quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

Pé de Cabra tinto 2019

 

Não sou muito afeito a esses métodos de autoajuda que tem por aí com essas pessoas de sucesso e deveras “perfeitas” que, por intermédio de livros best sellers e vídeos com milhões de visualizações, elaboram teses e métodos que dão o mapa da mina da felicidade. Primeiro que não existe felicidade, mas “surtos” de alegria. Mas não quero ficar aqui proferindo filosofias de bar e buscar respostas com caminhos complexos, mas mostrar que momentos simples e conceitualmente banais podem sim, trazer alegrias para a sua vida, te proporcionar prazeres que podem ser preponderantes para a sua vida, permitindo que você siga, rejuvenescido o seu caminho, superando os obstáculos que a vida nos impõe.

Agora vem aquela perguntinha básica: Por que toda essa história? Porque o vinho, o vinho nosso de cada dia pode te entregar momentos melhores na sua vida, trazer o elixir para a sua alma, a resposta para muitas dúvidas, ou simplesmente te proporcionar o prazer que você deseja para aquele momento em que você só precisa relaxar, descansar, depois da batalha cotidiana. Uma vez eu ouvi ou li, não sei ao certo, de que da simplicidade vem a nobreza e essa frase nunca foi tão relevante para o universo do vinho e com esse vinho de hoje, a frase personifica perfeitamente a sua proposta.

Um vinho simples, descontraído, informal, ligeiro, mas que traz toda a relevância para o momento! Um vinho que não sintetiza apenas a tipicidade da região a qual foi produzido, que foi cultivado, com todo o apelo regionalista, que revela todas as características de um povo, de uma cultura, de suas cepas, do seu terroir, mas o que proporciona para aquele que enche e ergue, com prazer, a taça: o prazer, a alegria de celebrar esse momento de degustar um vinho. E esse vinho que degustei e gostei traz todo o conceito, mesmo que nas entrelinhas, de força, de prazer diante dos obstáculos difíceis da vida, de todos os seus infortúnios e reveses. Falo do vinho “Pé de Cabra”, um IG (Indicação Geográfica) da emblemática região portuguesa do Tejo, com um blend composto pelas castas Tinta Roriz (35%), Trincadeira (35%) e Castelão (30%). E, além de todas essas questões espirituais e existenciais, esse vinho marca uma estreia na minha vida de enófilo: É o meu primeiro IG (Indicação Geográfica) do Tejo. Então convém falar, até mesmo para entender a proposta de vinho que estamos degustando, um pouco da região, tradicional de Portugal, e as suas classificações, bem como os seus conceitos.

Os vinhos do Tejo

A Região Vitivinícola do Tejo está localizada no centro de Portugal, a pouca distância de Lisboa. O rio não é o que separa, mas o que liga um território vitivinícola com 12.500 hectares de vinhas distribuídos por 21 municípios. Largo e imponente, o Tejo é o maior rio de Portugal. Como elemento primordial da paisagem, moldou a história dos que lá vivem, criam e trabalham, influenciando o clima e o terroir.

Tejo

Lá, os dias bastante quentes asseguram a maturação da fruta. As noites, frescas e úmidas, diminuem o estresse hídrico das videiras, dando às uvas características que permitem fazer vinhos de grande qualidade e com potencial de guarda. Dos 12.500 hectares de vinha, 2.500 dão origem a vinhos com denominação de origem DOC do Tejo e 5.000 a vinhos com certificação IG Tejo. Todos são reconhecidos e apreciados pelo equilíbrio, frescor e aromas frutados. Resultam de uma combinação harmoniosa de sábias e velhas tradições com os novos conhecimentos de uma jovem e qualificada geração de viticultores e enólogos. O Tejo tem alguns dos mais vibrantes e acessíveis vinhos de Portugal, oferecendo uma gama diversificada e diferenciada de estilos, para todos os gostos, orçamentos e ocasiões. A produção anual, que cresce safra após safra, atingiu, no ano passado, os 23,3 milhões de litros. Nos brancos, o perfil traduz-se em vinhos muito aromáticos, frescos e elegantes. Os tintos são muito equilibrados, frescos e com taninos distintos. No nariz, sobressai a fruta.  Já nos tintos de guarda a madeira revela-se de forma discreta. A região do Tejo produz também excelentes vinhos rosés, espumantes, frisantes, e ainda licorosos e colheitas tardias.

Por denominação de origem "DO", entende-se o nome geográfico de uma região, que serve para designar ou identificar um produto vitivinícola originado de uvas provenientes dessa região e cuja qualidade ou características se devem, essencialmente ou exclusivamente, ao meio geográfico, incluindo os fatores naturais e humanos e cuja vinificação e elaboração ocorrem no interior daquela área ou região geográfica delimitada. Por indicação geográfica "IG", entende-se o nome de um país ou região, ou de uma denominação tradicional, associada a uma origem geográfica, ou não, que serve para designar ou identificar um produto vitivinícola originado de uvas daí provenientes em pelo menos 85%, no caso de região ou de local determinado, cuja reputação, determinada qualidade ou outra característica podem ser atribuídas a essa origem geográfica e cuja vinificação ocorra no interior daquela área ou região geográfica delimitada.

E agora finalmente o vinho!

Na taça entrega um lindo vermelho rubi intenso, mas com entornos violáceos e uma abundante concentração de lágrimas finas, mas que logo se dissipam.

No nariz revela uma explosão de frutas vermelhas e negras, onde se destacam amoras e framboesas, com notas, diria, de especiarias, de ervas, e até de tabaco.

Na boca é seco, confirma as impressões olfativas no que tange a fruta, tendo ainda um bom corpo, mostrando uma personalidade marcante, mas macio, redondo, equilibrado, fácil de degustar. Tem taninos presentes, mas domados com acidez correta e um final persistente e frutado.

Um vinho surpreendente! Tem o corpo da Tinta Roriz, as especiarias e toque herbáceo da Trincadeira e a fruta da Castelão. Um bom percentual entre as castas nesse blend. Um excelente vinho que, mesmo com uma proposta mais básica, mais simples, revela a sua imponência, revela a sua personalidade. Um vinho com bom corpo, mas fácil de degustar, redondo, equilibrado. O vinho entrega além do que vale, além de sua proposta, com uma boa vocação gastronômica, mas que, dada a sua descontração, pode ser degustado sozinho e de preferência com amigos para celebrar a vida! E por falar em vida, o nome do vinho é “Pé de Cabra” e faz menção a aquela ferramenta que se usa para abrir tampas e objetos pesados usando a força de alavancas. Ou seja, pode ser entendido como um vinho que nos dá forças para seguir a vida com alguma alegria, mesmo que fugaz, e para superar os obstáculos difíceis da vida. Tem 13% de teor alcoólico.

Sobre a Quinta do Gradil:

Não muito distante do sopé da vertente poente da Serra de Montejunto, entre Vilar e Martim Joanes, está instalada a Quinta do Gradil. Considerada uma das mais antigas, senão a mais antiga, herdade do concelho do Cadaval, a Quinta do Gradil tem uma forte tradição vitivinícola que se prolonga desde há séculos. A propriedade é composta por uma capela nobre ornamentada por um torreão artisticamente decorado, um núcleo habitacional, uma adega e uma área agrícola de 200 hectares ocupados com produções vinícolas e frutícolas. A Quinta do Gradil foi adquirida, nos finais dos anos 90, pelos netos de António Gomes Vieira, precursor da tradição de vinhos na família desde 1945. Os novos proprietários iniciaram, em 2000, o processo de reconversão de toda a área de vinha primando por castas de maior qualidade. A adega sofreu melhoramentos, estando projetada uma reformulação profunda nos próximos 2 anos, e as cocheiras recuperadas deram lugar a uma sala de tertúlias. O palacete e capela, em fase muito avançada de degradação aquando da aquisição da Quinta pelos novos proprietários, foram limpos e contam agora com um projecto ambicioso de recuperação, sendo que a herdade tem marcas históricas seculares e constitui um marco arquitetônico significativo. As mais antigas referências documentais encontradas sobre a Quinta do Gradil remontam ao final do século XV, num documento Régio. Em de 14 de Fevereiro de 1492, data do documento, D. Martinho de Noronha recebeu de D. João II a carta de doação da jurisdição e rendas do Concelho do Cadaval e da Quinta do Gradil. Por ocasião da ascensão de D. Manuel I ao trono português e a sua atuação a favor dos membros da Casa de Bragança, a Quinta do Gradil torna a ser referenciada na confirmação de doação concedida por D. Manuel I a D. Álvaro de Bragança, irmão mais novo do 3º Duque de Bragança, D. Fernando II, que acusado de traição foi mandado degolar por D. João II, em 1483. A Quinta terá sido adquirida pelo Marquês de Pombal por ocasião do movimento que a partir de 1760 levou à ocupação de terras municipais, admitindo-se que já na altura contasse com o cultivo de vinha, fator que terá sido decisivo para o estadista que criou a Companhia das Vinhas do Alto Douro. Manteve-se na pretensa da família até meados do século XX, quando foi comparada por Sampaio de Oliveira. Já nos finais dos anos 90 que os atuais proprietários, a família Vieira, adquirem a herdade.

Sobre a Parras Wines:

A Parras Vinhos de Luís Vieira nasce no ano de 2010, atualmente com sede em Alcobaça, onde também está instalada a unidade de engarrafamento do grupo. Cinco anos depois, com a empresa consolidada e voltada para o mercado internacional, surge a necessidade de se fazer um reposicionamento de marca e “vesti-la” de outra forma, mais atual. É assim que no início de 2016 aparece a Parras Wines, mais jovem, mais flexível, e numa linguagem universal para que possa ser facilmente compreendida por todos, mesmo os que estão além-fronteiras. Descendente de um pai e de um avô que sempre trabalharam com vinho, Luís Vieira é o único dono deste projeto. Aos cinco anos caiu num depósito de vinho e quase morreu afogado, não fosse um colaborador do avô na altura, que atualmente é seu, tê-lo salvo. Hoje, recorda com graça esse episódio e diz mesmo que simboliza o seu “batismo nestas andanças do vinho”. A empresa começa então a formar-se com terra própria na Região Vitivinícola de Lisboa, mais exatamente na freguesia do Vilar, Cadaval, com duzentos hectares de propriedade em extensão, sendo que 120 são hoje de vinha plantada. Na mesma região do país, um bocadinho mais acima, na zona de Óbidos, a Parras Wines é também responsável pela exploração de 20 hectares de vinha que dão origem aos vinhos Casa das Gaeiras. Com sede em Alcobaça, nas antigas instalações de uma fábrica de faianças, deu-se início a uma nova área de negócio – uma Unidade de Engarrafamento de Bebidas, que hoje serve também de sede à Parras Wines e que se chama Goanvi. Cinco anos mais tarde, em 2010, constitui-se então a Parras Vinhos, hoje Parras Wines. Para além de terra na Região de Lisboa, o grupo começou paralelamente a produzir vinhos de outras regiões do país. Através de parcerias com produtores locais, a empresa consegue assim dar resposta às necessidades globais que iam surgindo do mercado, produzindo vinhos do Douro, Vinhos Verdes, Dão, Lisboa, Tejo, Península de Setúbal e Alentejo.

Mais informações acesse:

https://www.quintadogradil.wine/pt/

https://www.parras.wine/pt/

Referências de pesquisa:

“Revista Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/entre-na-regiao-dos-vinhos-do-tejo_12582.html

“Comissão Vitivinícola Regional do Tejo”: https://www.cvrtejo.pt/






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