sábado, 2 de julho de 2022

Urries Nerello Cappuccio 2020

 

Mais um rótulo da série: Vinho e suas novas castas. E esse vem da bela Sicília, um IGT Terre Siciliane, região esta que, a cada vinho degustado, vem me ganhando de forma incondicional.

E quando essa casta é popular e conhecida em suas terras torna-se tudo, tudo melhor. Traz aquele apelo regionalista, que evidencia todas as suas características, as nuances de seu terroir, isso quando o produtor reflete fielmente, desde a vindima, vinificação, até a mesa de nós, privilegiados enófilos.

Mas digo também que a cultura do povo pode ser determinante para todos esses processos de produção, influenciando diretamente às questões relacionadas à terra, aos aspectos naturais, somando ao dedo do enólogo, o trabalho daqueles que estão na terra. Tudo é terroir que, por sua vez nos remete ao apelo regional.

Sabe aquela sensação de que, embora nunca tenha pisado na região, o contato, as experiências sensoriais com os seus rótulos entregam um panorama de suas propostas e faz valer o conceito acima mencionado.

Esse rótulo da Sicília eu recebi de um clube de vinhos a qual fui assinante. Acredito ter dito, em algum momento, sobre a minha opinião acerca dos clubes dos vinhos. Para um iniciante talvez seja consistente e para quem já é um inveterado degustador, nem tanto, mas o fato é que esta seleção me surpreendeu positivamente pois me proporcionou degustar um vinho de uma casta pouquíssimo conhecida em terras brasileiras.

O vinho que degustei e gostei veio da região italiana da Sicília, do Monte Etna, e se chama Urries da casta Nerello Cappuccio (100%) da safra 2020. Nerello Cappuccio? Sim! O nome soa como um gongo repleto de novidades! Nunca tinha ouvido falar dela até receber esse rótulo do clube de vinhos a qual fazia parte. Então para não perder mais tempo falemos um pouco da casta, da sua história e depois da Sicília. Ah antes de falar sobre a Nerello Cappuccio e da Sicília, vale lembrar que já degustei e gostei o Urries Nerello Mascalese da safra 2020! Foi surpreendente!

Nerello Cappuccio

Nerello Cappuccio, também conhecido como Nerello Mantellato, Nerello di San Antonio, nerello Mantellato, nireddu Cappucciu ou niureddu Cappucciu (pequeno dialeto negro duplo siciliano), niureddu Mascali, niureddu minuteddu, nirello Cappuccio, Perricone, é uma variedade cultivada nas encostas do Etna, na província de Catania, e na província de Messina e Sicília e que contribui para a produção dos vinhos Etna DOC e Faro DOC.

A sua origem é desconhecida, mas tem sido cultivada localmente há várias centenas de anos. Sua produção vem diminuindo ano após ano e há um certo período teme-se sua extinção. Como o Nerello Mascalese, com o qual contribui para a produção do Etna tinto, é colhido muito tarde, em meados de outubro.

Em 1998, cobria 6.550 ha. É cultivada principalmente na Sicília e é a terceira uva atrás da Nero d'Avola e Nerello Mascalese na ilha.

A Nerello Capuccio é uma uva vigorosa, que resulta em vinhos frutados e com boa acidez. Também famosa na Sicília, é muito utilizada em cortes com a Nerello Mascalese, a comparação seria como a Capuccio sendo a Merlot e a Mascalese a uva Cabernet Sauvignon de um corte bordalês.

Sicília

A Sicília é a maior ilha do Mediterrâneo. É uma ilha vulcânica repleta de praias lindas, paisagens espetaculares e uma arquitetura interessante. Fruto da mistura de civilizações que habitaram a ilha e da cálida hospitalidade de seu povo. A Passagem de diversos povos através durante séculos, a Sicília tornou-se um entreposto importante no Mediterrâneo. É um destino desejado para todo viajante. Mas a Sicília não é apenas conhecida pela exuberante natureza, mas também se destaca quando o assunto é vinho. E isso teve influências na sua cultura e, claro, no seu vinho.


Foram os fenícios que iniciaram o cultivo da videira e a elaboração do vinho na Sicilia, porém foram os gregos que introduziram as cepas de melhor qualidade. Alguns historiadores relatam que antigamente na região de Siracusa (província siciliana), havia um vinho chamado Pollios, em homenagem a Pollis de Agro (que foi um ditador nessa região), que se tornou famoso na Sicilia no século VIII-VII a.C..

Esse vinho era um varietal de Byblia, uva originária da área mais oriental do Mediterrâneo, dos montes de Biblini na Trácia (antiga região macedônica que hoje é dividida entre a Grécia, Turquia e Bulgária). O historiador Saverio Landolina Nava (1743-1814) relatou que o Moscato de Siracusa deriva desse vinho de Biblini, sendo classificado como o vinho mais antigo da Itália.

Já o vinho doce Malvasia delle Lipari (Denominação de Origem do norte da Sicilia) parece ter sua origem na época da colonização grega na Sicilia. Lipari é uma cidade que pertence ao arquipélago das ilhas Eólicas.

Durante o Império Romano, o também vinho doce Mamertino (outra Denominação de Origem) produzido no norte da Sicilia, era muito apreciado por muitos, inclusive por Júlio César e era exportado para Roma e África

A viticultura na região sofreu uma grande redução com a queda do Império Romano, porém durante a dominação árabe foi introduzida a variedade de uva Moscatel de Alexandria na ilha Pantelleria, que mantém ainda hoje ali o nome árabe Zibibbo. Os árabes introduziram na Sicília suas técnicas de viticultura e também o processo de passificação das uvas.

No século XVIII a indústria enológica na Sicilia teve um grande avanço e começou a produzir o vinho de Marsala que conta atualmente com uma Denominação de Origem Protegida. Esse vinho se tornou conhecidíssimo no resto da Europa graças a um navegante e comerciante inglês chamado John Woodhouse, que ancorou sua embarcação no porto de Marsala para se proteger de uma tempestade. Foi quando provou o vinho local e se apaixonou, resolvendo levar alguns barris para a Inglaterra. O vinho de Marsala fez tanto sucesso por lá que Woodhouse começou a investir na Sicilia comprando vinhedos e construindo vinícolas para produzir vinho de Marsala, se tornando um empresário do setor vitivinícola de grande êxito.

Como na maioria dos vinhedos da Europa, a Phylloxera também atingiu a ilha Salinas, no norte da Sicilia, provocando uma devastação dos vinhedos que foram se recuperando gradativamente com a plantação de novos vinhedos e a criação em 1973 da Denominação de Origem Malvasia delle Lipari.

A região possui um clima e um solo que favorecem muito a viticultura e a elaboração de vinhos, sendo uma das principais atividades econômicas da ilha italiana. A topografia é variada, formada por colinas, montanhas, planícies e o majestoso vulcão Etna. Encontramos vinhedos por toda parte, que vão das colinas até a parte costeira.

Nas colinas os vinhedos são cultivados em terrazas que chegam inclusive a uma altitude de 1.300 metros, o que as videiras adoram, pois proporciona muita luminosidade e uma ótima drenagem. Encontramos vinhedos também na parte costeira da ilha.

O clima na Sicília é mediterrâneo, mais quente na área mais costeira e no interior da ilha é temperado e úmido, podendo ás vezes apresentar temperaturas bem elevadas por influência de ventos procedentes da África. Também possui uma quantidade grande de microclimas por causa da influência do mar. As chuvas são mais comuns durante o inverno com cerca de 600mm anuais. Os vinhedos sicilianos necessitam, portanto, serem regados.

O solo na ilha é muito variado e rico em nutrientes em razão das erupções vulcânicas do Etna. Encontramos solos arenosos, argilosos e de composição calcária. Em uma parte da ilha o solo é constituído de gneiss, que é um tipo de rocha metamórfica composta de granito. Em quase todas as localidades da Sicília se elaboram vinhos, e essas regiões vitivinícolas contam com várias DOC.

Sicília e suas sub-regiões

As principais castas tintas produzidas na Sicília são: Cabernet Sauvignon, Cabernet Franc, Merlot, Syrah, Nerello Mascalese, Nerello Capuccio, Frappato, Sangiovese, Nero d’Avola e Pinot Nero. Já as brancas destacam-se: Grillo, Catarrato, Carricante, Inzolia, Moscato di Panteleria, Grecanico, Trebbiano Toscano, Malvasia, Chardonnay e Sauvignon Blanc.

E agora finalmente o vinho!

Na taça apresenta um vermelho rubi, com alguma intensidade, mas com reflexos violáceos que o torna brilhante e envolvente, com lágrimas finas e rápidas.

No nariz se revela o destaque. É extremamente aromático, graças às suas notas frutadas, de frutas vermelhas bem frescas, tais como morango, framboesa e cereja, com um toque de especiarias e de flores vermelhas, fazendo do vinho delicado.

Na boca é leve, fresco, potencializado pela fruta, como no aspecto olfativo. É um vinho saboroso, devido a sua jovialidade e a acidez proeminente. Os taninos, no início, se mostrou um pouco adstringente, mas, ao respirar na taça, ficou bem domado, fino e elegante. Percebe-se, no final, um discreto dulçor que não compromete, pelo contrário, o torna persistente e longo.

Mais uma vez a novidade trouxe prazer! O regozijo de uma degustação surpreendente nos ensina que o universo do vinho é vasto e ainda inexplorado, então temos de nos permitir diversificar as nossas experiências, abrir a mente para as novas possibilidades e não cair na temível zona de conforto. Degustar o Urries Nerello Cappuccio foi perceber que a Sicília é um continente dentro de um país, pois traz uma diversidade incrível de castas, propostas e micro terroirs que faz com que viajemos intensamente por intermédio de seus rótulos. Um vinho de personalidade, por ter o caráter regional de um local improvável para cultivo, um vinho harmonioso, saboroso, descontraído, porém intenso. Mais uma vez me sinto privilegiado por degustar um vinho especial, simples, mas nobre, pois personifica uma região que a cada dia me surpreende, a cada rótulo degustado. A experiência sensorial mais do que agradece, se rende, de forma incondicional, aos caprichos de rótulos interessantes e marcantes. Tem 13% de teor alcoólico.

Sobre a Cantine La Vite:

Cantine La Vite foi fundada em 1970 pela vontade de 43 fundadores que decidiram se unir para dar vida ao que se tornou uma das vinícolas mais produtivas e florescentes da Sicília.

Os 1.300 sócios cultivadores cultivam cerca de 2.300 hectares nos territórios do centro e sul da Sicília, em particular entre as províncias de Caltanissetta, Agrigento e Ragusa. A produção está orientada para as castas de bagas pretas (cerca de 80%), as uvas brancas locais da Sicília e as uvas Nero d'Avola, das quais a empresa é a maior produtora na Sicília.

Graças ao uso das técnicas de produção mais inovadoras e, acima de tudo, operando com o máximo cuidado e respeito ao meio ambiente, a Cantine La Vite é conhecida mundialmente pela qualidade de seus produtos.

Desde 2020 Cantine La Vite SCA criou a marca Le Schette Fruit para promover um novo negócio de frutas e legumes inteiramente feito em nosso território e por nossos produtores, e nasceu graças à criação de uma infraestrutura moderna, tecnológica e eficiente.

Mais informações acesse:

https://www.cantinelavite.it/en/main-home-english/

Referências:

“Wine”: https://www.wine.com.br/vinhos/urries-i-g-t-terre-siciliane-nerello-cappuccio-2020/prod27166.html

“Wikipedia”: https://pt.frwiki.wiki/wiki/Nerello_Cappuccio

“Revista Sociedade de Mesa”: https://revista.sociedadedamesa.com.br/2016/04/sicilia/

“Enologuia”: https://enologuia.com.br/regioes/290-sicilia-o-continente-do-vinho

“Vinhos e Castelos”: https://vinhosecastelos.com/vinhos-da-sicilia-italia/

 

 

 

 

 

 








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