Origem
Na Grécia Antiga, era considerado civilizado diluir o vinho.
A crença era que só os bárbaros, bêbados e assassinos bebiam o vinho puro. O
rei espartano Cleômene I afirmou que o consumo do vinho puro causou a
decadência dele, que foi preso e se suicidou.
As uvas, naquela época, eram colhidas e prensadas juntas,
brancas e tintas, e eram pisadas e colocadas em ânforas para a fermentação.
Esse processo de ânfora, que fazia com que evaporasse um percentual do líquido
por causa da porosidade, os deixava com a característica oxidativa e mais
tânicos. Os originais vinhos naturais, eis a receita.
Com a evolução natural da curiosidade e tentativas, pois no
mundo do vinho não se para, mas sim se continua criando, separaram as uvas
brancas das tintas. Gregos e romanos conhecem os brancos e os tintos, mas, os
tintos eram muito tânicos e robustos e a preferência ficou para o rosé. O rosé
do momento era apenas tinto diluído em água! E beberam durante séculos.
Os Foceios trouxeram vinhas da Grécia para Marselha e
utilizavam o mesmo processo, uvas tintas e brancas misturadas. Os rosés do sul
da França, em Provença, ficaram conhecidos em todo o Mediterrâneo. Quando os
romanos chegaram, eles já sabiam desta fama e, com suas habilidades comerciais,
espalharam pelo resto do Mediterrâneo este vinho muito apreciado no verão,
especificamente. Por isso que, ainda hoje, a Provença é considerada o epicentro
do vinho rosé.
Na Idade Média circulava um boato que Bordeaux tinha feito um
vinho violeta, o famoso clarete. Clarete é uma especialidade de Bordeaux que
vem conquistando popularidade. Ele homenageia o vinho que era exportado ao
Reino Unido na Idade Média e inspirou o termo inglês claret, usado para descrever o Bordeaux tinto. Como Bordeaux estava
sobre o domínio inglês, entre os anos 1152 e 1453, o vinho logo foi exportado
pra lá e virou a nova coqueluche. Até meados de 1900, os ingleses e o clarete
eram inseparáveis. No século XIX os franceses começaram a viajar para o sul da
França e, depois de um belo banho de mar, um dia na praia, tomavam um rosé
refrescante, e o local virou símbolo de glamour, prazer e verão. Et voilà!
Curiosidade: O nome claret ainda é amplamente usado na
Grã-Bretanha e aplica-se a todos Bordeaux tintos, enquanto clairet passou a ser
o nome dos vinhos de estilo rosé dessa região.
Como nasce o vinho rosé?
A carne das uvas é basicamente da mesma cor: um verde claro
translúcido. E isso independe de sua espécie, se escuras ou verdes. Porém
também sabemos que há vinhos tintos e brancos. E, na enologia, é pecado mortal
usar corantes ou qualquer tipo de pigmento estranho às uvas. E então? Por que
há essa distinção de cores entre os tintos e brancos? E o que seria, nessa
questão, o vinho rosé? A coloração e matização dos tintos dão-se pelo contato
do mosto com as cascas da uva. Quanto maior as permanências, mais encorpadas e
escuras serão.
Assim, por essa lógica, o vinho rosé tem um contato curto com
as cascas. Não passa de algumas horas. A transferência de coloração ocorre de
modo brando, e há leve mudança estrutural. Justamente por isso esse vinho
recebe este nome: trata-se de uma bebida fina, fresca, mas com tanicidade ainda
presente. Sua coloração varia do raso alaranjado até tons um tanto mais
presentes. Salmão e, mesmo, tom de cereja são encontrados em versões mais
tânicas.
Quais métodos para se fazer um vinho rosé?
Saignée: sangria, pela tradução. É quando se
tira, logo após o inicio da fermentação, por volta de 10% do líquido em contato
com as cascas das uvas tintas para que, este fique mais concentrado. E com mais
antocianos e ácidos fenólicos, para quem tem interesse em vinhos com mais
antioxidantes (sempre bom!). Todos os de apelação Côtes des Provence tem que
ter no mínimo 20% de saignée, por lei.
Contato com a casca: neste, as uvas ficam em contato com o
suco por horas ou dias. Esse é o método clássico.
Blending: misturar vinho branco e tinto. Não
gera vinhos muito interessantes e era proibido fazer em Champanhe, na Provença,
até 2009.
Provence: A terra dos rosés
Embora a Provence seja o berço do vinho rosé no mundo e sua
história remonte há muitos anos antes de Cristo, foi apenas no século XIV que
ganhou prestígio mundial, quando se tornou residência papal e mais do que nunca
o vinho rosé passou a ser sinônimo de elegância.
No sudeste da França, ao redor do que os franceses chamam de
Côte d’Azur, não muito distante do principal balneário do país, quase que de
Montpellier até Nice, passando por cidades como Marselha, e praias como
Saint-Tropez, fica essa região espetacular.
A Provence produz cerca de 150 milhões de garrafas de rosés
por ano, 42% da produção nacional da Franca e 6% dos vinhos rosés do mundo.
Cerca de 90% da produção local é de rosés. Seus rosados são feitos não por
blend de vinhos tintos com brancos, mas por maceração, ou seja, o contato das
cascas das uvas tintas com o mosto durante o processo de produção.
A Provence é dividida em três grandes denominações com
sub-regiões: Côtes de Provence (que responde por mais de 70% do vinho local),
Coteaux d’Aix em Provence (16%) e Coteaux Varois em Provence (10%). Dentro de
Côtes de Provence, algumas das regiões mais famosas são: Sainte Victoire,
Fréjus, La Londe e Pierrefeu. Há outras seis denominações: Les
Baux-de-Provence, Pierrevert, Bandol, Cassis, Bellet and Palette.
Existe uma lista de propriedades “Cru Classés” de Provence de
1955, quando 23 produtores foram condecorados como sendo “Crus” entre os cerca
de 300 que havia na região na época. No entanto, atualmente, cinco dessas
propriedades já não produzem mais vinho, então sobraram apenas 18 da
“classificação original”. Mais recentemente, alguns produtores criaram o “Club
des Crus Classés de Côtes de Provence” com alguns dos membros “originais” e também
outros.
Existem duas áreas principais. A oeste e norte, encontramos
colinas e socalcos de calcário esculpidos pela erosão, em um ambiente de
matagal (montanha de Sainte-Victoire, maciço Sainte-Beaume). A leste, de frente
para o Mediterrâneo, os maciços cristalinos Maures e Tanneron tem um relevo
mais suave com mais maquis. Os solos são geralmente pobres, bem drenados e
rasos, sem excesso de umidade. Quanto ao clima, o vento Mistral traz um ar
refrescante a uma das regiões mais quentes da França, com poucas chuvas, mas
intensas.
Mais de uma dúzia de variedades de uvas são utilizadas na
fabricação de vinhos da Provence. Entre as brancas, encontramos: Rolle, Ugni
Blanc, Clairette, Sémillon, Grenache Blanc, Bourboulenc etc. Entre as tintas:
Grenache, Cinsault, Syrah, Mourvèdre, Tibouren, Carignan, Cabernet Sauvignon
etc.
Curiosidade: os vinhos rosés da Provence também são famosos
por suas garrafas lindas. Aliás, a região é precursora na inovação do uso de
garrafas, o que também reflete um estilo mais alegre e moderno de produzir
vinhos. As garrafas são, de fato, um chamariz e diferencial do vinho provençal.
O rosé pelo mundo
Não é só na Provence que esses vinhos têm espaço; em países
europeus como Itália, Portugal e Espanha, os rosados ou rosatos também têm
importância.
Na França mesmo se pode encontrar ótimos rosés produzidos da
apelação controlada (AOC) em Cotes de Rhône, principalmente de Tavel, uma
apelação controlada dedicada aos rosés. Na Provence, temos, além dos mais
cobiçados Rosés da Côtes de Provence, os deliciosos Bandol nas cercanias da
belíssima Toulon. Ainda na França, o Languedoc-Roussillon vem despontando na
produção de deliciosos rosés a excelentes preços. De todo o Languedoc,
Minervois é a região que mais coloca no mercado rosés de qualidade. Em todas
essas regiões ao sul da França, as uvas que têm destaque são a Grenache (a mais
importante de todas), a Cinsault e a Mourvedre. Podemos encontrar bons vinhos
rosés em Bordeaux e no vale do Loire. Nessas regiões, as uvas mais utilizadas
são os Cabernets (Sauvignon e Franc) e a Merlot. Mais raros e de excelente
qualidade são os pouquíssimos rosés da Borgonha, produzidos a partir da Pinot
Noir.
Na Itália, o vinho rosé está consagrado e tem seu lugar
garantido na tavola. A produção de rosés é forte no sul da bota, mas quando
falamos de qualidade três regiões devem ser destacadas na produção de rosés de
qualidade. A Toscana vem produzindo a cada dia melhores vinhos rosados a partir
Sangiovese. A região do Lago de Garda tem na uva Gropello um ícone para
produção de rosés especiais. Por último, no norte da Itália, mais especificamente
no Alto Ádige, há excelentes rosés à base das uvas locais Moscato Rosa e
Lagrein.
Em Portugal, os rosés deliciosos estão por toda a parte. Os
destaques são os rosados do Douro, Estremadura e Ribatejo. Normalmente os rosés
apresentam pouca intensidade aromática, o que, aliás, faz com que seja mais
fácil apreciá-los gelados e sem muito compromisso. Em relação à variedade de
uvas utilizadas nos vinhos rosados portugueses encontram-se muitos à base de
blends, bem como varietais de Touriga Nacional, por exemplo.
Na Espanha, os rosados são quase uma religião. Talvez o país
tenha sido o que menos sofreu com o preconceito do rosé. O consumo deste vinho
sempre esteve em alta. As regiões de destaque são Rioja, Navarra e Penèdes.
Assim como na França, quem comanda por aqui é a Garnacha (nome da Grenache na
Espanha), seguida das Tempranillo e Merlot.
Os nossos vizinhos, Chile e Argentina, produzem cada vez mais
rosés à base de vários tipos de uvas, tais como Cabernet Sauvignon e Malbec.
Normalmente, esses vinhos são de cor e corpo mais intensos se compararmos aos
delicados vinhos da França.
No Brasil apesar dos vinhos rosés representarem a categoria de
vinhos que tem crescido mais rapidamente ao redor do mundo nos últimos anos. E
os números não mentem, entre 2002 e 2018, o consumo mundial de rosés cresceu um
acumulado de cerca de 40%. Porém, ao mesmo tempo em que ganham maior espaço,
estes vinhos ainda sofrem com certo preconceito.
Talvez o principal fator seja o histórico dos vinhos rosé. Por
muito tempo vinho rosé no Brasil era quase sinônimo de vinho simples, barato e,
ainda pior, um vinho mal elaborado. Para muita gente, vinho rosé virou sinônimo
de vinho de piscina, aquele que só presta para ficar no baldinho de gelo, para
matar a sede. Ou ainda pior, para receber uns cubinhos de gelo, para ficar
ainda mais refrescante.
Em um certo sentido, esta experiência pode ser comparada com
a do vinho alemão no Brasil, que por muito tempo foi quase sinônimo de vinho
branco doce e enjoativo. Por conta de anos de importação dos vinhos
Liebfraumilch, em sua esmagadora maioria doces e de qualidade discutível, todos
os vinhos alemães acabaram sendo penalizados. Felizmente, hoje em dia, porém, a
qualidade dos vinhos alemães já é de conhecimento da maioria.
Ajudar o consumidor a compreender melhor os vinhos e mostrar
alternativas diferentes resolveu esta questão. Da mesma forma, isso precisa ser
feito com os vinhos rosé. Assim como qualquer vinho, a qualidade do vinho rosé
varia bastante. Há rosés ótimos e rosés muito ruins, da mesma forma como
acontece com brancos ou tintos.
O que harmoniza com vinho rosé?
Para pensar na harmonização do vinho rosé, se pode seguir
dois caminhos:
1 - Observar a tradição de seus criadores;
2 - Analisar friamente suas características.
E, claro, seguir os dois caminhos. Porque, por mais que
enologia seja ciência, a sabedoria popular tem sempre seu papel de importância.
Quanto à tradição, a regra é clara: o vinho rosé é perfeito para frutos do mar.
Seu frescor e vitalidade harmonizam perfeitamente com esses alimentos.
E sequer há debate: em todo restaurante costeiro europeu, o
vinho rosé ocupa a esmagadora maioria das mesas. Há, inclusive, quem o nomeie
“vinho de laranja”, embora seja puramente de uvas. Verdade seja dita: o gosto
popular, muitas vezes, nos entrega maravilhas. E este é o aporte comum, com
relação ao vinho rosé.
Já na enologia, o esse vinho brilha por sua versatilidade.
Combina com pratos leves, como saladas e carnes brancas e magras. Mas, por sua
vez, também merece espaço em outros ambientes. Isso ocorre por conta da leve
adstringência que promove. É como dissemos: nem branco nem tinto. Ele possui o
melhor de dois mundos.
Dessa forma, o ressecamento tânico do vinho rosé o torna
único. Ele consegue ocupar espaços que o vinho branco não poderia. E, apesar
disso, não perde seu lugar, nas refeições leves. De petiscos a carnes mais
pesadas; das saladas tropicais ao churrasco; do mexilhão ao porco, o vinho rosé
pode e deve ser provado.
Essa qualidade versátil, que o torna coringa, dá, a ele, o
sobrenome de “vinho do verão”. Encorpado ao ponto de agradar os fãs do tinto;
leve e frutado na medida certa.
Dia internacional do rosé: Rosé Day
Os rosés ganharam uma data para comemoração própria: toda
quarta sexta-feira do mês de junho. Neste ano de 2021, portanto, o Dia
Internacional do Rosé é celebrado no dia 25. A data teria sido idealizada pela
proprietária dos Châteaux Roubine e Sainte Béatrice, ambos localizados na
região de Provence, na França, o berço do vinho rosé.
Referências:
“Revista Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/rose-o-vinho-tipico-do-verao_6679.html
“Forbes”: https://forbes.com.br/colunas/2021/03/carolina-schoof-centola-a-origem-dos-vinhos-roses/
“Blog do Jeriel”: https://blogdojeriel.com.br/2012/02/15/voce-sabe-e-um-vinho-clarete/
“Master Vinho”: https://mastervinho.com.br/vinho-rose/?utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=vinho-rose
“Revista Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/provence-um-guia-rapido-sobre-regiao-dos-roses_12975.html
“Wine Fun”: https://winefun.com.br/vinho-rose-consumo-cresce-mas-preconceito-continua-no-brasil/
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