O enófilo às vezes sofre por algumas “provações”, alguns
dilemas. Agora vem a pergunta: Mas como sofrer por degustar a poesia líquida,
por degustar grandes e especiais rótulos? A escolha, a tomada de decisão para
nós que apreciamos um bom vinho pode parecer muito difícil. Pelo preço: o seu
orçamento está curto e gostaria de comprar a loja inteira, mas você tem de sair
dela com uma no máximo duas garrafas! E aí, como fazer para escolhê-las com
tantos rótulos que julgou serem especiais? Essa é uma das mais sofridas, sem
dúvida!
E quando o vinho não tem nenhuma informação no rótulo, mas
algo te cativou nele, sabe-se, como a região, a casta que você nunca degustou?
Eu que preciso dos requintes de detalhe do vinho, fico tenso em saber um pouco
mais do rótulo e se de fato ele contempla os meus anseios de momento. São várias
as situações que eu poderia elencar aqui, mas uma enredou o vinho que será o
protagonista dessa resenha de hoje e ele veio do Chile, que já é uma porta de
entrada no que tange a qualidade.
Eu estava como sempre, em uma de minhas incursões ao
supermercado e logo me dirigi à adega para ver se tinha algumas gratas
novidades. Logo vi que tinha muitas promoções, os cartazes com os preços baixos
gritavam em números garrafais, hipnotizava o humilde enófilo que tentava, com
seus parcos salários, comprar algum vinho e este clamava: “Me leve!”.
Contudo, diante de irresistíveis dicas, um me chamou
demasiadamente a minha atenção. Já que falei em hipnotismo esse sim fez com que
merecesse a minha atenção. Tomei o rótulo em minhas mãos e era um Sauvignon
Blanc de uma região que estampava no rótulo e que não conhecia: Leyda, Valle de
Leyda. Continuei a examiná-lo e vi que era da Viña Luis Felipe Edwards, adoro
esse produtor! Já estava ficando animado. Quando vi o preço: R$ 22,90! Uau! Não
é possível! Mas uma informação me deixou receoso... A safra!
2012 era a safra e estávamos em 2018! E agora? Para um
branco, um Sauvignon Blanc me parecia ser bem “velhinho” e era a única garrafa!
Nossa que sofrimento, que dilema! Uma garrafa de um branco da casta Sauvignon
Blanc, mas a um atraente preço. Levo ou não? Decidi leva-lo, afinal, se
estivesse avinagrado ou coisa do tipo, eu perderia apenas 20 e poucos reais.
Optei por abri-lo de uma vez, naquela semana! Quando a rolha,
naquele característico barulhinho que se desprende da garrafa, apresentou o
vinho que foi derramado na taça, em seu “primeiro round” um arrebatamento tomou
de assalto em minha vida naquele momento: Que vinho! Que grande vinho! Ele
estava vivo, pleno e descortinava todas as características de um grande
Sauvignon Blanc! A compra fora muito bem sucedida! Então o vinho que degustei e
gostei veio do Valle de Leyda, no Chile e se chama Marea, da casta Sauvignon
Blanc (100%) da safra 2012. Então falemos de Valle de Leyda, antes deste vinho
surpreendente.
Valle de Leyda, Valle de San Antonio
Valle de Leyda é uma região vinícola do Chile, situada a
menos de 100 quilômetros da capital Santiago e é uma sub-região que fica no
Valle de San Antonio. Esta região é privilegiada pela corrente fria de Humboldt
proveniente do Oceano Pacífico e, por consequência, dá origem a vinhos
excelentes a partir das uvas Chardonnay e Pinot Noir.
Associada à produção de cevada e trigo, a região chilena
rapidamente está conquistando seu espaço perante o mundo dos vinhos de alta
qualidade. Os primeiros produtores apareceram na região em 1990, atraídos por
um terroir ideal para a elaboração de uvas premiadas. Com o investimento de uma
família produtora de vinhos, obteve-se a construção de um gasoduto de 8
quilômetros para canalizar a água do rio Maipo – potencializando o cultivo das
vinhas.
A região de Valle de Leyda está localizada em um conjunto de
colinas ao lado da faixa costeira que protege a faixa central do país de
influências oceânicas. Trata-se de uma região vinícola localizada ao sul da
fria região de Valle de Casablanca.
As brisas frias do oceano e a névoa da manhã moderam as
temperaturas da área, mais baixas do que sua altitude indica. Estas
temperaturas frescas são complementadas pela elevada incidência solar durante o
período de crescimento das vinhas, proporcionando que as uvas amadureçam
completamente e desenvolvam excelente complexidade, mantendo seus níveis de
acidez equilibrados.
Leyda Valley é uma das zonas vinícolas em maior ascensão do
Chile, atraindo a atenção de muitos críticos e especialistas do mundo do vinho
com o decorrer dos últimos anos. Além de produzir alguns dos melhores vinhos
chilenos Pinot Noir e Chardonnay, a região é responsável também pela elaboração
de excelentes vinhos Syrah e Sauvignon Blanc.
E agora finalmente o vinho!
Na taça o vinho apresenta uma viva, intensa e brilhante cor
amarela, com alguns traços esverdeados com poucas e finas lágrimas que logo se
dissipavam.
No nariz uma exuberância explosão de aromas de frutas brancas
e tropicais frescas, como groselha verde, maracujá, abacaxi, pera, maçã-verde,
além de notas cítricas vívidas.
Na boca se revelou com alguma estrutura, com um incrível
volume de boca, mas equilibrado, redondo e extremamente elegante. A acidez
muito alta, mas que não agride, pelo contrário, entregava um frescor
maravilhoso apesar dos 6 anos de safra, com toques minerais e de especiarias,
talvez pimenta. Tem um final frutado e prolongado.
Um grande vinho! Um vinhaço! Exuberância é um bom adjetivo
para este rótulo que estava lá esquecido, a um preço que certamente estava bem
abaixo por ter uma safra “antiga” para a sua proposta. Desconheciam os gerentes
do supermercado de onde comprei este vinho que ele estava vivo, intenso, pleno,
com todas as suas características presentes na taça, no olfato e no paladar. Um
vinho saboroso e que ousaria em dizer que teria mais alguns anos pela frente.
Um achado, um valioso e especial rótulo que, diante da situação que se
apresentava naquela gôndola, certamente, em um momento “racional” ninguém
levaria por receoso. Mas diante desta experiência aprendi que a emoção do
sentimento, o “feeling”, o coração
precisa ser ouvido. Tem teor alcoólico de 13,5%.
Sobre a Viña Luis Felipe Edwards:
A Viña Luis Felipe Edwards foi fundada em 1976 pelo
empresário Luis Felipe Edwards e sua esposa. Após alguns anos morando na
Europa, o casal decidiu retornar ao Chile e, ao conhecer terras do Colchágua,
um dos vales chilenos mais conhecidos, se encantou. Ali, aos pés das montanhas
andinas, existia uma propriedade com 60 hectares de vinhedos plantados, uma
pequena adega e uma fazenda histórica que, pouco tempo depois, foi o marco do
início da LFE.
De nome Fundo San Jose de Puquillay até então, o produtor,
que viria a se tornar uma das maiores vinícolas do Chile anos mais tarde,
começou a expandir sua atuação. Após comprar mais 215 hectares de terras no
Vale do Colchágua nos anos de 1980, começou a vender vinho a granel, estudar a
fundo seus vinhedos e os resultados dos vinhos, e cultivar diferentes frutas
para exportação.
O ponto de virada na história da Viña Luis Felipe Edwards
veio na década de 1990, quando Luis Felipe Edwards viu a expectativa do mercado
sobre os vinhos chilenos. Sabendo da alta qualidade dos rótulos que criava, o
fundador resolveu renomear a vinícola e passou a usar o seu próprio nome como
atestado de qualidade. Após um período de crescimento e modernização,
especialmente com o início das vendas do primeiro vinho em 1995, a LFE se
tornou um importante exportador de vinho chileno no começo do século XX. A
partir de então, o já famoso produtor começou a adquirir terras em outras
regiões do país.
Na busca incessante por novos terroirs de qualidade, ele encontrou no Vale do Leyda um dos seus maiores tesouros: 134 hectares de videiras plantadas em altitude extrema, a mais de 900 metros acima do nível do mar.
Mais informações acesse:
Referências:
“Vinci”: https://www.vinci.com.br/c/regiao/valle-de-leyda
Degustado em: 2018