Definitivamente os eventos de degustações são essenciais, não
pelas degustações somente, embora seja o cerne da coisa, mas também para que
conheçamos novos rótulos, novas regiões, novos terroirs, castas e também ter
contatos com pessoas que comungam do seu mesmo prazer: pelo vinho!
Eu já estava com saudades! Desde 2020 eu não frequentava
eventos como esses. O caos sanitário, que ocasionou essa pandemia, reduziu
drasticamente esses eventos e para quem degusta vinhos, realmente ficou um
tanto quanto órfão de eventos como esse.
Mas com a iniciativa de uma nova loja de vinhos que chegou à
minha cidade, em Niterói, tive o prazer e a alegria de participar de um novo
evento de degustação e que descobri quase que por acaso, acessando as redes
sociais da loja. Tomado por uma animação que não sentia a tempos, logo fui
buscar informações sobre o evento e sobre os rótulos que seriam expostos para
degustação: A Vinícola Hermann. Esse produtor tem sede em Blumenau, Santa
Catarina, mas que tem alguns hectares no Rio Grande do Sul.
Não os conhecia e isso já foi uma porta de entrada para a
minha animação! Iria degustar rótulos de uma nova vinícola para mim e melhor:
os vinhos expostos vieram de uma região que é ainda nova para os enófilos
brasileiros: Serra do Sudeste!
Ah! Tudo estava conspirando a meu favor! Novos rótulos, um
novo terroir, vinhos brasileiros, novo evento de degustação em dois anos! E
falando neste evento da degustação dos vinhos da Vinícola Hermann, em que a
resenha pode ser lida por aqui, contava com cerca de 6 rótulos, em tese pouco,
mas digo que a qualidade foi significativa, enorme. Vinhos estupendos de uma
região que tem tudo, a meu ver, diante dessa amostragem dos vinhos da Hermann,
para ser uma vitrine vitivinícola deste país.
Escolhi três rótulos e os trouxe comigo! Um deles abrirei
para recepcionar meu bom amigo e hoje confrade, Paulo Rodrigues, que para mim
fora um dos melhores daquela noite agradável, aprazível de degustações desta
vinícola. E ainda tinha mais: o vinho é da safra 2013! Um vinho com seus 9 anos
de safra! Era tudo que eu queria! Tantos predicados que corroborou a qualidade
deste vinho!
Então sem mais delongas o vinho que degustei e gostei veio da
região Serra do Sudeste, no Rio Grande do Sul, e se chama Matiz Plural e ainda
traz um blend inusitado e que fez com que o vinho brilhasse, são eles: Aragonez,
Cabernet Sauvignon, Merlot, Touriga Nacional e Cabernet Franc e a safra é 2013.
E esse blend traz a Aragonez, a Tempranillo como é chamada na região portuguesa
do Alentejo e tem uma razão.
O projeto da Hermann trouxe um dos caras mais importantes
atualmente da enologia lusitana, o Anselmo Mendes, considerado como o “pai da
Alvarinho”, que trouxe um pouco da identidade do seu país para agregar ao
terroir da Serra do Sudeste. E falando nessa região, vamos, claro, gerar
algumas linhas de sua história relativamente recente na viticultura nacional.
Serra do Sudeste
Nossa mais famosa região vinícola é, sem dúvida alguma, a
Serra Gaúcha, da qual faz parte a primeira área de Indicação de Procedência
brasileira, o Vale dos Vinhedos. De dentro para fora, sabemos que o Vale está
chegando ao seu limite de plantio. Como área de procedência certificada, as
regras que controlam sua existência são rígidas e hoje sobram poucas terras de
qualidade às vinícolas para que plantem suas uvas. Ele não deixa de ser, no
entanto, o polo para onde convergem as atrações turísticas e as grandes
instalações produtoras das vinícolas, incluindo suas adegas.
Os outros municípios que compõem a região da Serra Gaúcha vêm
se desenvolvendo com constância como Garibaldi, Flores da Cunha e Farroupilha.
Mas algumas novidades interessantes estão aparecendo em cidades a noroeste de
Bento Gonçalves, como Guaporé, na linha Pinheiro Machado e Casca, na direção de
Passo Fundo.
Mas tem uma região que, apesar de ter sido descoberta na
década de 1970, pode-se considerar que se trata de uma região nova, pois
somente a partir dos anos 2000, com investimentos feitos pelas vinícolas da
Serra Gaúcha, que o potencial dela foi, de fato, explorado. Essa região é a
Serra do Sudeste.
Ela forma uma espécie de ferradura virada para o mar, ligando
os municípios de Encruzilhada do Sul e Pinheiro Machado, separados ao meio pelo
rio Camaquã, que deságua na Lagoa dos Patos. Essa região faz divisa com outra importante
área vinícola brasileira, a Campanha Gaúcha, dividida entre Campanha Meridional
(que começa na cidade de Candiota) e Campanha Oriental, que segue a linha da
fronteira com o Uruguai.
A Serra do Sudeste tem colinas suaves, que facilitam o plantio
e a mecanização, tornando-a um terroir mais simples de trabalhar. Aliadas a
isso, estão as condições climáticas, mais favoráveis do que no Vale dos
Vinhedos. Essa região tem o menor índice de chuvas do Estado do Rio Grande do
Sul, além de noites frias mesmo no verão, justamente a época da maturação das
uvas. Essas condições naturais, além de um solo mais pobre e de origem
granítica, ajudam a ter maior concentração de cor, estrutura e potencial de
envelhecimento dos vinhos.
O Instituto de Pesquisa Agrícola do Rio Grande do Sul mapeou
pela primeira vez esta área nos anos 1970, mas é no começo da década de 2000
que as primeiras vinícolas de certa importância começam a plantar vinhedos por
aqui, entre os municípios de Encruzilhada do Sul, o principal, Pinheiro Machado
e Candiota (mesmo próxima de Bagé Candiota é considerada pelo IBGE como
pertencente à Serra do Sudeste e não à Campanha, embora haja controvérsias).
Em grande parte se trata de uma região vitícola, geralmente
as uvas aqui colhidas são conduzidas nas instalações das vinícolas na Serra
Gaúcha e lá transformadas em vinho, esta região ainda não possui, e nem
pleiteia em curto prazo, o reconhecimento a Denominação de Origem Controlada,
quando, e se, isso ocorrer o vinho deverá ser produzido por aqui, já que este é
um fator crucial na lei das denominações de origem.
As castas internacionais dominam a viticultura na Serra do
Sudeste, tintas e brancas que na Serra Gaúcha podem representar um desafio pelo
clima úmido, aqui prosperam com mais facilidade, o índice pluviométrico é
alinhado com o estado do Rio Grande do Sul, chove um pouco menos que no Vale
dos Vinhedos, mas o que mais importa é que as chuvas são mais bem distribuídas
ao longo do ano, raramente coincidindo com o período da colheita das variedades
tardias.
A característica dos vinhos daqui é o bom nível de aromas, a
sapidez pronunciada por conta da presença do calcário e o perfil gastronômico,
boa acidez, taninos enxutos nos tintos e presença mineral nos brancos. Uvas
mais cultivadas na região são: Malbec, Cabernet Franc, Merlot, Gewurztraminer,
Sauvignon Blanc e Malvasia.
Se é verdade que a Serra do Sudeste não possui o panorama
encantador da Serra Gaúcha, é também verdade que seus vinhos representam um
patrimônio da vitivinicultura brasileira que merece ser descoberto, e sem
demora.
E agora finalmente o vinho!
Na taça revela um lindo vermelho rubi intenso com tons
violáceos e no seu entorno mostra uma cor atijolada discreta denunciando os
seus 9 anos de safra e lágrimas finas e abundantes.
No nariz traz notas de frutas negras maduras com cereja
negra, ameixa e amora, especiarias são sentidas, algo de pimenta, diria, com
toques de terra molhada, baunilha, madeira.
Na boca é complexo, estruturado, mas se mostra elegante,
macio graças ao seu tempo de safra, mostrando-se ainda com uma ótima capacidade
de evolução, tendo ainda bom volume de boca e um álcool proeminente, mas sem
agredir. Tosta, couro, terra, café, chocolate e madeira são percebidas graças
aos 15 meses de passagem por barricas de carvalho, com taninos presentes, mas
domados e acidez correta. Final prolongado.
Um vinho que mesmo com os seus 9 anos de vida ainda estava
pleno, vivo e intenso e que poderia evoluir mais e mais. Uma região nova que
sem dúvida poderá nos brindar com muita tipicidade, expressividade e qualidade.
Sim os vinhos brasileiros têm potencial de guarda, têm complexidade, têm
relevância e têm a cara do vinho brasileiro, sem cópias e comparações com o
Velho Mundo. O Matiz representa a elegância, a complexidade, a arrojo que todo
vinho com a sua proposta pode entregar: Frutas negras maduras, especiarias,
álcool em evidência, mas sem agredir, mas que entrega personalidade, as notas
terrosas, da madeira, do tostado, da baunilha. Todos os predicados de um vinho
com a complexidade que a proposta deve entregar. Tem 13% de teor alcoólico.
Sobre a Vinícola Hermann:
A família Hermann trouxe todo o seu know-how de profundos
conhecedores de diversas regiões vinícolas do mundo para a esfera da produção
de vinhos, apostando no potencial dos melhores terroirs da região sul do
Brasil. Proprietários de uma das maiores importadoras de vinhos de alta
qualidade do país, a Decanter, compraram em 2009 um vinhedo de grande vocação
em Pinheiro Machado, na Serra do Sudeste no Rio Grande do Sul, plantado com
mudas de alta qualidade por um dos viveiros líderes de Portugal.
A assessoria enológica de um dos mais brilhantes enólogos de
Portugal, o renomado “rei do Alvarinho” Anselmo Mendes - “Enólogo do Ano” pela
Revista de Vinhos de Portugal em 1997 - ao lado do talentoso enólogo Átila
Zavarizze, garante a excelência na transformação das uvas promissoras em
grandes vinhos brasileiros, com caráter e tipicidade.
Mais informações acesse:
http://www.vinicolahermann.com.br/
Referências:
“Marco Ferrari Sommelier”: https://www.marcoferrarisommelier.com.br/blog.php?BlogId=33
“Cave BR”: https://www.cavebr.com.br/serra-do-sudeste-1
“Revista Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/a-nova-fronteira-sul_8619.html
“intelivino”: https://intelivino.com.br/serra-do-sudeste
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