Eu sempre defendi e defendo que a degustação de um vinho não
se restringe ao consumo meramente, a degustação propriamente dita, embora seja
o ápice, o momento épico, único, singular. Porém degustamos também a informação
que absorvemos o conhecimento decantado, o banho de cultura, um escambo
cultural é necessário sem nenhuma sombra de dúvida e não é mero preciosismo,
mas também a certeza de que podemos ter acesso aos mais diversos rótulos,
castas, regiões, países e o principal: novas experiências sensoriais que nos
propicie a melhor, adivinhe, degustação, o célebre momento da degustação.
O caso desse rótulo retrata fielmente o que registrei acima. Em
meados dos anos 2000, não sei dizer ao certo o ano, talvez 2013, eu participei
de um evento de degustação no Rio de Janeiro, no Centro da cidade. Esse evento
de degustação, tornou-se, por cerca de duas horas, o centro de minha atenções,
o deleite das minhas experiências sensoriais. Eram muitos rótulos, estava
difícil escolher por onde começar: vinhos brasileiros, italianos,
portugueses...que dúvida ótima essa, não é?
Mas comecei as degustações e de estande por estande, produtor
por produtor, observei, ainda ao longe, distante até, mas aproximei,
interessado e, como que atraído, como um imã, cheguei em um estande que não
tinha tantos rótulos disponíveis, mas que me interessou e confesso que não
sabia o motivo pelo qual tinha sido atraído para aquele estande, para aquele
produtor, talvez pelo fato de ser um rótulo novo, pouco conhecido à época.
Era um vinho brasileiro, de uma vinícola nova, mas que
pertencia a gigante, tradicional e importante Família Valduga da região de
Bento Gonçalves, no Vale dos Vinhedos. E isso eu fui descobrindo pelo fundador,
Rogério Carlos Valduga, isso mesmo, o criador da vinícola em pessoa estava
diante de mim, muito atencioso e simpático, que passava, sem hesitar, todas as
informações dos rótulos disponíveis e da sua vinícola. Fiquei tão entusiasmo
quando degustei cada um deles, Merlot, Tannat etc, que diante da opção sensorial,
os meus sentidos apontou para o Torcello, esse também é o nome da vinícola e
que dá nome aos vinhos também, da casta Tannat da safra 2014.
Eu estava experimentando os Tannats nacionais e estava
gostando e muito dos rótulos escolhidos, então esse veio a calhar e como veio!
Então aqui seguem as minhas impressões, mais do que entusiasmadas, desse ótimo
vinho: Torcello Tannat 2014. Mas o tempo foi passando, descobertas foram sendo
feitas, novas experiências sendo empreendidas e no ano de 2017, em mais um
evento de degustação conhecido como “Vinho na Vila”, direcionado apenas aos
vinhos nacionais, lá estava eu passeando pelos estandes e conhecendo um pouco
mais os rótulos brasileiros. Esse evento foi emblemático, um verdadeiro divisor
de águas para mim, no que tange ao contato mais intenso com os vinhos
tupiniquins.
E por uma grata surpresa lá estava o estande da Torcello!
Agora com uma bela diversidade de rótulos, novos rótulos para mim e os que eu
já conhecia daquela época de 3 ou 4 anos atrás. E neste evento o Rogério Carlos
Valduga de novo, juntamente com a sua simpática, empatia e atenção tão
característica que tive a oportunidade de ver há algum tempo atrás. Claro que
fui até o estande, não hesitei desta vez e degustei um a um e cheguei ao
Cabernet Sauvignon (não me recordo se tinha degustado este na primeira vez, no
primeiro contato com os vinhos da Torcello), fui servido, a minha taça cheia de
novidades! O degustei e gostei! Que vinhaço! Então não hesitei em levá-lo.
Ficou em minha adega por longos 4 anos! E com 6 anos de safra,
um vinho mais austero, poderoso, mas afinado pelo tempo. A ansiedade palpitava!
É chegada a hora de degusta-lo. Então o vinho que degustei e gostei veio do
Brasil, da região do Vale dos Vinhedos e se chama claro, Torcello da casta
Cabernet Sauvignon (100%) da safra 2015. Mas antes de falar do vinho não
podemos deixar de enaltecer a região de onde é oriunda: Vale dos Vinhedos!
O Vale dos Vinhedos
O Vale dos Vinhedos localiza-se no centro do triângulo
formado pelas cidades de Bento Gonçalves (nordeste), Monte Belo do Sul
(noroeste) e Garibaldi (sul). O Vale dos Vinhedos compreende a parte da bacia
hidrográfica do Rio Pedrinho, situada a montante da foz de um córrego afluente
deste e situado a sudeste da comunidade de Vale Aurora, no município de Bento
Gonçalves. A parte do vale a jusante é denominada de Vale Aurora. A maior parte
da área do Vale dos Vinhedos fica localizada em território do município de
Bento Gonçalves, com 55 por cento do total, e a menor parte fica localizada em
território de Monte Belo do Sul, com 8 por cento na porção noroeste. A parte
sul do Vale pertence ao município de Garibaldi, com 37 por cento da área total.
Parte da zona urbana de Bento Gonçalves situa-se dentro do perímetro do Vale,
haja vista que a linha divisória de águas entre as bacias do Rio Pedrinho e do
Rio Buratti passa pela parte oeste da cidade. Localizam-se ao longo desta
linha, ou próximo desta, a pista do Aeroclube de Bento Gonçalves, a Estação
Rodoviária de Bento Gonçalves, o Estádio da Montanha e a Estação Ferroviária de
Bento Gonçalves.
O Vale dos Vinhedos foi a primeira região com classificação
de Denominação de Origem (DO) de vinhos no país. Sua norma estabelece que toda
a produção de uvas e o processamento da bebida seja realizada na região
delimitada do Vale dos Vinhedos. A DO também apresenta regras de cultivo e de
processamento mais restritas que as estabelecidas para a Indicação de
Procedência (IP), em vigor até a obtenção do registro da DO, outorgado pelo
INPI.
Detalhes da Denominação de Origem do Vale dos Vinhedos
1 - A produção de uvas e a elaboração dos vinhos ocorrem
exclusivamente na região delimitada do Vale dos Vinhedos, uma área de 72,45 km2
localizada nos municípios de Bento Gonçalves, Garibaldi e Monte Belo do Sul.
2 - Existem requisitos específicos para de cultivo dos
vinhedos, produtividade e qualidade das uvas para vinificação;
3 - Os espumantes finos são elaborados exclusivamente pelo
“Método Tradicional” (segunda fermentação na garrafa), nas classificações
Nature, Extra-brut ou Brut; para este produto as uvas Chardonnay e/ou Pinot
Noir são de uso obrigatório;
4 - Nos vinhos finos brancos, a uva Chardonnay é de uso
obrigatório, podendo ter corte com a Riesling Itálico;
5 - O uso da uva Merlot é obrigatória para os vinhos finos
tintos da DO, os quais podem ter cortes com vinhos elaborados com as uvas
Cabernet Sauvignon, Cabernet Franc e Tannat;
6 - Os produtos que passam por madeira envelhecem
exclusivamente em barris de carvalho;
7 - Para chegar ao mercado, os vinhos brancos passam por um
período mínimo de envelhecimento de 6 meses; no caso dos vinhos tintos são 12
meses; os espumantes finos passam por um período mínimo de 9 meses em contato com
as leveduras, na fase de tomada de espuma;
8 - Os vinhos apresentam características analíticas e
sensoriais específicas da região e somente são autorizados para comercialização
os produtos que obtenham do Conselho Regulador da DO o atestado de conformidade
em relação aos requisitos estabelecidos no Regulamento de Uso.
E agora finalmente o vinho!
Na taça apresenta um vermelho rubi intenso, escuro, com
reflexos acastanhados em seu entorno demonstrando a maturidade do vinho, com
lágrimas grossas e abundantes que desenham, mancham as paredes do copo.
No nariz as notas de frutas vermelhas maduras se revelam de
forma intensa, mas em perfeito equilíbrio com a madeira, com toques discretos de
baunilha e tostado, além de um pimentão.
Na boca é estruturado, encorpado, mas muito redondo e
harmonioso, o tempo lhe foi gentil, os taninos se mostram vivazes, mas
aveludados, com a madeira e o tostado aparecendo de novo, devido a passagem de
6 a 8 meses por barricas de carvalho, com uma boa acidez que entrega um vinho
pleno aos 6 anos de idade. Final persistente e frutado.
Um belíssimo Cabernet Sauvignon, equilibrado e austero, o
tempo foi muito gentil com esse vinho, mas revelou-se ainda complexo,
estruturado, poderoso. Uma curiosidade que recebi do produtor: “Trabalhamos com
apenas 3 Kg de uva por planta, dessa forma a uva ganhou muito em estrutura e
nutrientes.” Um exemplo de que temos sim grandes vinhos da casta Cabernet
Sauvignon que, para muitos, existe o receio de vinhos brasileiros inexpressivos
dessa cepa. O Torcello é o exemplo de que essa informação é totalmente
improcedente. Um vinho oriundo das informações, da decantação do conhecimento.
Vinho e conhecimento andam juntos, devem andar juntos, de mãos dadas a serviço
do enófilo, para deleite e prazer do enófilo, sempre. Novas experiências, novas
percepções, todas são formas de celebração ao vinho e Torcello Cabernet
Sauvignon é uma ode às gratas novidades! Que venham mais e mais vinhos com esse
emblema de qualidade e tipicidade. Tem 13% de teor alcoólico.
Sobre a Vinícola Torcello:
A História da Torcello inicia com a chegada do primeiro
imigrante italiano da Família Valduga ao Brasil (Marco Valduga), em 1875. Com
muita fé, trabalho e perseverança, desbravaram matas virgens e construíram o
que hoje conhecemos como Vale dos Vinhedos. A Vinícola Torcello foi fundada no
ano de 2000 por Rogério Carlos Valduga, quarta geração da Família Valduga, e
filho de Remy Valduga (viticultor, escritor e bisneto de Marco). A Torcello
surgiu do fascínio de Rogério pela vitivinicultura e pelo seu desejo de
resgatar a tradição da família, a qual elaborava vinho de maneira totalmente
artesanal no próprio porão de casa para consumo próprio.
Curiosidades sobre a Torcello:
Uma das menores ilhas de Veneza chama-se Torcello, e dessa
forma, por sermos uma das menores vinícolas instaladas no Vale dos Vinhedos,
fizemos alusão a ilha. Já a escolha do símbolo da Vinícola, Leão Alado de São
Marcos, deu-se pelo fato de o Leão representar proteção. Sendo assim, o símbolo
remete a proteção do Leão Alado sobre os vinhos por nós elaborados. Os
primeiros vinhos foram elaborados em 2005, e a abertura do varejo aconteceu em
2007. Hoje a Vinícola elabora vinhos, espumantes e sucos em pequena escala,
buscando sempre a qualidade.
Mais informações acesse:
Referências:
“Wikipedia”: https://pt.wikipedia.org/wiki/Vale_dos_Vinhedos#Denomina%C3%A7%C3%A3o_de_Origem_Vale_dos_Vinhedos
“Viajali”: https://www.viajali.com.br/vale-dos-vinhedos/
“Embrapa”: https://www.embrapa.br/indicacoes-geograficas-de-vinhos-do-brasil/ig-registrada/do-vale-dos-vinhedos
Nenhum comentário:
Postar um comentário