Os bons enófilos entenderão o que direi, o melhor,
textualizarei, agora: é possível sim nos apaixonarmos por um vinho, digo mais,
paixão é efêmero, é fugaz, mais criar um vínculo amoroso com um rótulo, com um
produtor, com uma linha de rótulos a ponto de criarmos um vínculo safra por
safra! Alguns poderão dizer que seria uma espécie de zona de conforto, se
deixar escravizar pela conveniência da qualidade, não se permitindo degustar
outros vinhos e se aventurar em outras experiências sensoriais. Ah talvez possamos,
como bons versáteis que devemos ser, unir a conveniência do amor a um rótulo, a
um produtor, a uma região, a uma casta e a aventura apaixonante das novas
experiências, diversificando o nosso leque de opções.
Agora vem aquela pergunta que não quer calar: Por que falar
tanto de amor, paixão e efemeridades? Bem tem tudo a ver com a nossa percepção
para com essa poesia líquida que nos traz tanta inspiração quando falamos,
conhecemos e, claro degustamos. Mas não é só isso, mas também um paralelo,
muito do óbvio, do rótulo que degustarei e que terei um grande prazer em tecer
algumas linhas, sobretudo pela sua casta, famosa na Espanha, como a mais
emblemática: Tempranillo.
A Tempranillo, popularmente conhecida em Portugal como Aragonez e Tinta Roriz, sem sombra de dúvida é, com o perdão da analogia, uma casta apaixonante, que se ama facilmente e diria muito democrática: estruturada, complexo, sobretudo quando estagia por barricas de carvalho, básico, um vinho mais direto e de grande vocação gastronômica. Agrada a todos os níveis de paladar, do mais exigente e experiente aos iniciantes do mundo do vinho.
E nada mais autêntico como a Tempranillo. Retrata fielmente a
tipicidade de cada região na Espanha, sendo de fácil cultivo, por isso é tão
popular e se adequa a todos os terroirs, ganhando em singularidade. E quando
falo de autenticidade, o rótulo que escolhi para degustar personifica, de forma
exemplar, tal condição: Um Tempranillo como ele deve ser na sua essência,
retratando as suas mais apaixonantes características. O vinho que degustei e
gostei vem da região de Castilla La Mancha, um emblemático e fiel Tempranillo
da emblemática e tradicional Vinícola Torres e se chama San Valentín da safra
2019. Ah já que falamos com tanto amor e aí está o motivo dessa palavra ser tão
mencionada nesta resenha, por causa do santo que inspirou o dia dos namorados
pelo mundo afora, mas também pelo apreço emocional que tenho, que todos têm
pela Tempranillo, falemos então da casta.
Tempranillo
O nome Tempranillo é o diminutivo de “temprano”, que em
espanhol significa cedo e, no contexto do mundo do vinho, quer dizer que essa
variedade de uva amadurece antes que as demais. Na Espanha, que é um dos países
onde essa uva é mais cultivada, ela amadurece algumas semanas antes que as outras
uvas. É oriunda da Península Ibérica, mas devido sua fácil adaptação a
diferentes climas e solos, no último século, tem sido muito cultivada em partes
diversas do do mundo do vinho, do México à Austrália. Ela possui várias outras
designações, dependendo do país de cultivo a Tempranillo pode ser conhecida
como Aragonez ou Tinto Roriz (Portugal), Negretto (Itália), Valdepeñas (Estados
Unidos) e, mesmo dentro do seu país originário, sua identificação muda
substancialmente. Em geral, produz um vinho tinto com acidez e teor alcoólico
de nível médio, textura macia e deliciosamente elegante.
Os povos fenícios foram provavelmente os introdutores dessa
variedade de uva na Península Ibérica, através da cultura da vitis vinifera,
trepadeira que deu origem a quase todas as castas de uvas existentes hoje.
Segundo pesquisas científicas, a Tempranillo foi cultivada pela primeira vez há
pelo menos 1.000 a.C, onde hoje é a província espanhola de Cádiz. Sua
utilização na produção vinícola da Espanha, porém, permaneceu subdesenvolvida
até o século XV, período pelo qual esteve o território espanhol sob o domínio
mouro, cuja cultura religiosa não dá valor algum às bebidas alcoólicas. Portanto,
durante muito tempo no país, a produção de vinho não ficou em primeiro plano,
estagnando seu desenvolvimento. Após esse período, a Espanha teve seu
florescimento no que diz respeito ao cultivo da uva e produção de diferentes
tipos de vinhos, chegando hoje a corresponder ao terceiro maior mercado
produtor. À frente dessa produção está a Tempranillo, que, devido sua
influência e predominância, tornou-se símbolo dos melhores vinhos do país.
Curiosamente, apesar de o sabor do vinho elaborado com a Tempranillo ser comparado, algumas vezes, com o da Cabernet Sauvignon, elas diferem em relação à adaptabilidade, assim como em relação à resistência as pragas e as intempéries climáticas. Nesses três quesitos a Cabernet Sauvignon apresenta maior resistência. Em relação ao clima, por exemplo, apesar da Tempranillo atualmente ser cultivada em diversas regiões do mundo (não tantas quanto a Cabernet Sauvignon) e de tolerar climas quentes, especialistas afirmam que os melhores vinhos são aqueles produzidos com uvas cultivadas em regiões mais frias e com maior altitude. Por outro lado, os estudiosos também reconhecem que, para aumentar o teor de açúcar e “engrossar” a casca (o que faz com que o vinho tenha uma cor mais intensa), é preciso que o local de cultivo tenha temperaturas mais altas. A conclusão, portanto, é que o clima ideal para o cultivo dessa variedade é o continental.
De forma geral, pode-se dizer que o vinho Tempranillo tem
taninos médios, acidez média para alta e cor vermelho escura. É considerado
como um vinho de corpo leve a médio. Se jovem, seus aromas remetem a frutas
vermelhas; se envelhecido, apresenta aromas de couro e de folhas frescas de
tabaco. Quando o vinho é envelhecido, ele fica mais encorpado e com aromas de
carvalho, mesmo que a aparência não mostre isso. Isso porque o bago dessa uva é
grande e tem casca fina, razão pela qual, quando o vinho está no copo, pode
parecer mais translucido do que outros vinhos de corpo médio.
São Valentim
Apesar do Brasil celebrar o Dia dos Namorados em junho, casais apaixonados da Europa e dos Estados Unidos comemoram o amor em 14 de fevereiro. Por quê? A data está diretamente ligada a São Valentim, o santo do amor. O bispo São Valentim viveu durante Império Romano, no século 3 – tempo em que muitas guerras estavam acontecendo.
Apesar do Brasil celebrar o Dia dos Namorados em junho, casais apaixonados da Europa e dos Estados Unidos comemoram o amor em 14 de fevereiro. Por quê? A data está diretamente ligada a São Valentim, o santo do amor. O bispo São Valentim viveu durante Império Romano, no século 3 – tempo em que muitas guerras estavam acontecendo. Naquela época, o Imperador Cláudio II proibiu o casamento porque achava que soldados solteiros eram combatentes melhores. Mas Valentim realizou muitas uniões clandestinamente. Até que um dia ele foi descoberto, preso e condenado à morte. Mesmo atrás das grades, o bispo recebeu cartas e flores de pessoas que acreditavam no amor e queriam agradecê-lo por realizar seus casamentos. Também foi na prisão que Valentim se apaixonou por uma mulher, mesmo sabendo que jamais ficariam juntos. A moça era cega e filha de um dos carcereiros. Reza a lenda que foi Valentim que, milagrosamente, a fez enxergar novamente. Antes de sua execução, no dia 14 de fevereiro de 269 d.C., o bispo escreveu uma carta de despedida à sua amada, terminando o texto com a frase: “De seu Valentim”. Mais de 200 anos depois, no ano de 496, o Papa Gelásio declarou Valentim santo, fazendo com que milhões de religiosos recordassem seus feitos. A data de sua morte foi escolhida pela Igreja como Dia dos Namorados para incentivar casais que pretendiam se unir em matrimônio.
E agora finalmente o vinho!
Na taça revela um vermelho rubi intenso, quase escuro, com
alguns reflexos violáceos muito brilhantes com lágrimas finas e em abundância, que
teimam em se dissipar das paredes do copo.
No nariz apresenta uma intensidade de aromas, muito frutado,
que vai de frutas vermelhas como groselha, cereja e framboesa a frutas negras
como amora, ameixa além de um toque floral muito agradável.
Na boca é estruturado, intenso, carnudo, logo com um ótimo
volume de boca, mas por outro lado, macio e aveludado, apesar de o início se
revelar alcoólico, pela sua impetuosidade, um jovem vinho, mas logo se
equilibrou, com uma acidez equilibrada, de média intensidade corroborando a sua
jovialidade, com taninos pronunciados e presentes, com final persistente.
Um autêntico e verdadeiro exemplar de Tempranillo está
personificado neste belíssimo rótulo da Miguel Torres. Os aromas e o palato
trazem a essência da Tempranillo expressando o terroir de La Mancha, mas com o
caráter, a gênese da casta mais popular e emblemática da Espanha. Um exemplo de
amor literal a terra, as verdadeiras características dessa cepa e que foi
produzido por Miguel Torres Carbó como um presente de dia dos namorados para
sua esposa, Margarita Riera, em fevereiro de 1956. A flecha do amor atingiu em
cheio o meu humilde coração enófilo. Um vinho altivo, revigorante, jovem,
intenso, as frutas no seu ápice, no seu auge, na plenitude de seu momento,
mostrando taninos vivos e presentes, acidez equilibrada, revelando frescor. Um
vinho de marcante personalidade, mas muito fácil de degustar. Que o amor pelo
vinho transmita prazer e momentos de celebração que somente o vinho pode
proporcionar! Tem 14,5% de teor alcoólico muito bem integrado ao conjunto do
vinho.
Sobre a Vinícola Miguel Torres:
A Vinícola Miguel Torres, é uma empresa moderna que está em
constante renovação e expansão e que possui vinícolas nas principais regiões
produtoras da Espanha: Penedès, Priorato, Rioja, Ribera Del Duero, Rueda, Rías
Baixas e Toro. Também possui vinícolas no Chile e nos Estados Unidos
(Califórnia). No Chile, foi a primeira vinícola européia a se instalar no Vale
de Curicó no fim da década de 1970 e por isso liderou a modernização vinícola
daquele país. Miguel Torres possui hoje 1.700 hectares de vinhedos na Cataluña
e é a maior vinícola do país, entregando ao mercado 35 milhões de litros de
vinhos por ano, tendo rótulos como Coronas, Gran Coronas, Sangre de Toro, Viña
Sol, um dos mais vendidos e conhecidos. Miguel Agustin Torres, pai de Miguel Torres
Maczasseck, formado em enologia na França, começou a trabalhar na empresa em
1961 e assumiu definitivamente o lugar do pai, Miguel Torres Carbó, em 1991.
Representando a quarta geração da família, foi ele quem comandou a ampliação
dos negócios na Espanha, há alguns anos, com novas vinhas em Rioja, Ribera del
Duero, Rueda e no Priorato, Toro e Jumilla. Além disso, em 1994 comprou a
vinícola de Jean Leon, mais em homenagem ao amigo espanhol que fez sucesso com
um restaurante em Los Angeles, nos Estados Unidos, com quem mantinha amistosa
rivalidade. Jean Leon foi o primeiro a plantar Cabernet Sauvignon no Penedés,
logo seguido por Miguel Torres. Atualmente, a Miguel Torres emprega milhares de
trabalhadores, possui vinotecas em Shanghai, Barcelona e Santiago, tem firme
atuação nas redes sociais e tem por lema “Cuanto
más cuidamos la tierra, mejor vino conseguimos”. Exporta seus vinhos para
mais de 150 países e tem um objetivo a ser atingido até 2020: reduzir as
emissões de CO2 de cada garrafa produzida a partir de 2008, uma vez que o
respeito ao meio ambiente, a ecologia faz parte da estratégia da vinícola
Torres no mundo todo.
Mais informações acesse:
https://www.torres.es/es/inicio
Referências:
Blog “Vinhosite”: http://blog.vinhosite.com.br/tempranillo-a-uva-que-os-espanhois-mais-cultivam/
“Clube dos Vinhos”: https://www.clubedosvinhos.com.br/tempranillo-a-nobre-uva-da-espanha/
“Revista Galileu”: https://revistagalileu.globo.com/Sociedade/Historia/noticia/2020/02/quem-foi-sao-valentim-o-bispo-inspirou-o-dia-dos-namorados-no-exterior.html
“Blog do Jeriel”: https://blogdojeriel.com.br/2020/07/01/vinhos-de-julho-miguel-torres-san-valentin-parellada-tempranillo-e-garnacha-todos-2018/
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