sábado, 18 de junho de 2022

Moinho de Sula Reserva Baga 2014

 

Eis que, finalmente, ela me surge por inteiro! Falo de uma casta que é o símbolo, a personificação de uma região que, tem pouco tempo, que conheci e que, a cada rótulo, me deixo seduzir: Falo da casta Baga e da Bairrada!

E quando falo que ela me surge por inteiro é na sua versão varietal! Em várias experiências ela veio em corte, em blends, igualmente sedutores em que ela protagonizou e entregou vinhos peculiares, diria arrebatadores.

São definitivamente vinhos pouco usuais, pouco ortodoxos, diria difíceis para aqueles que estão adentrando no universo do vinho ou ainda aqueles que se entregam às zonas de conforto dos vinhos escancaradamente frutados.

Mesmo que a Baga, em tempos contemporâneos, graças ao enólogo e vinhateiro Luis Pato, conhecido como aquele que “domou” a Baga, a variedade é, por si só, extremamente peculiar, diferente, por assim dizer.

Como? Não sei dizer, tecnicamente! Talvez é mais algo mais orgânico ou pelo menos deveria ser os dois, mas a Baga traz, ainda hoje, algo de selvagem, de rústico, que a caracterizou nos seus primórdios, traz contornos de tabaco, de couro, de frutas secas e pretas. Em suma, uma casta pouco usual.

E quem abriu as cortinas, os meus olhos para a Baga, a Bairrada e o Beira Atlântico, a região coadjuvante, mas não menos importante, foi a Adega de Cantanhede. A Cantanhede me foi revelada, de uma forma quase despretensiosa, por um de seus rótulos mais falados e premiados, o Marquês de Marialva Colheita Selecionada. Eu degustei a safra 2014 no ano de 2019! Achei que estaria “avinagrado”, ruim! Enganei-me! Um senhor vinho! Vivo, pleno aos 5 anos! A Bairrada se revelara para mim com esse rótulo! A Baga se mostrava com a sua incrível capacidade longeva!

O interesse pelos rótulos desse produtor, pelos vinhos da Bairrada e do Beira Atlântico foi instantâneo. Para o Beira Atlântico foi um pulo! E a linha Moinho de Sula me foi apresentada! O Colheita Selecionada branco, o Reserva Arinto e mais recentemente o Colheita Selecionada tinto degustado com 6 anos de safra e tendo a Baga predominante.

Então dessa vez a Baga será protagonista e o vinho escolhido é da “família” Moinho de Sula. E este já está com seus oito anos de vida! Será que resistiu? Será que está em sua plenitude? A Ansiedade me toma de assalto nesse momento. O vinho ganha a liberdade com a retirada da rolha, o ritual traz a textura inicial à degustação.

A taça finalmente é inundada pela poesia líquida e finalmente o vinho que degustei e gostei veio do Beira Atlântico e se chama Moinho de Sula Reserva da casta Baga (100%) da safra 2014. E como gostei! Todas as características da Baga, que conheci, há pouco tempo, estão neste rótulo e agora figurando solitariamente, mas ricamente.

Então sem mais delongas, antes de tecer maiores e melhores, sem dúvida, comentários do vinho, contemos um pouco a história da Baga e da região onde domina: Beira Atlântico.

Baga

A uva Baga, uma das principais uvas nativas de Portugal, é capaz de oferecer enorme complexidade aos rótulos que compõe. Demonstrando muita classe e estrutura, a variedade da casta de tintos é única no seu valor e possui um fantástico potencial de envelhecimento, que atua com o vinho na garrafa durante anos após sua fabricação.

A uva Baga é uma variedade amplamente utilizada na costa central de Portugal, na elaboração de ótimos vinhos tintos. Particularmente na região da Bairrada, a Baga é, sem dúvida, uma das uvas tintas mais cultivadas, além de ser plantada também no Dão e em Ribatejo. Há quem diga que a casta nasceu nas terras do Dão, inclusive alguns produtores locais mais tradicionais defendem essa tese, mas foi nas terras da Bairrada que ganhou reputação, onde ocupa mais de 90% dos vinhedos.

A Baga é conhecida tradicionalmente pela espessura de sua pele, em proporção com o tamanho das pequenas bagas que o cacho apresenta. Além disso, essa variedade é extremamente tânica, podendo ser notado o caráter adstringente em alguns vinhos.

Baga

A Baga é uma uva pequena, com casca grossa, capaz de oferecer classe e estrutura aos rótulos que compõem, que vão desde os tintos até os rosés e espumantes. É exatamente o fato do fruto ser pequeno que faz com que os vinhos da uva Baga tenham taninos em alta concentração e acidez acentuada.

No passado, a Baga era conhecida por ser empregada na produção de vinhos rústicos, excessivamente ácidos e tânicos e de pouca concentração. Porém, após a chegada do genial Luís Pato, conhecido como o “revolucionário da Bairrada” e maior expoente desta variedade, a casta da uva Baga foi “domesticada”.

Luis Pato

O cultivo da Baga é árduo e trabalhoso, demorando para que o amadurecimento ocorra. A fruta desenvolve-se melhor quando plantada em solos argilosos e necessita de uma excelente exposição ao sol durante o processo de cultivo. Entretanto, após os devidos cuidados e maturação, a Baga produz preciosos rótulos, podendo envelhecer na garrafa durante anos, garantindo complexidade e elegância para seus exemplares, além de tornar os vinhos concentrados, aromáticos e possuidores de uma coloração escura.

Conhecida também como Tinta da Bairrada, Tinta Poeirinha ou Tinta Fina, a uva Baga atualmente é considerada uma das maiores uvas portuguesas, com enorme complexidade, estrutura e classe, sendo muito apreciada no mundo do vinho. A casta Baga dá origem a vinhos portugueses com muita personalidade, altamente interessantes e únicos.

Beira Atlântico

A produção de vinho na região remonta ao tempo dos romanos, fazendo disso prova os diversos lagares talhados nas rochas graníticas (lagares antropomórficos), onde na época o vinho era produzido. Já nos reinados de D. João I e de D. João III, respectivamente, foram tomadas medidas de proteção para os vinhos desta área do país, dadas a sua qualidade e importância social e econômica.

A tradição destes vinhos remonta ao reinado de D. Afonso Henriques, que autorizou a plantação das vinhas na região, com a condição de ser dada uma quarta parte do vinho produzido. Estendendo-se desde o Minho ate a Alta Estremadura, e uma região de agricultura predominantemente intensiva e multicultural, de pequena propriedade, aonde a vinha ocupa um lugar de destaque e a qualidade dos seus vinhos justifica o reconhecimento da DOC "Bairrada".

Beira Atlântico

Os solos são de diferentes épocas geológicas, predominando os terrenos pobres que variam de arenosos a argilosos, encontrando-se também, com frequência, franco-arenosos. A vinha e cultivada predominantemente em solos de natureza argilosa e argilo-calcaria. Os Invernos são longos e frescos e os Verões quentes, amenizados por ventos de Oeste e de Noroeste, que com maior frequenta e intensidade se faz sentir nas regiões mais próximas do mar.

A região da Bairrada situa-se entre Agueda e Coimbra, delimitada a Norte pelo rio Vouga, a Sul pelo rio Mondego, a Leste pelas serras do Caramulo e Bucaco e a Oeste pelo oceano Atlântico. E uma região de orografia maioritariamente plana, com vinhas que raramente ultrapassam os 120 metros de altitude, que, devido a sua planura e a proximidade do oceano, goza de um clima temperado por uma fortíssima influencia atlântica, com chuvas abundantes e temperaturas médias comedidas. Os solos dividem-se preponderantemente entre os terrenos argilo-calcários e as longas faixas arenosas, consagrando estilos bem diversos consoantes à predominância de cada elemento.

Integrada numa faixa litoral submetida a uma fortíssima densidade populacional, a propriedade rural encontra-se dividida em milhares de pequenas parcelas, com dimensões medias de exploração que raramente ultrapassam um hectare de vinha, favorecendo a presença de grandes adegas cooperativas e de grandes empresas vinificadoras, a par de um conjunto de produtores engarrafadores que muito dignificam a região.

As fronteiras oficiais da Bairrada foram estabelecidas em 1867, por Antônio Augusto de Aguiar, tendo sido das primeiras regiões nacionais a adoptar e a explorar os vinhos espumantes, uma vez que na região, o clima fresco, úmido e de forte ascendência marítima favorece a sua elaboração, oferecendo uvas de baixa graduação alcoólica e acidez elevada, condição indispensável para a elaboração dos vinhos espumantes.

E agora finalmente o vinho!

Na taça revela um vermelho granada intenso e límpido, típico da casta e talvez pelos seus oito anos de safra, com lágrimas finas, lentas e abundantes.

No nariz traz ainda, apesar do tempo de safra, um considerável aroma de frutas vermelhas e pretas bem maduras em perfeita sinergia com as notas amadeiradas, graças aos nove meses de passagem por barricas de carvalho, com toques de especiarias, diria um herbáceo, além de leve tosta e defumado.

Na boca apresenta um corpo médio, com um bom volume de boca e complexidade, mas elegante, redondo, equilibrado. A fruta madura protagoniza, como no aspecto olfativo, bem como o amadeirado, que ainda entrega o chocolate, a baunilha. Percebem-se também especiarias doces, terra molhada e tabaco. Tem taninos macios e uma incrível acidez. Final longo e cheio.

A experiência foi incrível! A Baga de fato traz personalidade! Essa é a palavra! E o vinho está no auge, no ápice com os seus oito anos de vida. A plenitude de uma casta retratada com as suas mais fiéis características e mesmo com a sua domesticação, se mostrou rústica, corpo médio, estrutura marcante, mas macio, elegante como bom vinho de oito anos de vida. Que a Baga se revele para todos dignos dela! Que a Baga se revele para mim sempre que eu merecer! O seu apelo regional merece o mundo! Tem 13,5% de teor alcoólico.

Curiosidades sobre o nome “Moinho de Sula”:

O Campo Militar da Batalha do Bussaco distribuiu-se por uma extensa zona da Serra do Bussaco e duas áreas, correspondentes a dois locais de combate distintos: o Campo de Santo António do Cântaro, situado abaixo da cumeada da Serra; o Campo de Moura/Sula, que inclui os moinhos com o mesmo nome, o Obelisco comemorativo da Batalha, erigido em 1873; e a Capela da Vitória, originalmente das Almas, que serviu de enfermaria de campanha às tropas da batalha.

Localizado na freguesia de Trezoi, no alto da Serra do Bussaco, o moinho de Sula foi construído entre os séculos XVII e XVIII. Com uma vista privilegiada sobre o vale de Mortágua, este lugar emblemático do Bussaco serviu de posto de comando ao general Robert Craufurd, comandante das tropas luso-britânicas que defendiam o flanco norte da Serra, em 1810.

Moinho de Sula

A cerca de 2 km do moinho de Sula, encontra-se o Moinho da Moura, moinho que foi albergue do posto de comando do Marechal André Massena, comandante em chefe das forças francesas, na Batalha do Bussaco, travada a 27 de setembro de 1810.

Um agradecimento especial e carinhoso à Adega de Cantanhede por gentilmente ceder o subsídio histórico de Moinho de Sula que entregue seu nome ao vinho que degustei e gostei.

Sobre a Adega de Cantanhede:                    

Fundada em 1954 por um conjunto de 100 viticultores, a Adega de Cantanhede conta hoje com 500 viticultores associados ativos e uma produção anual de 6 a 7 milhões de quilos de uva, constituindo-se como o principal produtor da Região Demarcada da Bairrada, representando cerca de 40% da produção global da região. Hoje certifica cerca de 80% da sua produção, sendo líder destacado nas vendas de vinhos DOC Bairrada DOC e Beira Atlântico IGP.

Reconhecendo a enorme competitividade existente no mercado nacional e internacional, a evolução qualitativa dos seus vinhos é o resultado da mais moderna tecnologia, com foco na qualidade e segurança alimentar (Adega Certificada pela norma ISO 9001:2015, e mais recentemente pela IFS Food 6.1.), mas também da promoção das castas Portuguesas, que sempre guiou a sua estratégia, particularmente das variedades tradicionais da Bairrada – Baga, Bical e Maria Gomes – mas também de outras castas

Portuguesas que encontram na Bairrada um Terroir de eleição, como sejam a Touriga Nacional, Aragonez e Arinto, pois acredita que no inequívoco potencial de diferenciação e singularidade que este património confere aos seus vinhos.

O seu portfólio inclui uma ampla gama de produtos. Em tinto, branco e rose os seus vinhos vão desde os vinhos de mesa até vinhos Premium a que acresce uma vasta gama de espumantes produzidos exclusivamente pelo Método Clássico, bem como Aguardentes e Vinhos Fortificados. É um portfólio que, graças à sua diversidade e versatilidade, é capaz de atender a diferentes segmentos de mercado, com diferentes graus de exigência em qualidade, que resulta na presença dos seus produtos em mais de 20 mercados.

A sua notoriedade enquanto produtor, bem como dos seus vinhos e das suas marcas, vem sendo confirmada e sustentadamente reforçada pelos prémios que vem acumulando no seu palmarés, o que resulta em mais de 750 distinções atribuídas nos mais prestigiados concursos nacionais e internacionais, com destaque para Mundus Vini – Alemanha, Concours Mondial de Bruxelles, Selections Mondiales du Vins - Canada, Effervescents du Monde – França, Berliner Wein Trophy – Alemanha e Japan Wine Challenge, sendo por diversas ocasiões o único produtor da Bairrada com vinhos premiados nesses concursos e, por isso, hoje um dos mais galardoados produtores da região. Em 2015 integrou o TOP 100 dos Melhores Produtores Mundiais, pela WAWWJ – Associação Mundial dos Jornalistas e Críticos de Vinho e Bebidas Espirituosas. Nos últimos 8 anos foi eleita “Melhor Adega Cooperativa” em Portugal por 3 vezes pela imprensa especializada.

Mais informações acesse:

https://www.cantanhede.com/

Referências:

“Divinho”: https://www.divinho.com.br/uva/baga/

“Mistral”: https://www.mistral.com.br/tipo-de-uva/baga

“Vinci”: https://www.vinci.com.br/c/tipo-de-uva/baga

“Winepedia”: https://www.wine.com.br/winepedia/sommelier-wine/serie-uvas-baga/

“Região de Coimbra”: https://visitregiaodecoimbra.pt/cultura-e-patrimonio/roteiros-de-3-dias/terras-ferteis-de-ilustres-guerras/mortagua/moinho-de-sula/#

“Soulwines”: https://www.soulwines.com.br/uvas-de-vinhos/baga

“IVV”: https://www.ivv.gov.pt/np4/503/

 

 












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