quarta-feira, 12 de outubro de 2022

Frank Lorena

 

Quem não começou no universo dos vinhos, aqui no Brasil, em especial, por intermédio das famosas uvas de mesa, com os vinhos de mesa que atire a primeira pedra. Os vinhos coloniais, aqueles vinhos de garrafão. Pois é o ritual de iniciação por intermédio desses vinhos não é tão somente uma questão de escolha, mas uma necessidade financeira também, afinal os vinhos são mais baratos em relação aos produzidos com uvas vitis viníferas.

Lembro-me como se fora ontem, embora já tenha mais de 20 anos que fiz que a minha “transição” para as uvas de mesa e uvas finas, quando disse que não retornaria mais com as degustações dos vinhos de uvas americanas, com o argumento de que estava em uma franca evolução na degustação dos vinhos.

Mas olhando um pouco mais de carinho para os vinhos de mesa, observando alguns rótulos, de alguns produtores percebi que, com o advento da tecnologia nas vinificações, alguns vinhos de tal proposta vêm ganhando em qualidade e o leque de opções vem se diversificando também, com vinhos que passam por barricas de carvalho, alguns sendo produzidos sob o conceito orgânico etc.

E com esse “boom” tecnológico nos “pátios” de vinificação dos produtores com um maciço investimento em tecnologia alguns rótulos, algumas castas vêm ganhando alguma repercussão, algum destaque e mesmo tendo tido uma experiência razoável com tais vinhos no passado, ainda há espaço para novidades, afinal, como sempre costumo dizer, o universo dos vinhos e vasto e inexplorado, para o nosso deleite.

Eu recebi recentemente do amigo de São Paulo, o Luciano Feliputti, dono do site “Pemarcano Vinhos”, especializado na venda de vinhos artesanais e de pequenos produtores um rótulo de uma casta chamada “Lorena”. Sempre ouvi falar dessa variedade, mas nunca degustei e confesso que nunca me interessei, pelo fato de não me interessar por rótulos cujas uvas são de mesa.

Mas aquela típica curiosidade que tem me norteado ao longo desses últimos tempos foi mais forte e se transformou em interessante e claro, jamais vou recusar um presente de um amigo que foi dado com muito carinho. Claro que me pus a degustar e, evidente, conhecer algo mais sobre a história dessa casta genuinamente brasileira.

E não é que ela, a delicada Lorena me surpreendeu?! Sim, uma casta saborosa, leve, fresca e levemente frisante! Uma variedade que definitivamente traz o DNA brasileiro em todos os sentidos. O vinho que degustei e gostei foi produzido em São Roque, São Paulo e se chama Frank da casta Lorena e não é safrado. Para não perder o costume vamos às histórias de São Roque e da variedade Lorena.

São Roque: a terra do vinho

A cidade de São Roque foi fundada no dia 16 de agosto de 1657, mas começou como uma grande fazenda do capitão paulista Pedro Vaz de Barros, que pertencia a uma família de bandeirantes e sertanistas. Vaz de Barros também participou de diversas Bandeiras. O fundador da cidade, também conhecido como Vaz Guaçú, contava com aproximadamente 1.200 índios que trabalhavam em suas terras, onde eram cultivados trigo e uva. Alguns anos após a morte de Vaz de Barros, seu irmão, Fernão Paes de Barros, se estabeleceu na mesma região, onde construiu uma casa e uma capela, que foram restauradas em 1945 pelo Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, a pedido do escritor Mário de Andrade, dono da propriedade.

Na região de São Roque, podem-se identificar referências à vitivinicultura desde a sua fundação, por volta do final do século XVII. Conforme informações encontradas e divulgadas pelos moradores da cidade, através da tradição oral, ou mesmo citado pelo Professor Joaquim Silveira dos Santos em seu artigo para a Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, volume XXXVII, nessa época toda a região pertencia a apenas três grandes proprietários de terras: Pedro Vaz de Barros, seu irmão Fernão Paes de Barros e o padre Guilherme Pompeu de Almeida, sendo que Pedro Vaz (tido como o fundador da cidade) se estabeleceu próximo da atual igreja Matriz, seu irmão mais ao norte, onde até hoje ainda se encontra a casa grande e capela Santo Antônio, e por fim a fazenda do padre Guilherme Pompeu se encontrava na hoje atual cidade de Araçariguama que faz divisa com Santana do Parnaíba.

Portanto realmente não se podem esperar grandes referências desse período da história, afinal o Brasil era apenas uma colônia e que existiam restrições da fabricação de qualquer tipo de produto em nosso solo, ou seja, em tese tudo deveria vir de Portugal, inclusive o vinho.

Outro fator que pode ter influenciado e não ter feito prosperar o cultivo da videira seria a prioridade da época de então, que era a descoberta de ouro, principalmente na região das Minas Gerais. Sabemos que São Paulo até então era somente um vilarejo sem grande importância econômica para a metrópole portuguesa, e se bem analisarmos a história da agricultura brasileira a uva e o vinho nunca foram tidos como principal interesse por parte de nossos colonizadores.

Após um período difícil, o povoado originado por Pedro Vaz foi elevado à categoria de Freguesia no dia 15 de agosto de 1768, recebendo o nome de São Roque do Carambeí. No dia 10 de julho de 1832, a Freguesia foi elevada à categoria de vila, mas o progresso do local só começou em 1838, quando começaram as lavouras de milho, algodão, arroz, mandioca e farinha de mandioca, cana de açúcar e derivados, legumes e verduras. Em março de 1846, seis anos após instalar-se na vila o destacamento da Guarda Nacional, Dom Pedro II e uma pequena comitiva permaneceram um dia na cidade de São Roque. Com a passagem de Dom Pedro II, Antônio Joaquim começou a se destacar no cenário político e, graças ao morador ilustre, São Roque foi elevada à categoria de cidade no dia 22 de abril de 1864.

Após esse longo período de estagnação, o primeiro registro oficial de plantação de uvas na região de São Roque se dá por volta de 1865, quando o Doutor Eusébio Stevaux inicia uma pequena plantação na sua fazenda em Pantojo. Pela mesma época, um colono italiano adquire uma pequena propriedade no bairro de Setúbal, alguns anos mais tarde um português na terra do então Sítio Samambaia forma um razoável vinhedo e inicia o processo de fabricação do vinho.

Dr. Eusébio Stevaux

Já em 1875 foi inaugurada a Estrada de Ferro Sorocabana, que ligou a cidade de São Paulo a São Roque e Sorocaba. Após alguns anos, em 1884, começou a grande chegada de imigrantes à cidade, fazendo com que as vinícolas aparecessem novamente e ganhassem força nos anos seguintes. Em 1924, a cidade já contava com 17.300 habitantes e foram produzidos 10 mil litros de vinho a cada ano, tendo doze produtores de vinhos, sendo cinco deles italianos.

O que possibilitou o retorno da cultura da uva e fabricação do vinho foi a importação de videiras oriundas dos Estados Unidos, pois estas eram mais resistentes ao clima brasileiro. Dentre as principais videiras trazidas estão inicialmente a “Izabel”, a “Seibel 2” (importada da França), curiosamente trazida por imigrantes italianos que se instalaram na região e posteriormente a “Niágara Branca”, oriunda da região do Alabama, EUA.

Portanto, a divisão do período da cultura vinícola de São Roque, desde a fundação da cidade até a época atual em quatro fases distintas:

1ª fase: 1657 – 1880: importação de videiras portuguesas, plantações domiciliares, sem qualquer cunho comercial, ou seja, somente para consumo próprio.

2ª fase: 1880 – 1900: Retomada da viticultura são-roquense, ainda que amadora, quase que familiar, continua voltada basicamente para o consumo e pequeno varejo. Já apresenta uma tendência a profissionalização graças às técnicas trazidas pelos imigrantes italianos e portugueses. Já se utiliza da videira americana que melhor se adaptou ao clima tropical brasileiro (talvez seja este um dos principais fatores de sucesso do cultivo da uva na região de São Roque);

3ª fase 1900 – até aproximadamente final da década de 1950: processo de industrialização e profissionalização da produção do vinho com aplicações de técnicas mais modernas permitindo assim obter resultados e desempenho melhores.

Podemos dividir esta fase primeiramente num período de início do processo de profissionalização e logo após (a partir da década de 1920), o período em que realmente a região investiu e desenvolveu as técnicas vinicultoras, durando até aproximadamente a década de 1950, onde após a massificação da produção entra num processo de decadência.

4ª fase década de 1960 – atual: esta fase engloba o processo de decadência da viticultura são-roquense. Por motivos econômicos e climáticos e até mesmo por falta de investimentos em pesquisas, que se reduziram sensivelmente tanto a qualidade como a quantidade de vinho produzido, levando ao fechamento de diversas adegas (isso principalmente a partir da década de 1980). São Roque permanecendo hoje somente com o título de “terra do vinho”, sendo que os poucos fabricantes que restaram (aproximadamente treze adegas) fabricam seu vinho não de uvas nativas de São Roque, mas sim oriundas de outras partes do Estado ou mesmo de outros estados (exemplo: Rio Grande do Sul).

Há atualmente um movimento para tentar a reversão dessa situação, porém continua bem modesto em relação a todo o histórico e números do passado no ápice do cultivo da videira em São Roque.

Lorena

A “BRS UV 127 31”, mais conhecida como “BRS Lorena”, foi obtida do cruzamento entre as cultivares Malvasia Bianca e Seyval. É indicada para a elaboração de vinhos brancos de mesa aromáticos e frisantes. Plenamente adaptada às condições ambientais do sul do Brasil, possui alta produtividade (25-30 t/ha) e vigor moderado.

O fato de o Brasil ser tradicionalmente conhecido por ter o clima ideal para a produção das castas americanas, por conta da umidade, mas apresentar dificuldades no desenvolvimento das uvas finas, motivou a Embrapa, desde os anos 1980, a atuar na adequação de variedades. Por meio de melhoramento genético, passou a cruzar uvas europeias e americanas como alternativa de qualidade dentro da realidade climática do Brasil.

Lorena

Com o Programa de Melhoramento Genético da Embrapa Uva e Vinho, a empresa detectou que havia uma carência no Rio Grande do Sul de brancas que cumprissem três requisitos: resistência às pragas e doenças (ótima para agricultura orgânica), alta produtividade e potencial enológico para vinhos de boa qualidade.

Foi daí que surgiu a BRS Lorena, de fácil vinificação, com elevada produtividade. É indicada para a elaboração de vinhos brancos de mesa aromáticos, com vigor moderado, boa relação entre doçura e acidez e boa intensidade no paladar, além de apresentar muitas frutas brancas, como pera e pêssego e baixa acidez.

Regulamentação brasileira

De acordo com a legislação brasileira, por ser uma híbrida, o vinho resultante não é considerado “fino”, mas “de mesa”, muito embora com relação ao sabor e aroma alguns especialistas garantam que tenha qualidade comparada às Vitis viniferas.

Se misturar com outras variedades finas, às cegas, não se detecta que tem Lorena, mas desenvolver um híbrido é um processo longo e criterioso, que leva cerca de 15 anos, desde o cruzamento, que ocorreu em 1986, até os testes no campo, tendo a Lorena sido lançada oficialmente em 2001.

Descobriu-se, nesse processo, uma uva versátil, que pode ser colhida um pouco antes da maturação completa para fazer moscatel espumante; no ponto ideal para branco tranquilo; e na maturação completa para a produção de licoroso.

Presta-se à elaboração de varietais e de vinhos de assemblage, entre eles cortes com Semillon e Riesling Itálico. A variedade foi pensada para a Serra Gaúcha, no Rio Grande do Sul, mas, como mostrou um resultado muito bom no campo, a ótima publicidade auxiliou na expansão de seu cultivo.

E agora finalmente o vinho!

Na taça tem um amarelo palha, límpido, brilhante com reflexos esverdeados e uma pequena aparição de lágrimas finas e ligeiras.

No nariz tem uma baixa intensidade aromática, porém, ainda assim sentem-se as notas frutadas, de frutas brancas, cítricas e tropicais, com um delicado frescor.

Na boca é leve, um agradável frescor, com as frutas mais evidentes, em relação ao aspecto olfativo, com um discreto residual de açúcar, acidez refrescante, média e um final frutado.

Incrível os predicados da Lorena, surpreendente ter degustado, pela primeira vez, uma casta brasileira, simples, sim, mas muito especial, delicada, aromática e muito frutada. Embora apresente, para muitos, o habitual para variedades brancas, ainda assim traz prazer, alegria ao degustar e isso sim é o mais importante, o mais significativo no ato de degustar. Frank Lorena é solar, agradável e muito despretensioso, que incita a harmonização com comidas leves ou apenas uma salutar conversa com bons amigos ou sozinho em uma tarde ensolarada. Delicioso! Tem 11% de teor alcoólico.

Sobre a Vinícola Frank:

Tudo começou há 97 anos com seu pai o Sr. Roque de Oliveira Santos que passou todas as suas experiências e habilidades para o Sr. Frank Vicente dos Santos.

No sitio da sua família deu continuidade no parreiral e no cultivo de uvas e se especializou na vitivinicultura que hoje conta com uma experiência de mais de 60 anos.

Casou-se com a Sra. Ferdinanda, uma imigrante italiana que veio para o Brasil na segunda guerra mundial e teve duas filhas onde tocam seus negócios até hoje.

Em 1965 fundou a marca que levaria seu nome, conhecida por VINHOS FRANK, que com muito trabalho, dedicação e amor tornou-se uma marca muito conhecida em todo Brasil por manter suas qualidades desde o primeiro litro de vinho até hoje.

Hoje a marca conta com 07 linhas de produtos, são elas: Tradicional, Bordô, varietais, frisante, espumante, cooler e suco de uva.

Toda sua produção continua sendo supervisionada e orientada pelo Sr. Frank que hoje tem 95 anos de vida e toma seu vinho todos os dias.

A marca "Vinhos Frank” nos meados de 1990 inaugurou seu restaurante que está sendo um dos principais atrativos, contando com um ótimo cardápio, com muitas variedades de pratos, sendo harmonizados com a linha de vinhos FRANK.

Mais informações acesse:

https://www.vinhosfrank.com/

Referências:

“Assembleia Legislativa de São Paulo”: https://www.al.sp.gov.br/noticia/?id=301135

“Blog do Lullão”: http://www.lullao.com/p/historia-do-vinho-em-sao-roque.html?m=1

“Sites Google”: https://sites.google.com/site/historiadovinhodesaoroque/home/historia-do-vinho-de-sao-roque

“Revista Sociedade de Mesa”: https://revista.sociedadedamesa.com.br/2022/01/hibrida-nobre/

“Embrapa”: https://www.embrapa.br/busca-de-solucoes-tecnologicas/-/produto-servico/6396/uva-brs-lorena-uv-127-31

 

 

 

 








domingo, 9 de outubro de 2022

AS3 Premium Cabernet Sauvignon 2015

Quando falamos em vinhos estruturados, encorpados do Chile, qual casta vem a mente? Não tem erro: Cabernet Sauvignon! Se quiser degustar um vinho com complexidade, com certa estrutura e potência, aposte firmemente no Cabernet Sauvignon do Chile, isso se optar pelos vinhos do Novo Mundo!

Já tive alguns das melhores experiências quando se fala dos Cabernets Sauvignon do Chile! Há quem diga que os mesmos são demasiadamente carregados no famoso “pimentão” quando estagiam em barricas de carvalho, que não traz um bom paladar.

De fato o excesso não pode trazer prazer na degustação, mas que mal há quando se tem aquele pimentão no Cabernet Sauvignon dos chilenos? Enfim há gosto e percepção para tudo, é tudo muito particular e deve ser respeitada a opinião alheia.

Mas os vinhos chilenos desta cepa que degustei até hoje, sobretudo os amadeirados, me trouxe grandes momentos na degustação! Foram ótimos! Alguns entregaram potência, estrutura e complexidade, principalmente quando tiveram poucos anos de garrafa, já outros rótulos que degustei e gostei da rainha das uvas tintas com algum bom tempo de guarda entregaram vinhos elegantes, aveludados, mas de marcante personalidade, característica essencial da uva, bem como a proposta dos vinhos naquele país produzido.

A compra do rótulo de hoje, com toda essa entrada de vinhos potentes e amadeirados, teve a compra estimulada pelo vinho mais básico da sua linha. Sim! Um rótulo de proposta distinta estimulou a compra da sua linha mais complexa. Algum tempo atrás comprei um vinho de nome “AS3 Reserva Cabernet Sauvignon da safra 2014” e que me surpreendeu grandemente pela personalidade e estrutura, aliada a maciez e elegância.

AS3 Reserva Cabernet Sauvignon 2014

Isso me excitou a degustar outros vinhos da sua linha. Neste mesmo supermercado havia um chamado “AS3 Premium” que, à época estava, a meu ver, muito caro. Sabemos que vinhos com tais propostas não são baratos quando entram no mercado brasileiro, mas sentia que, pelo simples fato do valor alto, eu poderia, um dia, ter a oportunidade de compra-lo a um preço mais acessível ao bolso.

E esse dia não demorou muito a chegar! O vinho entrou na promoção custando na faixa dos R$55,00 e não hesitei em comprar dessa vez.

Então já “denunciei” o rótulo de hoje: o vinho que degustei e gostei veio da Região do Vale do Curicó, no Vale Central, Chile e se chama AS3 Premium da safra 2015. Mas as histórias que giram em torno do rótulo não param por aqui.

Por que o nome “AS3” e de onde esse vinho veio?

Em 2012 a gigante OLISUR, empresa chilena do ramo de alimentos, entrou no mercado brasileiro disposta a não brincar em serviço. Seus azeites invadiram as gôndolas dos nossos supermercados em uma política comercial bem agressiva. A garrafa de 500ml do famoso “O-Live” vendeu muito e a preços muito atraentes, na faixa dos R$13,00 em média, desbancando a concorrência.

Em 2013 decidiram, entretanto, investir no ramo dos vinhos. No caso da nossa poesia líquida é fácil fazer guerra de preços, basta trazer rótulos de baixa qualidade e inundar o nosso mercado, mas não foi o que a Olisur quis fazer.

A Olisur fez uma pesquisa de mercado para aprender o gosto dos enófilos brasileiros e contrato a vinícola chilena Terramater para vinificar os vinhos. Buscou ainda o prestigiado enólogp Stefano Gandolini para prestar consultoria no ambicioso projeto que era o enólogo-chefe da Von Siebentahl, onde assina alguns dos mais premiados e conceituados vinhos do Chile.

E assim nasceu o projeto “AS3”, que consiste em uma linha de três rótulos de vinhos com propostas mais básica, intermediária e a chamada Premium, ou seja, vinhos de entrada, sem passagens por barricas de carvalho, um reserva com um tempo razoável em madeira e o “Premium” ou a “versão” Gran Reserva com uma passagem maior por barricas. Tais rótulos foram concebidos para atingir apenas o mercado brasileiro.

O termo “AS3” refere-se, primordialmente nas três sub-regiões distintas de onde vêm esses vinhos, oriundas do Vale Central, são elas: Vale do Curicó, do Maipo e Maule. O rótulo que degustarei em questão é produzido na região do Vale do Curicó e do Vale centras, regiões estas que valem contar as suas histórias.

Vale Central

Valle Central, ou Central Valley como é conhecida, é uma região vinícola do Chile, estando entre uma das mais importantes áreas produtoras de vinho de toda a América do Sul, em termos de volume. Além disso, o Central Valley é uma das regiões que mais se destaca com relação a extensão, indo desde o Vale do Maipo até o final do Vale do Maule.

Vale Central, Chile

Uma ampla variedade de vinhos é produzida na região, elaborados a partir de uvas cultivadas em diferentes terrenos. Tal exemplar vão desde vinhos finos e elegantes, como os produzidos em Bordeaux, até os vinhedos mais velhos e estabelecidos em Maule. A região do Valle Central é também lar de diversas variedades de uvas, porém, as plantações são ocupadas pelas castas Cabernet Sauvignon, Sauvignon Blanc, Merlot, Chardonnay e Syrah. A uva ícone do Chile, a Carmenère, também é importante na região, assim como a Malbec é referência em Mendoza, do outro lado dos Andes.

As áreas mais frias do Central Valley estão ganhando cada vez mais destaque perante o mundo dos vinhos, onde são cultivadas as uvas Riesling, Viognier e até mesmo a casta Gewürztraminer.

O Central Valley é dividido em quatro sub-regiões vinícolas, de norte a sul, cada qual com características e diferenças marcantes. O Maipo é a sub-região mais histórica do país, onde as vinhas são cultivadas desde o século XVI, abrigando as videiras mais antigas existentes na região. O Rapel Valley é lar das tradicionais sub-regiões Cachapoal e Colchagua, enquanto Maule Valley é uma das sub-regiões vinícolas mais prolíferas de toda a América do Sul. Por fim, a última sub-região Curico Valley foi a pioneira no cultivo vinícola na década de 1970, onde Miguel Torres deu início a vinicultura moderna.

A Cabernet Sauvignon pode ser cultivada com sucesso tanto no Vale do Maipo quanto no Vale de Rapel, cada um por um motivo diferente. No Vale de Rapel, a presença de um solo rochoso e com baixa atividade freática (pouca disponibilidade hídrica) aliada à alta taxa de amplitude térmica (diferença entre a maior e a menor temperatura nessa área em um dia) vai favorecer o grau de maturação da Cabernet Sauvignon, aprofundando seu sabor. Essa parte do vale, portanto, produz uvas com um sabor mais profundo e maduro.

Já a Cabernet Sauvignon que é cultivada no vale do Maipo (de onde provém mais da metade da produção dessa cepa) conta com a influência direta do Rio Maipo. Onde as águas do rio servem para regular a temperatura e fornecer a irrigação dos vinhedos. E para não deixar de destacar a área a sotavento da Cordilheira da Costa, o Vale do Curicó possui um clima quente e úmido, já que todo o ar frio é impedido de passar pela barreira natural da montanha. Quem se beneficia com isso é a produção de Carménère, que por tamanha perfeição em seu desabrochamento são conhecidos por todo o mundo, não sendo surpresa o fato de que somente desse Vale derivem vinhos para mais de 70 países ao redor do mundo.

Em outras palavras, o Vale Central se constitui como uma mina de ouro de cepas premiadas e irrigadas com tradição centenária. O Valle Central é uma área plana, localizada na Cordilheira Litoral e Los Andes, caracterizada por seus interessantes solos de argila, marga, silte e areia, que oferece ao produtor uma extraordinária variedade de terroirs.

Excepcionalmente adequada para a viticultura, o clima da região é mediterrâneo e se traduz em dias de sol, sem nuvens, em um ambiente seco. A coluna de 1400 km de vinhas é resfriada devido à influência gelada da corrente de Humboldt, que se origina na Antártida e penetra no interior de muito mais frio do que em águas da Califórnia. Outra importante influência refrescante é a descida noturna do ar frio dos Andes.

Vale do Curicó

O nome “Curicó” significa “águas negras”, no idioma indígena mapuche. O motivo é a bacia do Mataquito, com suas águas escuras que serpenteiam pelo vale. Por conta dessa irrigação, o Curicó tem sido um centro agrícola importante do Chile.

O Vale de Curicó, a 85 quilômetros do oceano e 45 da Cordilheira dos Andes, é uma importante Denominação de Origem chilena que tem vastas extensões de terras plantadas com videiras de alto rendimento.

Localizado no Maule, região da parte central do Chile, 45 quilômetros a oeste da imponente Cordilheira dos Andes e 85 a leste do Oceano Pacífico, o Vale de Curicó é um dos principais e mais antigos centros vinícolas do país. Por conta disso, sua famosa rota do vinho é também um importante roteiro turístico do Novo Mundo. 

Vale do Curicó, Chile

Mais de 30 variedades de uvas são cultivadas no vale, desde a metade do século 19. A característica climática é a neblina que cobre tudo pela manhã. A variação de temperatura gera vinhos de boa acidez, sendo perfeitos para as castas brancas. Os vinhos de Sauvignon Blanc, Vert e Gris do Vale do Curicó são de qualidade notável, com todo o frescor que eles prometem.

Já as partes mais quentes do vale, como Lontué, trazem ótimos vinhos de Cabernet Sauvignon, principalmente dos vinhedos mais antigos. Foi no Vale do Curicó que o produtor espanhol Miguel Torres começou um investimento, nos anos 70, iniciando a onda de valorização de vinhos do Novo Mundo.

E agora finalmente o vinho!

Na taça manifesta um intenso vermelho rubi, mas com entornos granada, acastanhado, devido talvez à passagem por barricas de carvalho e/ou tempo de garrafa, sete anos, com a presença de algumas borras e lágrimas grossas, lentas e em vultosa quantidade.

No nariz a presença das notas amadeiradas ganha protagonismo, entregando tabaco, couro, terra molhada, menta, café e tostado médio, mas logo se percebe, se sente as frutas pretas maduras, como ameixa, amora e cereja negra, que se fundem e revelam um inigualável equilíbrio além de especiarias com destaque para pimenta preta e aquele pimentão, mas discreto.

Na boca é seco, estruturado, médio corpo, mas elegante graças às facetas do tempo em garrafa, que lhe confere, graças também aos 12 meses em madeira, muita complexidade, promovendo também um equilíbrio fantástico entre as frutas maduras e a madeira, com taninos maduros, mas macios e domados, com acidez correta, com toques de chocolate, baunilha, álcool evidente e integrado e um agradável e persistente final com retrogosto frutado.

Quer degustar um Cabernet Sauvignon poderoso, de personalidade marcante, com complexidade? Vai de Chile! Não há como errar! São vinhos de caráter, de voluptuosidade, são rótulos dessa região que expressão os melhores e mais prestigiados terroirs da América Latina e não é à toa e com muitos preços compatíveis, acessíveis a todas as camadas sociais, o que é o mais importante! O AS3 Premium é versátil, o afinamento em barricas o possibilitou ser mais elegante, saboroso, complexo, mas com a estrutura típica da cepa. E se junta a essas combinações, 50 anos de vinhas às quais esse vinho foi concebido. Fantástico! Tem 14% de teor alcoólico.



Sobre a Vinícola Terramater:

Em 1996, numa idade em que muitas pessoas pensam em se aposentar, 3 irmãs Canepa, - Gilda, Edda e Antonieta -, respondendo à paixão pela produção de vinhos finos que está em sua família desde os anos trinta, decidem juntar-se vinhas de longa tradição para uma nova adega de última geração, fundando assim a TerraMater.

O nome TerraMater diz-nos muito sobre esta empresa, que nasce de terras excecionais com vinhas nobres até aos 70 anos e maravilhosos olivais, com troncos grossos e bonita folhagem verde com mais de 50 anos, que atualmente produzem o melhor azeite e azeitona do mundo. Também é possível encontrar árvores de fruto, principalmente macieiras, que nos meses de verão enfeitam com os seus frutos abundantes e fazem destas quintas um verdadeiro espetáculo.

TerraMater representa a combinação perfeita entre a tradicional viticultura chilena de vinhos de alta qualidade, a busca constante pela inovação entregando novos aromas e sabores, e a preocupação em conseguir os melhores vinhos que a terra pode nos dar, criando assim vinhos que possam verdadeiramente honrar a generosidade da Mãe Terra.

Mais informações acesse:

https://www.terramater.cl/

Referências:

Portal Vinci, em: https://www.vinci.com.br/c/regiao/valle-central

Portal Winepedia, em: https://www.wine.com.br/winepedia/enoturismo/valle-central-chile/

Portal Enologuia, em: https://enologuia.com.br/regioes/186-o-vale-central-no-chile-ponto-de-encontro-de-vinhos-reconhecidos-mundialmente

“Wine”: https://www.wine.com.br/winepedia/enoturismo/vale-do-curico-para-alem-dos-vinhedos/

“Blog Sonoma”: https://blog.sonoma.com.br/vales-do-chile/

“Enoeventos”: http://www.enoeventos.com.br/201401/as3/as3.htm

“Escrivinhos”: https://escrivinhos.com.br/2015/04/tres-cabernets-do-chile-com-uma-otima.html/

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 




 




 

sábado, 8 de outubro de 2022

L'Esquirre Sémillon (50%) e Sauvignon Blanc (50%) 2020

 

Para muitos, eu diria que seja unânime, que a região francesa de Bordeaux é uma das mais prestigiadas do planeta do vinho, se não for a mais importante. Não quero entrar em discussões frívolas, mas o fato é que, sem sombra de dúvidas, Bordeaux é uma das mais famosas, mas melhor, em um universo de milhares terroirs, seria até fazer pouco caso das demais regiões.

Evidente que cada terra, cada região tem as suas particularidades, tornando-se impossível fazer quaisquer juízos de valores nesse quesito. Mas em um quesito, eu acho que Bordeaux ganha de lavada: o seu famoso blend: Cabernet Sauvignon e Merlot ou Merlot e Cabernet Sauvignon, dependendo do “lado” da região.

Sou um entusiasta desse blend. Para mim é o melhor blend que existe! Independente se é “Lado Direito” ou “Lado Esquerdo”, o corte dessas duas castas, na sua predominância, pois pode levar também, em um pequeno percentual, Cabernet Franc, Malbec e Petit Verdot, traz uma versatilidade incrível.

Tem a força, a potência, a estrutura da Cabernet Sauvignon, a maciez da Merlot e nessa ambiguidade o vinho ganha em personalidade e elegância, sem contar que, dependendo da proposta, o vinho ganha em longevidade. Não há como negligenciar a complexidade que esse “assemblage”, como dizem os franceses, pode nos entregar.

Mas não se enganem, mesmo que diante desse glamour e fama dos tintos de Bordeaux há sim lugar e espaço para os brancos “tranquilos” da região bordalesa. E eu custei, até por causa desse prestígio que os tintos ostentam, a perceber que os brancos têm vez na emblemática Bordeaux.

E descobri, por acaso, quando fazia aquelas indispensáveis incursões aos supermercados em busca de alguns “achados”, algo que nos faça crer que vale a pena continuar a degustar a poesia líquida. E não é que achei o tal “achado”?

E de Bordeaux! Um branco bordalês! Desculpem-me se eu fiquei animado quando, nessa altura da vida, encontrei um branco de Bordeaux, mas para mim é uma novidade diante de tantos tintos dessa região.

E é tão novo, não apenas pelo fato de ser um branco de Bordeaux, mas de uma sub-região que, à época, quando o comprei, eu, diante da minha estupenda ignorância, desconhecia: Entre-Deux-Mers.

Claro que tudo isso gerou um clima de excitação, eu precisava ter esse vinho em minha adega, haja vista que não é tarefa fácil encontrar uma boa variedade desses rótulos por aqui em terras brasileiras. E o preço também excitou: cerca de R$34,90, aproximadamente. Dizem que é uma temeridade comprar Bordeaux a esses valores! Que se dane! Comprar vinho é um risco, então vamos encará-los!

Sem mais delongas vamos às apresentações! O vinho que degustei e gostei, veio de Bordeaux, de Entre-Deux-Mers, e se chama L’Esquirre, composto pelo blend das castas Semillon (50%) e Sauvignon Blanc (50%) da safra 2020. Falemos um pouco de Entre-Deux-Mers.

Entre-Deux-Mers: Entre dois mares

O extenso território situado entre Graves e Sain-Émilion, dentro do “Y” formado pelos afluentes Garrone e Dordogne, ganhou sua denominação que significa “Entre-dois-Mares”. O nome da região é derivado, não da palavra francesa “mer” ("mar"), mas de "marée" ("maré"). Assim, significa "entre duas marés", uma referência à sua localização entre dois rios de maré.

Com 3.000 hectares (7.400 acres), é a maior sub-região de Bordeaux, embora, como existem grandes áreas de floresta, apenas metade da terra é usada para o cultivo de uvas. A área total de vinha é de cerca de 1.500 hectares (3.700 acres), com cerca de 250 produtores fazendo vinho nesta região.

Essa sub-região sempre foi conhecida por seus vinhos brancos, na AOC de mesmo nome, mas nas últimas décadas progrediu muito a produção de vinhos tintos nas AOC regionais Bordeaux e Bordeaux Supérieur, baseados na uva mais plantada em Bordeaux - a Merlot. É uma região de interesse onde surgem boas descobertas.

Entre-Deux-Mers

A região vinícola de Entre-Deux-Mers possui 8 apelações: Bordeaux-Haut-Benauge (AOC), Côtes de Bordeaux Saint-Macaire (AOC), Entre-Deux-Mers (AOC), Entre-Deux-Mers-Haut-Benauge (AOC), Graves de Vayres (AOC), Loupiac (AOC), Premières Côtes de Bordeaux (AOC) e Sainte-Croix du Mont (AOC).

A apelação Bordeaux e suas derivadas (Bordeaux Supérieur, Bordeaux Blanc Sec, Bordeaux Clairet, Bordeaux Rosé, Crémant de Bordeaux) é uma apelação regional: Todos os vinhos produzidos no departamento da Gironde podem se classificar para usar esta AOC. Os produtores mais qualificados preferem usar as apelações comunais como Pauillac ou Moulis, mas todos podem produzir vinhos na AOC Bordeaux. Curiosamente vários produtores de Blaye preferem usar AOC Bordeaux.

A AOC Bordeaux Supérieur não produz vinhos brancos secos. Na AOC Bordeaux os tintos são produzidos principalmente em Entre-Deux-Mers, ao sul de Graves, na margem direita (fora das zonas de AOC) e também uma pequena área no Médoc, perto da cidade de Bordeaux.

Esses pequenos Bordeaux hoje são comercializados com preços muito competitivos e sua qualidade os faz ótima compra. Na maioria são produzidos com uma presença maior de Merlot (70-90%), podendo jovens ser sem madeira, 30% de barrica.

Os pequenos Bordeaux podem ter 70%, 80% ou mais de Merlot, beneficiando-se assim da maior produtividade dessa uva e produzindo vinhos macios e fáceis de agradar, com bons preços.

Esses vinhos podem ser elaborados sem madeira, com 30% ou com 100% de madeira, nesse caso os preços variam bastante, mas são vinhos que surpreendem.

Os brancos são tradicionalmente produzidos com Sauvignon Blanc, seja em varietais, na atualidade, ou em cortes tradicionais com Sémillon e Muscadelle.

A AOC Bordeaux Supérieur possui normas de produção mais rígidas, como menores rendimentos por hectare e maturação mais longa. O nível médio de qualidade é bom, mas cada vez mais produtores se destacam pela alta qualidade de seus vinhos.

A denominação Entre-Deux-Mers tem as seguintes características:

1 - Vinho branco seco: menos de 4 gramas/litro de açúcar residual;

2 - Lote de três castas: Sauvignon Blanc (principalmente), Sémillon e Muscadelle;

3 - Teor alcoólico mínimo de 11,5%;

4 - O vinho é tipicamente apreciado jovem – dentro de um ano de safra – mas tem algum potencial de envelhecimento, devido ao Sémillon.

E agora finalmente o vinho!

Na taça revela um amarelo palha com reflexos esverdeados bem brilhantes, límpido e com lágrimas finas, dispersas e ligeiras.

No nariz intensidade aromática alta com as notas frutadas predominando, com destaques para frutas amarelas, de polpa branca e cítricas, tais como pêssego, em destaque, abacaxi, pera, maçã-verde, combinados com uma boa mineralidade e algo floral, de flores brancas.

Na boca é seco, com incrível frescor e leveza, mas que traz certo volume de boca, é um vinho cheio, diria entregar uma discreta untuosidade, com a fruta aparecendo, como no aspecto olfativo, com uma acidez média e agradável e um final de persistência média.

Bordeaux é sempre Bordeaux! E algumas “máximas” quanto a qualidade dos vinhos tendo como parâmetro o preço, não funcionou, pelo menos na minha reles e humilde percepção! Não quero entrar em discussões polarizadas e tão pouco questionar a qualidade dos Bordeaux mais caros e de “grife”, mas há sim vida nos bordaleses mais baratos. Esse L’Esquirre (Camarão, em francês), trouxe aquelas notas agradáveis de frutas como maracujá, abacaxi, pera, um delicado floral, boa acidez e uma leveza sem igual. Belo Bordeaux! Tem 12,5% de teor alcoólico.

Sobre a Vinícola Seignouret Frères:

Fundada em 1830, A Seignouret Frères é uma das casas comerciais mais antigas de Bordeaux. No entanto, a história de seu fundador, François Seignouret, parece muito com uma história de sucesso americana. Nascido em Bordeaux em 1783, chegou a Nova Orleans em 1808. A cidade, que acaba de passar sob a bandeira americana, está crescendo. François Seignouret lança-se com sucesso no design de tapeçaria e mobiliário.

Em 1820, sua reputação se estendeu além da Louisiana. Ele é então considerado o fabricante dos móveis mais elegantes do sul dos Estados Unidos. Ainda hoje, possuir um “Seignouret” é um privilégio.

Para atender à crescente demanda por vinhos franceses nos Estados Unidos, Seignouret fundou uma casa de exportação em 1830, a rue de la Verrerie. Em Nova Orleans, ele converteu suas oficinas em adegas onde engarrafava vinhos excepcionais como Château Margaux, Château Lafite, Château Latour, Château Mouton Rothschild e Château Haut-Brion.

François Seignouret morre em Bordeaux em 1852. Seu negócio permanecerá nas mãos dos descendentes da família Seignouret até 1927, quando a casa é comprada pela família Brou de Laurière antes de ser adquirida em 2011 por Laurent Barrier e Erwan Flageul.

Entre os últimos comerciantes de vinho independentes em Bordeaux, Seignouret Frères segue uma abordagem muito particular: combina sua busca permanente por safras excepcionais e exclusivas com a paixão pelas profissões da vinha e da vinificação.

Igualmente essencial é a proximidade que cultivamos com os nossos clientes e parceiros, elemento essencial para nos mantermos proativos e respondermos de forma adequada às suas necessidades.

Graças ao seu conhecimento histórico dos terroirs, apurado ao longo de dois séculos, Seignouret Frères sabe como selecionar grands crus excepcionais e descobrir os tesouros escondidos de Bordeaux. Um know-how enológico interno também permite produzir cuvées e marcas muito apreciadas pelos conhecedores. Cada garrafa é cuidadosamente armazenada em adegas internas mantidas em temperatura e umidade ideais.

A Seignouret Frères gera mais de 80% do seu volume de negócios com exportações. A casa sempre esteve muito presente em nichos de mercado: departamentos e territórios ultramarinos, Pacífico, Sudeste Asiático, Caribe, África, Europa Oriental, América Central e América do Sul. A Seignouret Frères também trabalha com lojas duty free e companhias aéreas.

Mais informações acesse:

http://www.seignouret.com/

Referências:

“Além do Vinho”: https://alemdovinho.wordpress.com/2016/03/23/os-segredos-de-bordeaux/

“Revista Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/direita-ou-esquerda_9559.html

“Academia do Vinho”: https://www.academiadovinho.com.br/__mod_regiao.php?reg_num=ENTREDX_R

“Wikipedia: https://en.m.wikipedia.org/wiki/Entre-Deux-Mers

 

 

 

 

 

 




segunda-feira, 3 de outubro de 2022

Zanotto Gewürztraminer 2020

 

Sabe daquela frase famosa, aquele ditado popular amplamente conhecido e falado? “Um raio não cai duas vezes no mesmo lugar!” Sinceramente é difícil contextualizar a essência e o significado da frase, haja vista que vai depender da situação, do que está sendo tratado.

Agora vem a pergunta: será que essa frase deve ser aplicada para a realidade do vinho, do nosso querido e amado universo vinífero? Eu digo que sim! Claro que um raio pode cair duas ou mais vezes no mesmo lugar! E o que significa tudo isso?

Quando falamos em um raio cair, ou não, duas vezes no mesmo lugar é adequar em uma realidade de degustar o mesmo rótulo em duas ou mais vezes! Claro que isso é possível e muito salutar! Demonstra uma predileção do enófilo por um rótulo, por um produtor, por uma região etc.

Principalmente quando se degusta o mesmo rótulo em safras distintas! Isso é melhor ainda, porque, por mais que o rótulo seja igual, a casta e a região idem, são safras diferentes, com climas, temperaturas diferentes, podendo oferecer nuances distintas uma das outras.

Mas como tudo na vida tem o lugar ruim, diria temeroso. A temível e silenciosa “zona de conforto” e isso para o mundo do vinho é péssimo, penso. Se você degusta, com alguma frequência, um determinado rótulo, de um determinado produtor e casta, demonstra que você tem uma predileção, o que é normal, mas essa predileção pode gerar uma espécie de dependência.

Em um cenário tão vasto, de uma infinidade de vinhos, regiões, países, castas, ficar no mesmo rótulo, tem impossibilita diversificar o tem leque de degustação e, convenhamos, a vida é deveras curta para ficar apenas em um rótulo, em um país, em uma região, em uma casta...

Mas esse rótulo deixou saudades! Não direi saudades, haja vista que o degustei no início deste ano, 2022, mas deixou um impacto positivo na minha degustação e a casta não é muito popular pelo menos em nossas terras brasileiras.

E resolvi compra-lo novamente! E o valor também estava arrebatador: R$37,90! Como encontrar um vinhaço da casta Gewürztraminer, brasileiro, a esse valor? Fiz uma breve, mas reveladora pesquisa, e os valores de rótulos tupiniquins desta variedade estão uma fábula! Caríssimos!

Mas decidi degusta-lo com dois anos de safra! Esse “novo velho” rótulo para mim é da “safra das safras”: 2020! É considerada, aqui no Brasil, como uma das melhores safras, a melhor em mais de trinta anos! Já traz esse atrativo! O primeiro que degustei, da safra 2019, o fiz com três anos de safra! Será que esse tempo afetará na degustação? Será que teremos novas nuances? Ah para uma comparação a resenha do Zanotto Gewürztraminer 2019 pode ser lida aqui. 

Então sem mais delongas vamos às apresentações: O vinho que degustei e gostei veio da região gaúcha de Campos de Cima da Serra, região essa que vem ganhando visibilidade e que está me ganhando também, e se chama Zanotto da casta Gewürztraminer e a safra, como disse, é a de 2020. Então para não fugir daquela máxima, vamos às histórias de Campos de Cima da Serra e desta casta que ainda não é tão popular no Brasil, a Gewürztraminer.

Campos de Cima da Serra

Por muito tempo, a região dos Campos de Cima da Serra ficou à sombra da Serra Gaúcha. A predominância do cultivo de variedades híbridas e o clima frio e ventoso eram encarados como entraves para o desenvolvimento de grandes vinhedos. Atualmente, no entanto, o cenário é o oposto. A baixa temperatura e a incidência constante do vento foram transformadas em diferenciais, pois propiciam uma maturação mais longa e condições para que as uvas viníferas apresentem excelente sanidade. As iniciativas de empresários que se aventuraram em elaborar vinhos na região foram recompensadas com grandes rótulos, hoje nacionalmente conhecidos por sua qualidade.

A Vitivinicultura na região dos Campos de Cima da Serra é recente, iniciou com pesquisas realizadas pela Embrapa Uva e Vinho, que desde 2004 conduz experimentos nas áreas de viticultura e enologia na região, tem indicado condições favoráveis devido ao solo e o clima. Ainda em fase de crescimento, destacam-se municípios como Campestre da Serra, Monte Alegre dos Campos, Ipê e Vacaria. Até então, o que víamos eram esplêndidas maçãs, sobretudo plantadas em Vacaria: "maçãs da Serra Gaúcha para a sua mesa!", um slogan bem conhecido localmente.

Campos de Cima da Serra mais ao norte

Naturalmente tem naquelas terras, devido ao fato de ser um pouco mais frio, um terreno propício para ciclos vegetativos mais longos e aos vinhos com menor teor alcoólico, acidez mais alta e boa estabilidade de cor e bom perfil aromático (os dois últimos graças à boa amplitude térmica).

Recordando a teoria: a cada 100 metros de altitude a temperatura média decresce em torno de 0,5 graus e corresponde a um retardo de 2-3 dias no período de crescimento da planta. Isso, comparativamente, coloca a região de Campos de Cima mais próxima de um clima de Bordeaux, ao contrário da Serra Gaúcha. Mas, há uma boa insolação sem dúvidas! Aliás, turisticamente, dali pode-se iniciar, rumo ao litoral, a conhecida "Rota do Sol"!

Como os ciclos da planta são longos, há colheitas de uvas tardias como a Cabernet Sauvignon no mês de abril, fato que traduz uma maturação lenta e que associada à já citada amplitude térmica (com variações de 15 graus em média, entre dia-noite) propicia vinhos mais harmônicos, com bom equilíbrio geral entre corpo-álcool-acidez.

Dentre as uvas principais temos as tintas Ancelotta, Cabernet Franc, Cabernet Sauvignon, Merlot, Tannat e Pinot Noir. Esta última, tem tido bom destaque, sobretudo no munícipio de Muitos Capões. As brancas mais cultivadas são Chardonnay, Moscato Branco, Glera (Prosecco), Trebbiano e a de melhor potencial de qualidade, a Viognier.

As videiras estão situadas principalmente em três municípios: Vacaria, Muitos Capões e Monte Alegre dos Campos. As uvas Pinot Noir e Chardonnay (uvas utilizadas na elaboração de espumantes) são muito cultivadas na região que apresenta clima temperado, com boa amplitude térmica. Por conta das baixas temperaturas, as videiras têm um ciclo vegetativo mais longo, brotam mais tarde. Consequentemente, a colheita é mais tardia, quase no início do outono.

Campos de Cima da Serra

Pode-se resumir que a região de Campos de Cima da Serra aporta e acrescenta um toque a mais de sutilezas climáticas, permitindo a diversificação de estilos de vinhos do Rio Grande do Sul como um todo e, por sua bela paisagem natural, pode se tornar um novo polo turístico, a contrapartida lúdica no trabalho de informação e educação sobre vinhos aos consumidores.

A inconfundível casta Gewürztraminer é uma uva de aroma peculiar, que lembra lichia, rosas, manga e pode ser bastante apimentada. A origem do nome da casta é ainda muito discutida. Para alguns estudiosos do mundo do vinho, o prefixo “gewürz” (especiaria em alemão), faz referência a grande variedade de aromas encontrados nos vinhos elaborados a partir da casta.

Outra teoria é de que a cepa tenha se originado na Itália, no vilarejo de Traminer, há ainda suposições de que a casta tenha parentesco com a cepa Amineada Thessalia e tenha se originado ao norte da Grécia. Apesar de ser cultivada em países do Novo Mundo, Chile, Austrália, Estados Unidos e Nova Zelândia, a cepa obtém bastante sucesso nos vinhedos da Europa, sendo as da região da Alsácia (França) e de Pfalz (Alemanha) as melhores uvas da casta.

Com características físicas e sabores bastante marcantes, a uva Gewürztraminer é utilizada na elaboração de vinhos bastante diferentes entre si, a cepa pode originar vinhos que vão de brancos secos e bem encorpados até maravilhosos e doces vinhos de sobremesa. A uva Gewürztraminer possui difícil cultivo e por isso baixos rendimentos. Os vinhos elaborados com a casta possuem coloração intensa que varia entre um amarelo bem escuro e dourado com presença de acidez bastante delicada, característica que contribui para que a maioria dos exemplarem seja apreciada enquanto jovens. Muito dos rótulos elaborados na Alsácia Francesa possui maior taxa de acidez, podendo assim, os vinhos serem degustados com maior tempo de envelhecimento.

Possuindo aspecto aromático bastante elevado, os vinhos brancos secos elaborados com a cepa Gewürztraminer acompanham e harmonizam excelentemente bem com pratos que possuam bastante presença de condimentos, destacando-se a gastronomia tailandesa, chinesa e indiana. Já as versões mais adocicadas de vinhos brancos originários da casta, contrastam e criam um inesquecível sabor no paladar quando degustados juntamente com sobremesas que possuam frutas como base.

E agora finalmente o vinho!

Na taça revela um amarelo palha, límpido, brilhante, com lindos e discretos reflexos esverdeados.

No nariz apresenta aromas intensos e calcados na fruta, frutas brancas e cítricas com destaque para pêssego, melão, maçã-verde, lichia, além de notas delicadas e agradáveis de flores, com um mineral que traz muito frescor.

Na boca muito frescor, leve para mediano, com algum açúcar residual, mas sem ser enjoativo, com as notas frutadas predominando como no aspecto olfativo, com um delicioso toque picante, típico da casta, com uma acidez equilibrada e instigante com final de média persistência.

Sim! Um raio pode cair no mesmo lugar duas vezes e diante desse rótulo, mais do que especial, essa frase ganha força e digo de antemão que continuarei a degustar mais e mais rótulos desse produtor. E o que dizer desse produtor? Falei muito, ao longo desse texto, de visibilidade e credibilidade, e não podemos negligenciar o trabalho que a Vinícola Campestre vem realizando com a sua linha Zanotto! Vinhos frutados, leves, saborosos e o principal: de personalidade! Expressivo! A Zanotto está levando o nome da região de Campos de Cima da Serra ao alto! Vamos seguindo a valorizar a região, os vinhos nacionais, os seus produtores! Definitivamente o Zanotto Gewürztraminer sintetiza o melhor momento do vinho brasileiro. Tem 12,5% de teor alcoólico.

Sobre a Vinícola Campestre: 

Fundada há meio século, a Vinícola Campestre é uma empresa familiar empenhada em elaborar vinhos, sucos, coolers e espumantes de qualidade diferenciada. Esta constante meta é a pauta do aprendizado e do respeito a arte milenar de transformar o fruto em vida, pois o vinho, para a vinícola, é cultura, ciência e, é uma bebida que tem a magia de reunir pessoas, provocar conversas inteligentes e acima de tudo, cultivar amigos.

Métodos enológicos e tecnologia são nossos aliados na vinificação. Buscando cada vez mais satisfazer o consumidor com produtos naturais e com sabor e características da serra gaúcha. Os vinhos da Campestre conduzem a diferentes emoções; olfato e paladar, delicados toques de frutas vermelhas, cassis, mel e flores. Toda esta arte de transformação é uma declaração muito firme, de amor e respeito ao produto e aos apreciadores.

Mais informações acesse:

https://www.vinicolacampestre.com.br/

Referências:

“Cafeviagem”: https://cafeviagem.com/vinhos-de-campos-de-cima-da-serra/

“ABS-SP”: https://www.abs-sp.com.br/noticias/n144/c/vinhos-do-brasil-parte-iv-campos-de-cima-da-serra

“Mistral”: https://www.mistral.com.br/tipo-de-uva/gewurztraminer

 



sábado, 1 de outubro de 2022

Quimay Malbec 2020

 

Muito se fala em terroir! Claro que nomenclaturas como essas, dentro do universo do vinho, precisa ser discutida, pois é a partir do seu entendimento que construímos, entre outros fatores, as nossas identificações com os vinhos que costumamos degustar.

Porém infelizmente o uso da palavra parece ter como intuito apenas para a manipulação de um marketing perverso, como a engrenagem de uma máquina apenas para venda de produtos e não a disseminação de uma filosofia, de um conceito.

Mas essa (des) construção parece ruir quando degustamos um vinho e percebemos, apesar da particularidade de quem o aprecia, e não conseguimos identificar a tipicidade da bebida. Sabe quando degustamos, e isso de caracteriza pela “litragem”, e percebemos que o vinho não tem caráter? Ninguém pode com as manifestações sensoriais, quando, claro, bem exercitadas.

Mas ainda temos, por sorte, produtores que, abnegados, contra tudo e contra todos, seguem, bravamente, a engarrafarem o terroir, explorando tudo que a terra pode oferecer, aliado a cultura do povo e do saber fazer que decisivamente influencia o processo que vai da vindima à mesa do enófilo.

E quando falamos em terroir nos vem à mente, mesmo que de uma forma menos instintiva, a tradição, mas nem sempre a tradição nos obriga a ser tão linear. Muitos produtores promovem, com base na tradição, alguns “movimentos” mais arrojados sem abdicar do... terroir.

E alguns países produtores de vinho pode se dar ao luxo de enveredar nessas gratas aventuras e países como a Argentina e o Chile, por exemplo, por sua extensão, ampla latitude e diversidade geológica, convertem-se em um infinito conjunto de microclimas esperando ser descobertos por audaciosos enólogos e produtores que buscam não apenas um sistêmico padrão.

E alguns argentinos estão se mexendo e promovendo alguns rompimentos de paradigma para entregarem vinhos contemporâneos, arrojados, mas com caráter, com terroir. O vinho de hoje traz um produtor novo, com novas ideias e novo para mim: Manos Negras! O nome é muito sugestivo e seus produtores preconizam que o enólogo tem de meter a mão na massa, promover o contato com a terra e entender que os autênticos enólogos têm que sujar as suas mãos para explorar os limites da sua profissão que vai desde a vindima até o engarrafamento da poesia líquida.

E eles estão fazendo algo bem interessante que os uruguaios já costumam fazer há algum tempo, por exemplo: a combinação de terroirs com uma mesma variedade. Isso já, logo de cara, te estimula, te excita a degustar o vinho! Vinhos com terroirs conhecidos de Mendoza, mas com a aposta do diferente e assim, com muito arrojo, trazer a originalidade enaltecendo a tradição das microrregiões.

E o melhor ou, diria, surpreendente: recebi esse rótulo de um clube de vinhos, de um importante clube de vinhos de um gigante de vendas no Brasil! O vinho que degustei e gostei veio da tradicional Mendoza e se chama Quimay da casta icônica Malbec, da igualmente icônica Mendoza, safra 2020.

O vinho vem de um único vinhedo em Valle de Uco, em Mendoza que produz dois vinhos Malbec totalmente diferentes. Essa diferença vem da base. O Malbec com solo arenoso, é mais quente, o que dá origem a um Malbec mais doce, aveludado, mais fácil de beber. Por outro lado, o Malbec com solo calcário é um solo frio, o que dá origem a um Malbec com mais acidez, aromas mais frescos e intensos.

Um complementa o outro e assim a mistura de ambos resulta em um vinho mais interessante e complexo. Cada solo é colhido e vinificado separadamente e, em seguida, são misturados para equilíbrio e complexidade adicionais.

E os “autores” dessa façanha são: o ex-diretor de Catena Zapata por mais de 15 anos Alejandro Sejanovich e de dois imigrantes neozelandeses Duncan Killiner e Jason Mabbett, e o educador de vinhos americano Jeff Mausbach.

E vale aqui uma curiosidade sobre a origem do nome do vinho: “Quimay”! Quimay, em dialeto indígena argentino, significa oásis, locais sagrados em meio aos desertos dos pampas argentinos. Hoje muitos dos vinhedos estão nessas regiões desérticas antigas, como nos arredores de Mendoza.

Falemos também de Valle de Uco, uma região, encrustada na velha Mendoza que a cada dia vem se aperfeiçoando, investindo fortemente em tecnologia e ganhando visibilidade e respeitabilidade.

Valle de Uco, a grande produtora de vinhos da Argentina

Foi possível confirmar a presença de aborígenes que povoaram o vale de Uco muitos anos antes de Cristo. Nos petróglifos encontraram seu modo de vida: eram pessoas que se dedicavam à agricultura e à caça de animais, graças aos benefícios que o lugar lhes oferecia. No século XVI, a chegada dos conquistadores espanhóis das terras chilenas e peruanas marca as primeiras explorações em terras habitadas por dóceis e laboriosas famílias indígenas: os huarpes. Daquela época vem a palavra "Uco", que se refere ao nome do cacique Cuco. Além disso, é traduzido como uma nascente de água, elemento fundamental da região.

Um século depois, os padres jesuítas se estabeleceram no vale. Eles constituíram a primeira cidade organizada e fundaram o Curato de Uco, dando início à evangelização. O general José de San Martín governou Cuyo com sede em Mendoza entre 1814 e 1816, enquanto organizava os preparativos para empreender a travessia dos Andes e libertar o Chile e o Peru. Em várias ocasiões, ele se encontrou com nativos na área antes da expedição de libertação. Também com o militar argentino Manuel de Olazábal quando retornou à sua terra natal pelo desfiladeiro El Portillo, no que hoje é conhecido como Manzano Histórico.

José de San Martín

Por sua vez, a história da viticultura na região tem suas referências. Na década de 1880, Juan Giol, Bautista Gargantini e Pascual Toso chegaram de suas terras europeias e se associaram e se dedicaram à produção de vinhos. Três apelidos famosos que deram origem à San Polo Winery and Vineyards no início dos anos 1930, que tem a honra de ter, até hoje, cinco gerações de enólogos.

Juan Giol

Batista Gargantini

Pascual Toso

O Vale do Uco foi “descoberto” pela indústria vitivinícola nos anos 1990. Localizado no sudoeste da cidade de Mendoza, bem aos pés dos Andes, seus vinhedos estão plantados em uma zona de clima temperado, com invernos rigorosos e verões quentes com noites frescas. Pode-se dizer que Uco é uma área realmente fria da região de Mendoza – e também de grande amplitude térmica (pode chegar a até 16o C), em parcelas que variam entre 850 e 1.700 metros de altitude.

Os solos são predominantemente pedregosos, com seixos rolados misturados à areia grossa, de boa permeabilidade, boa drenagem e pouco férteis. Em algumas zonas, observa-se argila ou calcário e até áreas com depósitos de cálcio, estas últimas mais raras e valorizadas, e também de onde vêm saindo alguns dos melhores vinhos lá produzidos atualmente. O índice pluviométrico é baixo e a irrigação dos vinhedos é normalmente feita por gotejamento com água de degelo das montanhas.

O Vale estende-se por três departamentos (segundo nível de divisão administrativa nas províncias argentinas): Tupungato, Tunuyán e San Carlos. A altitude e a grande amplitude térmica constante que os três departamentos compartilham exercem influência na qualidade das uvas produzidas, uma vez que torna a fase de amadurecimento da fruta mais longa, permitindo que o caráter varietal de cada cepa cultivada desenvolva-se por completo, ao mesmo tempo em que um teor agradável de acidez seja preservado.

Vale de Uco

O sucesso do vale é tamanho que, no início da década de 2010, a área de vinhedos plantados chegava a quase 26.000 hectares, praticamente o dobro do que havia no local no início dos anos 2000. O desenvolvimento da região é inconteste, assim como a sua crescente reputação dentro da vitivinicultura argentina, haja vista que um grande número de vinícolas estabelecidas em outras áreas de Mendoza busca adquirir vinhedos no vale e também construir novas plantas na região.

Aproximadamente 75% dos vinhedos são de uvas tintas, especialmente Malbec, Cabernet Franc, Cabernet Sauvignon, Merlot e Pinot Noir, com destaque para a vedete nacional nos últimos anos, a Cabernet Franc. Dentre as brancas, brilham a Chardonnay, a Sémillon e a Sauvignon Blanc, mas também há vinhos com Viognier e Torrontés.

E agora finalmente o vinho!

Na taça entrega um lindo vermelho rubi intenso e brilhante, mas com entornos violáceos, com lágrimas, lentas e em média intensidade que desenham as paredes do copo.

No nariz traz a predominância de frutas maduras, pretas e vermelhas, com as notas amadeiradas bem integrada, entregando baunilha, um leve tostado e um defumado. O toque floral traz frescor ao vinho.

Na boca é seco, mas traz a sensação de um discreto residual de açúcar, com alguma estrutura e vivacidade, sobretudo pela sua jovialidade, sendo corroborada pela fruta intensa, como no aspecto olfativo. As notas amadeiradas também ganham evidência, graças aos 8 meses de passagem por barricas de carvalho, com toques de chocolate, baunilha. Tem taninos gulosos, presentes, mas domados, com ótima acidez e final persistente e frutado.

Vinhos contemporâneos, com novas propostas, arrojadas, técnicas de cultivo novas, conceitos sustentáveis, todos esses quesitos vislumbra um único e precioso resultado: vinhos autênticos, castas que reflitam o seu terroir. O conceito de terroir não deve ser levado em conta de uma forma apenas, tão somente voltada para marketing, mas que seja de fato efetivada e que entregue o máximo de tipicidade na bebida e que ela chegue de fato à mesa do enófilo e que este entenda, não importa a forma, que esse vinho é de Mendoza, que é um Malbec distintamente argentino, pois sintetiza o chão, a terra a qual fora concebido. Tem 13,8% de teor alcoólico.

Sobre a Vinícola Manos Negras:

Os verdadeiros produtores de vinho sujam as mãos, ou seja, ficam com as mãos pretas de vinho, e é disso que se trata o Manos Negras. Arregaçando as mangas e sujando as mãos, é assim que fazemos esses vinhos artesanais.

Manos Negras concentra-se na vinificação em latitude, e sendo assim as regiões vinícolas da Argentina e do Chile se estendem por 1.500 milhas de norte a sul ao longo dos Andes. Cada latitude possui um terroir único com combinações singulares de solo e temperatura que são decerto ideais para diferentes variedades.

Manos Negras, fundada em 2009, usa as habilidades únicas de dois imigrantes neozelandeses Duncan Killiner e Jason Mabbett, e o educador de vinhos americano Jeff Mausbach, bem como o renomado viticultor argentino Alejandro Sejanovich para criar vinhos com base em emocionantes combinações terroir-varietais.

Mais informações acesse:

www.manosnegras.com.ar

Referências:

“Welcome Argentina”: https://www.welcomeargentina.com/valle-de-uco/historia.html

“Revista Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/conheca-o-vale-do-uco-local-que-reune-grandes-vinhos-argentinos_11401.html

“Revista Sociedade de Mesa”: https://revista.sociedadedamesa.com.br/2015/07/vinicola-manos-negras/