Definitivamente os vinhos da Salton fazem parte da minha
história de simples e reles enófilo. Sempre costumo falar da Vinícola Miolo,
mas a Salton tem o seu pedaço importante em minha vida afetiva e emocional com
os vinhos.
Mas não apenas afetivo e emocional, mas também no quesito da
qualidade, principalmente. Afinal é o que vale! A afeição e o carinho a um
vinho e/ou produtor se constroem com a qualidade e a tipicidade de seus
rótulos, afinal.
E faz algum tempo que não aprecio os rótulos da Salton e hoje
o retorno às suas degustações será premiada com rótulos, ditos, “premium” da
vinícola: a linha “Domênico”, que carrega o nome de seu fundador, então esperemos
algo de bom, muito bom nessa nova linha de vinhos da gigante Salton.
Além da linha “Domênico”, que vislumbra novidades na linha
“Premium” da Salton, ela também visa privilegiar uma região que está em franca
ascendência entre os terroirs brasileiros, a Campanha Gaúcha, tanto que faz
questão de carregar seu nome no vinho.
Como falei a linha “Domênico” faz homenagem a Antônio
Domênico Salton, imigrante que iniciou a história da empresa há mais de cem
anos. Segundo Maurício Salton, presidente da Salton, esta é a primeira
“marca-conceito” da Salton e vem sendo trabalhada pelos jovens enólogos da quarta
geração da família. O que entusiasma, apesar do caráter “industrial” da
vinícola, dado o seu tamanho no mercado, ela mostra que ainda é familiar,
enaltecendo o seu passado.
Então sem mais delongas vamos às apresentações! O vinho que
degustei e gostei veio, como disse, da Campanha Gaúcha e se chama Domênico
Campanha, composto pelo inusitado e excelente corte de Marselan (76%) e Tannat
(24%) da safra 2017. Para não perder o costume vamos também de histórias, vamos
de Campanha Gaúcha.
Campanha Gaúcha
Entre o encontro de rios como Rio Ibicuí e o Rio Quaraí,
forma-se o do Rio Uruguai, divisa entre o Brasil, Argentina e Uruguai. Parte da
Campanha Gaúcha também recebe corpo hídrico subterrâneo, o Aquífero Guarani
representa a segunda maior fonte de água doce subterrânea do planeta, dele
estando 157.600 km2 no Rio grande do Sul.
A Campanha Gaúcha se espalha também pelo Uruguai e pela
Argentina garante uma cumplicidade com os “hermanos”
do outro lado do Rio Uruguai. Os costumes se assemelham e os elementos locais
emprestam rusticidade original: o cabo de osso das facas, o couro nos tapetes,
a tesoura de tosquia que ganha novas utilidades.
No verão, entre os meses de dezembro a fevereiro, os dias
ficam com iluminação solar extensa, contendo praticamente 15 horas diárias de
insolação, o que colabora para a rápida maturação das uvas e também ajuda a
garantir uma elevada concentração de açúcar, fundamental para a produção de
vinhos finos de alta qualidade, complexos e intensos.
As condições climáticas são melhores que as da Serra Gaúcha e
tem-se avançado na produção de uvas europeias e vinhos de qualidade. Com o bom
clima local, o investimento em tecnologia e a vontade das empresas, a região
hoje já produz vinhos de grande qualidade que vêm surpreendendo a vinicultura
brasileira.
A mais de 150 anos, antes mesmo da abolição da escravatura, a
fronteira Oeste do Rio Grande do Sul já produzia vinhos de mesa que eram
exportados para os países do Prata (Uruguai, Argentina e Paraguai) e vendidos
no Brasil.
A primeira vinícola registrada do Brasil ficava na Campanha
Gaúcha. Com paredes de barro e telhado de palha, fundada por José Marimon, a
vinícola J. Marimon & Filhos iniciou o plantio de seus vinhedos em 1882, na
Quinta do Seival, onde hoje fica o município de Candiota.
E o mais interessante é que, desde o início da elaboração de
vinhos na região, os vinhos da Campanha Gaúcha comprovam sua qualidade
recebendo medalha de ouro, conforme um artigo de fevereiro de 1923, do extinto
jornal Correio do Sul de Bagé.
IP (Indicação de Procedência) da Campanha Gaúcha
Em 2020 a Campanha Gaúcha ganhou reconhecimento de Indicação
de Procedência (IP) para seus vinhos. Aprovada pelo Inpi na modalidade de I.P.,
a designação vem sendo utilizado pelas vinícolas da região a partir do ano de
2020 para os vinhos finos, tranquilos e espumantes, em garrafa.
A Indicação Geográfica (IG) foi o resultado de mais de 5 anos
de pesquisa, discussões e estudos de um grupo interdisciplinar coordenados pela
Embrapa Uva e Vinhos do Rio Grande do Sul.
Além disso, os vinhos devem ser elaborados a partir das 36
variedades de vitis viníferas permitidas pelo regulamento, plantados em sistema
de condução em espaldeira e respeitando os limites máximos de produtividade por
hectare e os padrões de qualidade das frutas que seguirão para a vinificação.
Finalmente, os vinhos precisam ser avaliados e aprovados sensorialmente às
cegas por uma comissão de especialistas.
Esta é uma delimitação localizada no bioma Pampa do estado do
Rio Grande do Sul, região vitivinícola que começou a se fortalecer na década de
1980, ganhando novo impulso nos anos 2000, com o crescimento do número de
produtores de uva e de vinho, expandindo a atividade para diversos municípios
da região.
A área geográfica delimitada totaliza 44.365 km2. A IP
abrange, em todo ou em parte, 14 municípios da região: Aceguá, Alegrete, Bagé,
Barra do Quaraí, Candiota, Dom Pedrito, Hulha Negra, Itaqui, Lavras do Sul,
Maçambará, Quaraí, Rosário do Sul, Santana do Livramento e Uruguaiana.
A Campanha Gaúcha está situada entre os paralelos 29º e 31º
Sul e trata-se de uma zona ensolarada, com as temperaturas mais elevadas e o
menor volume de chuvas entre as regiões produtoras do Sul do Brasil.
Ao mesmo tempo, as parreiras – predominantemente plantadas em
sistema de espaldeira – foram estabelecidas em grandes extensões de planície
(altitude entre 100 e 360 m.) com encostas de baixa declividade, o que favorece
a mecanização das colheitas, reduz os custos e potencializa a escala produtiva.
Uma característica importante é o solo basáltico e arenoso, com boa drenagem,
que somada aos outros fatores propicia a ótima qualidade das uvas.
Esta foi uma conquista para a região, que pode refletir em
uma garantia da qualidade de seus produtos. Fica a torcida para que, após muito
tempo de consistência de qualidade e de uma real identificação da tipicidade, a
Campanha Gaúcha possa ter o reconhecimento de uma Denominação de Origem (DO).
Leia aqui na íntegra o regulamento de uso da IP da Campanha Gaúcha.
Na taça revela um lindo e brilhante rubi com entornos
violáceos, com uma bela profusão de lágrimas finas e lentas que desenham as
bordas do copo.
No nariz traz um aroma exuberante de frutas frescas, de
frutas vermelhas com destaque para morangos, amoras, framboesas e groselhas,
além de um floral, de violeta que corrobora a sua condição de frescor mesmo que
aos seis anos de garrafa. Tem sutis notas de baunilha, especiarias e carvalho
graças aos 21 meses em barricas de carvalho que o Tannat passou.
Na boca é extremamente elegante, seco, macio, redondo, mas
com alguma estrutura e complexidade, tudo isso envolto em notas frutadas
evidentes, quase que em compota, a fruta tem protagonismo como no olfativo. A
madeira protagoniza trazendo a baunilha, o mentolado, o couro, com taninos bem
sedosos, mas vivazes, bem como a sua acidez que, embora correta, equilibrada, é
salivante, com um final guloso e persistente.
Não é apenas uma nomenclatura, algo que designa qualidade que
fomenta interesses ou dita regras de etiqueta social, mas a tipicidade, a
qualidade de um rótulo que expressa fielmente o terroir da Campanha Gaúcha e
toda a sua ascendência, o prestígio de uma região. Definitivamente trata-se de
um belíssimo vinho! Tem 13% de teor alcoólico.
Sobre a Vinícola Salton:
Antônio Domênico Salton veio para o Brasil em 1878 e junto
com seus filhos fundou em 1910 a vinícola que é reconhecida por ser a maior
produtora brasileira de espumantes e top 3 entre as produtoras de vinho no
Brasil!
Nos anos 1980 o forte da empresa era a produção e venda de conhaque.
O vinho deixava a desejar e para mudar essa realidade foi contratado o enólogo
Lucindo Copat, um dos fundadores da Vinícola Aurora. Novos equipamentos foram
comprados e a produção foi modernizada.
Outro marco foi a criação em 1995 do projeto que resultaria
em 2002 no Salton Talento e na nova unidade no distrito de Tuiuty, que trouxe
tecnologia de ponta para a empresa. No ano de 2019 a empresa inaugurou a bela
Enoteca Salton na capital paulista. Local que mais do que pronto para a compra
de vinhos, serve como um ponto para degustar os sabores que a Salton tem.
Na extensa lista de conquistas destes mais de 100 anos de história comemora o fato de ser familiar e 100% brasileira. Com a terceira geração à frente da empresa, tanto na Unidade em Bento Gonçalves quanto em São Paulo, revela em seus quadros a quarta geração Salton, que promete o mesmo empenho e dedicação com que a empresa foi comandada até agora.
Mais informações acesse:
Referências:
“Mesa Completa”: https://mesacompleta.com.br/salton-campanha/
“Academia do Vinho”: https://www.academiadovinho.com.br/__mod_regiao.php?reg_num=CAMPANHA
“Vinhos da Campanha”: https://www.vinhosdacampanha.com.br/campanha-gaucha/
“Vinhos da Campanha”: https://www.vinhosdacampanha.com.br/ciclo-de-crescimento-da-uva/
“Tudo do Vinho”: https://tudodovinho.wordpress.com/2020/07/14/i-p-campanha-gaucha/
“Além do Vinho”: https://alemdovinho.wordpress.com/2015/09/20/brasil-campanha-gaucha-melhor-terroir-para-a-tannat/