Têm castas que já faz parte da nossa vida de enófilo! Aquelas
que, apesar de manjadas, tem tradição, se estão nas mentes e taças de muita
gente são porque tem história, imponência e respeitabilidade, até aí não é,
pelo menos para mim, novidade.
Mas ainda assim, mesmo que com essas castas já tão conhecidas
e respeitadas no universo do vinho, são capazes de trazer gratas novidades,
experiências surpreendentes.
E hoje, particularmente hoje, as grandes surpresas e
experiências sensoriais tomaram de assalto as minhas percepções e sentimentos
acerca dessa casta que tenho tanto apreço, tanto carinho e que me entregou
momentos sublimes. Falo da Tempranillo.
Tempranillo, como todos são capazes de saber, ganhou
prestígio na Espanha, mas ela dá o seu ar da graça em Portugal e recebe outros
nomes como Aragonez, no Alentejo e Tinta Roriz no Douro.
Porém mesmo degustando vinhos especiais, sobretudo os
espanhóis, da Tempranillo, ainda há espaço para, como disse, novidades, mesmo
sendo, para muitos, algo, diria, banal. Mas é aquilo, todo grande momento novo
tem de ser vivido plenamente.
E vou contar uma história para ilustrar esse momento de
novidade! Sempre quis degustar um Tempranillo rosé, desde que conheci e fiquei
sabendo que se faziam Tempranillos no “formato” rosé. Então, por um momento de
minha vida, decidi garimpar, buscar rótulos rosés da variedade.
Acessei sites de lojas especializadas, procurei em
supermercados, queria degustar um a qualquer custo. Vi alguns rótulos em alguns
sites, mas a proposta não estava em consonância com os valores praticados e
quando achei um em supermercado famoso em minha região, fiquei receoso em
compra-lo. Queria que esse momento fosse especial!
Por um momento dessa trajetória eu desisti de procurar. Mas
quando o amigo Luciano, da loja Pemarcano Vinhos, me disse que mandaria, tão
gentilmente, tão carinhosamente, alguns rótulos de cortesia, um deles era um
Tempranillo rosé! Quando não procurei ele veio até a mim!
E melhor: um Tempranillo rosé brasileiro e melhor ainda: um
Tempranillo rosé brasileiro e da região paulista de São Roque. São Roque está
figurando de forma intensa e maravilhosa em minhas taças e, mais uma vez, a
experiência retomaria com essa tradicional região brasileira de produção de
vinhos.
Então sem mais delongas vamos às apresentações do vinho que
degustei e gostei que veio, claro, de São Roque e se chama Frank, um rosé da
casta Tempranillo da safra 2019. E para a minha alegria eu já havia degustado o
Frank Tempranillo 2020 tinto e a experiência foi ótima! Antes de falar do vinho
vamos à história de São Roque e a sua importância para a viticultura
brasileira.
São Roque: a “terra do vinho”
A cidade de São Roque foi fundada no dia 16 de agosto de
1657, mas começou como uma grande fazenda do capitão paulista Pedro Vaz de
Barros, que pertencia a uma família de bandeirantes e sertanistas. Vaz de
Barros também participou de diversas Bandeiras. O fundador da cidade, também
conhecido como Vaz Guaçú, contava com aproximadamente 1.200 índios que
trabalhavam em suas terras, onde eram cultivados trigo e uva. Alguns anos após
a morte de Vaz de Barros, seu irmão, Fernão Paes de Barros, se estabeleceu na
mesma região, onde construiu uma casa e uma capela, que foram restauradas em
1945 pelo Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, a pedido do
escritor Mário de Andrade, dono da propriedade.
Na região de São Roque, podem-se identificar referências à
vitivinicultura desde a sua fundação, por volta do final do século XVII.
Conforme informações encontradas e divulgadas pelos moradores da cidade,
através da tradição oral, ou mesmo citado pelo Professor Joaquim Silveira dos
Santos em seu artigo para a Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São
Paulo, volume XXXVII, nessa época toda a região pertencia a apenas três grandes
proprietários de terras: Pedro Vaz de Barros, seu irmão Fernão Paes de Barros e
o padre Guilherme Pompeu de Almeida, sendo que Pedro Vaz (tido como o fundador
da cidade) se estabeleceu próximo da atual igreja Matriz, seu irmão mais ao
norte, onde até hoje ainda se encontra a casa grande e capela Santo Antônio, e
por fim a fazenda do padre Guilherme Pompeu se encontrava na hoje atual cidade
de Araçariguama que faz divisa com Santana do Parnaíba.
Portanto realmente não se podem esperar grandes referências
desse período da história, afinal o Brasil era apenas uma colônia e que
existiam restrições da fabricação de qualquer tipo de produto em nosso solo, ou
seja, em tese tudo deveria vir de Portugal, inclusive o vinho.
Outro fator que pode ter influenciado e não ter feito
prosperar o cultivo da videira seria a prioridade da época de então, que era a
descoberta de ouro, principalmente na região das Minas Gerais. Sabemos que São
Paulo até então era somente um vilarejo sem grande importância econômica para a
metrópole portuguesa, e se bem analisarmos a história da agricultura brasileira
a uva e o vinho nunca foram tidos como principal interesse por parte de nossos
colonizadores.
Após um período difícil, o povoado originado por Pedro Vaz
foi elevado à categoria de Freguesia no dia 15 de agosto de 1768, recebendo o
nome de São Roque do Carambeí. No dia 10 de julho de 1832, a Freguesia foi
elevada à categoria de vila, mas o progresso do local só começou em 1838,
quando começaram as lavouras de milho, algodão, arroz, mandioca e farinha de
mandioca, cana de açúcar e derivados, legumes e verduras. Em março de 1846,
seis anos após instalar-se na vila o destacamento da Guarda Nacional, Dom Pedro
II e uma pequena comitiva permaneceram um dia na cidade de São Roque. Com a
passagem de Dom Pedro II, Antônio Joaquim começou a se destacar no cenário
político e, graças ao morador ilustre, São Roque foi elevada à categoria de
cidade no dia 22 de abril de 1864.
Após esse longo período de estagnação, o primeiro registro
oficial de plantação de uvas na região de São Roque se dá por volta de 1865,
quando o Doutor Eusébio Stevaux inicia uma pequena plantação na sua fazenda em
Pantojo. Pela mesma época, um colono italiano adquire uma pequena propriedade
no bairro de Setúbal, alguns anos mais tarde um português na terra do então
Sítio Samambaia forma um razoável vinhedo e inicia o processo de fabricação do
vinho.
Já em 1875 foi inaugurada a Estrada de Ferro Sorocabana, que
ligou a cidade de São Paulo a São Roque e Sorocaba. Após alguns anos, em 1884,
começou a grande chegada de imigrantes à cidade, fazendo com que as vinícolas
aparecessem novamente e ganhassem força nos anos seguintes. Em 1924, a cidade
já contava com 17.300 habitantes e foram produzidos 10 mil litros de vinho a cada
ano, tendo doze produtores de vinhos, sendo cinco deles italianos.
O que possibilitou o retorno da cultura da uva e fabricação
do vinho foi a importação de videiras oriundas dos Estados Unidos, pois estas
eram mais resistentes ao clima brasileiro. Dentre as principais videiras
trazidas estão inicialmente a “Izabel”, a “Seibel 2” (importada da França),
curiosamente trazida por imigrantes italianos que se instalaram na região e
posteriormente a “Niágara Branca”, oriunda da região do Alabama, EUA.
Portanto, a divisão do período da cultura vinícola de São
Roque, desde a fundação da cidade até a época atual em quatro fases distintas:
1ª fase: 1657 – 1880: importação de videiras portuguesas,
plantações domiciliares, sem qualquer cunho comercial, ou seja, somente para
consumo próprio.
2ª fase: 1880 – 1900: Retomada da viticultura são-roquense,
ainda que amadora, quase que familiar, continua voltada basicamente para o
consumo e pequeno varejo. Já apresenta uma tendência a profissionalização graças
às técnicas trazidas pelos imigrantes italianos e portugueses. Já se utiliza da
videira americana que melhor se adaptou ao clima tropical brasileiro (talvez
seja este um dos principais fatores de sucesso do cultivo da uva na região de
São Roque);
3ª fase 1900 – até aproximadamente final da década de 1950:
processo de industrialização e profissionalização da produção do vinho com
aplicações de técnicas mais modernas permitindo assim obter resultados e
desempenho melhores.
Podemos dividir esta fase primeiramente num período de início
do processo de profissionalização e logo após (a partir da década de 1920), o
período em que realmente a região investiu e desenvolveu as técnicas
vinicultoras, durando até aproximadamente a década de 1950, onde após a massificação
da produção entra num processo de decadência.
4ª fase década de 1960 – atual: esta fase engloba o processo
de decadência da viticultura são-roquense. Por motivos econômicos e climáticos
e até mesmo por falta de investimentos em pesquisas, que se reduziram
sensivelmente tanto a qualidade como a quantidade de vinho produzido, levando
ao fechamento de diversas adegas (isso principalmente a partir da década de
1980). São Roque permanecendo hoje somente com o título de “terra do vinho”,
sendo que os poucos fabricantes que restaram (aproximadamente treze adegas)
fabricam seu vinho não de uvas nativas de São Roque, mas sim oriundas de outras
partes do Estado ou mesmo de outros estados (exemplo: Rio Grande do Sul).
Há atualmente um movimento para tentar a reversão dessa
situação, porém continua bem modesto em relação a todo o histórico e números do
passado no ápice do cultivo da videira em São Roque.
E agora finalmente o vinho!
Na taça revela um lindo rosado com alguma intensidade,
tendendo para o escuro, como uma casca da cebola, mas muito brilhante.
No nariz explodem os aromas de frutas vermelhas frescas,
frutas compotadas, que se destacam morango e framboesa, com um delicado floral,
de flores vermelhas.
Na boca reproduzem-se as impressões olfativas, com muita
fruta, sendo leve, fresco e despretensioso, com algum volume, acidez
equilibrada, correta e um curioso toque de especiarias doces. Final médio com
retrogosto frutado.
A experiência que, para muitos, pode ser taxada de banal,
para mim foi única, incrível, especial. Degustar meu primeiro Tempranillo Rosé
foi maravilhoso! Um vinho frutado, alegre, descompromissado, fresco, leve, com
uma acidez ótima, mas com um toque marcante, de alguma personalidade, como deve
ser a velha e eterna Tempranillo. E que os grandes momentos, por mais simples
que sejam, aconteçam, porque são nobres, porque da simplicidade vem a nobreza.
Tem 12% de teor alcoólico.
Sobre a Vinícola Frank:
Tudo começou há 97 anos com seu pai o Sr. Roque de Oliveira
Santos que passou todas as suas experiências e habilidades para o Sr. Frank
Vicente dos Santos.
No sitio da sua família deu continuidade no parreiral e no
cultivo de uvas e se especializou na vitivinicultura que hoje conta com uma experiência
de mais de 60 anos.
Casou-se com a Sra. Ferdinanda, uma imigrante italiana que
veio para o Brasil na segunda guerra mundial e teve duas filhas onde tocam seus
negócios até hoje.
Em 1965 fundou a marca que levaria seu nome, conhecida por
VINHOS FRANK, que com muito trabalho, dedicação e amor tornou-se uma marca
muito conhecida em todo Brasil por manter suas qualidades desde o primeiro
litro de vinho até hoje.
Hoje a marca conta com 07 linhas de produtos, são elas:
Tradicional, Bordô, varietais, frisante, espumante, cooler e suco de uva.
Toda sua produção continua sendo supervisionada e orientada
pelo Sr. Frank que hoje tem 95 anos de vida e toma seu vinho todos os dias.
A marca "Vinhos Frank” nos meados de 1990 inaugurou seu
restaurante que está sendo um dos principais atrativos, contando com um ótimo
cardápio, com muitas variedades de pratos, sendo harmonizados com a linha de
vinhos FRANK.
Mais informações acesse:
Referências:
“Assembleia Legislativa de São Paulo”: https://www.al.sp.gov.br/noticia/?id=301135
“Blog do Lullão”: http://www.lullao.com/p/historia-do-vinho-em-sao-roque.html?m=1
“Sites
Google”: https://sites.google.com/site/historiadovinhodesaoroque/home/historia-do-vinho-de-sao-roque
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