Quando nos lembramos da Espanha no que tange a produção de
vinhos associamos imediatamente das castas mais populares, sobretudo em terras
brasilis, que chega para o Brasil que são a Tempranillo e a Garnacha. São
inegavelmente as mais emblemáticas da Espanha pelos predicados já expostos
demasiadamente por especialistas e enófilos. Mas diante de alguns garimpos que
estou me dando o direito de fazer neste vasto e inexplorado universo dos vinhos
tenho feito algumas descobertas mais do que espetaculares acerca de castas,
blends e regiões, especialmente da Espanha e um país com o arcabouço histórico
na vitivinicultura como este, não podemos nos privar, não podemos negligenciar
para a nossa vida alguns vinhos e rótulos pouco ortodoxos que há por aí.
E nessa caminhada contra a zona de conforto eu descobri um
vinho com um corte, um assemblage que
considerei no mínimo inusitado e, de quebra, veio no “pacote” uma região que eu
nunca havia ouvido falar, enfim, um combo de novidades. A princípio, após
contato com o produtor e as informações que este me passou, decidi guarda-lo um
pouco mais, deixa-lo evoluir, haja vista que a vinícola informou que o vinho
tem uma boa vocação de guarda que gira em torno dos 5 à 10 anos! Contudo tocado
pela curiosidade, com 5 anos de vida, acredito que no seu auge, decidi
desarrolhá-lo, sem pestanejar, sem hesitações, afinal, essas características,
essa apresentação não pode deixar por muito tempo esquecido nos cantos escuros
da adega.
Então o momento chegou! O estouro da taça soou como música
para os meus ouvidos e a ansiedade deu lugar a sede de degusta-lo, de ouvir o
líquido deslizar pelo bojo da minha taça e voilá! O vinho que degustei e gostei
veio de uma região espanhola, pouco conhecida chamada Yecla, e se chama
Barahonda Tranco composto pelas castas Monastrell ou Mouvedre (75%) e a
francesa globalizada Cabernet Sauvignon (25%) da safra 2016. E antes de imergir
nos conceitos, qual o motivo do nome “Tranco”?
O nome "Tranco" faz referência a um jogo que o
fundador da vinícola, adorava na sua infância. Além disso, Tranco é como
algumas pessoas em Yecla chamam videiras grandes e antigas, por isso o rótulo
trazendo a imagem de uma videira. Então já que, mais uma vez falamos da pouco
badalada região de Yecla, falemos, é claro, dela.
Yecla
Localizada no sul da Espanha, próxima da região de Murcia, a
área vinícola de Yecla desperta a atenção do mundo por sua produção de vinhos
que prezam pela ótima relação entre qualidade e preço. A uva símbolo de seus
vinhedos e, consequentemente, de seus vinhos, é a cepa Monastrell, responsável
por dar origem a vinhos tintos encorpados e frutados.
Yecla obteve a denominação de origem em 1975. Vinte anos
antes, as adegas já tinham começado a proclamar a qualidade dos seus vinhos,
que, tomando um novo rumo, iam deixando para trás os antigos, mais robustos,
para oferecer novos e interessantes tintos de garrafa, a maioria dos quais
explora o grande potencial da Monastrell. A Denominação de Origem inclui o
termo municipal de Yecla, a sudeste da Península, na Região de Murcia. O relevo
Yeclaan, com solos rochosos calcários profundos e altamente permeáveis,
delineia uma vinha situada a uma altitude entre 400 e 800 metros acima do nível
do mar. A região de Yecla possui clima e terroir únicos, característica
elogiada pelo famoso crítico americano Robert Parker. Sua formação peculiar
denota um alto grau de qualidade para os vinhos, sobretudo para os que traduzem
as nuances da uva Monastrell, que atinge sua expressão máxima nesta região
espanhola. A extensão média de vinhedos de Yecla é de 6.500 hectares, em zonas
privilegiadas pelo clima continental. A região possui verões curtos e marcados
por temperaturas elevadas. Já os invernos, de maior duração, caracterizam-se
pelas temperaturas amenas.
As estações são contrastantes e propiciam uma amplitude
térmica interessante para as vinhas que se adaptam aos diferentes picos de
temperaturas de Yecla. Tal característica oferece um caráter extremamente particular
às cepas ali cultivadas. O solo de cultivo da área espanhola também pode variar
de um extremo a outro. No campo de baixo, um dos dois locais onde ocorre a
plantação de uvas, a altitude é muito elevada, além de o solo ser constituído
de calcário. Já no campo de cima, a altitude é bem mais baixa e o solo é
majoritariamente argiloso. Apesar da uva tinta Monastrell ser a dona do maior
prestígio na região de Yecla, outras castas podem ser encontradas nos vinhedos
hispânicos, entre as quais, destacam-se as de coloração branca Sauvignon Blanc,
Airén, Malvasia, Macabeo, Chardonnay e Moscatel e, no caso das variedades
tintas, despontam as uvas Tempranillo, Syrah, Garnacha Tinta, Cabernet
Sauvignon e Garnacha Tintorera.
A região de Barahonda, que dá nome a vinícola, está
localizada na Denominação de Origem Yecla, na região do Altiplano, uma zona de
transição entre o planalto e o Mediterrâneo cercada por um anel de baixas
montanhas e montanhas. A antiga tradição vitivinícola desta região remonta à
época dos fenícios, que já cultivavam a vinha nestas terras de solo pobre e
clima extremo. Nos últimos anos, o pequeno DO Yecla ganhou rápido
reconhecimento pelo caráter peculiar e pela qualidade dos seus vinhos
elaborados com a casta nativa Monastrell.
E agora o vinho!
Na taça revela um lindo e brilhante vermelho rubi intenso,
escuro, mas com entornos violáceos, com lágrimas finas e abundantes que
desenham e teimam em se dissipar das paredes da taça. Uma bebida caudalosa, que
“mancha” a taça, já mostrando a sua potência.
No nariz apresenta uma explosão de frutas vermelhas e negras
com destaque para a cereja, framboesa, ameixa e amora, com um delicado e
agradável toque amadeirado.
Na boca é volumoso, estruturado, o aporte das frutas
vermelhas e negras é percebida, como no aspecto olfativo, uma verdadeira
compota de frutas, mas é muito equilibrado e até macio, mostrando que está no
auge de sua condição. Tem taninos gulosos e presentes, mas contidos, com uma
ótima acidez, além do amadeirado graças aos 3 meses de passagem por barricas de
carvalho que a Cabernet Sauvignon, neste blend, passou. Um final de média
persistência com retrogosto frutado.
O tempo certamente poderia conspirar a favor do Barahonda
Tranco, mas o auge entregou um vinho robusto, pleno, poderoso, quente e
impetuoso. Talvez diria que o tempo não passou de um mero detalhe, não passou
de um mero coadjuvante com o protagonismo de um grande vinho de uma região
pouco conhecida, mas em franco crescimento em termos de visibilidade, de
credibilidade e que entregam, pela impressão que tive, acerca desse rótulo
vinhos expressivos, de personalidade marcante. Um vinho equilibrado, redondo,
vivo e que inundou de prazer e celebração o meu dia. Produzido com uvas
colhidas a mais de 2 mil metros de altitude, esse rótulo conquistou medalha de
ouro no Concours Mondial Mundus Vini 2016 e 89 pontos Robert Parker. Tem 14,5%
de teor alcoólico que, embora alto e evidente no paladar, está muito bem
integrado ao conjunto do vinho. Que vinho!
A história da Barahonda teve início em 1850, quando Pedro
Candela Soriano começou a produzir e a comercializar pequenas quantidades de
vinho na região espanhola de Yecla. Em 1925, Antonio Candela García fundou
oficialmente uma pequena vinícola, a Bodegas Antonio Candela, a primeira da
família Candela. Alguns anos depois, Antonio Candela Poveda assumiu o comando,
aumentando a dimensão do projeto. Atualmente, já na quarta geração da família,
os dois filhos de Poveda, Alfredo e Antonio, são os responsáveis por gerir os
negócios familiares.
Em 1999, eles construíram uma nova vinícola, batizada de
Barahonda, nome de um vinhedo que pertence à família Candela há mais de sete
gerações. A vinícola Barahonda foi fundada com a filosofia de produzir rótulos
de alta qualidade, engarrafados sob a Denominação de Origem Yecla, mas sem
perder a essência da origem familiar. Ao longo dos anos, cada pai passava para
o filho toda a tradição, conhecimento e a paixão pelo vinho. Focada na
elaboração de exemplares expressivos, a Barahonda conquista novos prêmios,
reconhecimento e altas pontuações a cada nova safra, dos melhores críticos do
mundo do vinho. O logo da Barahonda tem como símbolo uma garrafa de vinho com
raízes, para expressar a ligação com a terra e a videira. A vinícola foca na
produção de uvas de alta qualidade, para mostrar o potencial e a tipicidade do
terroir local.
Mais informações acesse:
Referências de pesquisa:
“Barahonda”: https://www.barahonda.com/do-yecla/
“Mistral”: https://www.mistral.com.br/regiao/yecla
“Winepedia”: https://www.wine.com.br/winepedia/enoturismo/vinicola-exclusiva-barahonda/
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