Quando costumo dizer, confesso, de forma demasiada, que
degustar um vinho de caráter, de grande apelo regionalista é maravilhoso, eu
não falo em vão, embora demasiadamente, admito, mas melhor ser redundante do
que omisso.
Degustar um vinho da casta que é considerada a rainha tinta
de Portugal, a Touriga Nacional, já é especial, mas quando fazemos a degustação
oriunda da região do Dão, torna-se, ainda mais, especial, embora co-protagonize
com outra casta emblemática, a Tinta Roriz, conhecida como a famosa
Tempranillo.
Mas por que falei da alegria de degustar um Touriga Nacional
do Dão? Explico! Porque a Touriga Nacional é oriunda de uma pequena região do
Dão chamada Nelas. Então degustar um Touriga Nacional, mesmo que em blend, do
Dão é como se guiássemos um carro ícone, de uma marca emblemática nas terras de
onde ele fora concebido. É algo muito expressivo, especial.
E mais especial ainda também quando você percebe, a olhos e
rótulos vistos, que uma região, tão importante e emblemática, como o Dão, está
de remodelando, crescendo, ganhando grandes contornos de modernidade, mas
mantendo, com dignidade, suas tradições.
Tanta coisa boa que antecipa uma degustação que se torna um
espetáculo à parte, fazendo de uma degustação uma verdadeira celebração, uma
ode às tradições, ao terroir de regiões tão importante para os vinhos neste
planeta como o Dão, por exemplo.
E nada melhor que degustar um Dão, depois de tanto tempo, o
último foi o estupendo Covas do Frade Touriga Nacional Reserva 2015, que mesmo
impulsiona a Portugal vitivinícola para o mundo e que traz, ao mesmo tempo, a
personificação de características tão marcantes das regiões que figura neste
país.
Então sem mais delongas vamos às apresentações do vinho! O
vinho que degustei e gostei vem da emblemática região lusitana do Dão e se
chama Quinta da Garrida Colheita Selecionada composta pelas castas Touriga
Nacional e Tinta Roriz da safra 2015. Mas antes de falar desse vinho da
tradicional Bacalhôa, falemos um pouco da história do Dão e a sua importância
para Portugal.
Dão
A região vinícola do Dão, em Portugal, sempre foi um área
nobre dos vinhos portugueses. Durante certo tempo, perdeu seu lugar para o
Douro e Alentejo, amargando um segundo plano no mundo dos vinhos, mas está
retornando com todo o orgulho que seus vinhos merecem pelas suas
peculiaridades.
A região é formada por planície, com encostas suavemente
onduladas, cercada de montanhas que a protegem da influência climática do
Oceano Atlântico. Além das montanhas, há também muitos pinheiros na região do
Dão, pinheiros que escondem os vinhedos e os protegem de intempéries.
Dão é nome da região e também do rio que se espalha por
vertentes de suave ondulação, de cor verde e dourado por vontade do sol e onde
o vinho, como nos amores antigos, nasce há muito tempo. Por exemplo, o Infante
Dom Henrique levou-o nas caravelas para Ceuta, em 1415 onde com ele celebravam
a vitória.
Atualmente, a Rota dos Vinhos do Dão está levando visitantes
e turistas aos espaços oferecidos para apreciação da produção vinícola da
região com cinco roteiros diferentes: Terras de Viseu, Silgueiros e Senhorim;
Terras de Azurara e Castendo; Terras de Besteiros; Terras de Alva e Terras de
Serra da Estrela.
Não é possível determinar com exatidão quando começou a
prática da vitivinicultura no Dão. Sabe-se que é anterior à nacionalidade
portuguesa, sendo claramente um reflexo das diferentes culturas que foram
ocupando diversas zonas da Península Ibérica.
Em 18 de Setembro de 1908, uma Carta de Lei estabelece
formalmente a Região Demarcada do Dão. O regulamento para a produção e
comercialização dos vinhos aí produzidos surge dois anos volvidos, em 25 de
Maio de 1910, com o Decreto regulamentador. Com esta decisão, o Dão tornou-se a
primeira região de vinhos não licorosos a ser demarcada e regulamentada no
nosso país.
Os fatores de distinção da região demarcada do Dão, são:
1-
Prestígio:
os vinhos do Dão eram comercializados a preços mais elevados que a média
nacional, beneficiando dos elogios dos técnicos agrícolas da época, como
António Augusto Aguiar ou Cincinato da Costa. Além disso, os vinhos do Dão, em
finais do século XIX, conseguiram obter distinções nas grandes exposições
nacionais e internacionais da altura, em Lisboa, Londres, Berlim e Paris.
2-
Grandes
Produtores: a região do Dão beneficiava da presença de grandes produtores de
vinho, sendo que algumas propriedades eram vistas como pioneiras e mesmo modelo
a nível nacional. Destacavam-se os nomes Casa da Ínsua, Conde de Villar Seco,
Conde de Santar ou José Caetano dos Reis.
3-
Influência
Política: entre 18 de Setembro de 1908 (data da primeira delimitação da região)
e 25 de Maio de 1910 (data da regulamentação) foi exercida uma intensa pressão
social e política pelas forças sociais e políticas da região, nos jornais
locais e nacionais, no Parlamento, em reuniões setoriais.
O Dão ficou desde sempre afamado pela produção de vinhos de
mesa com um perfil muito particular: vinhos nobres, elegantes, boas escolhas
para acompanhar variadas criações gastronômicas, com elevado potencial de
guarda e até com algumas semelhanças com a prestigiada região francesa da
Borgonha.
Já no século XIX era significativa a exportação de vinhos do
Dão para França e Brasil. Todas estas características foram sendo reconhecidas
e apreciadas pelos consumidores, com o Dão a assumir-se como região
privilegiada no país para a produção de vinho.
Todavia, a partir das décadas de 1960 e 1970 do século XX, a
produção dos vinhos do Dão foi-se deteriorando, uma vez que se começou a
apostar mais no volume de produção e menos na qualidade. As adegas cooperativas
dominavam o mercado e o Dão ressentiu-se de toda a orientação seguida nessa
época.
Depois de certa “travessia do deserto”, o Dão foi retomando o
caminho mais correto, sobretudo a partir de meados da década de 1990, momento
em que se começou a verificar uma melhoria muito significativa da generalidade
dos vinhos da região, o que tem permitido um renascimento fantástico, muito
devido ao investimento de pequenos vitivinicultores na região donde surgiram os
vinhos de Quinta.
Às novas práticas vitícolas e às novas tecnologias de
vinificação aliou-se um espírito empreendedor de querer fazer melhor, com
resultados que têm provado que as novas opções têm sido as mais corretas. Alguns
produtores privados que têm conseguido vinhos de quinta de qualidade já
reconhecida entre as mais importantes empresas de vinho portuguesas estão
representadas no Dão.
A Região Demarcada do Dão possui 376 mil hectares, dos quais
20 mil hectares são destinados exclusivamente às vinhas, abrigando vários
distritos, como Coimbra, onde se localizam Arganil, Oliveira do Hospital e
Tábua; Guarda, onde estão Aguiar da Beira, Fornos de Algodres, Gouveia e Seia;
e Viseu, onde se concentram Carregal do Sal, Mangualde, Mortágua, Nelas,
Penavaldo, Castela, Santa Comba Dão e Sátão.
A Região Demarcada do Dão é caracterizada por um relevo
acidentado, com solo predominantemente granítico e possuindo terroir e clima
propícios para a produção de boas uvas, principalmente devido à sua larga
amplitude térmica.
Entre suas castas, as uvas colhidas na Região Demarcada do
Dão apresentam alguns destaques, como por exemplo, a Touriga Nacional, a casta
mais nobre da região, produzindo vinhos com bom teor alcoólico, trazendo aromas
intensos, encorpados, com taninos nobres e propícios ao envelhecimento mais
longo, tornando o paladar ainda melhor depois de maturados.
A Alfrocheiro Preto é outra das castas nobres, conferindo aos
vinhos aromas finos, ganhando complexidade ao longo dos anos em que amadurece,
e a Jaen, com teor alcoólico regular, mas com aromas intensos de fruta madura,
taninos de grande maciez e de altíssima qualidade. Entre as castas brancas, a
mais nobre e a Encruzado, com bom teor alcoólico, trazendo aromas complexos,
frescos e relativamente secos.
O Dão é o berço da Touriga Nacional, famosa uva de Portugal e
uma das principais componentes do vinho do Porto. De tão marcante que é, os vinhos
da região demarcada devem ter, segundo a regulamentação vigente, no mínimo, 20%
de Touriga Nacional em sua composição. Mas além da Touriga Nacional, que é a
mais nobre, outras variedades são cultivadas, tanto tintas quanto brancas.
As tintas
Alfrocheiro: segundo especialistas, essa variedade contribui
para o equilíbrio entre a acidez e a doçura do vinho dão.
Aragonês: também conhecida como Tinta Roriz, essa cepa
confere potencial de guarda ao vinho (uma das principais características do
vinho do Dão), além de dar equilíbrio entre corpo e a acidez.
Jaen: essa variedade é geralmente usada para trazer aromas
para o vinho, pois tem um perfume intenso e, ao mesmo tempo, delicado.
As brancas
Encruzado: é a casta branca mais valorizada da região, que
produz vinhos frescos e que, apesar disso, tem potencial para envelhecimento.
Malvasia fina: outra casta branca cultiva na região, de
aromas simples.
E agora finalmente o vinho!
Na taça apresenta um rubi com tons atijolados, bem granada,
quase alaranjados, denotando seus 8 anos de garrafa, com lágrimas finas, lentas
e em profusão.
No nariz notou-se um vinho já em decadência, mas apresentando
notas de frutas secas, algo de uvas passas, além de discretos aromas de frutas
pretas maduras, com nuances florais, madeira igualmente discretas, que aportam
baunilha, cacau e caramelo. Traz também especiarias, couro, tabaco e carpete.
Na boca se mostra leve, macio e elegante, o tempo encarregou
de deixa-lo dessa forma. As notas de frutas secas e pretas maduras, já em
geleia também se faz perceber, bem como a madeira, graças aos 12 meses em barricas
de carvalho além de leve tosta e chocolate. É alcoólico, mas não incomoda,
entregando ainda algum volume em boca, com taninos já domados, uma acidez ainda
presente, com toques herbáceos e terra molhada. Tem final de média a longa
persistência.
Tudo conspirou a favor desse belíssimo Quinta da Garrida Colheita
Selecionada 2015! Tudo! A história, as tradições, tudo temperou com prazer e
celebração a degustação a parte que culmina, o cume da alegria. É a prova cabal
de que não é apenas a degustação, o que já é mágico, mas tudo que circunda esse
momento, como costumo dizer: degustamos história, degustamos o abnegado
trabalho que antecede o engarrafamento desta poesia líquida. É isso mesmo! Uma
poesia líquida que nos inspira, que acalenta o corpo e a alma. Não se é feliz o
tempo todo, mas quando se tem ao lado uma garrafa de vinho estamos e ficamos
sim, felizes. Um vinho expressivo, mas macio pelo tempo, um paladar distinto e
marcante e, por falar em tempo, 2015 foi um ano excepcional para todo o
Portugal e é mais um ponto que faz a singularidade da degustação. Que venha
mais Dão! Tem 13,5% de teor alcoólico.
Sobre a Quinta da Bacalhôa:
Bacalhôa Vinhos de Portugal foi fundada em 1922, sob a denominação
João Pires & Filhos. Em 1998 o controle da empresa foi para José Berardo,
que adquiriu novas propriedades e celebrou um acordo de parceria com o grupo
Lafitte Rothschild.
No ano de 2008 o grupo Lafitte Rothschild adquiriu uma
participação na empresa, que adquiriu mais propriedades e uma participação
maioritária na vinícola Aliança. O Comendador José Berardo, sendo o principal
acionista, prosseguiu com a missão de revolucionar na gestão da empresa,
investindo no plantio de novas vinhas, na modernização das adegas e na
aquisição de novas propriedades, junto com a imprescindível parceria com o
Grupo Lafitte Rothschild na Quinta do Carmo.
Em 2007 a Bacalhôa tornou-se a maior acionista na Aliança, um
dos produtores mais prestigiados nas categorias de espumantes de alta
qualidade, aguardentes e vinhos de mesa. No ano seguinte, a empresa comprou a
Quinta do Carmo, aumentando assim para 1200 ha de vinhas a sua exploração
agrícola.
A Bacalhôa dispõe de adegas nas regiões mais importantes de
Portugal: Alentejo, Península de Setúbal (Azeitão), Lisboa, Bairrada, Dão e
Douro. O projeto implementado nas diversas quintas sob o tema “Arte, Vinho,
Paixão” visa surpreender as expectativas mais exigentes.
Das vinhas ao vinho, todo o processo vitivinícola é envolvido
em vários cenários que incluem a tradição e modernidade, com exposições
artísticas diversas, da pintura à escultura, nunca esquecendo as magníficas
obras naturais.
Com uma capacidade total de 20 milhões de litros, 15.000
barricas de carvalho e uma área de vinhas em produção de cerca de 1.200
hectares, a Bacalhôa Vinhos de Portugal prossegue a sua aposta na inovação no
setor, tendo em vista a criação de vinhos que proporcionem experiências únicas
e surpreendentes, com uma elevada qualidade e consistência.
A Bacalhôa Vinhos de Portugal, S.A., uma das maiores e mais
inovadoras empresas vinícolas em Portugal, desenvolveu ao longo dos anos uma
vasta gama de vinhos que lhe granjeou uma sólida reputação e a preferência de
consumidores nacionais e internacionais. Presente em 7 regiões vitícolas
portuguesas, com um total de 1200ha de vinhas, 40 quintas, 40 castas diferentes
e 4 centros vínicos (adegas), a empresa distingue-se no mercado pela sua
dimensão e pela autonomia em 70% na produção própria.
A cada uma das entidades que constituem a Bacalhôa Vinhos de
Portugal, S.A. - Aliança Vinhos de Portugal, Quinta do Carmo e Quinta dos
Loridos - corresponde um centro de produção com características próprias e um
património com intrínseco valor cultural. É à dinâmica gerada pelo cruzamento
destas várias identidades, explorada com recurso à tecnologia mais atual e aos
conhecimentos de uma equipa de renome, que a Bacalhôa Vinhos de Portugal, S.A.
deve a sua capacidade única no competitivo mercado português de oferecer o
vinho perfeito para qualquer ocasião.
Mais informações acesse:
Referências:
Wikipedia, em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Quinta_da_Bacalhoa
“Clube dos Vinhos”: https://www.clubedosvinhos.com.br/regiao-do-dao-portugal/
“Clube Vinhos Portugueses”: https://www.clubevinhosportugueses.pt/turismo/caraterizacao-da-regiao-do-dao-2/
“Winer”: http://www.winer.com.br/vinho-dao/
“Comissão Vitivinícola do Dão”: https://www.cvrdao.pt/pt/regiao-demarcada/