sábado, 12 de dezembro de 2020

Marchesi del Salento Primitivo 2018

 

Ao longo da semana que antecedeu a minha tão esperada degustação tradicional de sábado, tentei escolher um vinho que emanasse tradição, história e, ao mesmo tempo, um vinho, uma casta, uma região que não degustava há algum tempo. Revirei cada canto da minha adega na expectativa de encontrar algum rótulo que se adequasse aos meus anseios. Eis que me deparei com um do Velho Mundo, da terra da Bota, da velha Itália, mais precisamente da emblemática região de Puglia ou, para alguns, Apulia, da casta Primitivo que, nos Estados Unidos se chama Zinfandel. Ah, quanto tempo eu não degusto um Primitivo, uma cepa tão versátil, que mescla a maciez e o frutado com muita personalidade e expressividade. Essa é a cara do vinho italiano: rótulos acessíveis à mesa, com muita elegância e requinte.

E, desde o meu último rótulo degustado da casta Primitivo, estamos testemunhando um crescimento exponencial, uma popularidade na Itália e no mundo inteiro. E não precisa fazer um grande trabalho de pesquisa para identificar isso. A oferta de rótulos dessa casta tem crescido vertiginosamente no Brasil nos últimos anos e consequentemente o seu consumo em todas as suas propostas de vinhos, dos mais frutados aos mais complexos e barricados. Então eu precisava degustar um Primitivo de novo, depois de quase 5 anos sem fazê-lo! Isso mesmo, quase 5 anos sem degustar e agora vem a calhar celebrar esse momento da casta em sua grata e nova realidade no Brasil.

Então o vinho que degustei e gostei veio da região de Puglia, da história vinícola Castellani, e se chama Marchesi del Salento, da casta, é claro, Primitivo e a safra é de 2018. E o seu atual sucesso nos dias atuais se deve também ao seu passado rico, de muita história, personificado em uma cultura de DNA, de identificação de um povo que tem um laço forte e simbiótico com o vinho e a vinha. Então falemos da Primitivo e da região a qual tem representatividade de cultivo: Puglia.

Primitivo

A uva Primitivo é uma das castas típicas do sul da Itália, especialmente na região de Puglia. Atualmente, ela tem grande cultivo também nos Estados Unidos, onde recebe o nome de Zinfandel. Algumas pessoas acreditam ter diferenças entre a Primitivo e a Zinfandel, mesmo que ambas as castas tenham o mesmo DNA, provado cientificamente. Um dos motivos é que originam vinhos com características muito distintas, embora tenham alto teor alcoólico. De característica mais doce, esta uva é capaz de produzir ótimos rótulos, especialmente nos DOC’s Primitivo di Manduria e Primitivo Del Salento, ambos na Itália.

O termo “Primitivo”, nome desta uva, está relacionado ao tempo de colheita. Ela é uma casta que amadurece precoce, em meados de agosto, antes de outras uvas tintas. Devido ao seu tempo de amadurecimento, esta uva tem grande quantidade de açúcar residual, resultando em vinhos com alto teor alcoólico. Ela é conhecida por produzir vinhos mais robustos e ricos em taninos.

Sua história não é confirmada, mas existem alguns indícios do surgimento desta uva. Foram encontrados sinais da Primitivo na Itália, durante o século XVIII, mas alguns estudiosos acreditam que ela tenha se originado anteriormente. Existem algumas evidências da comercialização de vinhos com esta casta no ano 1400. Enquanto isso, outro estudo, que analisou as raízes da Primitivo, atribuem sua origem a Croácia. Após algum tempo, foi descoberto que a Zinfandel, considerada uma casta californiana, tem o mesmo DNA da Primitivo. Embora não exista um consenso sobre suas origens, a Primitivo tem destaque em terras italianas. Em Puglia, ela é cultivada em 11 mil hectares, quantidade que aumentou consideravelmente nos últimos dez anos, em cerca de 40%. A Primitivo tinha registrado anteriormente um período de baixa, devido a algumas normas da União Europeia para desarraigar vinhas.

Puglia

O nome Puglia vem do povo Iapigi, que os romanos em latim chamaram de Apuli, e a região, consequentemente, Apulia.  Em português o nome se manteve como em latim, e em italiano passou a ser Puglia. Puglia fica no “calcanhar da bota” do mapa italiano. A região é cercada por praias consideradas as mais lindas da Itália, como Torre dell’Orso, um balneário italiano de pequenas falésias que moldam e encantam as areias de seu litoral. Outro destaque da região é a cidade de Otranto, a maior dessa parte do litoral, que possui sítios históricos, que nos remetem a era da Itália medieval e ainda mantém algumas ruínas greco-romanas.

Puglia

O sul da Itália é considerado o berço do vinho italiano. Embora a região setentrional também possua seu prestígio, as regiões que compreendem a parte sul, Molise, Campânia, Basilicata, Calábria e Puglia, são destaque na produção e qualidade dos famosos vinhos italianos, sendo Puglia a região considerada principal, não somente pela grande produção de seus vinhedos, como também pela qualidade dos vinhos. Puglia possui uma extensão de aproximadamente 400 km através da costa do mar Adriático, com clima e solo considerado ideal para a produção de vinhos, além da topografia da região ser praticamente plana. Puglia possui uma área de vinhedos de 190.000 ha, a região é responsável por 17% da produção de vinho italiano. Em Puglia, 60% da produção se dão através do sistema de cooperativas.

A região tem ampla diversidade de uvas nativas, que conferem status quando o assunto é exportação. Ao norte da região as uvas mais abundantes são a Trebbiano e a Sangiovese e os vinhos gerados a partir dessas espécies respondem por até 30% dos vinhos DOC produzidos na região. Há ainda as uvas Bombino Bianco e Montepulciano, oriundas da província de Foggia, e a “Uva di Troia” ou Sumarello. As que possuem maior destaque na região são a Primitivo e a Negroamaro.

A uva Primitivo é proveniente de Manduria, localizada ao sul da região, a 10km do mar Jônio. Normalmente, os vinhos dessa uva possuem corpo denso e médio, cor escura e acidez entre média e alta, de boa longevidade e excelentes companheiros na gastronomia da região. A uva Negroamaro é utilizada para a produção de vinhos bastante rústicos. Atualmente é trabalhado em conjunto com a Malvasia Negra, o que resulta na produção de vinhos muito fortes e bem encorpados, considerados ideais para o consumo com carne.

E agora o vinho!

Na taça tem um vermelho rubi com reflexos violáceos muito brilhante, com grande concentração de lágrimas finas, mas que logo se dissipa das paredes do copo.

No nariz tem agradáveis aromas de frutas vermelhas como framboesa, groselha e morango, com um discreto toque floral, diria.

Na boca se reproduz as impressões olfativas, com toques de frutas vermelhas, com um discreto adocicado. Tem corpo leve para médio, mas é fácil de degustar e macio. No início o álcool sobressaiu um pouco, mas com alguns minutos na taça, o vinho ficou aveludado e equilibrado. Os taninos estão domados e suaves, com uma acidez média e um final persistente, com muita fruta.

Tradição, história, o DNA da vitivinicultura da Itália traduzida em grandes vinhos que, em alguns momentos tiveram contratempos, alguns reveses, que só veio a reforçar o potencial de crescimento da região e dos seus vinhos, dos seus “Primitivos” que entrou em nosso país sendo reverenciado, em todos os seus aspectos, em todas as suas propostas. Marchesi del Salento personifica, em requinte de detalhes, de terroir, de história, todas as características mais emblemáticas de um Primitivo com a sua proposta: frutada, jovem, fácil de degustar, mas com a personalidade e expressividade que determinam a sua imponência. Um vinho surpreendentemente maravilhoso. O único ponto negativo é claro fica para o seu valor e que vale ser registrado: lembro-me quando o comprei na faixa dos R$ 30,00 e atualmente, dado ao seu sucesso, está na faixa dos R$ 60,00! Um valor absurdo e que precisa ser revisto, se de fato querem que a democracia da cultura do vinho seja disseminada. De resto, um grande e surpreendente vinho que é muito versátil, harmonizando com pratos mais simples a complexos. Harmonizou muito bem com um queijo gorgonzola e logo será degustado com uma bela macarronada, como todo bom rótulo italiano. Tem 13% de teor alcoólico.

Marchesi del Salento Primitivo harmonizado com Queijo Gorgonzola

Sobre a vinícola Castellani:

O negócio de Castellani foi estabelecido em Montecalvoli no final do século 19 quando Alfred, um viticultor de longa data, decidiu começar a engarrafar e vender seu vinho. O filho de Alfredo, Duilio, junto com seu irmão Mario dá início ao período de expansão da empresa. Duilio, homem meticuloso e diligente, participa ativamente de todas as etapas do trabalho. A vinha mais importante é aquela situada em Santa Lúcia, no fértil vale do Arno, onde se produz um vinho tinto vivo e apto para envelhecer e engarrafado em típicos frascos com palha, conquistando o interesse dos mercados transalpinos. Nos anos seguintes, o filho primogênito de Duilio, Giorgio, homem determinado e ambicioso, inicia a exportação em grande escala. A enchente de 1966 causa grandes danos à vinícola Montecalvoli. Decide-se então transferir temporariamente o negócio para a Fazenda Burchino, nas colinas da vila de Terricciola. O irmão de Giorgio, Roberto, brilhante jornalista do jornal “Il Giornale del Mattino”, de Florença, corre para ajudar a retirar lama da vinícola da família. Ele então decide ficar e contribui para a evolução da empresa. Roberto, homem culto e cosmopolita, inicia uma atividade pioneira em mercados longínquos, tornando-se um dos defensores do sucesso internacional do Chianti. A aquisição da vinha Poggio al Casone coincide com a ampliação da adega da Quinta Travalda em Santa Lúcia. urante a noite do dia de Ano Novo em 1982, um incêndio queimou quase completamente as instalações da empresa. Parece ser o fim. Mas em poucos meses os irmãos Castellani adquirem a Fazenda Campomaggio e, graças à contribuição de Piergiorgio, filho de Roberto, o negócio ganha força. As pesquisas vitivinícolas e tecnológicas são promovidas por especialistas como o enólogo Sabino Russo e o agrônomo Carlo Burroni. Hoje esta empresa centenária persegue com grande entusiasmo o objetivo de produzir vinhos, que são a expressão de uma das maiores regiões enológicas do mundo: a Toscana.

Mais informações acesse:

https://www.castelwine.com/

Referências:

Sobre a casta Primitivo:

Blog “Vinho Site”: http://blog.vinhosite.com.br/uva-primitivo/#:~:text=O%20termo%20%E2%80%9CPrimitivo%E2%80%9D%2C%20nome,vinhos%20com%20alto%20teor%20alco%C3%B3lico.

Portal Viavini: https://www.viavini.com.br/blog-de-vinhos/primitivo-uma-uva-diversos-vinhos/

Sobre a região de Puglia:

Blog “Sonoma”: https://blog.sonoma.com.br/regioes/puglia-uma-das-maiores-da-italia/

Blog “Diário de Bari”: http://diariodebari.blogspot.com/2011/12/puglia-um-pouco-de-historia.html

Portal “Clube dos Vinhos”: https://www.clubedosvinhos.com.br/vinhos-de-puglia-o-berco-dos-vinhos-italianos/


 






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