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domingo, 25 de abril de 2021

D. João I branco

 

Já ouvi um grande crítico e especialista de vinhos dizer: “Vinhos simples e básicos não requer uma grande análise”. Em tese até faz sentido, um vinho simples para uma grande análise não “harmonizariam”. Mas o que dizer de um vinho que, embora seja simples e básico, seja especial para quem o degusta? Então, com todo o devido respeito ao nobre especialista, requer sim, uma grande e entusiasmada análise, sem sombra de dúvida. Independente de valores e proposta, todo vinho é especial se o enófilo gostar dele. Valor não define se o vinho é bom ou ruim, são apenas propostas de vinhos distintas que entregam sensações distintas em momentos distintos.

E o rótulo que degusto hoje e que já degustei em um passado não muito distante, mas por um tempo suficiente para relembrar e querer degusta-lo novamente, fez com que viesse à tona em meus pensamentos. E não é pelo valor, não, até porque, ao longo desse tempo, o vinho aumentou consideravelmente, mas porque ele me deixou uma marca, diria, sem exageros, indelével, uma surpresa digna de arrebatamento. Precisava degusta-lo novamente, sem essas atitudes de retrocesso ou a temida zona de conforto, mas para perceber possíveis novas nuances, novas percepções. Quem sabe? Simples e básico sim, mas especial, e quem sabe novas surpresas!

Então o vinho que degustei e gostei, duas vezes, veio das Terras da Beira, da sub-região de Pinhel, o D. João I branco composto pela típica casta portuguesa Síria e não safrado. E apesar da casta branca Síria ser muito difundida e conhecida em terras lusitanas, mas no Brasil não é muito comentada e muito consumida diria, a não ser em rótulos alentejanos, onde é conhecida como Roupeiro. Essa é a minha segunda experiência com o rótulo, com o surpreendente D. João I branco. E já que falei da Síria que, nas Terras de Beira é conhecida como Codo, vamos a história dela!

Síria

Cultivada nas regiões do interior de Portugal, já foi a casta branca mais plantada na região alentejana, onde é denominada Roupeiro, contudo, verificou-se que as temperaturas demasiado elevadas do Alentejo não eram benéficas para esta casta: os vinhos não tinham frescura, boa acidez e perdiam os aromas rapidamente. Assim, desenvolveu-se o cultivo da Síria nas terras mais altas e frescas da Beira Interior (nomeadamente na zona de Castelo Rodrigo) e Dão (onde a casta é conhecida por Alvadurão, Côdega ou Crato Branco). A Síria é uma casta muito produtiva de cachos e bagos pequenos. Apesar de ser bem resistente ao oídio e ao míldio, é bastante sensível à podridão.

Síria

Seus vinhos podem apresentar, no aroma, especiarias leves e folha de louro. Destacam-se, principalmente, as notas florais e frutas como laranja, limão, pêssego e melão. Na maioria, de tonalidade clara, seus exemplares são indicados para serem consumidos enquanto jovens, pois apresentam sua melhor expressão. A acidez nos rótulos elaborados com essa uva pode ser de média para alta. A Síria é a variedade mais plantada na região de Beira Interior, localizada no interior do país, na faixa estreita que se estende de norte a sul, na fronteira com a Espanha.

Beira Interior: As Terras da Beira

É na Beira Interior, identificada geograficamente como prolongamento do sistema central ibérico e histórico e culturalmente pelas matrizes testemunhadas nas suas aldeias medievais e cidadelas fortificadas que, a Denominação de Origem Beira Interior foi criada a 2 de novembro de 1999, resultado da aglutinação das regiões de Castelo Rodrigo, Cova da Beira e Pinhel, que passaram a sub-regiões desde então. Tem um passado histórico vitivinícola que remonta à fundação da nacionalidade portuguesa, está localizada no interior centro de Portugal, tem cerca de 16 000 hectares de vinhas e uma grande variedade de castas. Situada no interior centro/norte de Portugal é a região vitivinícola mais alta de Portugal, com vinhas plantadas entre os 300 e os 700 metros de altitude.

Beira Interior

Os vinhos são muito influenciados pela montanha e a orologia da região é dominada pelas serras da Estrela, Gardunha, Açor, Marofa e Malcata. Os solos são de origem granítica (80%), na sua maioria, sendo os restantes essencialmente de origem xistosa, existindo entre o granito e o xisto alguns filões de quartzo. O clima da região é muito agreste, com temperaturas negativas no Inverno e Verões muito quentes e secos. Os encepamentos mais tradicionais são nas brancas a Síria, Fonte Cal, Malvasia, Arinto e Rabo de Ovelha, e Malvasia e nas Tintas, a Rufete, Touriga Nacional, Touriga Franca e Tinta Roriz, Trincadeira, Mourisco, Jaen e alfrocheiro.

E agora o vinho!

Na taça apresenta um amarelo palha, bem claro, quase transparente com o aparecimento de algumas lágrimas finas, mas que logo se dissipa das paredes do copo.

No nariz surpreende pela estrutura aromática com notas de frutas brancas como maçã verde, melão e pera, além de algo discretamente cítrico, com destaque para o abacaxi. O toque floral entrega um vinho fresco e agradável.

Na boca é seco, fresco, leve, macio, com as frutas brancas em evidência como no aspecto olfativo, com uma acidez leve para média, um vinho com um belo volume de boca que o torna saboroso, com um final prolongado e retrogosto frutado.

Um vinho coringa, fácil de degustar, simples, básico, mas especial e surpreendente. Sim, ele continua surpreendendo os meus mais simplórios sentidos de um humilde enófilo, mas muito feliz por ter degustado novamente o bom e necessário D. João I branco que, há 4 anos atrás, descobri, pelo mesmo especialista que diz que um vinho simples não requer uma grande análise. Talvez esteja certo, mas por ser um vinho tão especial, a análise pode ser grandiosa e singular, pois é arrebatador e, diante de sua simples proposta, entrega muito além do que poderia se esperar. Ele harmonizou com um dia ensolarado de outono. Leve, delicado e agradável. Tem 13% de teor alcoólico.

Sobre a Adega Cooperativa de Pinhel:

Desde tempos muito antigos que em Pinhel, e seu termo, se praticava a cultura da vinha e se produziam vinhos de alta qualidade; já nos princípios do ano 1500, o Rei D. Manuel I, o Venturoso, concedeu diversas regalias e privilégios em favor dos vinhos de Pinhel. Em 1942 e 1943, houve colheitas abundantes e não havia escoamento para a produção, foi então que a Junta Nacional do Vinho, recentemente criada, como organismo de Coordenação Económica, e que veio substituir a antiga Federação dos Vinicultores do Centro e Sul de Portugal, instalou em Pinhel uma caldeira móvel de destilação, acionada por uma geradora locomóvel, em que foram destilados milhões de litros de vinho e que veio resolver a crise gravíssima, que afetava os lavradores da Região, que viviam exclusivamente do rendimento do vinho. 

De todos os Organismos Corporativos, criados pelo Estado Novo, a Junta Nacional do Vinho, era o mais querido, pelos beneficias que trouxe a toda a região vitivinícola, por isso os vinicultores depositavam toda a confiança esperançados que o organismo, quando necessário, lhe resolvesse os problemas respeitantes ao vinho. Os vinhos desta área eram tão bons que as aguardentes vínicas resultantes da destilação ficavam de finíssima qualidade. Quando transportadas para os armazéns da Mealhada não eram misturadas com outras provenientes de outras áreas ficando em depósitos separados. 

Em 1945, a Junta Nacional do Vinho iniciou a instalação de duas caldeiras fixas de destilação contínua, que trabalhavam de dia e de noite, só paravam cada 15 dias para limpeza. Como era pena destilar vinhos de tão boa qualidade, a Junta Nacional do Vinho, em colaboração com o Grémio da Lavoura de Pinhel, pensou na criação da Adega Cooperativa, nas suas próprias instalações que tinham sido compradas à Câmara Municipal de Pinhel e que tinham ficado devolutas pela saída das Forças Militares, ali aquarteladas, e que se tinham revoltado contra o Governo da Ditadura Militar.Em 1947, construíram-se 6 lagares em granito, no parque utilizado pelas viaturas militares e os tonéis foram montados nas cavalariças depois de devidamente adaptadas. 

A primeira laboração foi feita por processos artesanais, pois em Pinhel não havia energia elétrica com potência suficiente e a mesma era desligada à meia-noite; às próprias bombas de trasfega, eram movidas por motores de explosão. Foram 33 sócios, a entregar as uvas nesse ano na Adega; embora com bastantes dificuldades, estava criada e posta a funcionar a Adega Cooperativa. Dos primitivos 33 cooperantes, atingiu-se os 2.300 atuais.

Maiores informações acesse:

http://www.acpinhel.com/index.html

Referências:

“Além do Vinho”: https://alemdovinho.wordpress.com/tag/uva-siria/

“Wine”: https://www.wine.com.br/winepedia/sommelier-wine/serie-uvas-siria/

“Vinho Virtual”: https://www.vinhovirtual.com.br/uvas-207-S%C3%ADria








quarta-feira, 6 de maio de 2020

D. João I branco


Qual o seu conceito, a sua percepção dos vinhos baratos? O que pesa na sua decisão ao comprar um vinho, quais as suas prioridades na escolha? É claro que, em tempos bicudos, de incerteza econômica, degustar vinhos baratos pode ser a alternativa para continuar degustando, mas o prazer de explorar rótulos desconhecidos, de produtores pouco badalados, de custo baixo, pode, para muitos, parecer um risco desnecessário, comparando valores com qualidade, não nego essa possibilidade, mas não se enganem de que podem trazer surpreendentes e gratas surpresas. Contudo, é deveras essencial você, caso se interesse por esses rótulos, antes fazer uma pesquisa, acessar o site do produtor e conhecer um pouco da história do vinho e da vinícola. Acredite isso pode fortalecer, para mais ou para menos, na sua decisão de compra do vinho, afinal, comprar no escuro é um risco que pode ser mitigado, mas se você não tiver as informações que precisa e estiver interessado em comprar, siga seu coração e não hesite na compra.

E um exemplo de retorno extremamente favorável, agradável, satisfatório e todos os sinônimos enaltecedores possíveis, foi um tinto da região portuguesa de Beira Interior, pouco conhecida por aqui no Brasil, principalmente se levamos em consideração, em termos de popularidade como Alentejo e Douro, por exemplo, de uma vinícola chamada Adega Cooperativa de Pinhel, chamado D. João I branco da casta Síria, conhecida como Roupeiro, no Alentejo e na Península de Setúbal. O mesmo não é safrado, é considerado, em Portugal, como um “vinho de mesa”. Mas não se enganem o conceito de vinho de mesa em Portugal, a título de informação, é diferente daqui do Brasil. Enquanto por aqui vinhos de mesa são produzidos por uvas não vitiviníferas, em Portugal vinho de mesa é considerado como um vinho básico, de cotidiano, que não tem uma classificação DOC ou “Regional” e que são produzidos com castas locais, denotando, mesmo assim um vinho de caráter regional, embora não ostente tais classificações, em minha opinião. Como disse que a região é pouco conhecida, convém fazer um breve histórico da mesma, antes de analisar o vinho.

Beira Interior

É na Beira Interior, identificada geograficamente como prolongamento do sistema central ibérico e histórico e culturalmente pelas matrizes testemunhadas nas suas aldeias medievais e cidadelas fortificadas que, a Denominação de Origem Beira Interior foi criada a 2 de novembro de 1999, resultado da aglutinação das regiões de Castelo Rodrigo, Cova da Beira e Pinhel, que passaram a sub-regiões desde então. Tem um passado histórico vitivinícola que remonta à fundação da nacionalidade portuguesa, está localizada no interior centro de Portugal, tem cerca de 16 000 hectares de vinhas e uma grande variedade de castas. Situada no interior centro/norte de Portugal é a região vitivinícola mais alta de Portugal, com vinhas plantadas entre os 300 e os 700 metros de altitude.


Os vinhos são muito influenciados pela montanha e a orologia da região é dominada pelas serras da Estrela, Gardunha, Açor, Marofa e Malcata. Os solos são de origem granítica (80%), na sua maioria, sendo os restantes essencialmente de origem xistosa, existindo entre o granito e o xisto alguns filões de quartzo. O clima da região é muito agreste, com temperaturas negativas no Inverno e Verões muito quentes e secos. Os encepamentos mais tradicionais são nas brancas a Síria, Fonte Cal, Malvasia, Arinto e Rabo de Ovelha, e Malvasia e nas Tintas, a Rufete, Touriga Nacional, Touriga Franca e Tinta Roriz, Trincadeira, Mourisco, Jaen e alfrocheiro.

O vinho:

No aspecto visual mostra um amarelo palha com reflexos esverdeados.

No nariz é fresco, leve, trazendo frutas brancas como abacaxi, maçã verde, maracujá.

Na boca confirma as impressões olfativas sendo muito fresco, leve, equilibrado, é incrivelmente saboroso, com final persistente e frutado.

Vinho honesto, bem feito, correto, com tipicidade e que sintetiza o caráter regional e que, independente dos valores, entregam muito mais do que valem. Com 13% de teor alcoólico. É claro que são diferentes dos vinhos mais emblemáticos, mais caros, com passagem por madeira etc Mas seria injusto comparar tais vinhos com a linha D. João I, pois, antes de qualquer coisa, são vinhos com propostas totalmente distintas.

Sobre a Adega Cooperativa de Pinhel:

Desde tempos muito antigos que em Pinhel, e seu termo, se praticava a cultura da vinha e se produziam vinhos de alta qualidade; já nos princípios do ano 1500, o Rei D. Manuel I, o Venturoso, concedeu diversas regalias e privilégios em favor dos vinhos de Pinhel. Em 1942 e 1943, houve colheitas abundantes e não havia escoamento para a produção, foi então que a Junta Nacional do Vinho, recentemente criada, como organismo de Coordenação Económica, e que veio substituir a antiga Federação dos  Vinicultores do Centro e Sul de Portugal, instalou em Pinhel uma caldeira móvel de destilação, acionada por uma geradora locomóvel, em que foram destilados milhões de litros de vinho e que veio resolver a crise gravíssima, que afetava os lavradores da Região, que viviam exclusivamente do rendimento do vinho. De todos os Organismos Corporativos, criados pelo Estado Novo, a Junta Nacional do Vinho, era o mais querido, pelos beneficias que trouxe a toda a região vitivinícola, por isso os vinicultores depositavam toda a confiança esperançados que o organismo, quando necessário, lhe resolvesse os problemas respeitantes ao vinho. Os vinhos desta área eram tão bons que as aguardentes vínicas resultantes da destilação ficavam de finíssima qualidade. Quando transportadas para os armazéns da Mealhada não eram misturadas com outras provenientes de outras áreas ficando em depósitos separados. Em 1945, a Junta Nacional do Vinho iniciou a instalação de duas caldeiras fixas de destilação contínua, que trabalhavam de dia e de noite, só paravam cada 15 dias para limpeza. Como era pena destilar vinhos de tão boa qualidade, a Junta Nacional do Vinho, em colaboração com o Grémio da Lavoura de Pinhel, pensou na criação da Adega Cooperativa, nas suas próprias instalações que tinham sido compradas à Câmara Municipal de Pinhel e que tinham ficado devolutas pela saída das Forças Militares, ali aquarteladas, e que se tinham revoltado contra o Governo da Ditadura Militar.Em 1947, construíram-se 6 lagares em granito, no parque utilizado pelas viaturas militares e os tonéis foram montados nas cavalariças depois de devidamente adaptadas. A primeira laboração foi feita por processos artesanais, pois em Pinhel não havia energia eléctrica com potência suficiente e a mesma era desligada à meia-noite; às próprias bombas de trasfega, eram movidas por motores de explosão. Foram 33 sócios, a entregar as uvas nesse ano na Adega; embora com bastantes dificuldades, estava criada e posta a funcionar a Adega Cooperativa. Dos primitivos 33 cooperantes, atingiu-se os 2.300 atuais.

Maiores informações acesse: