sexta-feira, 17 de abril de 2020

Malbec Day: História




Malbec é um nome forte, sua sonoridade chama a atenção de todos, mas de que mesmo se trata? Este nome foi dado a quem primeiro identificou esta uva, um viticultor húngaro chamado Malbek, que ajudou a espalhar a cepa pela Europa.

Comemorado pela primeira vez em 17 de abril de 2011, o Dia Mundial do Malbec, conhecido como “Malbec World Wine” é uma iniciativa global criada pela Wines of Argentina que busca posicionar o Malbec argentino como um dos mais importantes do mundo e comemorar o sucesso da indústria vinícola nacional. Esse evento histórico e cultural que promove, globalmente, contou, na sua primeira edição, com a participação de mais de 72 eventos, em 45 cidades de 36 países diferentes.

Cahors: a pátria mãe

Embora a Malbec tenha conquistado a Argentina foi na França que nasceu. Abrangendo uma região que se estende de Bergerac aos Pirineus (cordilheira que separa a França da Espanha), essa porção de terra, conhecida também como Gasconha, possui a maior diversidade de castas vitivinícolas de todo o território francês. Além da Malbec - mais conhecida por Auxerrois e Côt Noir - encontram-se por lá a Tannat, a Fer Servadou, a Negrette, a Duras, a Petit Manseng, a Gros Manseng, a Mauzac e várias outras. Isso se citarmos apenas as uvas tintas, que representam 80% da produção regional. Os vinhedos se espalham pelas subregiões de Madiran (Tannat principalmente), Tursan, Bergerac, Côtes de Bergerac, Côtes du Marmandais, Monbazillac, Gaillac, Fronton, Cahors e outras menos importantes. Por elas, correm os rios Lot, Cahors, Bergerac, Gaillac, Fronton, Puzat e Marmandais, a maioria deles tributários do estuário do rio Gironda.



Seus vinhedos acompanham o caminho desses rios. Parte do sudoeste francês e bem próxima à Bordeaux, Cahors sofreu forte influência de seu poderoso vizinho em sua dramática história. O vinhedo foi criado pelos romanos e, durante a Idade Média, seu prestígio teve expressivo crescimento. O casamento de Eleanor de Aquitânia com Henrique II, rei da Inglaterra, abriu as portas do grande mercado consumidor inglês, antes dominado pelos vinhos de Bordeaux. No entanto, os poderosos produtores e comerciantes bordaleses, sentindo-se ameaçados, mobilizaram-se para pressionar Londres e conseguiu arrancar do rei da Inglaterra alguns privilégios exorbitantes, o que resultou num duro golpe para os produtores gascões. Além de sofrerem pesada taxação, os vinhos do sudoeste só podiam chegar à capital inglesa depois que toda a produção bordalesa estivesse vendida. Tal regra durou cinco séculos (foi interrompida apenas em três curtos períodos) e o vinho da região sentiu o golpe. Esta conduta só foi abolida em 1776, pelo liberal ministro de finanças de Luís XVI, Jacques Turgot, quando se iniciou um novo ciclo dourado dos fermentados de Cahors. Apesar da Revolução Francesa e das guerras do Império já no século XIX, 75% do vinho da região era exportado e um terço das terras agricultáveis era dedicado à vinha, que cobria a impressionante área de 40 mil hectares. A região enfrentou bem a praga do oídio (de 1852 a 1860) e a superfície plantada subiu ainda mais, chegando a 58 mil ha. Para se ter uma ideia da queda que viria mais tarde, a área do vinhedo de Cahors hoje é de apenas 4.200 ha. Mas o território teve pior sorte ao enfrentar a filoxera no final do século XIX. Como se sabe, todos os vinhedos atacados no mundo tiveram de ser replantados, desta vez, de forma enxertada. Então, as vinhas de Malbec reagiram muito mal a esta nova situação, dando origem a fermentados medíocres, com qualidade muito abaixo da que tinha anteriormente. Apenas no final dos anos 1940, depois de muita pesquisa, chegou-se ao clone 587 da Malbec, que teve muito boa adaptação. Assim se retomou, então, sua marcha ascendente até chegarmos a 1971, quando Cahors é declarada região AOC (Appellation d'Origine Contrôlée, denominação de origem controlada). A região está renascendo.



A chegada da Malbec na Argentina

Mas por que o dia 17 de abril foi escolhido para celebrar a Malbec pelo mundo?

Assim como no Brasil, os primeiros exemplares de vitis vinifera, a uva própria para produção de vinho, chegaram na Argentina no início do século XVI junto com os seus colonizadores. No entanto, foi só em 1551 que o cultivo da uva se espalhou por toda a região. As condições climáticas e o solo dos arredores dos Andes favoreceram muito a agricultura dos vinhedos e, impulsionada pelos monastérios que precisam produzir vinho para a celebração das missas.


Junto com a cultura espanhola desembarcou na Argentina uma forte tradição católica, e a vitivinicultura se beneficiou enormemente de ambas. No século XIX chegou à região uma nova onda de imigrantes europeus que trouxeram em suas bagagens novas cepas estrangeiras e muita tradição na produção de vinhos, como os italianos. Os europeus recém-chegados encontraram em Los Andes e no Vale de Rio Colorado os locais ideais para começar o seu próspero cultivo, e ali se estabeleceram. Entre 1850 e 1880 a produção de vinhos argentinos começou a mudar de forma. Com a integração do país à economia mundial, a chegada da industrialização e a abertura de múltiplas ferrovias cortando a região, o que antes era uma agricultura voltada para a produção de vinhos tomou forma de uma indústria do vinho.


Em 1853 foi criada a Quinta Normal de Agricultura de Mendoza, a primeira escola de agricultura do país, por meio da qual novas técnicas de cultivo de vinhedos foram implementados na região, como o uso de máquinas e modernas metodologias científicas. O seu fundador foi, claro, um francês, chamado Michel Aimé Pouget, conhecido também por Miguel Amado Pouget.

Michel Pouget: o homem por trás da Malbec argentina

Michel Aimé Pouget ou Miguel Amado Pouget nasceu na França em 1821. O engenheiro agrônomo emigrou primeiro para o Chile e depois para Mendoza, na Argentina.

No Chile trabalhou em Villuco, na propriedade de José Patricio Larraín Gandarillas, que apresentou todas as notícias europeias e americanas em questões agrícolas em sua terra natal. Sua fazenda chamada Peñaflor era um verdadeiro livro de amostra aplicado ao trabalho da terra. Já em 1844, ele teve a glória de trazer de Milão (Itália), vinte e cinco colmeias, das quais apenas duas chegaram com abelhas. Este estabelecimento escasso foi a base da apicultura chilena e depois da Mendocina. Gandarillas contratou os serviços do especialista apicultor D. Carlos Bianchi para restaurar seu apiário punido e colocar o sábio agricultor Miguel Amado Pouget à frente de suas plantações. Pouget realizou milagres nas propriedades de Larraín Gandarillas, Santiago do Chile e Villuco. Ele fez extensas plantações de acordo com os mais recentes avanços da ciência francesa e introduziu inúmeras variedades em horticultura, jardinagem e arboricultura.


Em 1852, o presidente da Argentina à época, Domingo Faustino Sarmiento se estabeleceu em Mendoza e propôs ao governador Pedro Pascual Segura a contratação do engenheiro agrônomo francês Michel Aimé Pouget. Ele próprio aceitou a proposta e se estabeleceu em Mendoza, em 1853. Modelada na França, a iniciativa propunha a adição de novas variedades de uvas como um meio de melhorar a indústria vinícola nacional. Em 17 de abril de 1853, com o apoio do governador de Mendoza, foi apresentado um projeto ao Legislativo Provincial, com o objetivo de estabelecer uma Escola Agrícola e Quinta Normal. Este projeto foi aprovado pela Câmara dos Deputados em 6 de setembro do mesmo ano. Portanto, Pouget plantou em Mendoza com Justo Castro inúmeras variedades de uvas originárias de seu país de origem: entre elas estava o Malbec, uma variedade que os antigos viticultores gostaram muito pelo seu alto rendimento, sua saúde, e a boa cor de seus vinhos e o Cabernet Sauvignon, Merlot, Semillon, Sauvignon Blanc, Chardonnay, Riesling e outros.

No final do século XIX, com a ajuda de imigrantes italianos e franceses, a indústria do vinho cresceu exponencialmente e, com ela, a Malbec, que rapidamente se adaptou aos vários terroirs e se desenvolveu com resultados ainda melhores do que em sua região de origem. Assim, com o tempo e com muito trabalho, surgiu como a principal uva da Argentina.

A consolidação da Malbec e da indústria vitivinícola da Argentina

Para se ter uma ideia do crescimento da produção de vinho argentino nessa época, em 1873 o país contava com apenas 2.000 hectares de vinhedos, enquanto em 1990 a área cultivada chegou a 210.371 hectares. O sucesso exponencial da cepa aconteceu também após o início da década de 1990, sendo que em um período de 20 anos, até 2009, suas áreas de cultivo cresceram 173%, passando de 10 mil hectares para 28 mil hectares (hoje já são 33 mil). Do total, 26 mil hectares marcam presença em Mendoza, principal região vitivinícola do país, seguido por San Juan (1,9 mil hectares), Salta (702 hectares), Neuquén (587 hectares), La Rioja (523 hectares) e outras. Presente em praticamente todo o país, a uva emblemática da Argentina produz vinhos de diferentes estilos e com características que variam a cada terroir. Via de regra, pode esperar aromas de ameixas maduras e o frescor de folhas de menta de um típico exemplar. A Malbec também é famosa por seus vinhos encorpados, repletos de taninos potentes (usualmente amaciados pelo estágio em carvalho).

A região de Luján de Cuyo foi a primeira a ter uma denominação de origem controlada (DOC) nas Américas para a casta Malbec. Embora vigore há décadas a denominação de origem foi reconhecida oficialmente em 2005. Os vinhos produzidos sob esse rótulo são elaborados com Malbec, e procedentes da zona de Luján de Cuyo, na província de Mendoza. De cor muito intensa e escura, vermelho cereja, o Malbec Luján de Cuyo pode chegar a parecer quase preto, e tem aromas de frutas negras e de especiarias doces, com forte expressão mineral. Como o conceito de denominação de origem não é tão forte na produção de vinhos do Novo Mundo, onde o que costuma dominar é o conceito de classificação de vinhos conforme a composição, e não conforme o terroir, ainda são poucas as vinícolas que produzem vinhos rotulados como Malbec Luján de Cuyo.

O dia 17 de abril é, para Vinhos da Argentina, não apenas um símbolo da transformação da indústria vinícola argentina, mas também o ponto de partida para o desenvolvimento desta uva, um emblema para o nosso país em todo o mundo.




Fontes:

Site Wines of Argentina, em:


Site El Malbec, em:


Site Vinos y Vides, em:


Sites Mulheres Empreendedoras, em:


Site Tintos & Tantos, em:



Site Grand Cru, em:


Site Revista Adega, em:










quarta-feira, 15 de abril de 2020

Qual a diferença entre blend e varietal?


Durante séculos da história da produção de vinhos poucas pessoas sabiam quais as variedades de uvas havia na bebida que estavam consumindo. Nomes como Cabernet Sauvignon, Chardonnay, Merlot, Sauvignon Blanc só ficaram "famosos" nos rótulos do mundo todo quando os produtores de fora da Europa, especialmente os norte-americanos, resolveram estampar os nomes das principais castas europeias em seus vinhos.

Antes desse fenômeno ocorrer, por volta de meados do século passado, os produtores raramente colocavam os nomes das variedades em seus produtos, optando sempre pelo nome das regiões DOC (Denominações de Origem Controlada) junto ao nome da propriedade, como, por exemplo: Joseph Drouhin Chablis. Ou seja, um Chablis - produto que representa uma região da Borgonha onde os vinhos brancos são feitos somente com uvas Chardonnay - do vinhateiro Joseph Drouhin. Então, o que indicava a casta com a qual o vinho era feito era o nome da região.

Modernamente, em uma jogada de marketing, os produtores do Novo Mundo passaram a colocar as variedades nos rótulos, para mostrar aos consumidores que seus vinhos eram feitos com as tradicionais e nobres uvas europeias e, assim, também para dar uma pista do estilo que seus vinhos teriam. Os consumidores passaram então a identificar-se com o estilo de cada uva e a apresentação das castas ganhou espaço no mundo inteiro.

Varietais e Blends

No entanto, vinhos monovarietais (ou varietais, feitos, teoricamente, com apenas uma casta) e blends (ou também ditos de corte, ou assemblage, ou assemblagem) não são novidade. Duas das principais regiões produtoras de vinho no mundo são os melhores exemplos dessas tradições. Os renomados tintos de Bordeaux sempre foram feitos com cortes. Cabernet Sauvignon, Merlot, Cabernet Franc e Petit Verdot são quatro das principais castas usadas nos blends feitos na região. Durante séculos de savoir-faire, os produtores daquela região aprenderam a misturar quantidades exatas de cada variedade para produzir seus vinhos safra após safra. Já os vinhateiros da Borgonha, outra clássica zona vitivinicultora francesa, sempre fizeram seus tintos com uma única casta tinta, a Pinot Noir, defendendo que ela seria delicada e sutil demais para se misturar com as outras. Nos vinhos de corte, a mistura das uvas é pensada pelo enólogo para que ele obtenha o melhor de cada uma das variedades.

Varietal 100% ou Blends aleatórios?

Quem pensa que vinhos varietais são sempre 100% feitos de uma única casta está enganado. A legislação de cada país, e de cada região, determina a porcentagem mínima necessária para que um vinho possa ostentar no rótulo o nome de uma casta como sendo um monovarietal. No Chile e na Nova Zelândia, por exemplo, é preciso que 75% do vinho tenha uma única casta para que seja considerado varietal. Ou seja, o enólogo pode "completar" o vinho com outros tipos de uva caso considere necessário. Por que ele faria isso? Para, por exemplo, emprestar ao seu vinho maior acidez, ou então dar mais estrutura e corpo através do acréscimo de outra variedade. Porém, apesar de permitido, as percentagens de outras cepas costumam ser bem menores que 25%.

No Brasil, para que um vinho traga o nome de apenas uma uva estampado no rótulo precisa ter ao menos 75% dessa variedade na sua composição.

E os blends? Seriam eles feitos aleatoriamente, juntando algumas castas e pronto? Nada disso. Em Châteauneuf-du-Pape, região vitivinícola francesa localizada no vale do Rhône, no sudeste da França, 13 variedades de uva são permitidas para compor seus vinhos e cada enólogo usa as que acredita mais interessantes (ou melhores) em uma determinada safra. Ele escolhe as proporções de cada uva baseado no estilo que pretende obter, contrabalançando pontos fracos de uma com os fortes de outra e criando algo harmonioso e maior do que a soma das partes. Essa mistura geralmente é feita pouco antes de o vinho ser engarrafado. Contudo, há casos, como nos Vinhos do Porto, em que diferentes uvas são prensadas juntas, formando um único caldo que depois será fermentado. Vinhos varietais nem sempre são feitos 100% de uma única uva.

O que é melhor?

Os defensores dos vinhos varietais advogam que somente os monocastas representam a verdadeira essência do terroir, ou seja, o gosto real da terra, do clima e todas as nuances da qual depende uma região produtora. Já os fãs dos blends defendem a arte milenar que está por trás da técnica de misturar diferentes castas e obter um vinho da máxima qualidade. O que é melhor? Aí depende de você, pois há vinhos maravilhosos feitos com apenas uma uva e também com diversas. Bom mesmo é provar para descobrir o que há de mais interessante por aí.

Safras

Repare que boa parte dos vinhos de corte possuem proporções diferentes de cada uva ano a ano. Por que isso? Porque a cada safra em uma determinada região, um ou mais tipos de uva se dão melhor do que outros, ou então ganham características levemente diferentes de anos anteriores, devido aos efeitos do clima. Assim, um grande produtor, que sempre busca a constância em seus vinhos, vai procurar compensar essas diferenças reajustando as proporções de cada variedade. Em alguns casos, como em Champagne, por exemplo, ele não apenas pode mudar as porcentagens de cada uva (Chardonnay, Pinot Noir e Pinot Meunier são as três castas permitidas) como também usar vinhos base de outras safras para chegar ao estilo que pretende.




120 Reserva Especial Sauvignon Blanc 2016


Sabe aquele vinho que encontramos no fundo da gôndola, empoeirado, sem destaque algum no supermercado que, por uma ordem do instinto, um chamamento do coração, pegamos e, quando degustamos nos arrebata em uma surpresa agradável? Pois é, uma das grandes alegrias de um humilde enófilo é investir em vinhos subestimados, geralmente baratos, e ter um retorno espetacular e improvável. Isso corrobora uma máxima, diria, de que vinho barato não deve ser encarado como um vinho ruim, mas apenas uma proposta diante de tantas que temos no universo infindável de vinhos.

O vinho que degustei e gostei veio do Chile, da região do Valle Central, o 120, reserva especial, tradicional linha de rótulos da igualmente tradicional Viña Santa Rita, da casta Sauvignon Blanc, ou melhor, segundo o site do produtor, conta com um corte de 98% de Sauvignon Blanc e apenas 2% de Semillón. Mas de acordo com uma legislação chilena, as castas que compõe um baixo percentual na composição do blend ou corte do vinho, não é informada nos seus rótulos. Para mais informações leia: Qual a diferença entre blend e varietal?

Na taça conta com um amarelo palha com reflexos esverdeados e brilhantes.

No nariz aromas intensos de frutas brancas frescas como abacaxi, melão, maçã verde e pêra, com um agradável toque floral que já denuncia um frescor e leveza.

Na boca se confirma as impressões olfativas com uma acidez agradável, e um agradável final frutado de média intensidade.

A linha 120, como diz no site da vinícola, entrega, com maestria, a simplicidade, a nobreza de entregar o vinho na sua expressão mais genuína, sobretudo no tocante as características da cepa, um vinho leve, fresco, para ser degustado jovem, de forma despretensiosa, desfrutando com amigos e harmonizando com comidas leves como frituras, carnes brancas e massas leves, sem condimentos fortes. Um vinho sensacionalmente surpreendente. Não posso dizer categoricamente isso, mas essa safra, 2016, deve ter sido muito especial, o vinho estava soberbo, muito equilibrado e harmonioso, talvez a sinergia entre o clima e a mão humana foi determinante para esse belo vinho. Tem 12% de teor alcoólico.

A história do rótulo “120”:

Em 1814, um grupo de soldados do movimento de independência, após a Batalha de Rancágua, procurou abrigo e refúgio na Hacienda de Paine que era uma propriedade agrícola que remonta antes mesmo da efetiva fundação da Viña Santa Rita, em 1880. Paula Jaraquemada, proprietária e defensora do movimento e ciente da proximidade dos espanhóis, protegeu os 120 soldados no porão da sede da fazenda, salvando suas vidas. Não à toa, uma das principais linhas da Santa Rita é o rótulo 120, em alusão aos soldados. Na ilustração abaixo, do início do século XIX, mostra Paula Jaraquemada sendo interrogada por soldados da Coroa Espanhola, em busca dos 120 soldados pró-independência.



A independência do Chile foi obtida em 1818, e a “Hacienda” viveu dias tranquilos a partir de então. Os anos se passaram e, em paralelo, no ano de 1880, o empresário chileno Domingos Fernández Concha fundara a Viña Santa Rita.

Sobre a Viña Santa Rita:

A Vinícola Santa Rita foi fundada em 1880 por Domingo Fernández Concha, destacado empresário e homem público da época. Dom Domingo introduziu finas cepas francesas nos privilegiados solos do Vale do Maipo e incorporou maquinaria especializada, o que somado à contratação de enólogos da mesma nacionalidade lhe permitiu produzir vinhos com técnicas e resultados muito superiores aos tradicionalmente obtidos no Chile, mudando a forma de elaborar vinhos em nosso país. Desde o final do século XIX e até meados do decênio de 1970, a vinícola funcionou sob o controle da família García Huidobro, iniciando com Dom Vicente García Huidobro, genro de Dom Domingo Fernández Concha, quem continuou com o legado e ideais do fundador.  No ano de 1980 o Grupo Claro e a empresa Owens Illinois, principal produtora de embalagens de vidro do mundo, adquirem parte do patrimônio da Vinícola Santa Rita. A chegada do Grupo Claro significou um forte impulso para a empresa. Na área produtiva foram introduzidos significativos avanços tecnológicos e técnicas de elaboração de vinhos desconhecidos até então no Chile. Da mesma forma, foi fortemente impulsionada a criação de novas linhas de vinhos; no ano de 1982 inicia-se a linha 120 e em 1985 começa a exportação de vinhos chilenos para distintos mercados do mundo. O crescimento da Santa Rita ocorreu também a partir da aquisição de marcas de prestígio no mercado como Carmen, em 1987. Em 1988, o Grupo Claro assume a propriedade total da Vinícola Santa Rita. Inicia-se um período de grande expansão da vinícola, transformando-se em sociedade anônima aberta em 1990. Seu crescimento se baseou no forte impulso às exportações e na excelente reputação de seus vinhos, os quais obtiveram importantes prêmios. Na década de 90 se iniciou investimentos significativos em todos os processos. Em todos os processos, destacando-se a área enológica, na qual foram incorporados novos equipamentos, tanques de aço inoxidável e barris de carvalho francês e americano. Na área agrícola consolidou-se a aquisição e plantação de mais de 1000 hectares nos mais importantes vales da vitivinicultura chilena: Maipo, Colchagua e Casablanca. Os mais de 135 anos nos quais a Vinícola Santa Rita tem trabalhado na elaboração de vinhos lhe propiciaram acumular uma vasta experiência, que sem dúvida repercute na qualidade de seus produtos, qualidade esta mantida inalterável com o passar do tempo e que seguirá surpreendendo consumidores em cada canto do mundo.

Mais informações acesse:

https://www.santarita.com/pt/

Vinho degustado em 2017.


Guia definitivo dos vinhos de Bordeaux


Além de ser a maior, mais antiga e mais prestigiada região vitivinícola do país, Bordeaux tem um dos terroirs mais reconhecidos do mundo dos vinhos, principalmente para os clássicos cortes do Velho Mundo.

Um pouco de história

Não é de hoje que Bordeaux é referência no mundo do vinho. Desde a Idade Média, a região tem atraído olhares de outras partes do mundo, principalmente da Inglaterra, que a incorporou à rota mercantilista – isso num tempo em que a maioria das denominações francesas eram praticamente desconhecidas fora do país.

Vamos começar pensando na fama que Bordeaux tem: vinhos elegantes, estruturados, bem feitos. Talvez os mais “franceses” da França. Comprar um Bordeaux é, na maioria das vezes, a certeza de um vinho correto, de um vinho que vai evoluir na guarda, de um vinho complexo, a cara do Velho Mundo.

Isso não quer dizer que não dá para se decepcionar com um Bordeaux. Tampouco quer dizer que não existam rótulos mais simples e baratos. Como saber? Como escolher? Não se preocupe até o final deste guia você vai saber tudo isso de cor!

Onde está?

Posicionada no litoral sudoeste da França, Bordeaux é uma região entremeada pelos rios Dordogne e Garone, que, ao se encontrarem, dão origem ao Gironde (maior e mais influente que os demais). Seu próprio nome faz referência aos rios (Bordeaux deriva da expressão francesa “au bord de l’eau”, que significa “ao longo das águas”).

Talvez a abundância de águas, tanto dos rios quanto do mar adjacente, seja um dos maiores atributos de Bordeaux. Além de amenizar o clima da região, as águas provêm o melhor ambiente para o desenvolvimento das videiras.

De tão extensa que é Bordeaux, a denominação está mais para um conjunto de várias denominações e terroirs. Um antigo ditado de Bordeaux diz que os melhores vinhedos “podem ver o rio”, regiões onde o solo é formado por cascalho e pedras, perfeito para a drenagem da água. A maioria dos principais produtores bordaleses está exatamente nessas localidades.

É exatamente por isso que Bordeaux deu tão certo no mundo dos vinhos – ali, as uvas crescem no clima, no solo… No terroir ideal. Existem outras denominações até melhores? Claro que sim, mas Bordeaux ainda é vista como um modelo a ser seguido para que tudo dê certo no final.

Mas nem sempre é igual

Na verdade, é sempre diferente. Mesmo com os rios, o clima da localidade ainda é extremamente delicado, chegando a ponto de ser instável. É justamente por isso que cada safra se diferencia das demais, algo que não se vê na maior parte do Novo Mundo, onde os climas são estáveis.

Em Bordeaux, é possível saber se um vinho é bom única e exclusivamente pela safra. Para os críticos, os anos de 2001 e 2002, por exemplo, foram ruins – seus vinhos, então, mais baratos e menos complexos; Já 2005 e 2009 foram algumas das melhores deste milênio, o que resulta em vinhos que ficam na memória (seja pelos sabores gostosos e persistentes ou pelos altos preços).

Quando a safra é tão boa, fica até difícil encontrar os vinhos no mercado. Os grandes apreciadores compram garrafas e mais garrafas, pois são vinhos que podem evoluir na guarda por muitos anos (10, 20, 50!), característica de Bordeaux que nenhum outro canto do mundo consegue imitar.

Sabe onde estão esses vinhos tão “tops”? Eles estão em leilões, em adegas pouco acessíveis, nas mãos dos colecionadores ou na China…

Negócios da China

Como assim estão na China?! Desde 2011, o consumo dos chineses tem sido de cerca de 1,3 milhão de litros por ano. O país já se tornou o primeiro importador mundial de vinhos de Bordeaux. Além disso, cerca de 30 vinhedos de Bordeaux foram comprados por chineses, e mais dezenas estão sendo negociados.

Pois é, o dragão tem sede de vinho, e encontrou seu pote de ouro justamente em Bordeaux (e ao pé da letra!). Isso porque os vinhos bordaleses, com o passar dos anos, tem índices de rendimento bem maior que outros investimentos tradicionais, como ouro, ações, antiguidades e até diamantes. Dez anos de guarda e o vinho valerá 500% o valor pago na garrafa!

Além disso, para os chineses, toda reunião de negócios que se preze precisa ser finalizada com um brinde de um grande Bordeaux. Do contrário, os convidados levarão como ofensa. Os chineses estão a cada dia mais exigentes, querendo vinhos diferentes e mais especiais.

Por melhor que seja a situação (para os produtores e chineses, claro), ela traz algumas complicações. A começar pelas falsificações. Houve um ano que a China vendeu mais garrafas do Lafite Rothschild que foi produzido no próprio château, nada mais nada menos que o tinto avaliado como o mais caro de todo o mundo.

Corte bordalês

Apesar de vasta, Bordeaux cultiva poucas uvas. São elas Cabernet Sauvignon, Merlot, Cabernet Franc, Malbec, Petit Verdot, Sauvignon Blanc, Sémillon, Muscadelle e Ugni Blanc. Houve um tempo em que a Carménère também brotava na região, porém foi extinta pela praga da filoxera que devastou parte de Bordeaux (e da Europa inteira).

Não existe uma regra específica quanto às proporções usadas no corte, e também nem todas as cepas precisam estar presentes. Cada uma delas desempenha um papel no corte e contribui de alguma maneira para deixar o vinho redondo, correto. Para se ter uma ideia, a maioria dos rótulos de Bordeaux nem mencionam as uvas que levam.

Como descobrir, então, o que estamos bebendo? Pela região de onde a garrafa vem…

As sub-regiões de Bordeaux

Quanto menor a denominação, melhor o vinho. É por isso que os melhores vinhos de Bordeaux não estampam seu nome no rótulo, mas o da sub-região. E por ser tão grande, a região francesa possui dezenas delas. Difícil seria conhecer todas…

Vamos falar das principais regiões e te ajudar a escolher as que mais gosta de acordo com o estilo de vinho, as uvas, os preços…

Tem a ver com o rio…

Extensa, Bordeaux é formada por diversas comunas. E adivinhe só? Cada uma se tornou uma denominação de origem (ou apelação, como chamam os franceses). Pode parecer frescura, mas não é. Para conseguirem estampar o nome da denominação de onde saíram, os vinhos passam por longas e rigorosas avaliações.

Podemos dizer, de modo geral, que Bordeaux se divide em três partes ao longo do rio Gironde: margem esquerda, margem direita e Entre-Deux-Mers (“entre dois mares”, em francês). Daí, então, já dá para tirar algumas conclusões: à direita do rio, predomina a Merlot, enquanto que à esquerda, Cabernet Sauvignon; já Entre-Deux-Mers é conhecida por seus brancos. Ah, e é bom ter isso sempre em mente, afinal, os vinhos de Bordeaux não costumam estampar a uva no rótulo, mas pela denominação já dá para saber!

Obviamente é muito mais complicado do que parece! Mas vamos simplificando…

Margem esquerda

O que sabe sobre a margem esquerda, tirando o fato de nela predominar o cultivo da Cabernet Sauvignon? É onde estão alguns dos maiores nomes de Bordeaux. São grandes as chances de já ter ouvido falar em alguns dos rótulos e vinícolas de peso que de lá emergiram.

Médoc

Talvez seja essa a sub-região de Bordeaux de maior importância. Ao menos é a primeira a ser lembrada (e a mais cara também…). Formada por seis comunas, das quais quatro são extremamente famosas, Médoc começa na cidade de Bordeaux e se estende por 50 quilômetros ao longo do Gironde.

Saint-Estèphe, Pauillac, Saint-Julien e Margaux são tão prestigiadas justamente por terem o que muitos consideram o melhor terroir de Bordeaux (e estão todas em Médoc!). Não à toa, estão em peso na lista dos primeiros classificados de 1885.

Saint-Estèphe

O estilo mais rústico dos vinhos de Saint-Estèphe nasce junto à foz do Gironde. Para contrariar a maioria dos châteaux de Médoc, os daqui preferem Merlot à Cabernet Sauvignon. Mas não espere um Merlot macio, característica tão tradicional uva. Estes são densos e poderosos. É o Château Cos d’Estournel, com seus vinhos ricos e expressivos, que se destaca na região.

Pauillac

Château Latife-Rothschild, Château Mouton-Rothschield e Château Latour. Precisa de mais? É em Pauillac que estão 18 dos 61 maiores vinhos de Bordeaux (lembra da classificação de 1885 que mencionamos? Aguarde e descobrirás…). Encorpados e luxuosos, com distintos toques de groselhas negras e oxicoco (cramberry!).

De lá, saem vinhos com potencial de guarda incomparável – de 20, 30, 40, 50 anos! É exatamente por isso que esses vinhos fazem a base do mercado de vinho de investimento. Um leilão de vinhos pelo Sotheby’s? Pode ter certeza que Paulliac será a estrela. E, como já deve estar imaginando, se a escolha for um Pauillac, é bom preparar o bolso com muitos dígitos (mais do que está pensando)!

Saint-Julien

Precisos e refinados, certinho, corretos… É assim que são os principais vinhos de Saint-Julien. Destacam-se por lá o Château Ducru-Beaucaillou, Château Gruaud-Larose e Château Gloria (o Bordeaux perfeito para os amantes da região que procuram vinhos a preços um pouco mais acessíveis do que nas outras regiões).

Margaux

Além de, obviamente, o Château Margaux (um dos principais do mundo), a região abriga ao menos outras 20 propriedades bem conceituadas. Com um dos solos mais favoráveis de Médoc, composto principalmente de cascalho, é de lá que saem os melhores vinhos das melhores safras. A denominação é conhecida pela elegância, refinamento e generosos aromas de frutas vermelhas, tostado, café e até trufa. Procure vinhos do Château Margaux, Château Palmer, Château Rausan-Ségla e Château Angludet e não se arrependerá!

Graves

Assustado com os preços? Não se preocupe, seu lugar existe e é em Graves, lar dos vinhos mais em conta de Bordeaux.

É da mistura entre cascalho e quartzo que o solo dos melhores châteaux de Graves são compostos. O próprio nome da apelação deriva da palavra francesa “gravier”, que significa cascalho.

Além da Cabernet Sauvignon, variedade que domina a região, Merlot e Cabernet Franc são usadas com bastante frequência. E preste atenção, pois estamos falando de uma das únicas partes de Bordeaux que fazem tanto vinhos tintos como brancos. Em se tratando destes, a maioria resulta do corte de Sémillon e Sauvignon Blanc.

Vinhos de algumas das mais antigas vinícolas de Graves chegavam na Inglaterra antes mesmo do século 12. Sendo assim, no século 16, alguns châteaux já eram conhecidos e tinham sua boa reputação conhecida, como é o caso do Château Haut-Brion, um dos mais tradicionais da região. Tão grande era a fama da propriedade, que é a única representada nos classificados de 1885.
Acontece que, alguns daqueles considerados melhores vinhos de Graves, agora pertencem a uma importante denominação que a região congrega, Pessac-Leógnan. É especificamente de lá que saem os mais conceituados brancos e tintos de Graves.

Sauternes e Barsac

Ao sul de Graves, ainda ao longo das margens do Gironde, estão situadas as comunas mais doces de Bordeaux. É de Sauternes e Barsac que estamos falando, provavelmente as mais devotas aos vinhos de sobremesa. Mais do que simplesmente doces, com deliciosas notas de mel e damasco, equilibram como nenhum outro acidez e álcool. Além de Sémillon, cepa que reina na região, alguns vinhos também contém Sauvignon Blanc, ambas atingidas com a dita “podridão nobre”… “Podridão nobre?!” Isso mesmo, clique e saiba mais sobre ela (não se preocupe, ela é do bem!).

O clima é um fator tão determinante para que as uvas sejam naturalmente atingidas pelo fungo, que os melhores châteaux simplesmente se recusam a vinificá-las nos anos em que umidade e calor não foram ideais. Para se ter uma ideia, um dos mais renomados, o Château d’Yquem, não chega a produzir uma garrafa sequer ao menos duas vezes numa década. Parece loucura, mas preferem lidar com os prejuízos de um ano sem produção a abaixar o padrão de qualidade de seus vinhos.

Margem direita

Cruzar a margem do Gironde é como viajar para outra região. As comunas à direita em nada lembram as da margem esquerda, com luxuosos châteaux e vinhedos enormes. São mais modestas, menos conhecidas (com uma exceção) e, além disso, quem domina a região é a Merlot, e não a Cabernet.

Saint-Émilion

Quanto menor o vinhedo, menos mão de obra necessária, certo? É isso mesmo que acontece em Saint-Emilion, e justamente por essa razão que os vinhos são, em sua maioria, feitos pela própria família dona da propriedade. Um dado curioso sobre a região apenas confirma o fato: para cada três habitantes existe um château.

Diferente das outras, Saint-Emilion é toda distribuída em colinas de calcário, as chamadas côtes. Além disso, é a comuna mais medieval de Bordeaux, chegando até a lembrar uma fortaleza. Os melhores vinhos da denominação saem do Château Cheval Blanc, Château Magdelaine ou Château Ausone.

Pomerol

A menor das sub-regiões de Bordeaux é também uma das que mais atraem olhares dos apreciadores da região. O mais curioso é que, até o início do século vinte, passava despercebida. O motivo da reviravolta? Simplesmente por ser a casa de um dos mais prestigiados châteaux do mundo, o Pétrus. É lá, portanto, que estão os vinhos mais caros de toda Bordeaux.

Mais de 70% da região é coberta por Merlot e o restante é praticamente exclusivo de Cabernet Franc. Isso porque seu solo resulta da mistura entre argila e carvalho, perfeito para ambas.

Nas melhores regiões de Pomerol nascem vinhos aveludados e ricos em notas de ameixa, cacau e violetas. Vinhos que combinam intensidade e elegância. É por essas características que é mais fácil encontrar Bordeaux de Pomerol num restaurante a um vinho de outras sub-regiões. Eles são fáceis de beber e não precisam de tantas anos de guarda para chegarem ao auge.

Entre-Deux-Mers

Como o próprio nome já diz, a região se encontra entre os rios Dordogne e Garonne. Nunca ouviu falar nela? Pois é… É um tanto quanto marginalizada mesmo, principalmente quando comparada às demais denominações de Bordeaux. Nunca seus vinhos foram classificados e a maioria dos tintos, inclusive, não segue as regras da denominação Entre-Deux-Mers, se enquadrando apenas como Bordeaux ou Bordeaux Superiéur.

Lá, os brancos é que dominam. Feitos principalmente de blends de Semillón, mas também de Sauvignon Blanc e Muscadelle, são florais com um toque picante. E por não estagiarem em barrica, ganham leveza e frescor como nenhum outro.

Escrito em grego?

Afinal, como ler um rótulo de Bordeaux? Bordeaux Superiéur, Cru, Grand Cru… O que é tudo isso? Que classificações são essas? Não está entendendo nada? Calma, calma, vamos te ajudar!

Saber ler o rótulo de um Bordeaux não parece tarefa difícil. Basta conhecer as leis estabelecidas pelo conselho francês e “voilà”! Qual é a dificuldade, então?

Bom… Tudo começou em 1855 (antes mesmo da criação do conselho regulador), quando Napoleão III resolveu organizar o Julgamento de Paris, que classificou os melhores vinhos à época.

O problema disso? Esta classificação não considerou toda Bordeaux, então algumas denominações, sentindo-se inferiorizadas, criaram posteriormente as suas próprias classificações.

Premier Grand Cru, Grand Cru Classé, Grand Cru… E por aí vai! Acredite, são várias delas, todas com nomes muito parecidos. Mas três, as mais importantes, são usadas até hoje.

Classificação de 1855 (o tal Julgamento aí de cima)

Para o evento, os principais châteaux deveriam classificar seus vinhos do melhor para o pior e, então, seriam degustados, avaliados e distribuídos em cinco categorias.

Com apenas um vinho classificado, a vinícola já ganha um título vitalício! Funciona como um atestado garantia de qualidade, e até os vinhos mais simples que da propriedade saem têm preços astronômicos.

Ao todo, 61 produtores foram classificados… E adivinhe só? A maioria deles está justamente em Médoc – fora isso, os outros que entram estão em Sauternes, Barsac e Graves.

Voltando ao julgamento…

Na ocasião, as categorias foram estabelecidas por faixas de preços dos vinhos. As mais caras, cujos vinhos são considerados Premier Cru, são seguidas pelos Deuxièmes Cru, e assim em diante até a quinta categoria.

Os mais conhecidos são os Premier Cru – Château Margaux, Château Latour, Château Haut-Brion, Château Lafite-Rothschild e Château Mouton-Rothschield.

Classificação de Graves (1953)

Quase um século se passou e Graves conseguiu classificar seus vinhos. Apenas 21 vinhos receberam tal honra, dentre eles, 13 tintos e oito brancos. Diferentemente da classificação anterior, todos estes são chamados de Grand Cru Classé.

Classificação de Saint-Émilion (1954)

No ano seguinte, foi a vez de Saint-Émilion classificar seus vinhos mais “tops”. E esta é considerada a mais diferente das classificações, pois, além de dividir nas categorias Premier Grand Cru Classé, Grand Cru Classé e Grand Cru (em ordem diminutiva), ela passa por uma revisão a cada década.

Só isso?

Não! Não basta entender de Cru e Grand Cru para ler facilmente os rótulos. Tem outros nomes e termos que é preciso conhecer.

Bordeaux Superiéur

Eis o típico nome que induz ao erro… Há quem pense se tratar de um vinho superior (afinal, é isso o que sugere o rótulo, não?), porém esta é uma das categorias mais genéricas da região.

Assim como a denominação Bordeaux, ainda mais simples que Bordeaux Superiéur, as uvas podem ter sido cultivadas em qualquer sub-região. O resultado? Um vinho com características mais genéricas da região, mas ainda sim uma excelente aposta para vinhos mais simples.

Château-o-quê?

Difícil mesmo é encontrar sequer um rótulo de Bordeaux sem a palavra “château”. O que parece ser uma mania local, na verdade, tem uma explicação pra lá de plausível.

Como a maioria dos vinhedos estava localizada no entorno de castelos (châteaux, em francês), as vinícolas acabaram sendo batizadas com seus nomes. Hoje, nem todas as vinícolas tem castelos próprios, mas mesmo assim são denominadas châteaux!

Mis en Bouteille au Château

Procure pela frase num rótulo e tenha a certeza de que as uvas do vinho que vai beber foram cultivadas e vinificadas no próprio château. Ao pé da letra, “Mis en Bouteille au Château” significa “engarrafado no château”, ou seja, é quando todas as etapas de produção de um vinho passaram aos cuidados do próprio vinicultor.

Por que preferir estes? Para conhecer a tipicidade de um terroir específico (pode acreditar que cada um deles tem características completamente únicas!).

Cadê as uvas?!

Percebeu que não falamos em uvas? Mais do que isso: percebeu ao manusear uma ou outra garrafa que elas não dão as caras por ali? Isso porque cada região de Bordeaux usa suas combinações de uvas, e só conhecendo a região, dá para descobrir que uvas o vinho leva.

Como escolher seu vinho Bordeaux ideal?

São tantas as denominações, características e cortes que até ficamos confusos… Mas, depois que você já leu tudo o que precisava sobre Bordeaux, já sabe como comprar um Bordeaux?

Ainda é um pouco difícil, dá para entender. Bordeaux é mesmo grande e complexo. Vamos acabar logo com as dúvidas. Qual tipo de vinhos você quer?

Prefiro os encorpados

Pensou em Cabernet Sauvignon? Vá direto para a margem esquerda, onde o solo quente favorece o cultivo da casta (nem precisa dizer que é a mais plantada, né?). É em Médoc que se concentram os vinhos mais encorpados de Bordeaux. Outras boas regiões são Saint-Estèphe, Saint-Julien e Pauillac. Os famosos Margaux são de lá e seguem a mesma linha.

Nada disso, quero algo refrescante e fácil de beber (e que não pese no bolso!)

Quando cada gole mata a sede, mas não é suficiente, é seguido por outro e outro. Claro que Bordeaux também tem deles. Acidez e frescor têm a ver com tudo isso. São cheios de aromas que lembram pedras e o mar. Se prefere um tinto, opte por cortes com Petit Verdot.

Falando de brancos

Algo que não se encontra com facilidade em Bordeaux são bons vinhos brancos. Mas eles existem, e seu lugar é Entre-Deux-Mers, região abraçada pelos rios (os dois “mares”) Dordogne e Garone. Sauvignon Blanc, Sémillon e Muscadelle deixam seus vinhos frescos, vivos e frutados, com bom corpo. Só não se esqueça de beber quando ainda são jovens, pois como a maioria dos vinhos brancos, são feitos para beber até três anos após o engarrafamento.

Vinhos complexos para bons conhecedores

Já experimentou de tudo e não se contenta com pouco. É normal – quanto mais aprendemos sobre vinho, mais queremos aprender. Uma boa aposta é a região da Saint-Émillion. Os vinhos mais legais de lá são feitos pelas mãos das próprias famílias em produções pequenas (até por isso são mais caros). Os vinhos de Saint-Émilion são tão elegantes que o rei Luis XIV os descreveu como “néctar dos deuses” (não são pouca coisa, não!). São vinhos de guarda, que aguentam anos envelhecendo e evoluindo – eles vão perdendo a cor e ganhando aquilo que chamamos de buquê, uma enxurrada de aromas terciários, complexos.

Vinhos exóticos? Desconhecidos?

Para você, vinho bom é aquele que rende boas histórias para contar? Então aí vai: procure por um autêntico Saint-Macaire, cuja uva homônima está quase em extinção, mas ainda é resguardada por alguns produtores locais. Saint-Foy-Bordeaux também vale a pena conhecer, é uma região pouquíssimo falada de Entre-Deux-Mers (pode ser tinto seco ou de sobremesa!).

E vinho doce, tem?

Uau, e como! É nas regiões de Sauternes e Barsac que estão os mais apaixonados (e apaixonantes) vinhos de Bordeaux (ao menos para aqueles que não abrem mão de um docinho, não importa a hora do dia). Sauternes é considerada a melhor região do mundo para vinhos de sobremesa, igualada apenas pelos Tokajis, da Hungria. São vinhos dourados e doces, mas elegantes, bem estruturados e complexos. Vale muito a pena provar.

Além disso, Entre-Deux-Mers possui boas denominações para vinhos de sobremesa: Loupiac, Saint-Croix-du-Mont e Cadillac. Guarde esses nomes – apesar de mais simples e menos populares, são encantadores e mais em conta (muito mais!).

Bordeaux para o churrasco?

Carnes que saem amaciadas pela brasa pedem por vinhos mais encorpados. Como já falamos, a Cabernet Sauvignon e a margem esquerda são ideias. Mas busque também os vinhos que levam Merlot, cujos toques terrosos combinam muito bem com o assado da brasa. As regiões são as mesmas que mencionamos, vá pela ordem: Saint-Estèphe, Pauillac e Médoc.

E naquele jantar especial?

Das duas uma: ou escolhe um vinho jovem, mas no ponto para beber, ou tira aquele que está há anos na adega. Caso não tenha um vinho na guarda, vá para Pomerol. É a terra do Château Petrus (o mais caro e famoso da França), mas também de onde saem Merlots que já nascem prontos para beber – fáceis, aveludados e não precisam de décadas para evoluir. São também mais fáceis de encontrar em restaurantes. Mas lembre-se, é um jantar especial, e se a ideia é brindá-lo com Bordeaux, não será barato (mas, acredite, vale muito a pena!).

Presentear também é impressionar

Um presente para seu pai, ou alguém que realmente vai apreciar um incrível vinho de qualidade? O nome Margaux é famoso, não só pelo mundialmente conhecido Chatêau Margaux, mas também pelos outros vinhos da região (dá para encontrar boas opções na média dos R$ 100). Elegância, refinamento, frutas, tostado, café e às vezes até trufas! Procure por vinhos de 2000, 2002, 2005 e 2009 e veja você mesmo.

Quer impressionar, mas não pode investir tanto assim? Graves é uma bela opção para tintos e brancos. Os Bordeaux que levam a denominação “Bordeaux Superiéur” costumam ser mais baratos, pois suas uvas podem ter sido cultivadas em qualquer sub-região. São mais simples, mas ainda assim uma excelente aposta.

Para esquecer na adega por décadas

Não é novidade… Bordeaux é um dos referênciais no mundo dos vinhos quando o assunto é guarda. Os vinhos das melhores safras podem durar 10, 20, 30… 50 anos! É até difícil de acreditar, mas é verdade. Nesse caso, não dá para apostar em qualquer vinho, não.
Aliás, longe disso. Estes vinhos não estão à venda em mercados comuns… Os mais famosos, Châteaux Petrus, Margaux, Lafite-Rothschild, Latour estão em apenas leilões, e custam 8 mil, 12 mil, 20 mil reais.

Ainda não sei do que gosto

Como lidar? Experimentando! Claro, precisa ir aos poucos. Comece pelos frutados (tintos ou brancos) de Graves, pois são mais leves, e seus sabores agradam a qualquer um. Depois disso, passa para os que levam a uva Merlot, a mais macia de todas, fácil de beber. Depois, parta para os cortes com Cabernet Sauvignon e Cabernet Franc, os clássicos dos clássicos de Bordeaux.


Chateau Timberlay Bordeaux Supérieur 2012


Em certos momentos percebo certa redundância quando falo de tipicidade, de terroir. Mas nada mais prazeroso do que degustar um vinho que expressa a terra, a cultura daqueles que o produz. É claro que também é difícil, quando fazemos as nossas análises dos rótulos que degustamos, mencionarmos tais características, dada a sua complexidade, de um assunto vasto que demanda aprendizado e um amplo estudo para que possamos ao menos ter a ciência do que essas regiões representam para a vitivinicultura mundial e, claro, o exercício da degustação conta muito, com as suas contínuas experiências. Confesso que, com essa região, não sou um ávido degustador, talvez seja por falta de oportunidade, desleixo, mas, os poucos que degustei, em suas mais distintas e variadas propostas, me trouxeram momentos especiais, sensações maravilhosas.

A região a qual me refiro é a emblemática Bordeaux e o vinho que degustei e gostei foi o Chateau Timberlay do famoso produtor Robert Giraud, um Bordeaux Supérieur, da safra 2012, um blend típico das castas Merlot (85%), Cabernet Sauvignon (10%) e Cabernet Franc (5%). Porém antes de falar sobre as características organolépticas do vinho, acho interessante falar sobre a denominação “Bordeaux Supérieur” e do motivo pelo qual a maioria dos vinhos bordaleses tintos terem Merlot, Cabernet Sauvignon, Cabernet Franc e alguns Malbec. Vamos aos conceitos.

Bordeaux Supérieur

Segundo o portal “The Wine Cellar Insider”, “Bordeaux Supérieur” os vinhos com Bordeaux Superieur no rótulo são vistos como um tipo de classificação, bem como uma denominação pelos consumidores hoje. Bordeaux Superieur é uma designação concedida aos castelos que produzem vinhos em denominações específicas que atendem a padrões de qualidade selecionados para que seus vinhos sejam classificados como Bordeaux Superieur. Embora um “chateaux” possa ter o direito de ser listada como parte de uma denominação específica, na maioria das vezes, mas nem sempre, a designação de Bordeaux Superieur é usada para significar vinhos de melhor qualidade do que muitos vinhos de denominações menos conhecidas de Bordeaux. Os vinhos com essa classificação têm de passar por um mínimo de 12 meses por barricas de carvalho.


As castas típicas

A grande maioria dos tintos e dos brancos de Bordeaux são produzidos a partir de um blend de cepas. Isso não se dá por acaso, já que historicamente, por conta da instabilidade do clima, em especial no tocante à umidade e ao regime de chuvas, sempre foi arriscado basear-se em uma única variedade de uva. A legislação bordalesa permite o cultivo e a utilização de uma série de cepas, que florescem e amadurecem em épocas distintas, o que faz com que uma eventual geada ou chuva mais pesada não arruíne toda uma safra. De fato, das 13 variedades permitidas na AOC, destacam-se três tintas e duas brancas: Cabernet Sauvignon, Cabernet Franc e Merlot, e Sémillon e Sauvignon Blanc, respectivamente. As proporções de cada uma delas nos blends variam de acordo com a sub-região.

Vamos ao vinho.

Na taça tem um vermelho rubi profundo, límpido, brilhante, com lágrimas finas e abundantes, desenhando as paredes do copo, se dissipando vagarosamente.

No nariz exala uma complexidade de frutas vermelhas como amora, groselha e morango, com notas de tabaco, especiarias e amadeiradas, graças aos 12 meses de passagem por barricas de carvalho.

Na boca tem estrutura, complexidade, mas se mostra muito delicado, redondo, harmonia e equilíbrio. Tem taninos presentes, mas delicados e sedosos, com acidez moderada, nuances de madeira, muito bem integrada, baunilha e diria um discreto e agradável toque de torrefação.

Um vinho que mostra toda a tipicidade de Bordeaux, toda a cultura do fazer vinho com identidade, privilegiando a cultura de um país milenar na produção dessa nobre bebida. Um vinho encorpado, estruturado, com vocação para uma boa evolução, bom potencial de guarda, mas, dado o seu equilíbrio e maciez, poderia ser degustado em qualquer momento. Um vinhaço! Com 12,5% de teor alcoólico e vinhas com idade média de 30 anos que corrobora as mencionadas características.

Sobre a propriedade Chateau Timberlay, onde foi produzido o vinho:


Destruído durante a Revolução e depois reconstruído, foi completamente restaurado após a Segunda Guerra Mundial. Regularmente premiado há mais de cem anos, o vinho Timberlay possui uma grande reputação internacional. As uvas são provenientes de um vinhedo de 110 hectares, com cerca de 30 anos.

Sobre a Robert Giraud:

O sucesso exemplar da Maison Giraud obviamente ultrapassa a estrutura da região de Cubzaguaise, onde se enraíza. Realizada em poucas décadas, dá a medida da personalidade excepcional de seu fundador. Nascido em 1925, Robert Giraud é o mais recente de uma longa linhagem de produtores de vinho de Cubzac que os arquivos da família hoje remontam até meados do século XVIII. O verdadeiro boom não ocorreu até depois da Segunda Guerra Mundial, com a aquisição do Chateau Timberlay por Raoul Giraud em 1945. Além da vinha inicial de Domaine de Perreau, os 35 hectares da propriedade trazem o patrimônio família administrada em 65 hectares de uma vinha homogênea, formando uma entidade econômica perfeitamente viável (a vinha Chateau Timberlay ocupa agora 115 hectares). Em 1953, Robert Giraud, cria sua própria casa de comércio e distribuição: Les Etablissements Viticoles Cubzaguais, a fim de vender a produção de propriedades familiares, gradualmente aumentada pela distribuição das propriedades vizinhas. No ano seguinte, ele atravessou o departamento, organizando incansavelmente reuniões e reuniões para obter a rotulagem de vinhos das denominações Bordeaux e Bordeaux Supérieur, dando ao mesmo tempo uma nova vida à união do vinho. Em 1960, Robert Giraud sucede seu pai à frente das propriedades da família. Ele agora dedicará a maior parte de sua força a isso. Sua principal preocupação será estabelecer a solidez da Casa por meio de uma política ambiciosa de aquisição de propriedades e pelo contínuo desenvolvimento da atividade de comerciante-criador. Em 1973, a necessidade de comercializar uma produção crescente e garantir a distribuição de muitos vinhos e marcas, decide Robert Giraud para reestruturar a Casa, que agora se torna ROBERT GIRAUD SAS. Essa reestruturação prevê o estabelecimento de uma nova equipe, a construção de adegas modernas e funcionais, bem como novos armazéns de armazenamento e embalagem. A partir de 1974, a empresa continuará rapidamente o desenvolvimento de sua linha e oferta, completando assim a produção de propriedades familiares, permitindo oferecer uma gama completa e qualitativa em todas as denominações dos grandes vinhos de Bordeaux. A orientação inicial de exportação desejada por Robert Giraud continuará e acelerará em 1976, com a chegada de seu filho Philippe, então de sua filha Florence. Sem negligenciar o mercado nacional, hoje é em mais de 60 países que os vinhos da Maison Giraud são estabelecidos e distribuídos.

Mais informações acesse:

http://www.robertgiraud.com/

Vinho degustado em 2017.