sábado, 19 de março de 2022

DNA Murviedro Bobal 2018

 

Mais uma degustação especial! E digo que essa degustação especial não se configura por ser um rótulo emblemático, caro ou de uma safra antiga e especial, nada disso! É especial pelo simples fato de ser especial para mim. Sim! É isso mesmo! Especial porque o considero como especial. Se for especial para você que está degustando, então considere assim e não por questões inerentes a valores e moda de rótulo.

Começo por ser um produtor que aprecio muito, que aprendi a gostar com algumas degustações surpreendentes, maravilhosas mesmo e com valores muito competitivos e o rótulo de hoje foi especial também, um valor extremamente bom para o meu bolso, muito acessível.

E segue com a casta! Pouco conhecida por aqui no Brasil, mas muito conhecida na Espanha, mais precisamente em uma região que está atingindo certa notoriedade, ganhando relativa credibilidade, inclusive, chamada Utiel-Requena. Então para quem curte ou conhece a região não preciso dizer que a casta emblemática por lá é a Bobal.

Essa será a minha segunda experiência com a Bobal. Já havia degustado o Bobal de SanJuan da safra 2016 e mais do que aprovei. Um vinho expressivo, frutado, macio, encorpado.

Lá em Utiel-Requena a Bobal reina absoluta tendo a arrasa quarteirão Tempranillo como protagonista também. Mas é muito gratificante degustar um Bobal de Utiel-Requena, pois traz fortemente o conceito de terroir, de tipicidade, a expressão de regionalismo de uma região que foge dos conhecidos e manjados Rioja e Ribera del Duero, degusta uma casta pouco conhecida, de um produtor que curtimos e ainda uma região em franco crescimento.

Então sem mais delongas vamos às apresentações! O vinho que degustei e gostei veio da região espanhola de Utiel-Requena e se chama DNA Murviedro Bobal (100%) da casta 2018. Para não fugir das tradições das resenhas vamos falar da história de Utiel-Requena e da sua casta principal: a Bobal.

Utiel-Requena

A Espanha possui a maior área cultivada de Vitis Vinifera do mundo, embora em volume de produção ocupe somente a terceira posição. Trata-se de um amplo território o qual nos presenteia, ano após ano, com vinhos exuberantes e geralmente de bastante personalidade: o emblemático Jerez fortificado da Andaluzia, tintos de Rioja, Priorat e Ribera Del Duero, brancos de Rueda, entre outros.

É natural que, entre as 13 macrorregiões a qual está dividida, existam sub-regiões as quais permaneçam relativamente ocultas do grande público, mesmo daquele consumidor habitual de vinhos. Algumas preferem manter o “anonimato”, dedicando sua produção ao consumo regional; outras, porém, dedicam esforços incansáveis no sentido de promover seu terroir, suas cepas endêmicas, a tipicidade de seus vinhos e as melhorias em seu processo produtivo. Este é o caso de Utiel-Requena.

Utiel-Requena

Recentemente, foram descobertos registros arqueológicos que comprovam que, desde o século V a.C., era praticada a vitivinicultura na região de Utiel-Requena. Sítios arqueológicos como El Molón, em Camporrobles, Las Pilillas, em Requena e Kelin, em Caudete atestam o passado vinícola da região. Quando do domínio romano sobre a região, estes introduziram novas técnicas de vinificação, propiciando a melhora dos vinhos ali produzidos. Utiel-Requena têm sua história também ligada ao período conhecido como Reconquista: a retomada, a partir do século VIII, do controle europeu dos territórios da Península Ibérica, dominados pelos árabes (mouros) desde o século VI.

Muitas das cidades da região foram fundadas e/ou possuem grande influência islâmica em suas construções, bem como vestígios de fortalezas e construções mouras, como a cidade de Chera, por exemplo. Em 1238, a região cai sob o domínio do reino de Castela. No século seguinte, após conflitos envolvendo este reino e seu vizinho, Aragão, ocorre a união entre a rainha Isabel (Castela) e Fernando (Aragão), conhecidos como os Reis Católicos, e, após a conquista dos demais reinos ibéricos por estes (exceto Portugal), constitui-se o Reino da Espanha.

Utiel-Requena, consequentemente, torna-se domínio espanhol. Durante o século XIX, eclodem na Espanha as Guerras Carlistas, que dividem a população espanhola entre os partidários do absolutismo e do liberalismo; reflexo de outras manifestações do mesmo cunho ocorridas Europa afora. Utiel (absolutista) e Requena (liberal), assim como as demais cidades da região, assumem posições antagônicas, situação somente resolvida com a conclusão da Primeira Guerra Carlista.

Utiel-Requena localiza-se na porção leste do território espanhol, dentro da província de Valencia. Situa-se numa zona de transição entre a costa mediterrânea e os platôs da região da Mancha. Seus vinhedos localizam-se predominantemente entre os rios Turia e Cabriel. A região possui um dos climas mais severos de toda a Espanha. Os verões costumam ser longos e quentes (máximas por vezes de 40 graus), enquanto os invernos são muito frios, com ocorrência frequente de geadas e granizo (mínimas podem chegar a -10 graus).

No entanto, as vinhas encontram-se adaptadas a tais rigores e oscilações e, como atenuante, sopra do Mar Mediterrâneo o Solano, vento frio que ajuda a suavizar o efeito dos quentes verões da região. O solo possui cor escura, de natureza calcária e pobre em matéria orgânica. Utiel-Requena é uma DOP (Denominación de Origen Protegida – Denominação de Origem Protegida) pertencente a Comunidade Valenciana, a qual possui certa autonomia em relação ao governo central espanhol. Não possui sub-regiões.

Bobal

As primeiras notícias da Bobal datam do século XIV. Da costa de Valência, esta uva estabeleceu-se com sucesso em outras regiões do interior da Espanha. Lugares como Utiel-Requena, Ribera e Manchuela, todas Denominação de Origem Controlada, tem a Bobal como uma das suas principais variedades, chegando seu cultivo ser quase que majoritário.

A Bobal é pouco cultivada fora da Espanha, há plantações dela nas regiões de Languedoc-Roussillon, no sul da França, e da Sardenha, na Itália. Dentro dessas regiões é também conhecida por requena, espagnol, benicarlo, provechón, valenciana, carignan d’espagne, balau, requenera, requeno, valenciana tinta ou bobos. Seu nome é derivado da palavra latina Bovale, que significa touro, e refere-se à semelhança que os seus cachos têm com a cabeça de um touro.

Bobal

É uma uva de porte médio para grande, com bagos redondos e cheios de sumo; além disso, apresentam quantidade razoável de taninos e sabores de chocolate e frutos secos. Seus cachos, por sua vez, são muito grandes, bem compactados e pesados.

Dá-se muito bem com climas mediterrâneos. Elabora diferentes tipos de vinhos, com especial destaque para os vinhos rosés, sempre jovens, com muita cor e com boa acidez; a Bobal ainda é responsável pelos aromas frutados destas bebidas. Os tintos desta uva são pouco alcoólicos, mas muito saborosos, vinhos de coloração cereja escura profunda e boa estrutura de taninos.

Por sua versatilidade e acidez adequada, a Bobal pode ainda ser ainda utilizada para produzir espumantes. As peles grossas de Bobal têm uma elevada quantidade de uma substância que dá cor intensa aos vinhos, bem como presenteia a bebida com uma presença importante de taninos finos, esse é um dos motivos que tem dado a esta uva um destaque especial na produção espanhola, principalmente na região de Manchuela, cujo status de Denominação de Origem deu respaldo ao cultivo da Bobal e aos os vinhos elaborados com ela frente ao mercado interno e externo.

E agora finalmente o vinho!

Na taça apresenta um vermelho rubi intenso, brilhantes e com reflexos violáceos com uma profusão de lágrimas finas e que desenham o bojo.

No nariz traz alguma complexidade, com notas intensas de frutas vermelhas maduras onde se destacam cerejas, ameixas e framboesa, além de um toque floral envolvente e que entrega um frescor.

Na boca é saboroso, seco, tem médio corpo, porém macio, equilibrado e fácil de degustar, com o protagonismo da fruta como no aspecto violáceo, tem volume de boca, alcoólico, mas que não incomoda, sendo bem integrado ao conjunto do vinho, tem taninos presentes, mas domados, uma picância instigante, uma boa acidez e toque inusitado de chocolate meio amargo, apesar de não passar por barricas de carvalho. Tem final prolongado.

DNA traz identidade, origem, características! E é assim com o DNA Murviedro e a todos os rótulos dessa linha da Murviedro: vinhos de expressividade, que elevam o conceito de terroir e é assim também quando falamos de Utiel-Requena e a sua emblemática Bobal. E, além da minha segunda experiência com a Bobal, também foi a minha segunda experiência com a linha “DNA” da Murviedro com o DNA Murviedro Gran Astro Tempranillo Crianza 2015. O DNA Murviedro Bobal traz corpo, personalidade, mas maciez, um aveludado que é entregue graças as notas frutadas, com taninos domados e acidez agradável. Um vinho oriundo de vinhas velhas de baixo rendimento o que corrobora, reforça as suas características. Um belo vinhos simples e especial. Tem 13% de teor alcoólico.

Sobre a Bodega Murviedro:

Bodegas Murviedro foi fundada em Valência em 1927, a princípio como filial espanhola do Grupo Swiss Schenk, que cresceu e se tornou uma das vinícolas mais importantes da região.

A Schenk España decide então, em 1931, concentrar as suas atividades na adega de Valência, o que, localizado junto ao porto, significou o início de um dos principais pilares da marca: a exportação.

Posteriormente, já em 2002, a empresa aproveita ao máximo as comemorações do 75º aniversário ao mudar seu nome para ‘Bodegas Murviedro’ em homenagem ao seu vinho Cavas Murviedro, uma das marcas de vinho mais emblemáticas da Comunidade Valenciana, o que fez de Murviedro uma das vinícolas mais renomadas.

A vinícola, desde que começou as suas atividade, sempre teve acesso a uma ampla variedade de castas indígenas e internacionais e produzem um amplo portfólio de estilos de vinho.

A filosofia da empresa baseia-se na combinação de modernas técnicas de vinificação com uvas de vinhas tradicionais para atender aos mais altos padrões internacionais de qualidade, mantendo seu caráter espanhol assim como a originalidade.

Mais informações acesse:

https://murviedro.es/

Referências:

Site “Clube dos Vinhos”: https://www.clubedosvinhos.com.br/os-prazeres-da-uva-bobal/

Blog “O Mundo e o Vinho”: http://omundoeovinho.blogspot.com/2015/11/utiel-requena.html

 

 






sábado, 12 de março de 2022

Genuíno Carménère 2017

 

O universo do vinho é vasto e inexplorado. Contudo mesmo que essa afirmação possa trazer a sensação incômoda de algo meio desolador, te impulsiona a explorá-lo mais e mais, a buscar novas experiências sensoriais.

Eu nunca pensei que, quando comecei a degustar vinhos, a quase 30 anos atrás, de que eu fosse desbravar, de forma tão intensa, os vinhos brasileiros. Desbravar regiões que jamais fosse chegar, que nunca esperei encontrar vinhos que atualmente não são polos de produção da bebida como o Rio Grande do Sul, por exemplo.

Como muitos, infelizmente, que adentra o mundo do vinho sempre, de forma pré-concebida, acha que o mundo do vinho brasileiro é limitado e incipiente, os rótulos e a história dizem o contrário e é uma forma de resistência que grita aos quatro cantos que o vinho nacional é válido e tem sim história.

Sempre ouvi dizer que São Paulo sempre foi uma região proeminente na produção de vinhos e mais, com certo protagonismo para a história vitivinícola brasileira. Mas nunca parei para pensar na dimensão dessa informação, na relevância disso tudo e consequentemente nunca me atentei para a possibilidade de degustar quaisquer vinhos das regiões contempladas pela natureza nas terras paulistas.

E o meu primeiro contato com os vinhos de São Paulo se deu de uma forma totalmente ocasional e despretensiosa. Estava eu acessando as minhas redes sociais e me deparei com uma publicação um tanto quanto atípica para mim e estava relacionado aos vinhos artesanais ou a vinhos produzidos por pequenas e médias vinícolas com baixa produção. Aquilo fora como se amor à primeira vista, dado o tamanho do interesse que me tomou como um arrebatamento.

Diante do tamanho do interesse decidi procurar detalhes sobre o vinho mencionado e como qualquer coisa que colocamos na grande rede para pesquisar, uma coisa vai puxando a outra, porém dentro do contexto. Até que cheguei a um site que vende vinhos de uma região famosa do interior de São Paulo conhecida como “a terra do vinho”, chamada São Roque! O site se chama “Pemarcano Vinhos”.

Os adquiri, mas não poderia parar e decidi desbravar a região de São Roque, em São Paulo, e descobri o quanto há de rótulos disponíveis, majoritariamente de pequenos e médios produtores e isso me excitou ainda mais. E as surpresas não pararam! Recebi, carinhosamente, do amigo Luciano, do site da Pemarcano Vinhos, um Carménère brasileiro! Sim! Foi o que vocês, caros leitores enófilos, leram: Um Carménère brasileiro! Os típicos vinhos chilenos com a sua casta que é o carro chefe sendo produzida em terras brasileiras!

Claro que a produção ainda é tímida por aqui, poucos são os produtores que vinificam a Carménère no Brasil, e isso traz o tempero para a minha efusiva animação em degustar esse rótulo de São Roque, o mais rápido possível. Então não hesitei muito e degustei logo este rótulo e em um misto de alegria, privilégio e ansiedade, me peguei a desarrolhá-lo e inundar a minha taça desse Carménère brasileiro. De cara já impressionou pela intensa cor vermelha escura, intransponível que logo explodiu em aromas de frutas vermelhas maduras, e aquele toque clássico de couro, de “carpete” da Carménère. Começamos bem! Quando o levei à boca...voilá!

O vinho que degustei e gostei veio da região de São Roque, em São Paulo, e se chama Genuíno da casta Carménère e a safra é de 2017. Não vou, ainda, entrar nos pormenores do vinho, em sua análise, falando antes da história da região de São Roque que personifica a história do vinho em nosso Brasil e que merece ser enaltecida inúmeras vezes. Vamos a terra do vinho!

São Roque: A terra do vinho!

 A cidade de São Roque foi fundada no dia 16 de agosto de 1657, mas começou como uma grande fazenda do capitão paulista Pedro Vaz de Barros, que pertencia a uma família de bandeirantes e sertanistas. Vaz de Barros também participou de diversas Bandeiras. O fundador da cidade, também conhecido como Vaz Guaçú, contava com aproximadamente 1.200 índios que trabalhavam em suas terras, onde eram cultivados trigo e uva. Alguns anos após a morte de Vaz de Barros, seu irmão, Fernão Paes de Barros, se estabeleceu na mesma região, onde construiu uma casa e uma capela, que foram restauradas em 1945 pelo Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, a pedido do escritor Mário de Andrade, dono da propriedade.

Na região de São Roque, podem-se identificar referências à vitivinicultura desde a sua fundação, por volta do final do século XVII. Conforme informações encontradas e divulgadas pelos moradores da cidade, através da tradição oral, ou mesmo citado pelo Professor Joaquim Silveira dos Santos em seu artigo para a Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, volume XXXVII, nessa época toda a região pertencia a apenas três grandes proprietários de terras: Pedro Vaz de Barros, seu irmão Fernão Paes de Barros e o padre Guilherme Pompeu de Almeida, sendo que Pedro Vaz (tido como o fundador da cidade) se estabeleceu próximo da atual igreja Matriz, seu irmão mais ao norte, onde até hoje ainda se encontra a casa grande e capela Santo Antônio, e por fim a fazenda do padre Guilherme Pompeu se encontrava na hoje atual cidade de Araçariguama que faz divisa com Santana do Parnaíba.

Portanto realmente não se podem esperar grandes referências desse período da história, afinal o Brasil era apenas uma colônia e que existiam restrições da fabricação de qualquer tipo de produto em nosso solo, ou seja, em tese tudo deveria vir de Portugal, inclusive o vinho.

Outro fator que pode ter influenciado e não ter feito prosperar o cultivo da videira seria a prioridade da época de então, que era a descoberta de ouro, principalmente na região das Minas Gerais. Sabemos que São Paulo até então era somente um vilarejo sem grande importância econômica para a metrópole portuguesa, e se bem analisarmos a história da agricultura brasileira a uva e o vinho nunca foram tidos como principal interesse por parte de nossos colonizadores.

Após um período difícil, o povoado originado por Pedro Vaz foi elevado à categoria de Freguesia no dia 15 de agosto de 1768, recebendo o nome de São Roque do Carambeí. No dia 10 de julho de 1832, a Freguesia foi elevada à categoria de vila, mas o progresso do local só começou em 1838, quando começaram as lavouras de milho, algodão, arroz, mandioca e farinha de mandioca, cana de açúcar e derivados, legumes e verduras. Em março de 1846, seis anos após instalar-se na vila o destacamento da Guarda Nacional, Dom Pedro II e uma pequena comitiva permaneceram um dia na cidade de São Roque. Com a passagem de Dom Pedro II, Antônio Joaquim começou a se destacar no cenário político e, graças ao morador ilustre, São Roque foi elevada à categoria de cidade no dia 22 de abril de 1864.

Após esse longo período de estagnação, o primeiro registro oficial de plantação de uvas na região de São Roque se dá por volta de 1865, quando o Doutor Eusébio Stevaux inicia uma pequena plantação na sua fazenda em Pantojo. Pela mesma época, um colono italiano adquire uma pequena propriedade no bairro de Setúbal, alguns anos mais tarde um português na terra do então Sítio Samambaia forma um razoável vinhedo e inicia o processo de fabricação do vinho.

Doutor Eusébio Stevaux

Já em 1875 foi inaugurada a Estrada de Ferro Sorocabana, que ligou a cidade de São Paulo a São Roque e Sorocaba. Após alguns anos, em 1884, começou a grande chegada de imigrantes à cidade, fazendo com que as vinícolas aparecessem novamente e ganhassem força nos anos seguintes. Em 1924, a cidade já contava com 17.300 habitantes e foram produzidos 10 mil litros de vinho a cada ano, tendo doze produtores de vinhos, sendo cinco deles italianos.

O que possibilitou o retorno da cultura da uva e fabricação do vinho foi a importação de videiras oriundas dos Estados Unidos, pois estas eram mais resistentes ao clima brasileiro. Dentre as principais videiras trazidas estão inicialmente a “Izabel”, a “Seibel 2” (importada da França), curiosamente trazida por imigrantes italianos que se instalaram na região e posteriormente a “Niágara Branca”, oriunda da região do Alabama, EUA.

Portanto, a divisão do período da cultura vinícola de São Roque, desde a fundação da cidade até a época atual em quatro fases distintas:

1ª fase: 1657 – 1880: importação de videiras portuguesas, plantações domiciliares, sem qualquer cunho comercial, ou seja, somente para consumo próprio.

2ª fase: 1880 – 1900: Retomada da viticultura são-roquense, ainda que amadora, quase que familiar, continua voltada basicamente para o consumo e pequeno varejo. Já apresenta uma tendência a profissionalização graças às técnicas trazidas pelos imigrantes italianos e portugueses. Já se utiliza da videira americana que melhor se adaptou ao clima tropical brasileiro (talvez seja este um dos principais fatores de sucesso do cultivo da uva na região de São Roque);

3ª fase 1900 – até aproximadamente final da década de 1950: processo de industrialização e profissionalização da produção do vinho com aplicações de técnicas mais modernas permitindo assim obter resultados e desempenho melhores.

Podemos dividir esta fase primeiramente num período de início do processo de profissionalização e logo após (a partir da década de 1920), o período em que realmente a região investiu e desenvolveu as técnicas vinicultoras, durando até aproximadamente a década de 1950, onde após a massificação da produção entra num processo de decadência.

4ª fase década de 1960 – atual: esta fase engloba o processo de decadência da viticultura são-roquense. Por motivos econômicos e climáticos e até mesmo por falta de investimentos em pesquisas, que se reduziram sensivelmente tanto a qualidade como a quantidade de vinho produzido, levando ao fechamento de diversas adegas (isso principalmente a partir da década de 1980). São Roque permanecendo hoje somente com o título de “terra do vinho”, sendo que os poucos fabricantes que restaram (aproximadamente treze adegas) fabricam seu vinho não de uvas nativas de São Roque, mas sim oriundas de outras partes do Estado ou mesmo de outros estados (exemplo: Rio Grande do Sul).

Há atualmente um movimento para tentar a reversão dessa situação, porém continua bem modesto em relação a todo o histórico e números do passado no ápice do cultivo da videira em São Roque.

E agora finalmente o vinho!

Na taça revela um lindo vermelho profundo, escuro, mas reluzente, brilhante, com lágrimas finas e em média intensidade que marcam no bojo.

No nariz apresenta aromas intensos e vivazes de frutas vermelhas, se destacam framboesa, groselha e cereja, com notas de especiarias, como pimenta, couro, algo de terra molhada e herbáceo.

Na boca é seco, as frutas vermelhas bem como os toques especiados ganham protagonismo como no aspecto olfativo, tem médio corpo, bom volume de boca, alcoólico, mas sem desequilibrar o conjunto do vinho, que se mostra macio, equilibrado, baixa acidez e taninos médios, porém aveludados. Final de média persistência.

Vinho não é só poesia engarrafada como dizia aquele poeta, mas história engarrafada também. Degustamos história, degustamos cultura! É muito gratificante e especial degustarmos vinhos com essa carga histórica atrelada de forma tão veemente, tão latente. A história é viva e plena, não é algo estático. Degustar o Genuíno Carménère foi, mais uma vez, a confirmação de que, mesmo com todas as adversidades do tempo e da atualidade, degustar um vinho da região de São Roque é viver de forma ativa e intensa a sua história e perceber, ou melhor, sentir que a região ainda pulsa vinho, pulsa a sua história e ainda é possível sim degustar vinhos de qualidade, bem feitos e que pequenos e médios produtores se engradecem pelo simples fato de personificar em seus vinhos a tipicidade da região, o fazer de homens e mulheres abnegados pelo amor a essa bebida que catapultou o prestígio dessa cidade ao Brasil. O nome que carrega, “Genuíno” talvez corrobore essa condição e carrega essa nome não é à toa! Sinto-me privilegiado e honrado pelo presente do Luciano, da Pemarcano Vinhos, e por degustar um Carménère brasileiro com um vermelho rubi intenso, escuro, brilhante, frutado, aromático, saboroso e que entrega as características da cepa no âmago de sua essência. Que São Roque continue me proporcionando grandes novidades espero por todo sempre. Tem 12,5% de teor alcoólico.

Sobre a Adega Terra do Vinho:

Em meados de 1966, a família Oliveira Santos decidiu dedicar-se a sua grande paixão: o Mundo do Vinho e abriu a Cantina Vieira Santos.

Empenho, dedicação e amor eram palavras de ordem dos irmãos, especialmente para o Moacyr. A Cantina cresceu, mudou e hoje se chama Adega Terra do Vinho. Como patriarca, certamente o Moacyr não imaginou que seu trabalho chegaria tão longe com o mesmo espírito e garra.

Sr. Moacyr

A paixão pelos vinhos fez nascer a pequena Adega do Moacyr com seus vinhos artesanais. Hoje a adega cresceu, mas continua trazendo, em cada garrafa, a mesma paixão.






sexta-feira, 11 de março de 2022

El Toqui Reserva Especial Merlot 2020

 

Há quem diga que os vinhos da região chilena do Vale Central são ruins pelo fato de ser uma das maiores em termos de volume produzido de vinho, logo entregam rótulos de baixa qualidade. Não sou um enciclopédico em terroir ou coisa que o valha, mas não consigo falar, ou melhor, degustar vinhos chilenos sem pensar em regiões como o Vale Central.

Quem nunca degustou um chileno do Central Valley que atira a primeira taça, ou melhor, a primeira pedra. Gosto dessa região pela sua diversidade, de vinhos simples, de proposta simples, de vinhos frutados, jovens a vinhos mais estruturados e complexos. Sinto um pouco de preconceito, de uma intolerância com a região. Não nos esqueçamos de que temos, como distritos, ou microrregiões, ou ainda sub-regiões do Vale Central os emblemáticos Vale do Maipo e outra pequena região que muito aprecio, o Maule.

E o rótulo que escolhi é um Merlot, casta que construiu a minha predileção pelos vinhos, os meus primeiros tintos foram constituídos por essa casta que, por muito tempo foi a preferida, até a descoberta de outras cepas, claro. Além da Merlot ter construído a minha preferência pelos vinhos, foram os exemplares chilenos que me cativaram com a sua presença, pegada e até alguns com alguma complexidade e estrutura.

Mas esse, como qualquer rótulo do Vale Central traz uma simplicidade mesclado a uma estrutura, um vinho de proposta mais direta, porém entregou o que se espera de um autêntico Merlot chileno. O vinho que degustei e gostei veio, claro, do Vale Central chileno, e se chama El Toqui Reserva Especial da casta Merlot (100%) da safra 2020. Esse é o meu segundo rótulo da linha, pois já degustei e também gostei do El Toqui Reserva Especial Cabernet Sauvignon da safra 2020. E, para não perder o costume, vamos às histórias que também alimenta e fomenta a celebração às degustações: Um pouco de Central Valley.

Valle Central: o centro vitivinícola do Chile

Valle Central, ou Central Valley como é conhecida, é uma região vinícola do Chile, estando entre uma das mais importantes áreas produtoras de vinho de toda a América do Sul, em termos de volume.

Além disso, o Central Valley é uma das regiões que mais se destaca com relação a extensão, indo desde o Vale do Maipo até o final do Vale do Maule. Uma ampla variedade de vinhos é produzida na região, elaborados a partir de uvas cultivadas em diferentes terrenos. Tal exemplar vão desde vinhos finos e elegantes, como os produzidos em Bordeaux, até os vinhedos mais velhos e estabelecidos em Maule. A região do Valle Central é também lar de diversas variedades de uvas, porém, as plantações são ocupadas pelas castas Cabernet Sauvignon, Sauvignon Blanc, Merlot, Chardonnay e Syrah.

A uva ícone do Chile, a Carmenère, também é importante na região, assim como a Malbec é referência em Mendoza, do outro lado dos Andes. As áreas mais frias do Central Valley estão ganhando cada vez mais destaque perante o mundo dos vinhos, onde são cultivadas as uvas Riesling, Viognier e até mesmo a casta Gewürztraminer. O Central Valley é dividido em quatro sub-regiões vinícolas, de norte a sul, cada qual com características e diferenças marcantes.

O Maipo é a sub-região mais histórica do país, onde as vinhas são cultivadas desde o século XVI, abrigando as videiras mais antigas existentes na região. O Rapel Valley é lar das tradicionais sub-regiões Cachapoal e Colchagua, enquanto Maule Valley é uma das sub-regiões vinícolas mais prolíferas de toda a América do Sul. Por fim, a última sub-região Curico Valley foi a pioneira no cultivo vinícola na década de 1970, onde Miguel Torres deu início a vinicultura moderna.

Vale Central

A Cabernet Sauvignon pode ser cultivada com sucesso tanto no Vale do Maipo quanto no Vale de Rapel, cada um por um motivo diferente. No Vale de Rapel, a presença de um solo rochoso e com baixa atividade freática (pouca disponibilidade hídrica) aliado à alta taxa de amplitude térmica (diferença entre a maior e a menor temperatura nessa área em um dia) vai favorecer o grau de maturação da Cabernet Sauvignon, aprofundando seu sabor.

Essa parte do vale, portanto, produz uvas com um sabor mais profundo e maduro. Já a Cabernet Sauvignon que é cultivada no vale do Maipo (de onde provém mais da metade da produção dessa cepa) conta com a influência direta do Rio Maipo. Onde as águas do rio servem para regular a temperatura e fornecer a irrigação dos vinhedos. E para não deixar de destacar a área a sotavento da Cordilheira da Costa, o Vale do Curicó possui um clima quente e úmido, já que todo o ar frio é impedido de passar pela barreira natural da montanha.

Quem se beneficia com isso é a produção de Carménère, que por tamanha perfeição em seu desabrochamento são conhecidos por todo o mundo, não sendo surpresa o fato de que somente desse Vale derivem vinhos para mais de 70 países ao redor do mundo. Em outras palavras, o Vale Central se constitui como uma mina de ouro de cepas premiadas e irrigadas com tradição centenária.

O Vale Central é uma área plana, localizada na Cordilheira Litoral e Los Andes, caracterizada por seus interessantes solos de argila, marga, silte e areia, que oferece ao produtor uma extraordinária variedade de terroirs. Excepcionalmente adequada para a viticultura, o clima da região é mediterrâneo e se traduz em dias de sol, sem nuvens, em um ambiente seco.

A coluna de 1400 km de vinhas é resfriada devido à influência gelada da corrente de Humboldt, que se origina na Antártida e penetra no interior de muito mais frio do que em águas da Califórnia. Outra importante influência refrescante é a descida noturna do ar frio dos Andes. 

E agora finalmente o vinho!

Na taça entrega um intenso e brilhante vermelho rubi com entornos violáceos, com finas e abundantes lágrimas finas e que desenham as bordas do copo.

No nariz traz aromas evidentes de frutas negras maduras, tais como ameixas, groselha e amora, com toques de especiarias, como baunilha e pimenta.

Na boca é seco, de leve a médio corpo, com as frutas negras protagonizando como no aspecto olfativo, álcool em evidência, mas que não agride e não desequilibra, com notas discretas de madeira, tosta e chocolate graças aos 8 meses de barricas de carvalho, com acidez proeminente, que traz frescor ao vinho, com taninos aveludados. Final prolongado.

Independentemente de sua safra, do tempo de vida do vinho, ele entregou o que eu verdadeiramente esperava de um Merlot chileno, aquele Merlot que aprendi a gostar nos tempos de outrora das minhas experiências de degustação: um vinho com alguma personalidade, mas fácil de degustar, harmonioso, equilibrado, com notas de pimenta, especiarias, macio. Um vinho redondinho, bem feito, entregando, inclusive, mais do que valia. Digam o que quiserem do Vale Central, mas eu nunca rejeitarei seus vinhos. Tem 13% de teor alcoólico.

Sobre a Vinícola Casas del Toqui:

Com o objetivo de criar vinhos finos e de alta qualidade que expressem o verdadeiro terroir chileno, a Casas del Toqui nasceu da união de uma tradicional família de produtores do Chile e o Château Larose Trintauton, uma grande propriedade vinícola de Bordeaux, na França, em 1994.

A soma de distintas experiências com vinhedos de alta qualidade e uma adega dotada da mais alta tecnologia tornaram a empresa um destaque constante na imprensa mundial, posicionando-a como uma das bodegas mais respeitadas do Chile.

Em 2010, a Família comprou a “Estate and Winery”, logo após o terremoto que a danificou severamente, e a modernizou. Hoje, sua principal adega está localizada próxima de Totihue, Alto Cachapoal, cerca de 100 km ao sul da capital Santiago.

Mais informações acesse:

https://www.casasdeltoqui.cl/index.html

Referências:

“Portal Vinci”: https://www.vinci.com.br/c/regiao/valle-central

“Portal Winepedia”: https://www.wine.com.br/winepedia/enoturismo/valle-central-chile/

“Portal Enologuia”: https://enologuia.com.br/regioes/186-o-vale-central-no-chile-ponto-de-encontro-de-vinhos-reconhecidos-mundialmente

 



sábado, 5 de março de 2022

Salton Paradoxo Merlot 2017

 

Significado de paradoxo: pensamento, proposição ou argumento que contraria os princípios básicos e gerais que costumam orientar o pensamento humano, ou desafia a opinião consabida, a crença ordinária e compartilhada pela maioria.

Agora vem a pergunta que não quer calar: Por que raios coloquei o significado de paradoxo inaugurando essa resenha? Talvez para fazer menção a alguma coisa relacionada ao vinho que degustarei esta noite tradicional de sábado.

Mas não é somente isso! “Pensamento, proposição ou argumento que contraria os princípios básicos e gerais que costumam orientar o pensamento humano, ou desafia a opinião consabida!” Vou explicar trazendo para a realidade do universo do vinho ou mais precisamente para apenas o vinho em questão: É possível degustar um vinho que seja fácil de degustar sem ser aquele vinho inexpressivo, tendo, pelo contrário, personalidade marcante? É possível?

Pois direi que sim, é muito possível degustar um vinho como esse! Sempre? Não sei dizer, mas tive algumas experiências surpreendentes adequando-se a este caso! É como fugir do padrão, é como fugir do óbvio! Vinhos gostosos, saborosos, arrojados, descomplicados, mas que gozam de marcante personalidade, estrutura e fogem do linear e agrada, de forma democrática, a todos as percepções e predileções do enófilo para com o vinho.

Ah mas vinhos de personalidade não podem ser considerados fáceis de degustar! Esses comentários demasiados arcaicos definitivamente são um desserviço para a disseminação da cultura do vinho. A máxima agora é fugir de padrões.

E degustando essa linha da gigante Vinícola Salton, o que já é sinônimo de história e qualidade, me trouxe a reflexões, mais uma vez, desse tipo, e não tão somente pelo nome que carrega em seu rótulo, mas pelo que tem dentro daquela garrafa, a começar também pelo fato de ser oriundo da Campanha Gaúcha que, a cada dia, vem entregando, de forma singular, vinhos excelentes e de tipicidade revelando o que sempre foi: uma região tradicional, importante, mas que tem trazido gratas e arrojadas novidades.

O vinho que degustei e gostei vem, como disse, da região brasileira da Campanha Gaúcha, e se chama, claro, Salton Paradoxo da casta Merlot (100%) da safra 2017. E não só pelo nome, pela sua definição, mas também pelo fato de que o Brasil está produzindo, cada vez mais, Merlots fantásticos, maravilhosos, de caráter, versáteis e que não se resume apenas à Serra Gaúcha, mas em todos os terroirs deste país varonil.

Então já que estamos falando de regiões, não custa nada falar um pouco mais da Campanha Gaúcha e da sua importância para o cenário vitivinícola brasileiro.

Campanha Gaúcha

Entre o encontro de rios como Rio Ibicuí e o Rio Quaraí, forma-se o do Rio Uruguai, divisa entre o Brasil, Argentina e Uruguai. Parte da Campanha Gaúcha também recebe corpo hídrico subterrâneo, o Aquífero Guarani representa a segunda maior fonte de água doce subterrânea do planeta, dele estando 157.600 km2 no Rio grande do Sul. A Campanha Gaúcha se espalha também pelo Uruguai e pela Argentina garante uma cumplicidade com os hermanos do outro lado do Rio Uruguai. Os costumes se assemelham e os elementos locais emprestam rusticidade original: o cabo de osso das facas, o couro nos tapetes, a tesoura de tosquia que ganha novas utilidades.

No verão, entre os meses de dezembro a fevereiro, os dias ficam com iluminação solar extensa, contendo praticamente 15 horas diárias de insolação, o que colabora para a rápida maturação das uvas e também ajuda a garantir uma elevada concentração de açúcar, fundamental para a produção de vinhos finos de alta qualidade, complexos e intensos.

As condições climáticas são melhores que as da Serra Gaúcha e tem-se avançado na produção de uvas europeias e vinhos de qualidade. Com o bom clima local, o investimento em tecnologia e a vontade das empresas, a região hoje já produz vinhos de grande qualidade que vêm surpreendendo a vinicultura brasileira.

Há mais de 150 anos, antes mesmo da abolição da escravatura, a fronteira Oeste do Rio Grande do Sul já produzia vinhos de mesa que eram exportados para os países do Prata (Uruguai, Argentina e Paraguai) e vendidos no Brasil.

A primeira vinícola registrada do Brasil ficava na Campanha Gaúcha. Com paredes de barro e telhado de palha, fundada por José Marimon, a vinícola J. Marimon & Filhos iniciou o plantio de seus vinhedos em 1882, na Quinta do Seival, onde hoje fica o município de Candiota.

E o mais interessante é que, desde o início da elaboração de vinhos na região, os vinhos da Campanha Gaúcha comprovam sua qualidade recebendo medalha de ouro, conforme um artigo de fevereiro de 1923, do extinto jornal Correio do Sul de Bagé.

E agora finalmente o vinho!

Na taça entrega um vermelho rubi intenso, brilhante e com reflexos violáceos, com lágrimas finas e em média intensidade.

No nariz revelam aromas de frutas vermelhas maduras, tais como groselha, amora e morango, com notas amadeiradas bem discretas, de baunilha, de um agradável defumado e especiarias doces.

Na boca é de leve para média estrutura, bem macio, redondo e harmonioso, com a fruta vermelha e as mesmas especiarias doces protagonizando como no aspecto olfativo, além da madeira em pleno equilíbrio, graças aos 6 meses de passagem por carvalho e mais 6 meses nas caves, com as notas frutadas e uma acidez vivaz entregando frescor, com taninos aveludados, domados e um final médio.

E assim diz no rótulo do Salton Paradoxo:

“Quando o impossível se torna realidade, se converte em paradoxo”.

A interpretação é livre, democrática. Então quando o impossível se torna realidade, se converte em paradoxo. Ou seja, foge do padrão que, às vezes escraviza que torna vítima da zona de conforto, nos prende ao óbvio. E é tudo o que o Salton Paradoxo Merlot não entrega: o óbvio! Um vinho de traços contemporâneos, moderno, que é fácil de degustar: macio, elegante, mas estruturado, volumoso em boca, envolvente, diria até intenso. Um Merlot como tem de ser, mas com a cara e a coragem dos vinhos dessa cepa produzido em nossas terras, corroborando as suas conquistas. E é assim que o vinho nos provoca, traz um reboliço em nossas percepções sensoriais e nos surpreendente por inteiro, em uma espécie de arrebatamento. A verdadeira edificação dos nossos sentidos. Tem 13% de teor alcoólico.

Sobre a Vinícola Salton:

 Antônio Domenico Salton veio para o Brasil em 1878 e junto com seus filhos fundou em 1910 a vinícola que é reconhecida por ser a maior produtora brasileira de espumantes e top 3 entre as produtoras de vinho no Brasil!

Nos anos 1980 o forte da empresa era a produção e venda de conhaque. O vinho deixava a desejar e para mudar essa realidade foi contratado o enólogo Lucindo Copat, um dos fundadores da Vinícola Aurora. Novos equipamentos foram comprados e a produção foi modernizada.

Outro marco foi a criação em 1995 do projeto que resultaria em 2002 no Salton Talento e na nova unidade no distrito de Tuiuty, que trouxe tecnologia de ponta para a empresa. No ano de 2019 a empresa inaugurou a bela Enoteca Salton na capital paulista. Local que mais do que pronto para a compra de vinhos, serve como um ponto para degustar os sabores que a Salton tem.

Na extensa lista de conquistas destes mais de 100 anos de história comemora o fato de ser familiar e 100% brasileira. Com a terceira geração à frente da empresa, tanto na Unidade em Bento Gonçalves quanto em São Paulo, revela em seus quadros a quarta geração Salton, que promete o mesmo empenho e dedicação com que a empresa foi comandada até agora.









sexta-feira, 4 de março de 2022

Vale de Lisboa Premium 2020

 

Em algumas resenhas atrás eu já expus a minha predileção pelos vinhos lusitanos da região de Lisboa. Apesar de eu ter tido o meu primeiro contato com os vinhos portugueses por intermédio do Alentejo, Lisboa entrou em minha vida pelos rótulos e taças cheias. Sei que sou redundante por conta disso, mas também não cansarei de dizer que melhor ser redundante do que omisso e fortalecer o meu amor por esses vinhos influenciados pelo atlântico.

Mas quando busquei referências para me ajudar a construir essa resenha li alguns comentários, algumas opiniões que, embora respeite e muito, de que por ser uma região que produz vinhos de volume, em larga escala, são tidos, segundo essa fonte, como de baixa qualidade, vinhos ruins, além também de ser produzidos por adegas cooperativas.

Como disse respeito a opinião, mas pelo fato de ser, a meu ver, produzido em larga escala, não significa sempre que são de baixa qualidade, são ruins. Mas afinal qual a concepção de ruim?

Não quero entrar aqui no mérito do assunto que requer uma discussão mais profunda e pormenorizada, mas o ruim no universo do vinho é relativo. É ruim porque é barato? É ruim porque é um vinho simples? É ruim porque não passa por barricas de carvalho? É ruim porque é produzido por adegas cooperativas?

Parecem-me ser comentários perniciosos, carregados de visões pré-concebidas que dão conta de que sempre seja uma regra! E não é uma regra, não pode ser entendida como uma regra! Temos que analisar questões como terroir, proposta do vinho e adequar-se a essas situações e chegar a uma decisão quanto a sua degustação ou não com base nelas e não em situações genéricas e logo movidas pelo preconceito.

Confesso que, por vezes, as minhas percepções podem ser passionais, pelo fato de ser um amante da região de Lisboa, mas precisamos mudar o nosso foco de percepção de um vinho e não sermos tão passionais, usando a poesia líquida como status e relacionando-o como qualidade.

Contudo hoje à noite pede um lisboeta até porque, devido a essa predileção, tenho muitos rótulos e preciso degustar um rótulo da referida região. Sem mais delongas vamos ao rótulo escolhido. O vinho que degustei e gostei veio, claro, da região portuguesa de Lisboa e se chama Vale de Lisboa Premium com aquele blend típico da região com Castelão (50%) e Aragonez (50%) da safra 2020.

E já que falei em redundância, repetições, faço questão de enaltecer a história de Lisboa e da sua importância para o cenário vitivinícola de Portugal e que merece ser um pouco mais respeitado. Então com vocês: Lisboa.

Lisboa

A costa de Portugal é muito privilegiada para a produção vitivinícola graças à sua posição em relação ao Oceano Atlântico, à incidência de ventos, ao solo e ao relevo que constituem o local. Entre as principais áreas produtoras podemos citar a região dos vinhos de Lisboa, antigamente conhecida como Estremadura, famosa tanto por tintos encorpados como por brancos leves e aromáticos.

Tem mais de 30 hectares de cultivo com mais de 9 mil aptas à produção de Vinho Regional de Lisboa e Vinho com Denominação de Origem Controlada. O nome passou em 2009 para Lisboa de forma a diferenciar da região de mesmo nome na Espanha, também produtora de vinhos.

O litoral da IGP Lisboa corre para o sul de Beiras a partir da capital de Portugal, onde o rio Tejo encontra o Oceano Atlântico. Suas características geográficas proporcionam certa complexidade à região, pois está situada climaticamente em zona de transição dos ventos úmidos e estios, com solo de idades variadas, secos, encostas e maciços montanhosos se contrapõem a várzeas e terras de aluvião. Ainda sofre influencia direta da capital do país localizada em um extremo da região. Uma de suas características determinantes é a grande variedade de solos, como terras de aluvião (sedimentar), calcário secundário, várzeas e maciços montanhosos, muitas vezes misturados. Cada um desses terrenos pode proporcionar às uvas características completamente diferentes.

Lisboa

Esta região possui boas condições para produzir vinhos de qualidade, todavia há cerca de quinze anos atrás a região de Lisboa era essencialmente conhecida por produzir vinho em elevada quantidade e de pouca qualidade. Assim, iniciou-se um processo de reestruturação nas vinhas e adegas. Provavelmente a reestruturação mais importante realizou-se nas vinhas, uma vez que as novas castas plantadas foram escolhidas em função da sua produção em qualidade e não em quantidade. Hoje, os vinhos da Região de Lisboa são conhecidos pela sua boa relação qualidade/preço.

A região concentrou-se na plantação das mais nobres castas portuguesas e estrangeiras e em 1993 foi criada a categoria “Vinho Regional da Estremadura”, hoje "Vinho Regional Lisboa". A nova categoria incentivou os produtores a estudar as potencialidades de diferentes castas e, neste momento, a maior parte dos vinhos produzidos na região de Lisboa são regionais (a lei de vinhos DOC é muito restritiva na utilização de castas).

Entre as principais uvas cultivadas podemos citar as brancas Arinto, Fernão Pires (ambas naturais de Portugal) e Malvasia, e as tintas, Alicante Bouschet, Castelão, Touriga Nacional e Aragonez (como é chamada a Tempranillo na região).

Acredita-se que a elaboração de vinhos seja uma atividade desde o século 12, quando os monges da Ordem de Cister se estabeleceram na região. Uma de suas principais funções era justamente a produção da bebida para a celebração de missas.

A Região de Lisboa é constituída por nove Denominações de Origem: Colares, Carcavelos e Bucelas (na zona sul, próximo de Lisboa), Alenquer, Arruda, Torres Vedras, Lourinhã e Óbidos (no centro da região) e Encostas d’Aire (a norte, junto à região das Beiras).

A Região de Lisboa é constituída por nove Denominações de Origem: Colares, Carcavelos e Bucelas (na zona sul, próximo de Lisboa), Alenquer, Arruda, Torres Vedras, Lourinhã e Óbidos (no centro da região) e Encostas d’Aire (a norte, junto à região das Beiras).

As regiões de Colares, Carcavelos e Bucelas outrora muito importantes, hoje têm praticamente um interesse histórico. A proximidade da capital e a necessidade de urbanizar terrenos quase levou à extinção das vinhas nestas Denominações de Origem.

A Denominação de Origem de Bucelas apenas produz vinhos brancos e foi demarcada em 1911. Os seus vinhos, essencialmente elaborados a partir da casta Arinto, foram muito apreciados no estrangeiro, especialmente pela corte inglesa. Os vinhos brancos de Bucelas apresentam acidez equilibrada, aromas florais e são capazes de conservar as suas qualidades durante anos.

Colares é uma Denominação de Origem que se situa na zona sul da região de Lisboa. É muito próxima do mar e as suas vinhas são instaladas em solos calcários ou assentes em areia. Os vinhos são essencialmente elaborados a partir da casta Ramisco, todavia a produção desta região raramente atinge as 10 mil garrafas.

A zona central da região de Lisboa (Óbidos, Arruda, Torres Vedras e Alenquer) recebeu a maioria dos investimentos na região: procedeu-se à modernização das vinhas e apostou-se na plantação de novas castas. Hoje em dia, os melhores vinhos DOC desta zona provêm de castas tintas como por exemplo, a casta Castelão, a Aragonez (Tinta Roriz), a Touriga Nacional, a Tinta Miúda e a Trincadeira que por vezes são lotadas com a Alicante Bouschet, a Touriga Franca, a Cabernet Sauvignon e a Syrah, entre outras. Os vinhos brancos são normalmente elaborados com as castas Arinto, Fernão Pires, Seara-Nova e Vital, apesar da Chardonnay também ser cultivada em algumas zonas.

A região de Alenquer produz alguns dos mais prestigiados vinhos DOC da região de Lisboa (tintos e brancos). Nesta zona as vinhas são protegidas dos ventos atlânticos, favorecendo a maturação das uvas e a produção de vinhos mais concentrados. Noutras zonas da região de Lisboa, os vinhos tintos são aromáticos, elegantes, ricos em taninos e capazes de envelhecer alguns anos em garrafa. Os vinhos brancos caracterizam-se pela sua frescura e carácter citrino.

A maior Denominação de Origem da região, Encostas d’Aire, foi a última a sofrer as consequências da modernização. Apostou-se na plantação de novas castas como a Baga ou Castelão e castas brancas como Arinto, Malvasia, Fernão Pires, que partilham as terras com outras castas portuguesas e internacionais, como por exemplo, a Chardonnay, Cabernet Sauvignon, Aragonez, Touriga Nacional ou Trincadeira. O perfil dos vinhos começou a alterar-se: ganharam mais cor, corpo e intensidade.

Agora o vinho!

Na taça revela um vermelho rubi intenso, escuro, com tons arroxeados, creditado pela Aragonez, com lágrimas finas e em média intensidade.

No nariz traz aromas de frutas vermelhas, graças a Castelão, e em compota e que se destacam as cerejas, amoras, framboesas e groselhas, além de um discreto, mas elegante floral que traz uma sensação de frescor.

Na boca é leve, com o protagonismo da fruta como no aspecto olfativo, com um curioso e interessante volume de boca, mas macio e fácil de degustar, com taninos domados, um pouco alcoólico, mas sem comprometer o conjunto do vinho, e uma boa acidez que corrobora o frescor. Tem um final prolongado e harmonioso.

Sempre quando vou degustar um vinho da Região de Lisboa e me vejo, me sinto feliz. E essa felicidade já começa nos preparativos, quando me vejo, me pego com a garrafa nas mãos olhando-a, vendo todas as suas nuances, as suas informações e se materializa na taça, na degustação. Podem não ser vinhos complexos, estruturados ou caros, primeiramente pelo fato de que essa é a proposta dos vinhos lisboetas, vinhos solares, frutados, banhados pelo oceano, pelo sol. A história acima mencionada nesta resenha corrobora tais fatos. E por serem solares e descompromissados, os produtores atentos e preocupados com o terroir de Lisboa, intervém o menos possível no processo de vinificação. Adoro os vinhos que leva a Castelão, a Aragonez, são vinhos que expressam a sua verdade, a sua tipicidade. Assim o é este rótulo: o Vale de Lisboa Preimum basicamente é um vinho frutado, vivaz, fácil de degustar e apropriados para momentos informais e de conversas com fraternais amigos e temos de considerar o corte, o blend bem dividido entre as castas Castelão e Aragonez como determinante para identificar as características das referidas cepas. Tem 13% de teor alcoólico.

Sobre a Encostas de Alqueva:

Localizada em plena Região Demarcada do Alentejo, a empresa Encostas do Alqueva, surge associada à Cooperativa Agrícola de Granja e à Amareleza Vinhos, reconhecidas produtoras de vinhos de qualidade.

À Encostas do Alqueva cabe a missão do desenvolvimento, gestão estratégica das marcas e co­mercialização das mesmas. Nesse contexto tracejou um rumo, pensado e estruturado, para levar os produtos de qualidade produzidos nesta região até ao mercado.

A Adega Cooperativa da Granja, com 70 anos de história (1952-2022), há muito que é reconhecida pelos seus excelentes vinhos.

Em 1989 atingiu o seu expoente máximo com um vinho “Campeão do Mundo” num concurso em Ljubljana na ex República na Jugoslávia.

Desde 2007 que se iniciou uma nova fase na vida desta adega. Forte investimento na modernização da linha de produção, nova equipe de enologia e recuperação das melhores tradições da região, tanto ao nível das castas como do estilo dos seus vinhos.

Mais informações acesse:

https://www.encostasdealqueva.pt/

Referências:

“Blog Divvino”: https://www.divvino.com.br/blog/vinho-lisboa/

“Olhar Turístico”: https://www.olharturistico.com.br/regiao-dos-vinhos-de-lisboa/

“Belle Cave”: https://www.bellecave.com.br/vinhos-de-lisboa-saiba-mais-sobre-essa-regiao-produtora

“Infovini”: http://www.infovini.com/pagina.php?codNode=3901

 

 

 

 








terça-feira, 1 de março de 2022

Matiz Plural 2013

 

Definitivamente os eventos de degustações são essenciais, não pelas degustações somente, embora seja o cerne da coisa, mas também para que conheçamos novos rótulos, novas regiões, novos terroirs, castas e também ter contatos com pessoas que comungam do seu mesmo prazer: pelo vinho!

Eu já estava com saudades! Desde 2020 eu não frequentava eventos como esses. O caos sanitário, que ocasionou essa pandemia, reduziu drasticamente esses eventos e para quem degusta vinhos, realmente ficou um tanto quanto órfão de eventos como esse.

Mas com a iniciativa de uma nova loja de vinhos que chegou à minha cidade, em Niterói, tive o prazer e a alegria de participar de um novo evento de degustação e que descobri quase que por acaso, acessando as redes sociais da loja. Tomado por uma animação que não sentia a tempos, logo fui buscar informações sobre o evento e sobre os rótulos que seriam expostos para degustação: A Vinícola Hermann. Esse produtor tem sede em Blumenau, Santa Catarina, mas que tem alguns hectares no Rio Grande do Sul.

Não os conhecia e isso já foi uma porta de entrada para a minha animação! Iria degustar rótulos de uma nova vinícola para mim e melhor: os vinhos expostos vieram de uma região que é ainda nova para os enófilos brasileiros: Serra do Sudeste!

Ah! Tudo estava conspirando a meu favor! Novos rótulos, um novo terroir, vinhos brasileiros, novo evento de degustação em dois anos! E falando neste evento da degustação dos vinhos da Vinícola Hermann, em que a resenha pode ser lida por aqui, contava com cerca de 6 rótulos, em tese pouco, mas digo que a qualidade foi significativa, enorme. Vinhos estupendos de uma região que tem tudo, a meu ver, diante dessa amostragem dos vinhos da Hermann, para ser uma vitrine vitivinícola deste país.

Escolhi três rótulos e os trouxe comigo! Um deles abrirei para recepcionar meu bom amigo e hoje confrade, Paulo Rodrigues, que para mim fora um dos melhores daquela noite agradável, aprazível de degustações desta vinícola. E ainda tinha mais: o vinho é da safra 2013! Um vinho com seus 9 anos de safra! Era tudo que eu queria! Tantos predicados que corroborou a qualidade deste vinho!

Então sem mais delongas o vinho que degustei e gostei veio da região Serra do Sudeste, no Rio Grande do Sul, e se chama Matiz Plural e ainda traz um blend inusitado e que fez com que o vinho brilhasse, são eles: Aragonez, Cabernet Sauvignon, Merlot, Touriga Nacional e Cabernet Franc e a safra é 2013. E esse blend traz a Aragonez, a Tempranillo como é chamada na região portuguesa do Alentejo e tem uma razão.

O projeto da Hermann trouxe um dos caras mais importantes atualmente da enologia lusitana, o Anselmo Mendes, considerado como o “pai da Alvarinho”, que trouxe um pouco da identidade do seu país para agregar ao terroir da Serra do Sudeste. E falando nessa região, vamos, claro, gerar algumas linhas de sua história relativamente recente na viticultura nacional.

Serra do Sudeste

Nossa mais famosa região vinícola é, sem dúvida alguma, a Serra Gaúcha, da qual faz parte a primeira área de Indicação de Procedência brasileira, o Vale dos Vinhedos. De dentro para fora, sabemos que o Vale está chegando ao seu limite de plantio. Como área de procedência certificada, as regras que controlam sua existência são rígidas e hoje sobram poucas terras de qualidade às vinícolas para que plantem suas uvas. Ele não deixa de ser, no entanto, o polo para onde convergem as atrações turísticas e as grandes instalações produtoras das vinícolas, incluindo suas adegas.

Os outros municípios que compõem a região da Serra Gaúcha vêm se desenvolvendo com constância como Garibaldi, Flores da Cunha e Farroupilha. Mas algumas novidades interessantes estão aparecendo em cidades a noroeste de Bento Gonçalves, como Guaporé, na linha Pinheiro Machado e Casca, na direção de Passo Fundo.

Mas tem uma região que, apesar de ter sido descoberta na década de 1970, pode-se considerar que se trata de uma região nova, pois somente a partir dos anos 2000, com investimentos feitos pelas vinícolas da Serra Gaúcha, que o potencial dela foi, de fato, explorado. Essa região é a Serra do Sudeste.

Ela forma uma espécie de ferradura virada para o mar, ligando os municípios de Encruzilhada do Sul e Pinheiro Machado, separados ao meio pelo rio Camaquã, que deságua na Lagoa dos Patos. Essa região faz divisa com outra importante área vinícola brasileira, a Campanha Gaúcha, dividida entre Campanha Meridional (que começa na cidade de Candiota) e Campanha Oriental, que segue a linha da fronteira com o Uruguai.


A Serra do Sudeste tem colinas suaves, que facilitam o plantio e a mecanização, tornando-a um terroir mais simples de trabalhar. Aliadas a isso, estão as condições climáticas, mais favoráveis do que no Vale dos Vinhedos. Essa região tem o menor índice de chuvas do Estado do Rio Grande do Sul, além de noites frias mesmo no verão, justamente a época da maturação das uvas. Essas condições naturais, além de um solo mais pobre e de origem granítica, ajudam a ter maior concentração de cor, estrutura e potencial de envelhecimento dos vinhos.

O Instituto de Pesquisa Agrícola do Rio Grande do Sul mapeou pela primeira vez esta área nos anos 1970, mas é no começo da década de 2000 que as primeiras vinícolas de certa importância começam a plantar vinhedos por aqui, entre os municípios de Encruzilhada do Sul, o principal, Pinheiro Machado e Candiota (mesmo próxima de Bagé Candiota é considerada pelo IBGE como pertencente à Serra do Sudeste e não à Campanha, embora haja controvérsias).

Em grande parte se trata de uma região vitícola, geralmente as uvas aqui colhidas são conduzidas nas instalações das vinícolas na Serra Gaúcha e lá transformadas em vinho, esta região ainda não possui, e nem pleiteia em curto prazo, o reconhecimento a Denominação de Origem Controlada, quando, e se, isso ocorrer o vinho deverá ser produzido por aqui, já que este é um fator crucial na lei das denominações de origem.

As castas internacionais dominam a viticultura na Serra do Sudeste, tintas e brancas que na Serra Gaúcha podem representar um desafio pelo clima úmido, aqui prosperam com mais facilidade, o índice pluviométrico é alinhado com o estado do Rio Grande do Sul, chove um pouco menos que no Vale dos Vinhedos, mas o que mais importa é que as chuvas são mais bem distribuídas ao longo do ano, raramente coincidindo com o período da colheita das variedades tardias.

A característica dos vinhos daqui é o bom nível de aromas, a sapidez pronunciada por conta da presença do calcário e o perfil gastronômico, boa acidez, taninos enxutos nos tintos e presença mineral nos brancos. Uvas mais cultivadas na região são: Malbec, Cabernet Franc, Merlot, Gewurztraminer, Sauvignon Blanc e Malvasia.

Se é verdade que a Serra do Sudeste não possui o panorama encantador da Serra Gaúcha, é também verdade que seus vinhos representam um patrimônio da vitivinicultura brasileira que merece ser descoberto, e sem demora.

E agora finalmente o vinho!

Na taça revela um lindo vermelho rubi intenso com tons violáceos e no seu entorno mostra uma cor atijolada discreta denunciando os seus 9 anos de safra e lágrimas finas e abundantes.

No nariz traz notas de frutas negras maduras com cereja negra, ameixa e amora, especiarias são sentidas, algo de pimenta, diria, com toques de terra molhada, baunilha, madeira.

Na boca é complexo, estruturado, mas se mostra elegante, macio graças ao seu tempo de safra, mostrando-se ainda com uma ótima capacidade de evolução, tendo ainda bom volume de boca e um álcool proeminente, mas sem agredir. Tosta, couro, terra, café, chocolate e madeira são percebidas graças aos 15 meses de passagem por barricas de carvalho, com taninos presentes, mas domados e acidez correta. Final prolongado.

Um vinho que mesmo com os seus 9 anos de vida ainda estava pleno, vivo e intenso e que poderia evoluir mais e mais. Uma região nova que sem dúvida poderá nos brindar com muita tipicidade, expressividade e qualidade. Sim os vinhos brasileiros têm potencial de guarda, têm complexidade, têm relevância e têm a cara do vinho brasileiro, sem cópias e comparações com o Velho Mundo. O Matiz representa a elegância, a complexidade, a arrojo que todo vinho com a sua proposta pode entregar: Frutas negras maduras, especiarias, álcool em evidência, mas sem agredir, mas que entrega personalidade, as notas terrosas, da madeira, do tostado, da baunilha. Todos os predicados de um vinho com a complexidade que a proposta deve entregar. Tem 13% de teor alcoólico.

Sobre a Vinícola Hermann:

A família Hermann trouxe todo o seu know-how de profundos conhecedores de diversas regiões vinícolas do mundo para a esfera da produção de vinhos, apostando no potencial dos melhores terroirs da região sul do Brasil. Proprietários de uma das maiores importadoras de vinhos de alta qualidade do país, a Decanter, compraram em 2009 um vinhedo de grande vocação em Pinheiro Machado, na Serra do Sudeste no Rio Grande do Sul, plantado com mudas de alta qualidade por um dos viveiros líderes de Portugal.

A assessoria enológica de um dos mais brilhantes enólogos de Portugal, o renomado “rei do Alvarinho” Anselmo Mendes - “Enólogo do Ano” pela Revista de Vinhos de Portugal em 1997 - ao lado do talentoso enólogo Átila Zavarizze, garante a excelência na transformação das uvas promissoras em grandes vinhos brasileiros, com caráter e tipicidade.

Mais informações acesse:

http://www.vinicolahermann.com.br/

Referências:

“Marco Ferrari Sommelier”: https://www.marcoferrarisommelier.com.br/blog.php?BlogId=33

“Cave BR”: https://www.cavebr.com.br/serra-do-sudeste-1

“Revista Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/a-nova-fronteira-sul_8619.html

“intelivino”: https://intelivino.com.br/serra-do-sudeste