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sábado, 20 de maio de 2023

Fabian Reserva Carménère 2018

 

Quando falamos da casta Carménère lembramos imediatamente do Chile e seus terroirs. A cepa ajudou a impulsionar a vitivinicultura daquele país e hoje ostenta uma posição de destaque entre os países do Novo Mundo do vinho.

Apesar de a Carménère ter essa representatividade penso que ainda, sobretudo no Brasil, exista uma rejeição, onde alguns dizem que é um clone mal acabado da Merlot, ou uma casta inexpressiva e pouco gastronômica.

A história de como a cepa foi “descoberta” no Chile foi meio inusitada e tem uma relação com a Merlot realmente. Diz a história de que a Carménère estava, de forma intrusa, entre os vinhedos de Merlot e todos achavam que se tratava de Merlot. Após estudos científicos comprovou-se que havia Carménère entre os vinhedos de Merlot, isso em 1994.

Mas eu não queria falar da Carménère que ganhou sucesso no Chile, mas em rótulos desta casta que estão sendo produzidas no Brasil, acredite se quiser! Alguns produtores brasileiros estão se aventurando na concepção desta em nossos terroirs.

E eu tive o privilégio e a alegria de ter degustado um rótulo vinificado na região tradicional de São Roque, interior de São Paulo, da Adega Terra do Vinho e se chama Genuíno da safra 2018. As uvas vieram da Serra Gaúcha, outra emblemática região e foi vinificada em São Roque. Um momento único de degustação e que maravilhosamente entregou algumas das características marcantes da Carménère: frutas maduras, couro, carpete e um delicioso toque herbáceo.

E hoje a história se repetirá, com uma nova experiência com a Carménère brasileira, concebida na cidade de Nova Pádua, que fica na Serra Gaúcha, de uma vinícola, ainda pouco conhecida, mas que vem ganhando alguma projeção nos últimos anos, falo da Vinícola Fabian.

O vinho que degustei e gostei veio, portanto, da Serra Gaúcha, de Nova Pádua e se chama Fabian, um 100% Carménère, da safra 2018. Não preciso dizer da minha ansiedade, diria excitação para degustar um Carménère brasileiro! Jamais esperaria degustar um brasileiro, é no mínimo inusitado. Mas antes de falar deste rótulo que me surpreendeu por inteiro, não podemos deixar de falar das regiões, da Serra Gaúcha e Nova Pádua e da emblemática Carménère. Lá vamos nós!

Serra Gaúcha

Situada a nordeste do Rio Grande do Sul, a região da Serra Gaúcha é a grande estrela da vitivinicultura brasileira, destacando-se pelo volume e pela qualidade dos vinhos que produz. Para qualquer enófilo indo ao Rio Grande do Sul, é obrigatório visitar a Serra Gaúcha, especialmente Bento Gonçalves.

Serra Gaúcha

A região da Serra Gaúcha está situada em latitude próxima das condições geoclimáticas ideais para o melhor desenvolvimento de vinhedos, mas as chuvas costumam ser excessivas exatamente na época que antecede a colheita, período crucial à maturação das uvas. Quando as chuvas são reduzidas, surgem ótimas safras, como nos anos 1999, 2002, 2004, 2005 e 2006.

A partir de 2007, com o aquecimento global, o clima da Serra Gaúcha se transformou, surgindo verões mais quentes e secos, com resultados ótimos para a vinicultura, mas terríveis para a agricultura.

Desde 2005 o nível de qualidade dos vinhos tintos vem subindo continuamente, graças a esta mudança e também do salto de tecnologia de vinhedos implantado a partir do ano 2000.

Nova Pádua

A colonização da região iniciou-se em 1886, com a chegada de imigrantes italianos do Vêneto, na Itália. No início de 1886, sete famílias do Vêneto chegaram ao Rio Grande do Sul para habitar a 16ª Légua do Campo dos Bugres, hoje Nova Pádua. Eram as famílias de Francisco Mantovani, comerciante; Carlos Mantovani, seu irmão e professor; João Zanini, ferreiro; Pedro Sartor, Francisco Menegat, Pascoal Pauletti e Pedro Menegat, estes agricultores. O nome do município foi dado em homenagem a cidade italiana de Pádua.

Já em 1890, todas as 307 colônias estavam tomadas por imigrantes que fugiam da miséria que assolava a pátria-mãe, a Itália. Todos provinham das várias cidades da província do Vêneto, e vinham para buscar o seu desenvolvimento, vinham para vencer. Em 2 de julho de 1888 tiveram a primeira missa, rezada pelo Padre Alexandre Pelegrini. Em 7 de junho de 1890 foi benta a imagem de Santo Antônio de Nova Pádua e, desde então, a 16ª Légua tomou o nome de Nova Pádua.

Em 27 de dezembro de 1892, Nova Pádua recebeu seu primeiro padre na pessoa do padre Giuseppe Candido Dalmazzi. Devido ao seu rápido desenvolvimento, Nova Pádua foi promovida a 4º Distrito de Caxias do Sul, no dia 13 de abril de 1904, pertencendo a esse município até 1926, quando foi incorporada ao novo município de Nova Trento, em Flores da Cunha.

Em 10 de novembro de 1991, a população de Nova Pádua decidiu se emancipar através de plebiscito. Sua criação como município foi decretada em 20 de março de 1992, pelo então governador Alceu Collares.

Localizada na Serra Gaúcha, Nova Pádua se orgulha de manter seus 2.557 habitantes (população estimada pelo IBGE em 2015) em harmonia com o trabalho e a natureza, marcas fortes do município. Com clima definido, as quatro estações do ano proporcionam farta produção agrícola, o que eleva a cidade como referência de hortifrutigranjeiros.

Nova Pádua

Sua economia é baseada na agricultura familiar, com destaque para o cultivo da uva, pêssego, maçã, cebola, alho e a criação de aves. A força do trabalho presente nas pequenas e grandes propriedades rurais gera uma atmosfera em que se visualiza crescimento e desenvolvimento.

O setor industrial ganha representatividade por meio das 27 vinícolas, que juntas produzem mais de 5,5 milhões de litros de vinho por ano. Aliada a isso tem a indústria moveleira, o comércio e as cooperativas, que empregam boa parte da mão-de-obra especializada.

Carménère

Originária de Bordeaux, na França, a Carménère foi uma das castas mais cultivadas até o começo do século XIX, principalmente nas regiões de Graves e Médoc. Contudo, na década de 1860, ela foi praticamente dizimada devido ao ataque do inseto chamado Filoxera, uma praga que devastou grande parte dos vinhedos da França e de outros países do continente europeu.

Filoxera

Durante muitos anos, acreditou-se que esta uva havia sido extinta e, só recentemente, nos anos 1990, reapareceu no Chile. Provavelmente a casta foi trazida para a América do Sul por imigrantes europeus, junto com outras variedades francesas, durante o século 19.

Em 1994, nos vales vinícolas chilenos, o enólogo francês Jean-Michel Boursiquot notou que algumas cepas de Merlot demoravam a atingir a maturidade e passou a estudá-las. Os resultados desses estudos identificaram que se tratava da “uva perdida de Bordeaux”, a Carménère, plantada no Chile como se fosse a uva Merlot.

Dessa época em diante, a casta passou a reinar em terras chilenas, sendo considerada como um verdadeiro presente da França para o país sul-americano. Apesar de não ser a uva tinta mais cultivada no país, ela é muito valorizada por ser quase uma “exclusividade” para o Chile.

Esta casta sobreviveu graças ao isolamento geográfico chileno. O país é cercado pela Cordilheira dos Andes a leste, do Pacífico a oeste, das areias do deserto de Atacama ao norte e das terras ermas da Antártica ao sul. As vinhas crescem com segurança, livres de pragas e de poluição. O Chile, por exemplo, nunca foi atacado pela praga Filoxera, responsável por dizimar a uva na França.

A origem do nome “Carménère” está relacionada à cor de sua pele, que exibe tonalidade forte de carmim, palavra francesa que, em português, significa um vermelho intenso. Essa coloração característica da uva é facilmente transferida para os vinhos elaborados com ela.

Os vinhos de Carménère apresentam uma combinação de aromas de frutas pretas e vermelhas maduras, terra molhada e pimenta preta. Em boca são suaves, com pouco tanino, baixa acidez e muito álcool. Veja outros aspectos do vinho em nossa seção de Análise Sensorial.

A Carménère precisa de certa atenção. Se não colhida na época exata, origina vinhos ásperos, com pouca expressão frutada e um herbáceo excessivo. A pirazina, substância existente na casca da uva, não completa seu processo químico e deixa aroma de pimentão no vinho. Isso também acontece muito com a Cabernet Sauvignon. 

E agora finalmente o vinho!

Na taça revela um rubi intenso, escuro e fechado, com alguma viscosidade que mancha o bojo, com lágrimas finas, lentas e em profusão.

No nariz não apresenta uma exuberância aromática, mas se mostra complexo, com uma bela combinação de frutas vermelhas e pretas bem maduras, em compota, com notas amadeiradas bem delicadas, graças aos 12 meses em barricas de carvalho, com toques de baunilha, leve tostado e chocolate. Traz especiarias, herbáceo, pimentão discreto, além de couro, tabaco, carpete e algo de terra molhada.

Na boca é elegante, macio, saboroso, o protagonismo das frutas, percebidos no olfato, entregam no paladar, com a madeira também evidente, mas muito discreta. Traz chocolate, tostado, baunilha, taninos amáveis, domados, com acidez baixa, típico da cepa, mostrando uma incrível qualidade no que tange a sua tipicidade. Tem um final de média persistência, de retrogosto frutado.

Com cinco anos de garrafa, está no ápice de sua condição: um vinho frutado, frutas maduras em compota, acidez saborosa, salivante e vivaz, com taninos presentes, mas macios e domados. Assim é o vinho: equilibrado, pois revela elegância, mas com austeridade e personalidade. O Brasil ainda está longe da produção da Carménère, mas não tenho dúvidas que a Serra Gaúcha se revelará forte na produção da casta em seu terroir. Espero que possa degustar um novo Carménère da Serra Gaúcha, do Brasil. Tem 13,1% de teor alcoólico.

Sobre a Vinhos Fabian:

A família imigrou da Itália para o Brasil no final do século dezenove. A tradição vitivinícola herdada dos ancestrais foi favorecida pelo clima encontrado na região dos Vinhos dos Altos Montes, no município de Nova Pádua, na Serra Gaúcha.

A localização entre colinas de 780m de altitude proporciona amplitude térmica, fator relacionado a uma boa formação de componentes que determinam a qualidade do vinho. A paixão pela produção de uvas e vinhos, fez com que a família elaborasse no ano de 1985, a primeira safra da vinícola.

A vinícola investe em tanques de aço inox, barricas de carvalho e equipamentos italianos. Aplica uma enologia moderna com o objetivo de extrair ao máximo as virtudes de cada variedade de uva a vinificar. A ascendência francesa traz consigo o símbolo da flor-de-lis que caracteriza a marca Fabian.

Mais informações acesse:

https://vinhosfabian.com.br/index.html

Referências:

“Academia do Vinho”: https://www.academiadovinho.com.br/__mod_regiao.php?reg_num=SERRAGAUCHA

“Prefeitura de Nova Pádua”: https://www.novapadua.rs.gov.br/secao.php?pagina=1

“Reserva 85”: https://reserva85.com.br/vinho/castas-uva-vitis-vinifera/carmenere/

“Vinho Blog”: http://blog.vinhosite.com.br/uva-carmenere-conheca-sobre-os-vinhos/