sábado, 24 de abril de 2021

Salton Talento 2011

 

Já dizia aquele velho ditado, já manjado: Quem espera sempre alcança! Talvez esse conceito possa ser bem aplicado para os vinhos evoluídos, afinal, alguns atingem a sua maturidade, o seu grande momento, o seu brilho, com alguns anos de guarda. Mas há quem diga que isso pode ser subjetivo, haja vista que alguns vinhos depreciem com o tempo e neste caso podemos levar em consideração alguns fatores como a forma de armazenamento, por exemplo. Mas como esse é um assunto deveras complexo, não entrarei no mérito, não agora pelo menos, mas sim darei o protagonismo, é claro, ao rótulo, ao vinho, que é sempre o artista do espetáculo da degustação.

E esse vinho eu aguardei pacientemente. Como sou um apreciador dos vinhos evoluídos, decidi, quando o comprei, há cerca de dois anos, em degusta-lo quando completasse exatamente 10 anos de safra. Degustar vinhos assim, nessas condições, pode ser um risco, mas também uma honra, um momento único, com o vinho no seu momento mais apoteótico e especial. Fui tomado por um espírito de positividade e aguardei cada dia e cada hora para degusta-lo e, com isso, pergunto: Quem disse que vinhos brasileiros não tem potencial de guarda? O tempo, literalmente falando, dirá pela excelência dos rótulos nacionais! E diz, com veemência, com a sua qualidade, tipicidade e expressividade.

O vinho que degustei e gostei é tupiniquim, é brasileiro, é o Salton Talento composto pelas castas Cabernet Sauvignon (50%), Merlot (30%) e Tannat (20%) da safra 2011. As castas Cabernet Sauvignon e Tannat são oriundas da Campanha Gaúcha e o Merlot veio da Serra Gaúcha. Sim! Um vinho que explora a multiplicidade de duas regiões, de alguns terroirs, uma mescla de tipicidades. Sem contar que já degustei a safra de 2009, minha primeira experiência com esse rótulo.

Tudo conspirou para essa degustação: desde o primeiro contato nas gôndolas dos supermercados, com um preço na faixa dos R$ 50,00, um ótimo preço, até o derramar deste na minha taça. A vida, a longevidade conspira sempre a favor e, claro, falo do vinho! Mas antes de falar no néctar, vamos conhecer um pouco sobre as regiões de onde veio, emblemáticas regiões, diga-se de passagem: Vamos da Serra e Campanha Gaúcha.

Serra Gaúcha

Situada a nordeste do Rio Grande do Sul, a região da Serra Gaúcha é a grande estrela da vitivinicultura brasileira, destacando-se pelo volume e pela qualidade dos vinhos que produz. Para qualquer enófilo indo ao Rio Grande do Sul, é obrigatório visitar a Serra Gaúcha, especialmente Bento Gonçalves.

Serra Gaúcha

A região da Serra Gaúcha está situada em latitude próxima das condições geo-climáticas ideais para o melhor desenvolvimento de vinhedos, mas as chuvas costumam ser excessivas exatamente na época que antecede a colheita, período crucial à maturação das uvas. Quando as chuvas são reduzidas, surgem ótimas safras, como nos anos 1999, 2002, 2004, 2005 e 2006.

A partir de 2007, com o aquecimento global, o clima da Serra Gaúcha se transformou, surgindo verões mais quentes e secos, com resultados ótimos para a vinicultura, mas terríveis para a agricultura. Desde 2005 o nível de qualidade dos vinhos tintos vem subindo continuamente, graças a esta mudança e também do salto de tecnologia de vinhedos implantado a partir do ano 2000.

O Vale dos Vinhedos, importante região que fica situada na Serra Gaúcha, junto à cidade de Bento Gonçalves, caracteriza-se pela presença de descendentes de imigrantes italianos, pioneiros da vinicultura brasileira. Nessa região as temperaturas médias criam condições para uma vinicultura fina voltada para a qualidade. A evolução tecnológica das últimas décadas aplicada ao processo vitivinícola possibilitou a conquista de mercados mais exigentes e o reconhecimento dos vinhos do Vale dos Vinhedos. Assim, a evolução da vitivinicultura da região passou a ser a mais importante meta dos produtores do Vale.

O Vale dos Vinhedos é a primeira região vinícola do Brasil a obter Indicação de Procedência de seus produtos, exibindo o Selo de Controle em vinhos e espumantes elaborados pelas vinícolas associadas. Criada em 1995, a partir da união de seis vinícolas, a Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos (Aprovale), já surgiu com o propósito de alcançar uma Denominação de Origem. No entanto, era necessário seguir os passos da experiência, passando primeiro por uma Indicação de Procedência.

O pedido de reconhecimento geográfico encaminhado ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) em 1998 foi alcançado somente em 2001. Neste período, foi necessário firmar convênios operacionais para auxiliar no desenvolvimento de atividades que serviram como pré-requisitos para a conquista da Indicação de Procedência Vale dos Vinhedos (I.P.V.V.). O trabalho resultou no levantamento histórico, mapa geográfico e estudo da potencialidade do setor vitivinícola da região. Já existe uma DOC (Denominação de Origem Controlada) na região.

O Vale dos Vinhedos foi a primeira região entregue aos imigrantes italianos, a partir de 1875. Inicialmente desenvolveu-se ali uma agricultura de subsistência e produção de itens de consumo para o Rio Grande do Sul. Devido à tradição da região de origem das famílias imigrantes, o Veneto, logo se iniciaram plantios de uvas para produção de vinho para consumo local. Até a década de 80 do século XX, os produtores de uvas do Vale dos Vinhedos vendiam sua produção para grandes vinícolas da região. A pouca quantidade de vinho que produziam destinava-se ao consumo familiar.

Esta realidade mudou quando a comercialização de vinho entrou em queda e, consequentemente, o preço da uva desvalorizou. Os viticultores passaram então a utilizar sua produção para fazer seu vinho e comercializá-lo diretamente, tendo assim possibilidade de aumento nos lucros.

Para alcançar este objetivo e atender às exigências legais da Indicação Geográfica, seis vinícolas se associaram, criando, em 1995, a Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos (Aprovale). Atualmente, a Aprovale conta com 24 vinícolas associadas e 19 associados não produtores de vinho, entre hotéis, pousadas, restaurantes, fabricantes de produtos artesanais, queijarias, entre outros. As vinícolas do Vale dos Vinhedos produziram, em 2004 9,3 milhões de litros de vinhos finos e processaram 14,3 milhões de kg de uvas viníferas.

Campanha Gaúcha

Entre o encontro de rios como Rio Ibicuí e o Rio Quaraí, forma-se o do Rio Uruguai, divisa entre o Brasil, Argentina e Uruguai. Parte da Campanha Gaúcha também recebe corpo hídrico subterrâneo, o Aquífero Guarani representa a segunda maior fonte de água doce subterrânea do planeta, dele estando 157.600 km2 no Rio grande do Sul. A Campanha Gaúcha se espalha também pelo Uruguai e pela Argentina garante uma cumplicidade com os hermanos do outro lado do Rio Uruguai. Os costumes se assemelham e os elementos locais emprestam rusticidade original: o cabo de osso das facas, o couro nos tapetes, a tesoura de tosquia que ganha novas utilidades.

Campanha Gaúcha

No verão, entre os meses de dezembro a fevereiro, os dias ficam com iluminação solar extensa, contendo praticamente 15 horas diárias de insolação, o que colabora para a rápida maturação das uvas e também ajuda a garantir uma elevada concentração de açúcar, fundamental para a produção de vinhos finos de alta qualidade, complexos e intensos.

As condições climáticas são melhores que as da Serra Gaúcha e tem-se avançado na produção de uvas europeias e vinhos de qualidade. Com o bom clima local, o investimento em tecnologia e a vontade das empresas, a região hoje já produz vinhos de grande qualidade que vêm surpreendendo a vinicultura brasileira.

Há mais de 150 anos, antes mesmo da abolição da escravatura, a fronteira Oeste do Rio Grande do Sul já produzia vinhos de mesa que eram exportados para os países do Prata (Uruguai, Argentina e Paraguai) e vendidos no Brasil.

A primeira vinícola registrada do Brasil ficava na Campanha Gaúcha. Com paredes de barro e telhado de palha, fundada por José Marimon, a vinícola J. Marimon & Filhos iniciou o plantio de seus vinhedos em 1882, na Quinta do Seival, onde hoje fica o município de Candiota.

E o mais interessante é que, desde o início da elaboração de vinhos na região, os vinhos da Campanha Gaúcha comprovam sua qualidade recebendo medalha de ouro, conforme um artigo de fevereiro de 1923, do extinto jornal Correio do Sul de Bagé.

E agora finalmente o vinho!

Na taça apresenta um vermelho rubi intenso e escuro, mas mostrando uma tonalidade meio atijolada nas bordas, em seu entorno, revelando a sua idade, o auge dos seus dez anos de vida, com lágrimas finas e abundantes marcando nas paredes do copo.

No nariz entrega aromas, ainda evidentes e intensos, de frutas negras e em compota, tais como ameixa, cereja e amora, com notas de torrefação, café, tabaco e especiarias e toque amadeirado em evidência, graças aos 12 meses de passagem por barricas de carvalho, mais 12 meses afinando em caves subterrâneas da vinícola.

Na boca é elegante, equilibrado, excelente estrutura mostrando marcante personalidade, as frutas negras, como no aspecto olfativo, se mostra agradavelmente no paladar, com taninos presentes, mas domados e sutis, com uma acidez ainda vivaz, o que faz do vinho pleno aos 10 anos de idade. Tudo isso harmonizando maravilhosamente com o toque amadeirado, muito bem integrado aos taninos, a acidez e o álcool, além do tabaco, do toque de pimentão e de couro. Final persistente e prolongado.

O tempo dirá! Mais um ditado popular que se adequou maravilhosamente ao Salton Talento. A vida, plena e intensa, pulsava dentro da garrafa, ansiosa por sair e explodir as minhas impressões sensoriais, inundar a minha taça do mais puro néctar, da poesia líquida que, a cada degustação, me arrebatou por inteiro. O tempo disse, o vinho se expressou maduro, intenso, a personalidade marcante, mostrou também delicadeza, elegância. A noção de terroir, de tipicidade estava evidente a cada degustação e que, graças a sua complexidade, aguça, ainda mais, o enófilo a explorar ainda mais o seu paladar. A honra e o prazer são evidentes, a sensação é indescritível, o ritual se faz necessário, todos os componentes de uma degustação, embora simples e direta, se mostra maravilhosa e singular. Senti-me tão pequeno, tão feliz, tão vivo! Tem 13,5% de teor alcoólico.

Sobre a Vinícola Salton:

Antônio Domenico Salton veio para o Brasil em 1878 e junto com seus filhos fundou em 1910 a vinícola que é reconhecida por ser a maior produtora brasileira de espumantes e top 3 entre as produtoras de vinho no Brasil!

Nos anos 1980 o forte da empresa era a produção e venda de conhaque. O vinho deixava a desejar e para mudar essa realidade foi contratado o enólogo Lucindo Copat, um dos fundadores da Vinícola Aurora. Novos equipamentos foram comprados e a produção foi modernizada.

Outro marco foi a criação em 1995 do projeto que resultaria em 2002 no Salton Talento e na nova unidade no distrito de Tuiuty, que trouxe tecnologia de ponta para a empresa. No ano de 2019 a empresa inaugurou a bela Enoteca Salton na capital paulista. Local que mais do que pronto para a compra de vinhos, serve como um ponto para degustar os sabores que a Salton tem.

Fundadores da Vinícola Salton

Na extensa lista de conquistas destes mais de 100 anos de história comemora o fato de ser familiar e 100% brasileira. Com a terceira geração à frente da empresa, tanto na Unidade em Bento Gonçalves quanto em São Paulo, revela em seus quadros a quarta geração Salton, que promete o mesmo empenho e dedicação com que a empresa foi comandada até agora.












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