Até recentemente, nos anos 1970 e início dos 1980, o
Languedoc ainda produzia, na maior parte, vinhos propostos para o consumo
massivo. Do ponto de vista vitivinícola, isso era impulsionado pela facilidade
com que a uva Carignan, que não se inclui entre as melhores, é cultivada e
amadurece nas planícies quentes do anfiteatro mediterrâneo. Ela ocupava grande
área de cultivo e sua utilização não conhecia limites.
O prestígio veio depois, por volta dos anos 1980, quando os
produtores elevaram a qualidade, chegando a exemplares de tipos variados, com
destaque para tintos frutados e robustos, com excelente relação custo e
benefício, o melhor da França.
No entanto, passados mais de trinta anos, poucas regiões
vinícolas do mundo são tão excitantes para vinhos tintos robustos e frutados a
preços convidativos como o Languedoc. Nesse período, vinicultores pioneiros
ajudaram a elevar a qualidade para novos níveis. As uvas Syrah, Grenache e
Mourvèdre ocuparam o lugar da Carignan e a procura pela qualidade reduziu a
primazia dos vinhos populares.
Um cauteloso processo de subdivisão de Languedoc-Roussillon
em terroirs reconhecidamente distintos está em andamento há alguns anos,
originando as apelações Clairette du Languedoc, La Clape, Picpoul de Pinet,
entre outras. Algumas encontram-se bem estabelecidas, com anos de certificação,
outras estão conquistando aos poucos seus espaços perante o mundo do vinho.
As cidades de maior destaque do Languedoc são Nîmes,
Montpellier, Sète e Bézier e as do Roussillon são Narbonne, Carcassone,
Minervois, Saint-Hilaire e Limoux. Essas duas regiões produzem principalmente
vinhos tintos, seguidos dos brancos espumantes, brancos doces, brancos
tranquilos secos e rosés.
Tradicionalmente, a Carignan é a uva de destaque, mas atualmente
muitas outras têm brilhado. Grenache, Mourvèdre, Syrah, Merlot, Cinsault e
Cabernet Sauvignon, entres as tintas. Picpoul, Muscat, Maccabéo, Clairette,
Rollet, Bouboulenc, Sauvignon Blanc, Viognier, Marsanne e Chardonnay, entre as
brancas.
Por causa da boa adaptação de uma grande diversidade de uvas,
há uma produção muito variada por lá. Os tintos Vin de Pays d’Oc são deliciosos e cheios de tipicidade. Os brancos
são impressionantes, dos secos aos doces. Sem falar do precioso espumante
Crémant de Limoux, de estilo similar ao champanhe.
Com exceção do seu extremo-oeste, que tem alguma influência atlântica,
o clima da região é essencialmente mediterrâneo, com chuvas escassas
(geralmente caem em temporais localizados) e verões muito quentes. O maior problema
para a viticultura é a seca. O Roussillon é a região mais ensolarada da França,
com 325 dias de sol no ano e com os ventos quentes que no verão aceleram a
maturação das uvas.
O solo da maior parte da região é do tipo aluvial, exceção
feita das partes mais ao norte, afastadas do litoral, e mais a oeste, próxima
aos Pirineus, onde os vinhedos estão a altitudes maiores e repousam em solos
variados como cascalhoso com seixos, xistoso, arenoso e de pedra calcária.
A virada
No período de 1982 a 1993, sub-regiões como Faugères,
Minervois e Limoux enquadram-se como Denominação de Origem Controlada.
Corbières, o vinhedo mais amplo da França Meridional, corre atrás com tintos
apimentados da Grenache.
Como a quantidade - mais que a qualidade - era a premissa para
a maioria dos produtores, isso se constituiu em uma virada no mundo dos vinhos
franceses. A melhoria começa timidamente com a vinícola Fortant de France, do
empreendedor Robert Skalli. Ele desvia-se da tradição local voltando-se para
varietais de Cabernet Sauvignon, Viognier e Chardonnay, mas limita-se a
enquadrar seus produtos sob a denominação Vin de Pays d'Oc (vinho regional).
Para encontrar os melhores tintos temos que nos voltar para
os terrenos mais elevados. Isso significa, principalmente, os Côteaux du
Languedoc, que contam, por sua vez, com diversas subregiões na zona de colinas
entre a planície costeira e o Maciço Central. Os melhores tintos do Coteaux são
cortes com base na Syrah e na Mourvedre. Propriedades emergentes, como os
Châteaux la Roque, de Flaugergues e Puydeval despontam internacionalmente e são
recomendados nos EUA, em 2003, pela Wine
Spectator.
Outras, com nomes pouco divulgados até então como, por
exemplo, os Domaines d'Aupilhac, Magellan e St. Martin de la Garrigue recebem
tratamento semelhante. Os vinhos de Gerard Bertrand recebem da revista
americana pontuações acima de noventa na sua escala de zero a cem.
A descoberta do Languedoc na Califórnia chega a ponto de
Robert Mondavi tentar instalar-se com uma vinícola na região na cidade de
Aniane. A prefeitura local socialista, entretanto, rechaça essa possibilidade e
não autoriza o empreendimento. No local, instala-se a Maison Nicolas.
Futuras gerações
De modo geral, pode-se confiar de forma consistente em que os
tintos contemporâneos do Languedoc, Corbières, Coteaux du Languedoc, Fitou etc,
são vinhos equilibrados, potentes e que seu frutado não se deixa suplantar por
aromas amadeirados. Tendo rompido com o passado, a possibilidade do Languedoc
de elaborar vinhos de qualidade ainda mais elevada, reconhecidos
internacionalmente, dependerá da dedicação da nova geração de vinhateiros ao se
expandir pela diversidade de terroirs da região.
A hedonista Viognier
A Viognier é uma variedade de origem francesa, muito ligada
ao Rhône, mas, graças às suas características aromáticas e estruturais, além de
ser uma ótima “parceira” de outras castas brancas em blends, espalhou-se por diversas partes do mundo, gerando vinhos
excepcionais.
As primeiras menções a ela são de 1781, ligando-a região de
Condrieu e também Ampuis, no vale do Rhône, mas uma tese diz que a Viognier foi
levada da costa da Dalmácia para a França pelo imperador Probus, e que a
variedade veio de Smirnium na Croácia. No entanto, não há evidências históricas
de que a casta seja mesmo croata.
Análises de DNA mostram uma relação pai-filho entre Viognier
e a casta Mondeuse Blanche e isso a torna uma possível meio-irmão ou até mesmo
avó da Syrah, já que elas fazem parte do mesmo grupo ampelográfico, mas
especialistas ainda não descobriram a ordem exata dos fatores.
Viognier
A origem do seu nome ainda é um mistério, mas teoricamente
derivaria do francês viorne, do gênero botânico “viburnum”, que remete a flores
brancas, possivelmente ligado às características aromáticas.
Há cerca de 50 anos, a Viognier estava restrita a poucos
lugares, encontrada em cerca de 10 hectares em Condrieu e no Château Grillet
somente, e hoje é um fenômeno mundial. A casta é tradicionalmente cultivada em
solos mais ácidos, mas também se adapta a regiões mais quentes, por isso tem
sido plantada em vários locais do mundo, da Califórnia, ao Uruguai, passando
por Austrália, Nova Zelândia, Chile, Alemanha etc.
A Viognier é para quem gosta de parar e sentir o cheiro das
flores. Os vinhos variam de sabor, desde mais leves como frutas amarelas, em
especial tangerina, manga e pêssegos até aromas mais cremosos de baunilha com
especiarias de noz-moscada e cravo-da-índia. Dependendo do produtor e de como o
vinho é feito, ele varia em intensidade, de leve e quente com um toque de
amargor a ousado e cremoso.
No paladar, os vinhos são geralmente secos, embora alguns
produtores façam um estilo levemente doce que embeleze os aromas de pêssego da
Viognier. Os estilos mais secos aparecem menos frutados no palato e produzem
amargura sutil, quase como se triturássemos uma pétala de rosa fresca. No
geral, os vinhos desta casta encontram seu melhor momento depois de 2 ou 3
anos, quando alcançam um estado mais opulento e exótico.
E agora finalmente o vinho!
Na taça revela um amarelo tendendo para o dourado, muito
brilhante, com algumas lágrimas finas, que logo se dissipa.
No nariz é surpreendentemente aromático e fresco trazendo, em
primeiro plano, aromas de frutas de polpa branca e tropicais com destaque para
pera, abacaxi, melão, maracujá, lima e pêssego, com uma agradável mineralidade
e grama cortada, algo de herbáceo.
Na boca traz notas deliciosas de aspecto seco, com muito
frescor, mas com uma incrível estrutura, personalidade, um bom volume, cheio, com
alguma untuosidade, mostrando equilíbrio entre corpo e frescor. As frutas
entregam protagonismo e leveza, com bela citricidade residual, com uma acidez
cativante, vibrante, que saliva, com final persistente.
Languedoc-Roussillon não entrega apenas tipicidade, qualidade
e valores justos, acessíveis aos mais variados bolsos, mas traz uma alternativa
para que todos indistintamente degustem vinhos franceses a bons preços e de
qualidade atestada. E ainda me possibilitou novas experiências com a excelente
casta Viognier com toda a sua exuberância aromática e complexidade no paladar.
Que venham mais e mais! Tem 13% de teor alcoólico.
Sobre a Vignobles & Compagnie:
Em 1963, graças ao espírito de federação dos viticultores,
liderado por Paul Blisson, que deu origem a vinícola, originada a promover
vinhos da região do Gard, do Vale de Rhône. A adega, um edifício original
inspirado pelo brasileiro Oscar Niemeyer, estava e ainda está localizada em um
ponto estratégico de Gard.
A família Merlout investe na organização, isso em 1969. À
frente da empresa estava uma mulher, Miss Noble, um fato ousado para a época.
Em 1972 a vinícola entra em uma nova era graças a modernização do local e ao
grande crescimento econômico também.
Em 1990 o Grupo Taillan assumiu todas as atividades da
vinícola, dando início a uma parceria importante com vários produtores locais,
trazendo o conceito de regionalismo aos seus rótulos.
Mais informações acesse:
https://vignoblescompagnie.com/en/
Referências:
“Mistral”: https://www.mistral.com.br/regiao/languedoc-roussillon
“Academia do Vinho”: https://www.academiadovinho.com.br/__mod_regiao.php?reg_num=FR14
“Revista Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/o-vinho-de-languedoc_8053.html
“Revista Sociedade da Mesa”: https://revista.sociedadedamesa.com.br/2021/10/languedoc-roussillon/
“Enologuia”:
https://enologuia.com.br/uvas/262-uva-viognier-a-uva-hedonista
“Revista
Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/branca-do-rhone-curiosidades-sobre-casta-viognier_13425.html