Nos famosos dias quentes do verão brasileiro o que é
recomendável para os enófilos? Espumantes, vinhos brancos “tranquilos”, rosés
etc! É quase instintivo para aqueles que não conseguem degustar tintos ou
aqueles que abominam cerveja!
Para os brasileiros os espumantes sempre estão na “pauta”,
sempre será prioridade! E com razão, os nossos borbulhantes vem crescendo,
embora vagarosamente, no consumo e principalmente na sua qualidade, na sua
tipicidade.
Mas para mim, em especial, um vinho, que não é de nosso país,
me ganhou por completo há quase dez anos e apesar de ser lusitano tem a cara, o
DNA do nosso país: o vinho verde!
Os vinhos verdes leves, frescos, com aquela famosa “agulha”,
boa acidez, e de ótimo custo são as características principais desse vinho que
chegam, em profusão, em terras brasileiras. Atualmente instituições ligadas a
região dos Vinhos Verdes, como a Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos
Verdes (CVRVV) e alguns produtores estão investindo em rótulos mais complexos,
inclusive por passagens em barricas de carvalho.
São novas propostas de rótulos e, nesse sentido, é válido,
mas os verdes, os vinhos verdes são aqueles frescos, leves e despretensiosos,
sobretudo para os nossos dias quentes de verão. Bem pelo menos foi assim, com
esses vinhos, que aprendi a gostar dos famosos vinhos do Minho.
E o rótulo de hoje traz, na sua essência, todas essas
características! Um rosé, leve, frutado, fresco e que facilmente pode
“rivalizar” com as “tentações” da cerveja no churrasco, na praia, na piscina.
Afinal por que não degustar vinhos com essa proposta quando não se gosta de
cerveja?
O vinho que degustei e gostei vem, claro, da região lusitana
dos Vinhos Verdes, e se chama Via Latina e é composto pelas castas Amaral,
Borraçal, Espadeiro e Vinhão, da safra 2021. Então para não perder o costume,
vamos de história, vamos de Vinhos Verdes.
Vinhos Verdes: Entre-Douro-e-Minho
Desde o tempo da ocupação romana, antes da era cristã, a
vinha era cultivada na margem sul do Rio Minho da forma característica e invulgar
que se mantém até hoje. Não se trata de suposição. As referências à viticultura
na região encontram-se nos escritos do naturalista Plínio, o Velho, em sua
História Natural, e do filósofo Sêneca, em seu compêndio Questões Naturais.
Está também documentada na legislação do Imperador Domiciano, entre 96 e 51
a.C.
Na Idade Média multiplicam-se as referências escritas ao
cultivo das uvas e a elaboração de vinhos no noroeste lusitano, a partir das
atividades nos mosteiros e do decisivo suporte da coroa portuguesa. O vinho
entra definitivamente, entre os séculos XIII e XIV, nos hábitos das populações
entre o Minho e o Douro ao mesmo tempo em que se dá a expansão econômica da
região e a crescente circulação da moeda. Ainda que a exportação fosse pequena,
os vinhos verdes foram, entre os vinhos portugueses, os primeiros conhecidos
fora das fronteiras, particularmente na Inglaterra.
No início do século XX, ultrapassados os problemas das
quebras de produção devido às pragas, foram tomadas medidas especiais para a colocação
dos vinhos locais e escoamento dos excedentes. Tornava-se obrigatório, para
isso, conservar a genuinidade e a qualidade dos produtos, assegurando-se seu
valor do ponto de vista cultural e econômico.
O ano de 1908 é crítico na história portuguesa: o rei Carlos
I e seu filho são assassinados, abrindo caminho para a República. Nesse mesmo
ano, a região dos vinhos verdes é demarcada oficialmente e dividida em seis
sub-regiões: Monção, Lima, Basto, Braga, Amarante e Penafiel. O limite a oeste
é o Atlântico e, ao norte, a Espanha.
A Região Demarcada dos Vinhos Verdes está dividia em nove
sub-regiões, cada uma com sua característica específica e suas castas de uva
recomendadas:
Sub-região de Monção e Melgaço: utilizam-se apenas as castas Pedral
(tinta) e Alvarinho (branca). É de lá o mais icônico Alvarinho, com notas
cítricas misturadas com nuances de aromas florais e de frutos tropicais e
paladar mineral.
Sub-região de Amarante: as castas brancas são Azal e Avesso e originam vinhos com aromas
frutados e com o maior teor alcoólico da Região. Mas é dos tintos que vem a
fama da sub-região. Elaborados com Amaral, Vinhão e Espadeiro, são vinhos com
cor carregada e muito viva.
Sub-região de Baião: também tem muita notoriedade na produção dos brancos, a
partir da casta Avesso.
Sub-região de Basto: a casta Azal atinge o seu máximo potencial e resultam
vinhos com aroma de limão e maçã verde muito frescos, de alta acidez.
Sub-região do Cávado: têm vinhos brancos das castas Arinto, Loureiro e Trajadura
com acidez moderada e notas de frutos cítricos e de pomar. Os vinhos tintos são
na maioria cortes de Vinhão e Borraçal, cor intensa vermelho granada e aromas
de frutos frescos.
Sub-região do Lima: Os vinhos brancos mais famosos são produzidos a partir da
casta Loureiro. Os aromas são finos e elegantes e vão desde limão até rosas.
Sub-região de Paiva: produz alguns dos tintos mais prestigiados de toda a região
a partir de Amaral e Vinhão.
Sub-região do Sousa: utiliza a casta Espadeiro, principalmente para a produção
de rosés, sendo alguns dos mais destacados da Região.
Sub-região do Ave: Arinto e Loureiro Trajadura juntas compõem um blend
perfeito com frescura viva e notas florais e de frutas cítricas.
Em 1926 foi criada a Comissão de Viticultura da Região dos
Vinhos Verdes (CVRVV), responsável por controlar e certificar os produtos
elaborados na região. Quando a amostra apresentada à CVRVV não cumpre com os
requisitos legais para ser certificada como DOC, o exemplar recebe o selo IG
Minho.
Isso não quer dizer que o vinho é de pior qualidade, apenas
que não se enquadra legalmente aos parâmetros pré-definidos. A IG Minho permite
a utilização de maior variedade de castas, incluindo uvas internacionais, e regras
distintas de vinificação.
Na maioria dos casos, os produtores não estão buscando
necessariamente a tipicidade do vinho, mas a produção de vinhos inovadores. É
comum encontrar vinhos IG Minho mais caros que os DOC Vinhos Verdes. Alguns
produtores optam de forma intencional por rotular seus vinhos como Regional do
Minho, até mesmo por questões de marketing e posicionamento de mercado.
A região dos Vinhos Verdes tem influência atlântica,
reforçada pela orientação dos vales dos principais rios, que correndo de
nascente para poente facilitam a penetração dos ventos marítimos. É observada
elevada pluviosidade, temperatura amena, pequena amplitude térmica e solo
majoritariamente granítico e localmente xistoso. Mas algumas regiões, por conta
do microclima, apresentam características de terroir distintas. O que
influencia diretamente no vinho.
Por que vinho verde?
Evidentemente, a cor do Vinho Verde não é verde. Então, por
que esse nome? Duas são as versões mais conhecidas. O Vinho Verde leva esse
nome porque as uvas da região, mesmo quando maduras, têm elevado teor de
acidez, produzindo líquido cujas características lhes dão a aparência de vir de
uvas colhidas antes da correta maturação.
A outra explicação diz que "Vinho Verde" significa
"vinho de uma região verde", ou seja, a denominação deriva da
belíssima paisagem local, onde o verde das terras cultivadas se perde no
horizonte.
As castas
Amaral
Amaral é conhecida por Azal Tinto ou Azar ou ainda como
Cainho Bravo ou Cainho Miúdo em Monção, por Cainzinho nos Arcos de Valdevez e
por Sousão Galego na zona de Basto.
Casta tinta de qualidade é mais intensamente cultivada; pouco
produtiva e rústica; dá origem a vinhos de cor vermelha rubi, com aroma sem
destaque a casta, ligeiramente acídulos e encorpados.
Borraçal
Borraçal é uma casta de uva tinta, cultivada na região dos
vinhos verdes, exceto na zona de Monção. Tem um grande interesse regional, pois
é antiga e tradicional. As gentes do campo apreciam muito o seu vinho, pois tem
muita qualidade, mas também o viajante já pede vinhos com casta Borraçal. Além
da sua rusticidade, os seus vinhos são de cor rubi, com uma elevada acidez
fixa, com bagos pequenos a médios, e os cachos são pequenos de forma cónica.
É uma casta rústica, recomendada em toda a região vinícola
dos vinhos verdes. Também lhe chamam, Esfarrapa e Morraça, em Viana do Castelo,
Cainho Grande, Cainho Grosso ou Espadeiro Redondo, em Monção, e na zona de
Basto é conhecida por Azevedo, Bogalhal ou Olho de Sapo.
Espadeiro
A Espadeiro é uma uva autóctone portuguesa, conhecida por dar
origem à ótimos vinhos tintos e vinhos rosés, na região dos Vinhos Verdes.
Existem, também, duas sub-variedades da uva Espadeiro, Espadeiro Tinto e
Espadeiro Mole. No sul de Portugal, o nome Espadeiro é utilizado para
referir-se a uva Trincadeira (Tinta Amarela). É importante não confundi-las,
pois são variedades completamente diferentes! Com cachos compactos e de formato
cilíndrico, bagos arredondados e de coloração preta-azulada, a Espadeiro é uma
casta que apresenta boa resistência ao ataque de pragas e doenças.
A uva Espadeiro é originária do Minho, dentro da região
vitivinícola dos Vinhos Verdes, em Portugal. Fora de sua terra natal, a uva
tinta Espadeiro é cultivada na região de Rías Baixas, na Espanha. Entre os
principais aromas da uva Espadeiro vale destacar notas de frutas cítricas, como
toranja, e nuances de frutas vermelhas, como morango.
Vinhão
A Vinhão, também conhecida como Sousão ou ainda Sauson é uma
uva de pele escura com origens que remontam a oeste da Península Ibérica. A
variedade se estabeleceu na região do Douro, onde se estabeleceu e se chama
apenas Sousão.
A Vinhão ou Sousão apresenta bagos com tamanho mediano e
casca com coloração negro-azulada, com uma excelente capacidade de pigmentar os
exemplares. Além disso, a polpa desta variedade tem coloração levemente rosa,
onde acaba sendo confundida com outras cepas tintureiras, ou seja, uvas com
polpa vermelha e pele escura.
Os vinhos elaborados a partir da uva Vinhão apresentam tons
de violeta e conseguem ser muito opacos e escuros que, quando despejados em
taças, podem quase ser impenetráveis à luz. Estes exemplares exibem um caráter
único, excelentes níveis de acidez, taninos leves e alto teor alcoólico. Os
vinhos Sauson, normalmente, possuem aromas mais frutados e amadeirados, podendo
exibir também notas de passas.
Apesar de todas estas características, a Vinhão pode produzir
também vinhos muito diferentes entre si, ou seja, o estilo dos exemplares
dependerá quase que, exclusivamente, da região onde a uva é vinificada e
cultivada. Na região portuguesa do Minho, é responsável pela elaboração da
maior parte dos vinhos tintos Verdes – rústicos e com elevados níveis de
acidez.
Ainda em Portugal, no Douro, a variedade é utilizada na
produção dos tradicionais e fortificados vinhos do Porto, onde a mesma é
responsável por adicionar excelente coloração e acidez aos exemplares –
características essenciais para que os vinhos exibam uma boa capacidade para
envelhecer. Também é utilizada na elaboração de vinhos de corte ao lado de
outras castas portuguesas, dando origem a vinhos tintos de alta qualidade, que
também podem envelhecer muito bem durante anos.
Atingem o ápice qualitativo em áreas vinícolas com
temperaturas mais quentes, enquanto fora de Portugal, encontra-se o cultivo da
Vinhão na Espanha, Austrália, África do Sul e Califórnia.
E agora finalmente o vinho!
Na taça revela uma cor rosada com alguma intensidade, beirando
um vermelho, com reflexos alaranjados. Tem uma efervescência típica dos vinhos
verdes que lembra um frisante.
No nariz mostra-se um pouco inibido, tímido, mas ainda assim são
perceptíveis os aromas frutados, de frutas vermelhas frescas, tais como
morango, framboesa e até algo de melancia também. Goza de um caráter leve e
jovem
Na boca é meio seco,
um discreto residual de açúcar que não compromete, goza de um caráter leve,
fresco e jovem, com as notas frutadas mostrando o seu protagonismo, como no
aspecto olfativo, mas apresenta uma boa estrutura para um rosé. Traz uma boa
acidez que te estimula a vorazes e intensas degustações seguidas, com um belo e
persistente final de boca.
O melhor do que degustar um vinho verde com essa proposta, um
vinho leve, fresco e de ótima acidez, é também ter um corte ou uma “mistura”,
como dizem os portugueses, de castas típicas da região dos Vinhos Verdes, uvas
autóctones dessa região, dando um caráter totalmente regionalista ao vinho,
mesmo sendo um rótulo simples, mas significativo em trazer o terroir do Minho.
Que venham muitos outros, que tragam vinhos solares, tão brilhantes quanto um
dia de verão. Tem 10% de teor alcoólico.
Sobre a Vercoope:
A Vercoope é uma união de sete Cooperativas Vitivinícolas da
Região dos Vinhos Verdes: Amarante, Braga, Guimarães, Famalicão, Felgueiras,
Paredes e Vale de Cambra. Foi criada em 1964 com o objetivo de engarrafar,
comercializar e distribuir o vinho produzido pelos viticultores destas
cooperativas.
A união permitiu juntar a produção de 4 000 viticultores e
lança-la no mercado, nacional e internacional, conseguindo mais qualidade,
dimensão e competitividade. A qualidade dos vinhos é reconhecida e comprovada
pelos consumidores, pelas vendas e pelas centenas de prémios conquistados em
competições de vinhos e imprensa especializada.
A Vercoope produz anualmente 8 milhões de garrafas de Vinho
Verde, sendo 30% para exportação. A Vercoope – União das Adegas Cooperativas da
Região dos Vinhos Verdes, U.C.R.L, está inserida na Região Demarcada dos Vinhos
Verdes, considerada a maior região demarcada de Portugal e uma das maiores do
mundo, essencialmente devido à sua extensão e da área dos solos dedicados à
cultura da vinha, a que acresce uma significativa percentagem de população
diretamente dependente do setor vitivinícola e nomeadamente do Vinho Verde.
A Vercoope é uma entidade vocacionada para o engarrafamento,
comercialização e distribuição de Vinho Verde e integra na sua estrutura as
adegas cooperativas de Amarante, Braga, Guimarães, Famalicão, Felgueiras,
Paredes e Vale de Cambra que representam no seu conjunto explorações vitícolas
de cerca de 5000 viticultores.
Situada em Agrela, Santo-Tirso, numa estrutura moderna e
tecnologicamente avançada, quer com meios técnicos quer com meios humanos, tem
potenciado, desde a sua fundação, em 1964, o desenvolvimento da cultura do
Vinho Verde, promovendo a sua divulgação, o seu consumo e a valorização do
produtor.
Com mais de meio século de atividade a defender uma política
de qualidade e prestígio para os seus vinhos, espumantes e aguardentes, ocupa
por direito próprio, um lugar de destaque no sector, sendo muito naturalmente
considerada uma instituição de referência no panorama regional e nacional.
Mais informações acesse:
Referências:
“Jornal da Golpilheira”: https://jgolpilheira.wordpress.com/2010/10/28/casta-de-uva-borracal/
“DiVinho”: https://www.divinho.com.br/uva/espadeiro/
“Vinho Virtual”: https://www.vinhovirtual.com.br/uvas-483-Amaral
“Mistral”: https://www.mistral.com.br/tipo-de-uva/sauson
“Revista Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/vinho-verde-bebida-portuguesa-do-verao_8317.html
https://revistaadega.uol.com.br/artigo/a-paisagem-que-deu-nome-ao-vinho_2744.html