As vezes alguns discursos engessados no universo do vinho me
aborrecem! Sabe aquela coisa que falam com demasiada reverência: “Ah os vinhos
da região ‘x’ são excelentes”! “Os vinhos da região ‘x’ são especiais”! Sempre
são os vinhos de uma determinada região em detrimento de várias outras que
fazem questão de jogar no ostracismo.
Por isso sempre faço questão de dizer UNIVERSO DO VINHO! Ele
é vasto, gigante, diversificado, logo traz inúmeras regiões com suas
peculiaridades, especificidades e tudo o mais. Será que realmente não merecemos
desbravar todas elas? Ou pelo menos boa parte delas, até porque precisaríamos
viver mil anos para degustar todos os vinhos do mundo.
E apenas para citar um exemplo: Espanha! Espanha é um dos
“centros” produtivos de vinhos com o maior número de regiões, hectares e tudo o
que tem direito do planeta. Por que ficar restrito a Rioja e Ribera del Duero?
Evidente que são regiões emblemáticas, importantes,
tradicionais e que merecem a relevância, o pedestal que as colocam, mas, pergunto
mais uma vez: Será que só existem essas regiões, as demais não podem apresentar
particularidades, algo especial?
Eu respondo! Sim! E de imediato apresento uma que descobri,
confesso e com certa vergonha, recentemente: Castilla La Mancha. A terra do errante
Dom Quixote tem revelado para mim alguns vinhos excepcionais, diria surpreendentes.
A escolha foi boa? Sorte de principiante? Não sei dizer ao certo, mas o fato é que
as escolhas foram certeiras, tem sido certeira!
O discurso mais forte que segmenta essa região por parte dos
“formadores de opinião” é: “Ah são vinhos de volume!” Vinhos de volume tem de
ser sempre ruins? Talvez tenham alguns pontos técnicos, na vindima, na
vinificação etc, mas isso não desmerece em nada a qualidade de alguns rótulos disponíveis
no mercado.
Então com o meu espírito subversivo e fora da caixinha, tenho
me aventurado nessas regiões “alternativas” da Espanha, como Utiel-Requena,
Navarra, Castilla La Mancha entre tantas outras que vem se descortinando diante
dos meus olhos. A Espanha é gigantesca e oferece um mundo de terroirs, de
características de vinhos, dos mais básicos aos mais complexos.
E a minha escolha de hoje é especial, vem da DO La Mancha,
uma das nove denominações de origem da região de Castilla La Mancha, no auge
dos seus nove anos de garrafa. O vinho que degustei e gostei se chama Gran
Oristan Gran Reserva no blend Tempranillo (65%) e Cabernet Sauvignon (35%) da
safra 2014.
Então já que enaltecemos La Mancha e a velha Castilla La
Mancha, vamos de história. Falemos um pouco da representatividade dessa região
para a Espanha.
A Região de Castilla La Mancha: A Terra de Dom Quixote
Castilla de La Mancha ou Castela La Mancha é uma das
principais regiões produtoras de vinhos da Espanha, que possui a maior
quantidade, em área, de vinícola em todo o mundo. E esta terra, de onde vem o
maior personagem da língua espanhola, Dom Quixote, escrito por Miguel de
Cervantes, também produz vinhos de qualidade soberba.
A região de Castilla-La Mancha é a que possui, não apenas na
Espanha, mas no mundo inteiro, a maior superfície plantada de vinhedos e no ano
de 2021 (um ano de baixa produtividade), fez 22,8 milhões de hectolitros de
vinho e mosto.
Para o Conselheiro de Agricultura, Água e Desenvolvimento Rural
da Espanha, Francisco Martínez Arroyo, Castilla La Mancha não é apenas uma
potência, mas uma potência ainda em crescimento forte nos últimos anos. Ele
relatou em uma coletiva de imprensa onde anunciou também a aprovação do
anteprojeto da “Lei da Uva e do Vinho” da região de Castilla La Mancha.
A região já tinha leis que protegiam a auxiliavam o setor
vitivinícola, mas em 2013 elas foram derrubadas pelo governo federal e não
foram substituídas, até agora. A expectativa é de que a aprovação do anteprojeto
da “Lei da Uva e do Vinho” aconteça o mais breve possível e que permitirá
facilitar e flexibilizar processos e autorizações como por exemplo a aprovação
de cultivo de novas variedades de uvas, permitindo que o setor se adapte ao que
demandam os consumidores do mundo.
História
e Características
Os primeiros escritos da cultura de uvas para vinho na região
de Castilla de La Mancha datam do século XII e é bastante evidente que as
vinhas foram introduzidas pelos romanos, assim como diversas outras regiões em
toda a península Ibérica, que compreende Espanha e Portugal.
Lá houve diversas guerras entre muçulmanos e cristãos, e esta
terra presenciou o casamento entre Isabella (de Castela) e Ferdinando (ou
Fernando, de Aragão) conhecidos como reis católicos.
Esta união deu origem ao atual estado espanhol, com vastas
planícies e vinhedos, que compõe o visual clássico deste belo país.
O nome “La Mancha” tem origem na expressão “Mantxa” que em
árabe significa “terra seca”, o que de fato caracteriza a região. Neste território,
o clima continental ao extremo provoca grandes diferenças de temperaturas entre
verão e inverno.
Nos dias
quentes de verão os termômetros podem alcançar os 45°C, enquanto nas noites
rigorosas de frio intenso do inverno, as temperaturas negativas podem chegar a
até -15°C. Aliás, existe um ditado local que descreve o clima em Castilla de La
Mancha como “9 meses de frio inverno e 3 do mais puro inferno”.
A irrigação torna-se muitas vezes essencial: além do baixo
índice pluviométrico devido ao caráter continental e mediterrâneo do clima, o
local se torna ainda mais seco graças ao seu microclima, que impede a entrada
de correntes marítimas úmidas.
O solo, repleto de argila e calcário, facilita o crescimento
de vinhedos, que se estendem por cerca de 200.000 hectares, abrangendo 182
municípios diferentes. Inclusive, cultivo e produção de vinho são fundamentais
para a economia de grande parte dessas cidades.
A ocorrência
de sol por ano é de aproximadamente 3.000 horas. Esta macrorregião é composta
por várias regiões menores, incluindo sete “Denominações de Origem”, das quais
se pode destacar La Mancha e Valdepeñas.
Curiosidades
e Uvas Cultivadas em Castilla La Mancha
Como chove
pouco, as vinhas são plantadas distantes umas das outras, chegando até a 8 metros,
para que elas garantam a umidade do solo para si.
Outra curiosidade é que, antigamente, era hábito deixar o
vinho descansando em ânforas feitas de barros. Elas eram enterradas no chão,
apenas com a boca para fora, para que ficassem refrigeradas.
As uvas que são cultivadas em Castilla de La Mancha são:
Airén, Viura, Sauvignon Blanc,
Chardonnay, Tempranillo, que na região é conhecida como Cencibel, Syrah,
Cabernet Sauvignon, Merlot e Grenache.
La Mancha
Geograficamente La Mancha corresponde a uma região localizada
no Sul de Espanha, na chamada Submeseta
Meridional. Possui uma extensão de 180 km de norte para sul e de 300 km de leste
para oeste, repartindo-se por quatro províncias diferentes (Cuenca, Toledo,
Cidade Real e Albacete).
É uma região essencialmente plana, apenas interrompida pelos
montes de Toledo e percorrida pelos rios Guadiana e Júcar. Aqui predominam
rochas calcárias, quartezíticas e argilosas e ainda se adivinham na paisagem
vestígios de crateras vulcânicas. Os moinhos constituem elementos recorrentes
da paisagem.
Economicamente trata-se de uma região fundamentalmente
agrícola e pecuária, onde se destaca a criação de gado bovino e caprino. A
viticultura é também muito importante, já que é a região mais produtiva de todo
o país, os vinhos de Valdepeñas e Manzanares são muito famosos. A produção de
cereais, girassol, alhos, açafrão e de queijo também é significativa.
A força na tradição de suas áreas vitivinícolas reflete suas
condições naturais que favorecem o cultivo de uva e a qualidade de vinhos bem
definidos. La Mancha é ideal para a plantação de uvas, embora o rendimento não
seja muito alto, a qualidade da fruta e dos vinhedos é extraordinária.
Muito tempo atrás, La Mancha tinha uma imagem de um lugar
imenso e árido que produzia grandes quantidades de vinho embora sem muita
qualidade. Hoje em dia, seus vinhos conquistaram grande prestígio no mundo
inteiro.
La Mancha é também a maior área produtora de vinhos do mundo,
um lugar notável que permite a produção de uma larga proporção de todos os
vinhos produzidos na Espanha.
E agora finalmente o vinho!
Na taça apresenta uma coloração rubi bem intensa, com halos
discretamente acastanhados, denotando seus nove anos de vida, mas ainda
apresentando vivacidade e até algum brilho, com lágrimas finas e lentas.
No nariz revela notas de frutas vermelhas maduras, com a
predominância da cereja, com um amadeirado instigante, que traz complexidade e
elegância ao vinho, entregando ainda baunilha, defumado, fumaça, tabaco, couro,
terra molhada.
Na boca é macio, elegante, mas traz uma personalidade
marcante, com alguma estrutura. As notas frutadas se revelam em um belo
protagonismo, como no aspecto olfativo, com notas de cereja e amora. A madeira,
graças aos vinte e quatro meses de barrica e três na garrafa, corrobora a sua
complexidade entregando taninos maduros, acidez média, além de notas terrosas,
chocolate, leve tosta, baunilha e um final de média persistência.
Nove anos de
vida! E ainda um longo caminho pela frente! Um vinho pleno, complexo em um misto
de frutas negras e aromas terciários revelando a sua versatilidade, a sua
complexidade. Alguma estrutura, densidade, mas que o tempo conferiu elegância e
equilíbrio. Por isso que esses especiais espanhóis vêm me ganhando a cada
experiência sensorial. Que venham mais e mais momentos como esse! Tem 13% de
teor alcoólico.
Sobre a Bodegas Lozano:
Em 1853 começa a história da vinícola, quando a família
Lozano planta as primeiras vinhas em Villarrobledo (município da Espanha na
província de Albacete, comunidade autônoma de Castilla-La-Mancha) formada principalmente
pela variedade Airén, nativa da região. Desde então, foram quatro gerações na
gestão da adega, sempre apostando no bom trabalho e no uso de técnicas
tradicionais na elaboração.
Em 1985, as instalações existentes foram adquiridas. Desde
então, houve muitas melhorias que foram desenvolvidas, proporcionando um
aumento considerável na capacidade de vinificação.
Em 2005, a Lozano diversificou o negócio e começou a
concentrar-se em sucos e concentrados de uva, formando a empresa CONUVA, usando
o mesmo roteiro: para alcançar a mais alta qualidade em todos os seus produtos
e para agregar valor diferenciado a todos os clientes, a confiança.
A adega passou por diferentes estágios que forjaram o que é
hoje: uma empresa familiar e profissional que é referência no setor
vitivinícola que aposta adaptação aos novos tempos através de novos produtos e
formatos.
Mais informações acesse:
https://bodegas-lozano.com/es/
Referência:
“Enologuia”: https://enologuia.com.br/regioes/245-a-regiao-de-castilla-la-mancha-a-terra-de-dom-quixote
“Revista Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/vinhos-dos-moinhos_4580.html
“Blog VinhoSite”: http://blog.vinhosite.com.br/la-mancha-maior-regiao-produtora-vinhos-espanha/
“Revista Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/castilla-la-mancha-maior-do-produtora-do-mundo-tem-novas-regras-para-seus-vinhos.html
“Vinho Virtual”: http://www.vinhovirtual.com.br/regioes-89-La-Mancha
“Infopedia”: https://www.infopedia.pt/apoio/artigos/$la-mancha