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terça-feira, 2 de junho de 2020

Festival Vinho na Vila 2017


No dia 20 de maio de 2017 eu participei de um dos melhores festivais de degustação que privilegia os vinhos brasileiros que esse país viu nesses últimos anos. É fato que, nesses últimos anos, o número de eventos de degustações de vinho tem aumentado, diria, significativamente. A oferta era baixa e hoje temos boas opções de eventos nos seus diversos formatos e opções de adesão. Mas é preciso, em minha opinião, democratizar esses eventos, para que os mesmos cheguem a todos os públicos, independentemente da classe social. Se quisermos democratizar é preciso baratear os ingressos que estão muito altos. Situações como essa só segmenta ainda mais um mercado que, por conta de problemas como esse (sim, é uma problema!), só a classe média alta participa.

Mas confesso que, além de ter me animado na época, de participar desse festival de degustação por ser direcionado aos rótulos brasileiros, o seu valor estava bem acessível ao bolso, fazendo valer a pena o investimento.

O Festival Vinho na Vila é projeto idealizado pela Larissa Fin em 2016 tendo a promoção de pequenas e médias vinícolas brasileiras e patrocinada pela IBRAVIN (Instituto Brasileiro do Vinho), com apoio institucional do “Vinhos do Brasil” e Governo do Estado do Rio Grande do Sul. É acompanhado de música, palestra, comida e degustação, acontecendo em várias cidades brasileiras. O evento tem como primordial objetivo oferecer ao público a oportunidade de conhecer e degustar alguns dos melhores vinhos e espumantes de produção nacional.

No ano de 2017 no Rio de Janeiro, foi realizado no Prédio Touring, na Praça Mauá, nos dias 19, 20 e 21 de maio. Durante os três dias de evento o Vinho na Vila contou com uma programação cultural especialmente pensada para a ocasião, incluindo palestras com temas relacionados ao secreto mundo dos vinhos, som ao vivo com apresentações de bandas de MPB, Jazz e Blues e atrações para os pequenos. Por sorte no dia que escolhi 20 de maio, em um sábado, chuvoso, mas que não me desestimulou nem um pouco, estava rolando um jazz e blues que embalou as ótimas degustações.

Entre as vinícolas confirmadas até o momento estão a Bueno Wines (Campanha - RS), Casa Perini (Vale dos Vinhedos - RS), Dal Pizzol (Vale dos Vinhedos - RS), Torcello (Vale dos vinhedos - RS), Pericó (Serra Catarinense - SC), Panizzon (Serra Gaúcha - RS), Aracuri (Serra Gaúcha - RS), Garibaldi (Serra Gaúcha - RS), Pizzato (Serra Gaúcha - RS), Don Giovanni (Serra Gaúcha - RS), Monte Paschoal (Serra Gaúcha - RS), Gallon Sucos, exclusiva de sucos de uva (Serra Gaúcha - RS), Rio Sol (Pernambuco - PE), Maximo Boschi (Bento Gonçalves - RS), Giaretta (Guaporé - RS), Vinhos Batalha (Campanha - RS), Maria Maria (MG) e Velho Amâncio (Santa Maria - RS).

As degustações

Iniciei as minhas degustações no evento com a excelente Vinícola Torcello, que já conhecia de outras ocasiões, de outros eventos e tive o prazer de reencontrar seus rótulos no Vinho na Vila. A Vinícola Torcello foi fundada no ano de 2000 por Rogério Carlos Valduga, quarta geração da Família Valduga, e filho de Remy Valduga (viticultor, escritor e bisneto de Marco). A Torcello surgiu do fascínio de Rogério pela vitivinicultura e pelo seu desejo de resgatar a tradição da família, a qual elaborava vinho de maneira totalmente artesanal no próprio porão de casa para consumo próprio.

O primeiro a ser degustado foi o Torcello Tannat, que já havia degustado em um evento anterior, mas, claro, não poderia deixar de lado e degustei de novo, o da safra 2014. Continua maravilhoso: Aromas de frutas negras e vermelhas, toque agradável de especiarias, taninos firmes e presentes e boa acidez. Um belo e estruturado Tannat.


Logo em seguida veio o Torcello Merlot da safra 2015. Esse foi uma novidade para mim, muita fruta, um vinho fresco, com bom volume de boca, jovem, aromas de frutas vermelhas em compota. Excelente Merlot brasileiro com muita tipicidade!


Fechei, em grande estilo, com o Torcello Cabernet Sauvignon, também da safra 2015. Arrebatador! Encorpado, frutas negras, um toque, muito bem integrado da madeira, taninos gordos e presentes. Um vinhaço! Esse eu não deixei passar, levei para casa uma garrafa!


E como não pode faltar a degustações de espumantes, avistei ao longe o stand da vinícola Velho Amâncio e estava tão movimentada que decidi conferir. A história da Velho Amâncio começa há mais de 100 anos, ainda no século XIX, quando Amâncio Pires de Arruda, de origem portuguesa, chegou em Santa Maria e por aqui resolveu se estabelecer, nas terras onde ainda hoje encontram-se os vinhedos e a vinícola. Os anos passaram, a cidade cresceu, Itaara tornou-se município e seu neto, Rubens Fogaça, no ano de 1986 iniciou a produção de vinhos no vale onde Amâncio Pires de Arruda havia se estabelecido com a família. Em 1999, a vinícola passa por uma modernização, os vinhedos varietais foram implantados e a qualidade aumentou. Atualmente, a vinícola produz vinhos finos e espumantes em pequena escala e possui vinhedos de uvas finas, conduzidos em espaldeira.

Comecei com o Vivelam Rosé. Apesar de ser um demi-sec, que não me agrada muito, me surpreendeu positivamente, não tendo aquele doce enjoativo, sendo até muito agradável em boca, aromas de frutas, leve e refrescante. Os espumantes dessa linha ão elaborados utilizando o método tradicional de fermentação na garrafa (Champenoise).


Depois, com o atendimento muito simpático e atencioso, dos herdeiros da vinícola, ele me indicou o brut, depois que falei que era fã dessa proposta de espumantes. Esse também foi arrebatador e, como o Torcello Cabernet Sauvignon, não pude deixar de levar. Ótima acidez, leve, fresco, com certa untuosidade, cremoso. Delicioso espumante!


Depois segui para a Casa Perini. Lá estava mais “versátil”, ou seja, tinha tintos e brancos de todas as propostas, espumantes, etc. A história da Casa Perini começa em 1929 quando o filho de imigrantes italianos João Perini começou a elaborar seus primeiros vinhos de forma artesanal no porão de sua casa, quando os fornecia para cerimônias festivas da comunidade local, no Vale Trentino, em Farroupilha.

Comecei com os tintos. Primeiro, por recomendação do representante da vinícola, degustei o Arbo da casta Maselan. Ele havia dito que o custo x benefício era ótimo e que estava tendo uma ótima saída no evento. Mas confesso que me chamou a atenção por conta da casta que não havia degustado até então. A linha “Arbo” é básica do produtor mas que não fica atrás e esse Marselan era muito interessante. Seco, frutado, com alguma estrutura e bem aromático me ganhou: O comprei! Depois degustei o Casa Perini Solidário, um corte das castas Cabernet Sauvignon e Merlot de 2015. Encorpado, amadeirado, frutas vermelhas em abundância, um vinhaço sem dúvida.


Depois fui para o primeiro Moscatel da noite. Um Moscatel Rosé com um residual de açúcar bem equilibrado surpreendeu pela fruta, pelo equilíbrio, leveza e uma simplicidade que faz do vinho muito bom. Não o levei, pois já tinha o Vivelam Brut e eu queria diversificar ou pelo menos tentar, diante de tantos rótulos magníficos.


Fui para um novo terroir para mim: Minas Gerais, representada pelos rótulos da Dom de Minas, da Vinícola Luiz Porto. Quando o Luiz Porto decidiu transformar sua paixão por vinhos em negócio, ele não tinha dúvidas que seria um sucesso. No Sul de Minas ele encontrara todas as características para que suas mudas importadas da França expressassem ao máximo sua qualidade. Mas para que o sonho tornasse realidade, ele sabia que ia precisar ter uma conversa muito franca com alguém que seria decisivo para o triunfo da vinícola: a Mãe Terra.

Como disse tinha apenas dois ou três rótulos distintos, infelizmente. Degustei o Merlot da safra 2014 e o Cabernet Franc da mesma safra. O Merlot era bem leve, agradável, frutado, bem descompromissado e fresco. Mas o que me surpreendeu foi o Cabernet Franc que inclusive fiz uma resenha que segue neste link: Dom de Minas Cabernet Franc. Um vinho de personalidade, mas macio e fácil de degustar. Não deu outra: levei!!


Fui para a vinícola Rio Sol! A Rio Sol está localizada no Vale do São Francisco, na cidade de Lagoa Grande, em Pernambuco. A vinícola produz vinhos e espumantes, cujos rótulos vêm, cada vez mais, conquistando prêmios nacionais e internacionais. A empresa pertence a Global Wines, com sede na região do Dão, em Portugal, produtora de vinhos reconhecida no mercado mundial pelo dinamismo e inovação, com grande diversidade de rótulos premiados entre os melhores da Europa. A vinícola levou  muitos rótulos da linha, tanto dos produzidos no Brasil quanto em Portugal.

Comecei com o Rio Sol Reserva tinto da safra 2014 das castas Cabernet Sauvignon, Syrah e Alicante Bouschet, traz um aroma delicado, com boa acidez, com taninos elegantes e macios.


Depois “viajei” para Portugal, começando com o Cabriz Colheita Selecionada, da emblemática região do Dão, da safra 2016. Das castas Alfrocheiro, Tinta-Roriz e Touriga Nacional traz um aroma exuberante de frutas negras, toque defumado, com belo volume de boca com taninos macios e presentes.


Fechando com o Grilos tinto Reserva. Esse já é um velho conhecido. Já havia degustado em outras ocasiões. Com um blend das castas Touriga Nacional, Tinta Roriz e Jaen entrega a tipicidade do Dão, com toque de frutas vermelhas, um vinho equilibrado, harmonioso e saboroso.



Fui para a Vinícola Batalha que nunca tinha ouvido falar. Eles unem o idealismo com as características que conferem uma vocação natural de uma região promissora para uma nova vitivinicultura mundial. São um grupo de jovens idealistas e de espírito empreendedor. O resultado econômico é uma consequência. A pretensão é produzir algo em escala limitada que possa surpreender os consumidores, buscando a valorização da pequena propriedade, onde não prioriza o volume, mas sim, a qualidade.

Degustei o Ideologia. Com um corte das castas Cabernet Sauvignon, Tannat e Merlot traz um equilíbrio interessante que confere ao vinho levez, harmonia e uma marcante personalidade. Frutado, taninos presentes mas sedosos, surpreendeu, mas o que desagradou foi o preço que não considerei como justo para a proposta do vinho.


Depois parti para o Batalha Cabernet Sauvignon da safra 2011. Esse tinha outra proposta. Um vinho mais encorpado, estruturado, mas, ao mesmo tempo macio e fácil de degustar. Um vinho redondo graças a passagem por barrica de carvalho.


Não posso deixar de destacar outro vinho que degustei e gostei e também levei que era da Vinícola Giaretta. A Vinícola Giaretta surgiu no ano de 2006, em uma reunião familiar e na evolução natural do próprio cultivo da uva que era realizado pelo Sr. Moacir. À época, a família estava com dificuldades na comercialização da sua produção de uvas, fato que motivou a abertura da vinícola.
Estava muito movimentado e consegui degustar apenas o Ancellota, mas não me arrependi. O vinho possui cor viva, vermelha rubi. Seus aromas lembram frutas maduras, como ameixa, sendo amplo e penetrante. Na boca é generoso e persistente, com taninos macios, se apresentando com estrutura e corpo marcante.


Como qualquer evento teve alguns problemas. Destaco aqui pelo menos dois: o primeiro foi o famigerado livrinho que constava a relação de todos os rótulos disponíveis para degustação. Era um controle dos organizadores do evento para garantir que todos os participantes degustasse todos os vinhos. Então a cada degustação os representantes dos produtores carimbava no seu livrinho o vinho que você degustou. Confesso que tive dificuldades de ficar, ao mesmo tempo, com o livrinho na mão e a taça e quando, por erro desses representantes que carimbava o rótulo errado e eu solicitava o vinho que fora carimbado para degustar e o representante via, dizia: “Esse o senhor já bebeu!” E quando eu dizia que não degustei ficava a minha palavra contra a do representante, mas no final das contas liberava a degustação. Era melhor definir uma quantidade de vinhos para a quantidade de participantes, embora trabalhoso, pois exige cálculos, é melhor. O outro problema foi o espaço onde fora realizado o evento. Achei pequeno e, por algum momento, ficou complicado e tenso para se locomover no local. Acredito que os organizadores não esperavam tanta gente! O sucesso do evento fora grande, mas nada que impedisse de se divertir e aproveitar os grandes rótulos expostos para degustação.

Foi uma noite maravilhosa e apoteótica que celebrou o vinho brasileiro. O vinho brasileiro que é tão inacessível aos brasileiros, o custo Brasil alto, os tributos que incidem igualmente alto, mas que naquele dia, todos os nossos sonhos foram vividos, mesmo que por algumas horas. Mas levei comigo, além de alguns rótulos, a expectativa de que é possível sim democratizar o vinho brasileiro e que, com isso o mesmo chegue à mesa do enófilo. Como sempre digo: Só falta o brasileiro conhecer o vinho brasileiro.

Minhas aquisições:


A taça do evento: