariz revelam aromas de frutas vermelhas maduras, tais
como groselha, amora e morango, com notas amadeiradas bem discretas, de
baunilha, de um agradável defumado e especiarias doces.
Na boca é de leve para média estrutura, bem macio, redondo e
harmonioso, com a fruta vermelha e as mesmas especiarias doces protagonizando
como no aspecto olfativo, além da madeira em pleno equilíbrio, graças aos 6
meses de passagem por carvalho e mais 6 meses nas caves, com as notas frutadas
e uma acidez vivaz entregando frescor, com taninos aveludados, domados e um
final médio.
E assim diz no rótulo do Salton Paradoxo:
“Quando o impossível se torna realidade, se converte em
paradoxo”.
A interpretação é livre, democrática. Então quando o
impossível se torna realidade, se converte em paradoxo. Ou seja, foge do padrão
que, às vezes escraviza que torna vítima da zona de conforto, nos prende ao óbvio.
E é tudo o que o Salton Paradoxo Merlot não entrega: o óbvio! Um vinho de
traços contemporâneos, moderno, que é fácil de degustar: macio, elegante, mas
estruturado, volumoso em boca, envolvente, diria até intenso. Um Merlot como
tem de ser, mas com a cara e a coragem dos vinhos dessa cepa produzido em
nossas terras, corroborando as suas conquistas. E é assim que o vinho nos
provoca, traz um reboliço em nossas percepções sensoriais e nos surpreendente
por inteiro, em uma espécie de arrebatamento. A verdadeira edificação dos nossos
sentidos. Tem 13% de teor alcoólico.
Sobre a Vinícola Salton:
Antônio Domenico
Salton veio para o Brasil em 1878 e junto com seus filhos fundou em 1910 a
vinícola que é reconhecida por ser a maior produtora brasileira de espumantes e
top 3 entre as produtoras de vinho no Brasil!
Nos anos 1980 o forte da empresa era a produção e venda de
conhaque. O vinho deixava a desejar e para mudar essa realidade foi contratado
o enólogo Lucindo Copat, um dos fundadores da Vinícola Aurora. Novos
equipamentos foram comprados e a produção foi modernizada.
Outro marco foi a criação em 1995 do projeto que resultaria
em 2002 no Salton Talento e na nova unidade no distrito de Tuiuty, que trouxe
tecnologia de ponta para a empresa. No ano de 2019 a empresa inaugurou a bela
Enoteca Salton na capital paulista. Local que mais do que pronto para a compra
de vinhos, serve como um ponto para degustar os sabores que a Salton tem.
Na extensa lista de conquistas destes mais de 100 anos de
história comemora o fato de ser familiar e 100% brasileira. Com a terceira
geração à frente da empresa, tanto na Unidade em Bento Gonçalves quanto em São
Paulo, revela em seus quadros a quarta geração Salton, que promete o mesmo
empenho e dedicação com que a empresa foi comandada até agora.
Já dizia aquele velho ditado, já manjado: Quem espera sempre
alcança! Talvez esse conceito possa ser bem aplicado para os vinhos evoluídos,
afinal, alguns atingem a sua maturidade, o seu grande momento, o seu brilho,
com alguns anos de guarda. Mas há quem diga que isso pode ser subjetivo, haja
vista que alguns vinhos depreciem com o tempo e neste caso podemos levar em
consideração alguns fatores como a forma de armazenamento, por exemplo. Mas como
esse é um assunto deveras complexo, não entrarei no mérito, não agora pelo
menos, mas sim darei o protagonismo, é claro, ao rótulo, ao vinho, que é sempre
o artista do espetáculo da degustação.
E esse vinho eu aguardei pacientemente. Como sou um
apreciador dos vinhos evoluídos, decidi, quando o comprei, há cerca de dois
anos, em degusta-lo quando completasse exatamente 10 anos de safra. Degustar
vinhos assim, nessas condições, pode ser um risco, mas também uma honra, um
momento único, com o vinho no seu momento mais apoteótico e especial. Fui
tomado por um espírito de positividade e aguardei cada dia e cada hora para
degusta-lo e, com isso, pergunto: Quem disse que vinhos brasileiros não tem
potencial de guarda? O tempo, literalmente falando, dirá pela excelência dos
rótulos nacionais! E diz, com veemência, com a sua qualidade, tipicidade e
expressividade.
O vinho que degustei e gostei é tupiniquim, é brasileiro, é o
Salton Talento composto pelas castas Cabernet Sauvignon (50%), Merlot (30%) e
Tannat (20%) da safra 2011. As castas Cabernet Sauvignon e Tannat são oriundas
da Campanha Gaúcha e o Merlot veio da Serra Gaúcha. Sim! Um vinho que explora a
multiplicidade de duas regiões, de alguns terroirs, uma mescla de tipicidades. Sem
contar que já degustei a safra de 2009, minha primeira experiência com esse
rótulo.
Tudo conspirou para essa degustação: desde o primeiro contato
nas gôndolas dos supermercados, com um preço na faixa dos R$ 50,00, um ótimo
preço, até o derramar deste na minha taça. A vida, a longevidade conspira
sempre a favor e, claro, falo do vinho! Mas antes de falar no néctar, vamos
conhecer um pouco sobre as regiões de onde veio, emblemáticas regiões, diga-se
de passagem: Vamos da Serra e Campanha Gaúcha.
Serra Gaúcha
Situada a nordeste do Rio Grande do Sul, a região da Serra
Gaúcha é a grande estrela da vitivinicultura brasileira, destacando-se pelo
volume e pela qualidade dos vinhos que produz. Para qualquer enófilo indo ao
Rio Grande do Sul, é obrigatório visitar a Serra Gaúcha, especialmente Bento
Gonçalves.
Serra Gaúcha
A região da Serra Gaúcha está situada em latitude próxima das
condições geo-climáticas ideais para o melhor desenvolvimento de vinhedos, mas
as chuvas costumam ser excessivas exatamente na época que antecede a colheita,
período crucial à maturação das uvas. Quando as chuvas são reduzidas, surgem
ótimas safras, como nos anos 1999, 2002, 2004, 2005 e 2006.
A partir de 2007, com o aquecimento global, o clima da Serra
Gaúcha se transformou, surgindo verões mais quentes e secos, com resultados
ótimos para a vinicultura, mas terríveis para a agricultura. Desde 2005 o nível
de qualidade dos vinhos tintos vem subindo continuamente, graças a esta mudança
e também do salto de tecnologia de vinhedos implantado a partir do ano 2000.
O Vale dos Vinhedos, importante região que fica situada na
Serra Gaúcha, junto à cidade de Bento Gonçalves, caracteriza-se pela presença
de descendentes de imigrantes italianos, pioneiros da vinicultura brasileira.
Nessa região as temperaturas médias criam condições para uma vinicultura fina
voltada para a qualidade. A evolução tecnológica das últimas décadas aplicada
ao processo vitivinícola possibilitou a conquista de mercados mais exigentes e
o reconhecimento dos vinhos do Vale dos Vinhedos. Assim, a evolução da
vitivinicultura da região passou a ser a mais importante meta dos produtores do
Vale.
O Vale dos Vinhedos é a primeira região vinícola do Brasil a
obter Indicação de Procedência de seus produtos, exibindo o Selo de Controle em
vinhos e espumantes elaborados pelas vinícolas associadas. Criada em 1995, a
partir da união de seis vinícolas, a Associação dos Produtores de Vinhos Finos
do Vale dos Vinhedos (Aprovale), já surgiu com o propósito de alcançar uma
Denominação de Origem. No entanto, era necessário seguir os passos da
experiência, passando primeiro por uma Indicação de Procedência.
O pedido de reconhecimento geográfico encaminhado ao
Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) em 1998 foi alcançado
somente em 2001. Neste período, foi necessário firmar convênios operacionais
para auxiliar no desenvolvimento de atividades que serviram como pré-requisitos
para a conquista da Indicação de Procedência Vale dos Vinhedos (I.P.V.V.). O
trabalho resultou no levantamento histórico, mapa geográfico e estudo da
potencialidade do setor vitivinícola da região. Já existe uma DOC (Denominação
de Origem Controlada) na região.
O Vale dos Vinhedos foi a primeira região entregue aos
imigrantes italianos, a partir de 1875. Inicialmente desenvolveu-se ali uma
agricultura de subsistência e produção de itens de consumo para o Rio Grande do
Sul. Devido à tradição da região de origem das famílias imigrantes, o Veneto,
logo se iniciaram plantios de uvas para produção de vinho para consumo local. Até
a década de 80 do século XX, os produtores de uvas do Vale dos Vinhedos vendiam
sua produção para grandes vinícolas da região. A pouca quantidade de vinho que
produziam destinava-se ao consumo familiar.
Esta realidade mudou quando a comercialização de vinho entrou
em queda e, consequentemente, o preço da uva desvalorizou. Os viticultores
passaram então a utilizar sua produção para fazer seu vinho e comercializá-lo
diretamente, tendo assim possibilidade de aumento nos lucros.
Para alcançar este objetivo e atender às exigências legais da
Indicação Geográfica, seis vinícolas se associaram, criando, em 1995, a
Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos (Aprovale). Atualmente,
a Aprovale conta com 24 vinícolas associadas e 19 associados não produtores de
vinho, entre hotéis, pousadas, restaurantes, fabricantes de produtos
artesanais, queijarias, entre outros. As vinícolas do Vale dos Vinhedos
produziram, em 2004 9,3 milhões de litros de vinhos finos e processaram 14,3
milhões de kg de uvas viníferas.
Campanha Gaúcha
Entre o encontro de rios como Rio Ibicuí e o Rio Quaraí,
forma-se o do Rio Uruguai, divisa entre o Brasil, Argentina e Uruguai. Parte da
Campanha Gaúcha também recebe corpo hídrico subterrâneo, o Aquífero Guarani
representa a segunda maior fonte de água doce subterrânea do planeta, dele
estando 157.600 km2 no Rio grande do Sul. A Campanha Gaúcha se espalha também
pelo Uruguai e pela Argentina garante uma cumplicidade com os hermanos do outro
lado do Rio Uruguai. Os costumes se assemelham e os elementos locais emprestam
rusticidade original: o cabo de osso das facas, o couro nos tapetes, a tesoura
de tosquia que ganha novas utilidades.
Campanha Gaúcha
No verão, entre os meses de dezembro a fevereiro, os dias
ficam com iluminação solar extensa, contendo praticamente 15 horas diárias de
insolação, o que colabora para a rápida maturação das uvas e também ajuda a
garantir uma elevada concentração de açúcar, fundamental para a produção de
vinhos finos de alta qualidade, complexos e intensos.
As condições climáticas são melhores que as da Serra Gaúcha e
tem-se avançado na produção de uvas europeias e vinhos de qualidade. Com o bom
clima local, o investimento em tecnologia e a vontade das empresas, a região
hoje já produz vinhos de grande qualidade que vêm surpreendendo a vinicultura
brasileira.
Há mais de 150 anos, antes mesmo da abolição da escravatura,
a fronteira Oeste do Rio Grande do Sul já produzia vinhos de mesa que eram
exportados para os países do Prata (Uruguai, Argentina e Paraguai) e vendidos
no Brasil.
A primeira vinícola registrada do Brasil ficava na Campanha
Gaúcha. Com paredes de barro e telhado de palha, fundada por José Marimon, a
vinícola J. Marimon & Filhos iniciou o plantio de seus vinhedos em 1882, na
Quinta do Seival, onde hoje fica o município de Candiota.
E o mais interessante é que, desde o início da elaboração de
vinhos na região, os vinhos da Campanha Gaúcha comprovam sua qualidade
recebendo medalha de ouro, conforme um artigo de fevereiro de 1923, do extinto
jornal Correio do Sul de Bagé.
E agora finalmente o vinho!
Na taça apresenta um vermelho rubi intenso e escuro, mas
mostrando uma tonalidade meio atijolada nas bordas, em seu entorno, revelando a
sua idade, o auge dos seus dez anos de vida, com lágrimas finas e abundantes
marcando nas paredes do copo.
No nariz entrega aromas, ainda evidentes e intensos, de
frutas negras e em compota, tais como ameixa, cereja e amora, com notas de
torrefação, café, tabaco e especiarias e toque amadeirado em evidência, graças
aos 12 meses de passagem por barricas de carvalho, mais 12 meses afinando em caves
subterrâneas da vinícola.
Na boca é elegante, equilibrado, excelente estrutura
mostrando marcante personalidade, as frutas negras, como no aspecto olfativo,
se mostra agradavelmente no paladar, com taninos presentes, mas domados e
sutis, com uma acidez ainda vivaz, o que faz do vinho pleno aos 10 anos de
idade. Tudo isso harmonizando maravilhosamente com o toque amadeirado, muito
bem integrado aos taninos, a acidez e o álcool, além do tabaco, do toque de
pimentão e de couro. Final persistente e prolongado.
O tempo dirá! Mais um ditado popular que se adequou
maravilhosamente ao Salton Talento. A vida, plena e intensa, pulsava dentro da
garrafa, ansiosa por sair e explodir as minhas impressões sensoriais, inundar a
minha taça do mais puro néctar, da poesia líquida que, a cada degustação, me
arrebatou por inteiro. O tempo disse, o vinho se expressou maduro, intenso, a
personalidade marcante, mostrou também delicadeza, elegância. A noção de
terroir, de tipicidade estava evidente a cada degustação e que, graças a sua
complexidade, aguça, ainda mais, o enófilo a explorar ainda mais o seu paladar.
A honra e o prazer são evidentes, a sensação é indescritível, o ritual se faz
necessário, todos os componentes de uma degustação, embora simples e direta, se
mostra maravilhosa e singular. Senti-me tão pequeno, tão feliz, tão vivo! Tem
13,5% de teor alcoólico.
Sobre a Vinícola Salton:
Antônio Domenico Salton veio para o Brasil em 1878 e junto
com seus filhos fundou em 1910 a vinícola que é reconhecida por ser a maior
produtora brasileira de espumantes e top 3 entre as produtoras de vinho no
Brasil!
Nos anos 1980 o forte da empresa era a produção e venda de
conhaque. O vinho deixava a desejar e para mudar essa realidade foi contratado
o enólogo Lucindo Copat, um dos fundadores da Vinícola Aurora. Novos
equipamentos foram comprados e a produção foi modernizada.
Outro marco foi a criação em 1995 do projeto que resultaria
em 2002 no Salton Talento e na nova unidade no distrito de Tuiuty, que trouxe
tecnologia de ponta para a empresa. No ano de 2019 a empresa inaugurou a bela
Enoteca Salton na capital paulista. Local que mais do que pronto para a compra
de vinhos, serve como um ponto para degustar os sabores que a Salton tem.
Fundadores da Vinícola Salton
Na extensa lista de conquistas destes mais de 100 anos de
história comemora o fato de ser familiar e 100% brasileira. Com a terceira
geração à frente da empresa, tanto na Unidade em Bento Gonçalves quanto em São
Paulo, revela em seus quadros a quarta geração Salton, que promete o mesmo
empenho e dedicação com que a empresa foi comandada até agora.
Dizem por aí que os espumantes brasileiros são certeiros para
quem quer degustar vinhos frescos, leves, frutados e descompromissados. E é
verdade! Hoje considero, sem medo de errar, que os nossos espumantes pode
rivalizar, hoje, em iguais condições com o champanhe, o original francês, os
cavas espanhóis, os proseccos italianos. Mas nem sempre foi assim para mim.
Digo isso pois nunca tive uma ligação muito forte e intensa, no que tange, é
claro, nas degustações com os espumantes brasileiros, quando comecei a degustar
os vinhos finos. Como muitos no Brasil ainda, eu nutria certa rejeição com os
brancos tranquilos e espumantes. Achava que eram vinhos sem expressão e vida e
que não iria me satisfazer, me entregar o que eu esperava nas percepções
olfativas e do paladar. Demorei um pouco a ter um contato com tais vinhos. Mas
decidi arriscar e comecei a juntar estímulos para degustar espumantes. O fiz,
mas não me recordo, devo confessar, qual foi o meu primeiro rótulo exatamente
que me desvirginou para o mundo dos vinhos das borbulhas, mas foi com algum
rótulo da Salton. Lembro-me, pois fui abordado em um supermercado por uma
pessoa que me via criar ânimo e coragem para escolher um espumante e estava
demorando para isso, acredito que foi por esse motivo que o bom enófilo tenha
intercedido por mim, me recomendando um rótulo. Degustei e gostei muito e
prometi: a partir daqui seguirei a degustar mais e mais espumantes. E falando
na minha saga com os espumantes, anos depois, em minhas excursões nos
supermercados avistei um espumante, que estava com um valor bem convidativo, da
Salton que logo me animou para comprar.
E esse vinho, ou melhor, o vinho que degustei e gostei e que
arrebatou por inteiro, foi o Salton Reserva Ouro brut, da Serra Gaúcha, com um
blend das castas Chardonnay (70%), Pinot Noir (20%) e Riesling (10%), produzido
pelo método Charmat (Caso queira saber um pouco mais sobre esse e outros
métodos clique aqui: Diferenças entre os métodos Champenoise e Charmat), mas esse é feito pelo “método Charmat Longo”. Mas o que
significa esse bendito “Charmat Longo”? O bom da degustação é que ela estimula o
aprendizado, para quem quer, é claro, absorvê-lo. Aprendi e faço questão de
aqui compartilhar o significado. Quando se quer um espumante mais estruturado,
com um corpo mais presente, cor mais intensa, menores perfumes frutados, porém
maior complexidade aromática se utiliza o método Charmat longo, inventando em
1970 pelo enólogo italiano Nereo Cavezzani, onde o processo de fermentação é
mais demorado (de 6 à 12 meses) e aonde os tanques de aços inox pressurizados
são munidos de um agitador em hélice para colocar em suspensão os sedimentos da
fermentação (lias), favorecendo a estrutura do vinho e criando um perfil
sensorial mais complexo, prerrogativa típica dos espumantes produzidos com o
método clássico ou tradicional.
Então vamos ao que interessa: O vinho!
Na taça apresenta um amarelo palha e não tinha detalhes tão
dourados assim, diria até um tanto quanto transparente, com perlages bem finos,
não em abundância, mas persistentes.
No nariz é floral, traz algumas notas frutadas, mas não em
grande evidência. Percebi notas de abacaxi, toques cítricos discretos, com
aquele toque, também discreto, mas agradável de fermento, pão torrado, certa
cremosidade, devido, é claro, a sua proposta do método do Charmat Longo e
também pelo contato por 12 meses com as leveduras.
Na boca é seco, claro, é um brut, baixo residual de açúcar,
as percepções frutadas também, como no olfato, é bem discreto, mas é muito
fresco, leve, descompromissado, mas que revela certa personalidade, marcante
diria, cremoso e com um final persistente.
Um vinho delicioso e que definitivamente colocou, foi
responsável, os espumantes em meus caminhos na estrada das experiências de
rótulos. A Salton, e seus espumantes, faz parte da minha história no que tange
aos vinhos de borbulhas em todas as suas personificações e propostas. Harmoniza
bem com pratos de entrada como frios, com comidas leves e mais simples ou
sozinho. Tem 12,5% de teor alcoólico.
Sobre a Vinícola Salton:
A história começa na Itália, em 1878, quando Antonio Domenico
Salton partiu da cidade de Cison di Valmarino, na região do Vêneto, à procura
de oportunidades melhores no Brasil. Ele se instalou na colônia italiana de
Vila Isabel, hoje conhecida como a cidade de Bento Gonçalves, no Rio Grande do
Sul. A empresa foi formalmente constituída em 1910, quando os irmãos Paulo,
Angelo, João, José, Cesar, Luis e Antonio deram cunho empresarial aos negócios
do pai, o imigrante Antonio Domenico Salton, que vinificava informalmente, como
a maioria dos imigrantes italianos. Os irmãos passaram a se dedicar à cultura
de uvas e à elaboração de vinhos, espumantes e vermutes, com a denominação
"Paulo Salton & Irmãos", no centro de Bento Gonçalves. Um século
depois, a Salton é reconhecida como uma das principais vinícolas brasileiras,
líder na comercialização de espumantes nacionais no Brasil. Hoje, à frente da
vinícola, membros da quarta geração da família preservam o legado de seu
fundador, Paulo Salton, amparado nos valores construídos ao longo dos mais de
cem anos de história e inspirados pela simplicidade e pelo trabalho árduo das
primeiras gerações.