sábado, 24 de outubro de 2020

Alandra tinto 2019

 

Nós, simples enófilos, costumamos falar, em profusão, em termos como tipicidade, DNA do vinho, terroir, a terra que o vinho é produzido, a região tem muito ou pelo menos deveria ter entre nós grande importância na escolha de um vinho, por exemplo, e nos nossos conceitos de preferência de rótulos. E quando falamos em região, não podemos negligenciar, é claro, das suas cepas, das suas castas. Atualmente eu estou imergindo fundo no garimpo de novas regiões e principalmente de novas castas, castas essas com um grande apelo regionalista, o que consequentemente reforça o conceito de terra, de terroir, de tipicidade, de cultura, de história, do comportamento de um povo, de uma sociedade com vocação para a feitura, para a produção dessa bebida poética e inspiradora chamada VINHO.

E esse vinho que degustei e gostei vem de um país e região que dispensam maiores comentários pela sua importância e história para a vitivinicultura mundial, mas que, sim, vale e muito ser contada com requintes de detalhes para enaltecer e estimular a degustação do vinho que, mesmo dentro de uma garrafa, na limitação de uma garrafa, expressa e sintetiza a gigante cultura de um país e uma região como Portugal e o Alentejo, respectivamente. E esse vinho, apesar de uma proposta básica, de um vinho básico, de entrada, entrega, com fidelidade, essas características que me agrada e que aqui foram mencionadas, pois tem um forte apelo regional, mesmo não apresentando nenhuma classificação como o “vinho regional” ou o famoso “DOC”, tem inserido em sua proposta esse aspecto tão marcante, nos vinhos portugueses: a força regionalista e cultural. Falo do Esporão Alandra tinto, composto pelas castas autóctones Moreto (15%), Castelão (40%) e Trincadeira (45%). Então já que estamos falando de regionalismos e castas autóctones, por que não falemos sobre as cepas que compõe este vinho?

Moreto

A casta Moreto é característica da zona do Alentejo, sendo bastante cultivada nas zonas de Reguengos, Redondo e Granja-Amareleja. Pensa-se que terá sido introduzida na região, por volta do século XIX, quando se assistiu a um grande desenvolvimento da vitivultura no Alentejo. Esta casta apresenta cachos de tamanho pequeno e bagos de tamanho médio e arredondados. É uma casta bastante produtiva e de maturação tardia. Os vinhos produzidos com a casta Moreto são normalmente pouco encorpados e apresentam pouca cor, por isso é utilizada em vinhos de lote. Normalmente é lotada com as castas Trincadeira, Aragonez e Tinta Caiada. Casta produtiva, de maturação tardia, com baixos teores de açúcares, pelo que é geralmente a última casta a ser vindimada. Casta de elevada robustez e produtividade, indicada para zonas de calor extremo.

Castelão

Uma das formadoras da identidade dos vinhos portugueses, a Castelão é de suma importância para a vinicultura de Portugal. Esta cepa está entres as variedades mais amplamente cultivadas, estando entre as 250 uvas nativas de Portugal.

Periquita?

O mundo do vinho é repleto de confusões de ordem taxonômicas. Uma uva tem nomes diferentes dependendo da época ou localidade, mas no caso da uva Castelão, o fato é ainda mais curioso. Esta confusão acontece na relação entre Castelão e Periquita: muitas fontes (incluindo a Wikipédia) parecem pensar que Periquita é simplesmente um sinônimo de Castelão, mas isso está errado. Periquita é um nome do produto (ou marca, se assim você preferir), propriedade da vinícola José Maria da Fonseca. As misturas de Periquita sempre contiveram a uva Castelão, mas a maioria também contém quantidades variadas de outras uvas (aparentemente, apenas o vinho da Vinícola Fonseca chamada Periquita Clássica é 100% Castelão). A Castelão também já foi amplamente conhecida como Castelão Francês, mas quando Portugal reforçou suas leis do vinho, o nome oficial tornou-se simplesmente Castelão. Os melhores vinhos feitos com uva Castelão são oriundos da região de Setúbal, ao sul de Lisboa. Lá, especificamente, existe um terroir excelente para a produção de vinhos mais concentrados. É no sul de Portugal, abarcando também o Alentejo, aonde a maior parte da produção da uva Castelão é feita. Apesar disso, uma pequena parcela é plantada na parte central, na região do Douro, e estas são utilizadas no vinho do Porto. Nos vinhedos onde nascem as uvas Castelão, encontram-se cachos pequenos com bagos escuros, e com a casca grossa e em grande quantidade, principalmente se comparada à polpa. É sabido que em Portugal os vinhos varietais são raros. Então é mais comum serem encontrados cortes de Castelão misturados com Aragonês e Trincadeira, os quais permitem que o vinho resultante seja mais acessível e suave.

Trincadeira

A Trincadeira pode não ser muito conhecida, mas é outra uva da família das Vitis vinifera, cultivada essencialmente no Alentejo, na região do Douro e no Ribatejo. Também é conhecida como Trincadeira Preta ou Tinta Amarela (principalmente na região do Douro), e está presente principalmente nas regiões secas e quentes. Embora seja uma das pérolas da vitivinicultura portuguesa, a Uva Trincadeira é frequentemente evitada pelos produtores e enólogos por ser uma uva de difícil trato, por assim dizer. Suas cepas são de uma delicadeza tal que qualquer mínima demora em colhê-la na hora certa pode resultar no apodrecimento de seus cachos e em uma enorme perda de safra. Não é algo estranho que as uvas assumam características diferentes quando cultivadas em terroir distintos. Mas, a Trincadeira possui um temperamento ainda mais peculiar e isso reflete até nas diferentes nomenclaturas que pode assumir. Por exemplo, quando cultivada em Tejo e Alentejo, é chamada de Trincadeira Preta. Já, pelas paragens emolduradas do rio Douro, é chamada de Tinta-amarela. É Mortágua em Torres Vedras, em Arruda é Preto Martinho e Cravo Preto em Algarve. Ironicamente, a quantidade de nomes que possui a uva Trincadeira parece convergir com seu perfil instável, frágil e seu constante transtorno de personalidade. Se por um lado a prematuridade da colheita a deixa sem sabor, a mínima demora reflete na falta de acidez ou rápido apodrecimento dos cachos. É uma uva com bastante potencial para o amadurecimento, especialmente quando no apreciadíssimo barril de carvalho francês. Sua relação com o estágio em madeira é extremamente positiva, podendo revelar vinhos de alta complexidade e qualidade.

E finalmente o vinho!

Na taça tem um lindo vermelho rubi escuro, intenso, com reflexos violáceos que garante um reluzente brilho, com poucas lágrimas finas e de média persistência.

No nariz traz uma explosão aromática de frutas vermelhas como amora, framboesa e morango, com muito frescor.

Na boca é seco, com nuances frutadas, com boa presença de boca, um bom volume de boca que faz desse vinho, apesar de jovem, expressivo e exuberante, com taninos aveludados e macios, com uma baixa acidez e um final de média persistência.

Um vinho de estilo jovem, um cara de moderno, despretensioso e que certamente pode agradar aos paladares mais inexperientes, que está começando no universo do vinho e para aqueles mais calejados que quer um vinho mais informar ou receber amigos. Digo-lhes que é um vinho saboroso, gostoso e revisitando os meus arquivos de degustação, lembrei que degustei o Alandra tinto a três anos atrás, da safra 2015 e tenho na memória que sempre foi essa a proposta do rótulo: simples, mas nobre na sua proposta e importante no aspecto regional e cultural. Tem teor alcoólico de 13%.


Sobre a Herdade do Esporão:

A Herdade do Esporão está localizada em Reguengos de Monsaraz, cidade situada no Alentejo, região do centro-sul de Portugal que, apesar de ter uma produção bastante recente, com pouco mais de 40 anos, é a maior exportadora de vinhos de Portugal e uma das maiores do mundo. A Herdade tem 700 hectares de vinhas e olivais, além de alguns pomares e hortas. As cerca de 40 castas produzem uma variada gama de brancos, rosés e tintos, além de um excelente espumante e uma peculiar colheita tardia. Já as 4 variedades de azeitona dão origem a um dos mais famosos e prestigiados azeites no mercado internacional.

A Herdade conta com uma vastíssima programação de enoturismo, especialmente interessante no verão (junho a setembro), mas suficientemente variada para atrair novos fãs em qualquer época do ano. Aliás, o refinado restaurante da vinícola conta com cardápios distintos para cada estação. São duelos entre o Douro e o Alentejo, verticais, elaboração do próprio blend, refeições harmonizadas, até passeios de um dia inteiro entre as maravilhas naturais da linda propriedade. 

Mais informações acesse:

https://www.esporao.com/pt-pt/

Fontes:

Sobre a casta Moreto:

Site Vida Rural: https://www.vidarural.pt/insights/castas-portugal-moreto/

Site Vinho Virtual: https://www.vinhovirtual.com.br/uvas-209-Moreto

Sobre a casta Castelão:

Site Enologuia: https://www.enologuia.com.br/uvas/250-uva-castelao-portuguesa-com-certeza

Sobre a casta Trincadeira:

Site Enologuia: https://enologuia.com.br/uvas/232-uva-trincadeira-delicada-e-temperamental

Site Blogs dos Vinhos: https://blogdosvinhos.com.br/conheca-a-uva-trincadeira/

 

 

 

 

 

 

 






Um comentário:

  1. Obrigado por ler meu amigo! Sim, a Castelão é muito popular em Portugal e sempre está presente nos blends lusitanos. Uma casta com um forte apelo regional. De tanto figurar nos cortes dos rótulos portugueses despertou em mim um ávido interesse em degustar um varietal dessa cepa o que é difícil de encontrar. Então, se avistar um não hesite em comprar. ah, fico feliz que a resenha tenha trazido em você boas histórias e curiosidades do universo agradável do vinho! E recomendo este rótulo que, apesar de simples, é muito correto! Saúde!

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