Definitivamente degustar os vinhos com apelo regional é
especial. Regional na verdadeira concepção da palavra, as castas locais,
produtores locais, é uma ode à região e todas as suas nuances culturais, do que
a terra e todas as suas propriedades geológicas e naturais podem oferecer. O
terroir na sua expressão mais genuína e mais simples possível, pois, a partir do
ato da degustação conseguimos entender as características mais marcantes dos
vinhos produzidos em determinadas regiões.
Esse vinho sintetiza com fidelidade a rica e emblemática do Alentejo, em Portugal. Como que um lugar tão pequeno em termos geográficos, oferecer uma gama tão rica de vinhos nas suas mais diversas propostas, sejam eles vinhos brancos, tintos, complexos, jovens, encorpados, leves etc. E, devido a essa diversidade me tornei um grande fã dos vinhos alentejanos. Foram eles que abriram a janela para um mundo lusitano de vinhos diante dos meus olhos. Impossível não esquecer os meus primeiros rótulos portugueses oriundo dessa abençoada terra alentejana e, com as minhas experiências sensoriais com essa região, personificada com seus belos rótulos, descobri os brancos, confesso um pouco tardiamente, do Alentejo. E que vinhos maravilhosos e especiais!
E mais especial ainda que o rótulo por mim escolhido veio das
mãos, cruzando o atlântico, direto de Portugal, por um bom amigo português. É
um presente ter um amigo que aprecia bons vinhos e que se lembra de nós, pobres
mortais enófilos aqui em terras brasileiras. A viagem foi garantida em todas as
suas formas de interpretação: tanto no sentido literal da palavra quanto no
sentido da experiência sensorial.
Ah amigos leitores, o vinho que degustei e gostei, como orgulhosamente disse, veio do Alentejo, na região da Vidigueira, é um branco, e se chama Vila de Frades, um blned composto pelas castas autóctones, tipicamente do Alentejo chamadas Antão Vaz (50%), Manteúdo (25%) e Roupeiro (25%) da safra 2018. E como não podemos negligenciar a história, falemos um pouco da região da Vidigueira e Vila de Frades e também dessas castas que, embora não sejam globais, se fazem significativas dentro de sua tradicional região do Alentejo.
Vidigueira e Vila de Frades
O topônimo “Vidigueira” é um derivado de “Vidigal” do latim “viticale”, cujo significado é “terreno
onde cresce o vitex”, o mesmo que agnocasto, uma espécie de arbusto aromático. A
existência desta povoação está documentada somente a partir do séc. XIII. No
entanto, encontram-se registos de ocupação humana da região desde a
pré-história. Para além do património megalítico, merecem referência as
próximas villas romanas de São Cucufate e do Monte da Cegonha. Sem grande
importância estratégica na defesa do território, o desenvolvimento desta vila
foi essencialmente agrícola. Este facto é facilmente comprovado pela produção
de vinho, uma vez que a Vidigueira é também o nome de uma Região de Origem
Controlada. A sua fama vinícola já existia no séc. XV e no séc. XIX era a 7ª
região produtora. O nome da Vidigueira está também ligado à figura histórica do
Vasco da Gama, a quem D. Manuel I (1495-1521) concedeu o título de Conde da
Vidigueira, em 1519. A Casa da Vidigueira, fundada então, permaneceu na mesma
família até ao nosso século. Na torre do relógio da vila bate as horas um sino
com a Cruz de Cristo e as armas dos Gamas gravadas, e a inscrição da data:
1520. Evoca-se ainda, a cerca de 2 km de Vidigueira outra memória de Vasco da
Gama. Na capela-mor da igreja do convento de Nossa Senhora das Relíquias (já
muito alterado nas suas linhas originais) estiveram depositados os restos
mortais do descobridor do caminho marítimo para a Índia quando vieram de Cochim
em 1539, até serem trasladados para o Mosteiro dos Jerónimos em 1898.
Vidigueira é uma vila portuguesa pertencente ao Distrito de Beja, região Alentejo e sub-região Baixo Alentejo, com cerca de 3 000 habitantes. É sede de um município com 314,20 km² de área e 5.963 habitantes (2006), subdividido em 4 freguesias. O município é limitado a norte pelo município de Portel, a leste por Moura, a sueste por Serpa, a sul por Beja e a oeste por Cuba. No coração do Alentejo, fica o concelho da Vidigueira, o quarto menor do Baixo Alentejo. Este pequeno concelho está delimitado pela Serra do Mendro a norte, o rio Guadiana a leste e a planície que se estende até perder de vista para sul. É nesta harmonia entre serra, planície e rio que assenta a riqueza das terras, onde proliferam as hortas, laranjais, vinhas, olivais e os campos de cereais.
A economia da freguesia assenta na agropecuária, sendo de
salientar que as culturas predominantes são a da vinha e a da oliveira, cujo
produto ao longo dos tempos adquiriu notoriedade a nível nacional. A caça é
atualmente um fator económico importante; assim como a silvicultura e a
indústria alimentar, destacando-se, ainda, o papel da Administração Local. No
artesanato predominam os bonecos em barro, em madeira e de trapos, destinados a
decoração. A região de Vila de Frades, que dá nome ao vinho, é uma vila
portuguesa sede da freguesia homónima de Vila de Frades do município de
Vidigueira, na região do Alentejo. Inserida na paróquia de São Cucufate,
instituída em 1255, a povoação que surgiu nesse local pertencente aos frades de
São Vicente de Fora tomou, logicamente, o nome de Vila de Frades (Detalhes
sobre a região disponível no link: https://pt.wikipedia.org/wiki/Vila_de_Frades).
Até 1854 foi sede de concelho. Na sequência de uma Reforma
Administrativa no século XIX, Vila de Frades foi integrada na Vidigueira,
passando a ser uma freguesia deste Município.
As castas típicas do Alentejo
Antão Vaz
Pouco se sabe sobre as origens da casta Antão Vaz, mas
curiosamente era este o nome do avô de Luís Vaz de Camões, poeta que celebrou
em “Os Lusíadas” os descobrimentos e a viagem de Vasco da Gama de Portugal à
Índia. Apesar da aura misteriosa que a rodeia, uma coisa se conhece: a sua
filiação alentejana. E também que viajou pouco. Fora do seu Alentejo natal,
apenas a Península de Setúbal a planta com alguma expressão, e não se encontram
sinonímias para ela noutras regiões – como acontece com tantas outras castas –,
comprovando-se assim a sua falta de apetência emigrante. Consensual, amada
igualmente por viticultores e enólogos, a Antão Vaz é indiscutivelmente o
“ex-libris” das castas brancas alentejanas, o orgulho e alma dos produtores
locais. Particularmente bem adaptada ao clima soalheiro da grande planície,
apresenta excelente resistência à seca e doença. Mais: é consistente,
produtiva, e amadurece de forma homogénea. Tudo condições mais do que
suficientes para a tornar incontornável no cenário dos vinhos brancos
alentejanos. Por regra, dá origem a vinhos estruturados, firmes e encorpados,
embora por vezes lhe falte acidez refrescante e revigorante. Daí a associação
comum com as castas Roupeiro e Arinto, que contribuem com uma acidez mais viva.
Se vindimada cedo, pode dar origem a vinhos vibrantes no aroma e a acidez
firme; se deixada na vinha, pode atingir grau alcoólico elevado e aromas
fragrantes, o que a torna boa candidata ao estágio em madeira. Os vinhos feitos
com a Antão Vaz apresentam por regra aromas exuberantes, apresentando-se
estruturados e densos no corpo.
Roupeiro
Roupeiro é uma das castas brancas mais utilizadas no
Alentejo. Noutras regiões tem o nome de Síria ou Códega. Casta de uva branca
muito utilizada em Portugal é recomendada nas regiões da Beira Interior com o
nome de Codo ou Síria, no Douro com o nome de Códega e em todo o Alentejo com o
nome de Roupeiro. Produz vinho com aromas primários muito interessantes a flor
e a fruto, mas é sensível à oxidação e o seu vinho deve ser consumido nos anos
imediatamente seguintes à colheita. Em geral, produz vinhos básicos para serem
consumidos jovens, mostrando aromas de frutas cítricas e de caroço, além de
notas florais. Quando bem feito, seu vinho apresenta aromas perfumados de
frutas cítricas, pêssego, melão, loureiro e flores silvestres. Entretanto,
perde rapidamente estes aromas, tornando-se bastante neutra após alguns meses
em garrafa. Pode também oxidar rapidamente, sendo uma opção para vinhos jovens,
de grande saída. Outros sinônimos: Síria, Malvasia Grossa, Dona Branca, Códega
etc.
Manteúdo
Pouco se tem de informação sobre a casta Manteúdo, mas apenas
se sabe, de acordo com sites e portais pela internet, é de que a mesma é
produzida na região de Algarve.
E finalmente o vinho!
Na taça revela um lindo amarelo ouro, com brilhantes reflexos
esverdeados, com alguma concentração de lágrimas finas e que demora um pouco a
se dissipar, mostrando a sua personalidade.
No nariz a explosão de aromas frutados sobressai, frutas
brancas, frutas tropicais e cítricas, suscitando em uma boa complexidade
aromática, corroborando a sua jovialidade e frescor.
Na boca é seco e com alguma estrutura e intensidade, revelando uma marcante personalidade, as notas frutadas são percebidas como no aspecto olfativo, com uma acidez equilibrada, um belo volume de boca, diria uma discreta untuosidade, fechando com grande persistência e um retrogosto frutado.
O apelo regional tem sido a base, o pilar de minhas novas
experiências sensoriais e, por mais que teoricamente os vinhos regionais possam
limitar-se, geograficamente falando, aos seus domínios, as suas cercas
territoriais, se revelam grandiosos e significativos na sua relevância para um
simples enófilo como eu, cujo garimpo não se limita ao agradável ato da
degustação, mas ao processo cognitivo cultural em conhecer as identidades mais
relevantes de uma cultura de um povo que construiu ao longo dos anos, dos
séculos, sua história vinícola, com terroirs tão ricos e complexos. Um vinho de
personalidade, expressivo, jovial, fresco, que entrega a versatilidade de uma
rica região como o Alentejo. Que o regional globalize os seus mais intensos e
gloriosos feitos para que todos, sem exceção, todos os enófilos, possam
usufruir de toda essa experiência sensorial. Tem 13% de teor alcoólico.
Sobre a Adega Cooperativa Vidigueira, Cuba e Alvito
A Adega Cooperativa de Vidigueira, Cuba e Alvito foi fundada
em 1960, mas a sua cronologia vai muito para além dos seus 60 anos de
existência. Foi criada para proteger a vinha, o vinho e o estilo de vida
milenar desta sub-região de vinhos e aportar ainda mais renome e qualidade ao
vinho aqui produzido.
Ao longo dos anos, um intenso esforço tem-se vindo a fazer
para proteger as castas e as técnicas de produção, pelo que, no património
vitícola da Adega descobrem-se castas autóctones, aperfeiçoadas de geração em
geração, entre as quais sobressai a Antão Vaz. Esta casta legitimada como a
casta da Vidigueira e musa inspiradora da Adega, dá origem a um vinho branco
excecional cuja notoriedade lhe vale o título de “O Branco do Alentejo”.
Com uma produção aproximada de 8 milhões de garrafas de vinho
por ano, resultado da exploração de cerca de 1500 hectares de vinha dos seus
cerca de 300 sócios, é hoje uma moderna e proeminente adega. Nunca esquecendo
as suas origens, projeta-se para o futuro apoiada nas gentes e na qualidade do
terroir da sub-região de vinhos.
Mais informações acesse:
Referências:
“Wikipedia”: https://pt.wikipedia.org/wiki/Vila_de_Frades
“Clube dos Vinhos Portugueses”: https://www.clubevinhosportugueses.pt/turismo/roteiros/vinhos-da-sub-regiao-da-vidigueira-denominacao-de-origem-alentejo/
“Vinhos do Algarve”: https://www.vinhosdoalgarve.pt/pt/regiao/castas
“Revista de Vinhos”: https://www.revistadevinhos.pt/beber/antao-vaz
“Terras de Portugal”: http://www.terrasdeportugal.pt/vidigueira
“Freguesia Vidigueira”: https://www.freguesiavidigueira.pt/index.php/freguesia/historia
“Visit Portugal”: https://www.visitportugal.com/pt-pt/content/vidigueira#:~:text=XIX%20era%20a%207%C2%AA%20regi%C3%A3o,fam%C3%ADlia%20at%C3%A9%20ao%20nosso%20s%C3%A9culo.
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