terça-feira, 1 de março de 2022

Matiz Plural 2013

 

Definitivamente os eventos de degustações são essenciais, não pelas degustações somente, embora seja o cerne da coisa, mas também para que conheçamos novos rótulos, novas regiões, novos terroirs, castas e também ter contatos com pessoas que comungam do seu mesmo prazer: pelo vinho!

Eu já estava com saudades! Desde 2020 eu não frequentava eventos como esses. O caos sanitário, que ocasionou essa pandemia, reduziu drasticamente esses eventos e para quem degusta vinhos, realmente ficou um tanto quanto órfão de eventos como esse.

Mas com a iniciativa de uma nova loja de vinhos que chegou à minha cidade, em Niterói, tive o prazer e a alegria de participar de um novo evento de degustação e que descobri quase que por acaso, acessando as redes sociais da loja. Tomado por uma animação que não sentia a tempos, logo fui buscar informações sobre o evento e sobre os rótulos que seriam expostos para degustação: A Vinícola Hermann. Esse produtor tem sede em Blumenau, Santa Catarina, mas que tem alguns hectares no Rio Grande do Sul.

Não os conhecia e isso já foi uma porta de entrada para a minha animação! Iria degustar rótulos de uma nova vinícola para mim e melhor: os vinhos expostos vieram de uma região que é ainda nova para os enófilos brasileiros: Serra do Sudeste!

Ah! Tudo estava conspirando a meu favor! Novos rótulos, um novo terroir, vinhos brasileiros, novo evento de degustação em dois anos! E falando neste evento da degustação dos vinhos da Vinícola Hermann, em que a resenha pode ser lida por aqui, contava com cerca de 6 rótulos, em tese pouco, mas digo que a qualidade foi significativa, enorme. Vinhos estupendos de uma região que tem tudo, a meu ver, diante dessa amostragem dos vinhos da Hermann, para ser uma vitrine vitivinícola deste país.

Escolhi três rótulos e os trouxe comigo! Um deles abrirei para recepcionar meu bom amigo e hoje confrade, Paulo Rodrigues, que para mim fora um dos melhores daquela noite agradável, aprazível de degustações desta vinícola. E ainda tinha mais: o vinho é da safra 2013! Um vinho com seus 9 anos de safra! Era tudo que eu queria! Tantos predicados que corroborou a qualidade deste vinho!

Então sem mais delongas o vinho que degustei e gostei veio da região Serra do Sudeste, no Rio Grande do Sul, e se chama Matiz Plural e ainda traz um blend inusitado e que fez com que o vinho brilhasse, são eles: Aragonez, Cabernet Sauvignon, Merlot, Touriga Nacional e Cabernet Franc e a safra é 2013. E esse blend traz a Aragonez, a Tempranillo como é chamada na região portuguesa do Alentejo e tem uma razão.

O projeto da Hermann trouxe um dos caras mais importantes atualmente da enologia lusitana, o Anselmo Mendes, considerado como o “pai da Alvarinho”, que trouxe um pouco da identidade do seu país para agregar ao terroir da Serra do Sudeste. E falando nessa região, vamos, claro, gerar algumas linhas de sua história relativamente recente na viticultura nacional.

Serra do Sudeste

Nossa mais famosa região vinícola é, sem dúvida alguma, a Serra Gaúcha, da qual faz parte a primeira área de Indicação de Procedência brasileira, o Vale dos Vinhedos. De dentro para fora, sabemos que o Vale está chegando ao seu limite de plantio. Como área de procedência certificada, as regras que controlam sua existência são rígidas e hoje sobram poucas terras de qualidade às vinícolas para que plantem suas uvas. Ele não deixa de ser, no entanto, o polo para onde convergem as atrações turísticas e as grandes instalações produtoras das vinícolas, incluindo suas adegas.

Os outros municípios que compõem a região da Serra Gaúcha vêm se desenvolvendo com constância como Garibaldi, Flores da Cunha e Farroupilha. Mas algumas novidades interessantes estão aparecendo em cidades a noroeste de Bento Gonçalves, como Guaporé, na linha Pinheiro Machado e Casca, na direção de Passo Fundo.

Mas tem uma região que, apesar de ter sido descoberta na década de 1970, pode-se considerar que se trata de uma região nova, pois somente a partir dos anos 2000, com investimentos feitos pelas vinícolas da Serra Gaúcha, que o potencial dela foi, de fato, explorado. Essa região é a Serra do Sudeste.

Ela forma uma espécie de ferradura virada para o mar, ligando os municípios de Encruzilhada do Sul e Pinheiro Machado, separados ao meio pelo rio Camaquã, que deságua na Lagoa dos Patos. Essa região faz divisa com outra importante área vinícola brasileira, a Campanha Gaúcha, dividida entre Campanha Meridional (que começa na cidade de Candiota) e Campanha Oriental, que segue a linha da fronteira com o Uruguai.


A Serra do Sudeste tem colinas suaves, que facilitam o plantio e a mecanização, tornando-a um terroir mais simples de trabalhar. Aliadas a isso, estão as condições climáticas, mais favoráveis do que no Vale dos Vinhedos. Essa região tem o menor índice de chuvas do Estado do Rio Grande do Sul, além de noites frias mesmo no verão, justamente a época da maturação das uvas. Essas condições naturais, além de um solo mais pobre e de origem granítica, ajudam a ter maior concentração de cor, estrutura e potencial de envelhecimento dos vinhos.

O Instituto de Pesquisa Agrícola do Rio Grande do Sul mapeou pela primeira vez esta área nos anos 1970, mas é no começo da década de 2000 que as primeiras vinícolas de certa importância começam a plantar vinhedos por aqui, entre os municípios de Encruzilhada do Sul, o principal, Pinheiro Machado e Candiota (mesmo próxima de Bagé Candiota é considerada pelo IBGE como pertencente à Serra do Sudeste e não à Campanha, embora haja controvérsias).

Em grande parte se trata de uma região vitícola, geralmente as uvas aqui colhidas são conduzidas nas instalações das vinícolas na Serra Gaúcha e lá transformadas em vinho, esta região ainda não possui, e nem pleiteia em curto prazo, o reconhecimento a Denominação de Origem Controlada, quando, e se, isso ocorrer o vinho deverá ser produzido por aqui, já que este é um fator crucial na lei das denominações de origem.

As castas internacionais dominam a viticultura na Serra do Sudeste, tintas e brancas que na Serra Gaúcha podem representar um desafio pelo clima úmido, aqui prosperam com mais facilidade, o índice pluviométrico é alinhado com o estado do Rio Grande do Sul, chove um pouco menos que no Vale dos Vinhedos, mas o que mais importa é que as chuvas são mais bem distribuídas ao longo do ano, raramente coincidindo com o período da colheita das variedades tardias.

A característica dos vinhos daqui é o bom nível de aromas, a sapidez pronunciada por conta da presença do calcário e o perfil gastronômico, boa acidez, taninos enxutos nos tintos e presença mineral nos brancos. Uvas mais cultivadas na região são: Malbec, Cabernet Franc, Merlot, Gewurztraminer, Sauvignon Blanc e Malvasia.

Se é verdade que a Serra do Sudeste não possui o panorama encantador da Serra Gaúcha, é também verdade que seus vinhos representam um patrimônio da vitivinicultura brasileira que merece ser descoberto, e sem demora.

E agora finalmente o vinho!

Na taça revela um lindo vermelho rubi intenso com tons violáceos e no seu entorno mostra uma cor atijolada discreta denunciando os seus 9 anos de safra e lágrimas finas e abundantes.

No nariz traz notas de frutas negras maduras com cereja negra, ameixa e amora, especiarias são sentidas, algo de pimenta, diria, com toques de terra molhada, baunilha, madeira.

Na boca é complexo, estruturado, mas se mostra elegante, macio graças ao seu tempo de safra, mostrando-se ainda com uma ótima capacidade de evolução, tendo ainda bom volume de boca e um álcool proeminente, mas sem agredir. Tosta, couro, terra, café, chocolate e madeira são percebidas graças aos 15 meses de passagem por barricas de carvalho, com taninos presentes, mas domados e acidez correta. Final prolongado.

Um vinho que mesmo com os seus 9 anos de vida ainda estava pleno, vivo e intenso e que poderia evoluir mais e mais. Uma região nova que sem dúvida poderá nos brindar com muita tipicidade, expressividade e qualidade. Sim os vinhos brasileiros têm potencial de guarda, têm complexidade, têm relevância e têm a cara do vinho brasileiro, sem cópias e comparações com o Velho Mundo. O Matiz representa a elegância, a complexidade, a arrojo que todo vinho com a sua proposta pode entregar: Frutas negras maduras, especiarias, álcool em evidência, mas sem agredir, mas que entrega personalidade, as notas terrosas, da madeira, do tostado, da baunilha. Todos os predicados de um vinho com a complexidade que a proposta deve entregar. Tem 13% de teor alcoólico.

Sobre a Vinícola Hermann:

A família Hermann trouxe todo o seu know-how de profundos conhecedores de diversas regiões vinícolas do mundo para a esfera da produção de vinhos, apostando no potencial dos melhores terroirs da região sul do Brasil. Proprietários de uma das maiores importadoras de vinhos de alta qualidade do país, a Decanter, compraram em 2009 um vinhedo de grande vocação em Pinheiro Machado, na Serra do Sudeste no Rio Grande do Sul, plantado com mudas de alta qualidade por um dos viveiros líderes de Portugal.

A assessoria enológica de um dos mais brilhantes enólogos de Portugal, o renomado “rei do Alvarinho” Anselmo Mendes - “Enólogo do Ano” pela Revista de Vinhos de Portugal em 1997 - ao lado do talentoso enólogo Átila Zavarizze, garante a excelência na transformação das uvas promissoras em grandes vinhos brasileiros, com caráter e tipicidade.

Mais informações acesse:

http://www.vinicolahermann.com.br/

Referências:

“Marco Ferrari Sommelier”: https://www.marcoferrarisommelier.com.br/blog.php?BlogId=33

“Cave BR”: https://www.cavebr.com.br/serra-do-sudeste-1

“Revista Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/a-nova-fronteira-sul_8619.html

“intelivino”: https://intelivino.com.br/serra-do-sudeste

 

 








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