Posso ser redundante, mas não sou
omisso! Tenho um orgulho monumental em dizer que a minha porta de entrada para
os vinhos lusitanos foi o bom e velho Alentejo! Para mim os rótulos alentejanos
são os melhores até hoje, independentemente de suas propostas e nuances.
E já tem algum tempo, mas a chama
nunca se apagou, muito pelo contrário, continua acessa e forte em meu coração e
sempre inundando a minha taça de um magnífico prazer sensorial e, claro, de
história.
Graças ao Alentejo pude explorar e
venho explorando todas as regiões vinícolas de Portugal que, tão pequeno,
geograficamente falando, mostra-se tão grande em seus terroirs tão particulares
uns dos outros.
E falando em particularidade o Alentejo me cativou e cativa tanto pelo fato da personalidade de seus rótulos! Uma região quente, no clima, que entrega vinhos estruturados, volumosos, de caráter. Quer um vinho cheio de vida? Encorpado? Vá de Alentejo!
Lembro-me, com nostalgia, que um
momento importante para mim foi ter participado de um evento, no Rio de
Janeiro, dedicado aos vinhos Alentejanos, o “Vinhos do Alentejo”, em 2018, cuja
resenha pode ser lida aqui. Foi um momento singular, ter degustado rótulos dos
principais produtores, das principais microrregiões, com particulares muito
peculiares, mostrando que a região ainda continua viva na produção de vinhos
tradicionais, mas com arrojo contemporâneo.
E o contemporâneo, o tradicional,
se mescla com o apelo regionalista que é respeitado sublimemente, mas que
atinge, dado o seu caráter e tipicidade conquistado pelo regionalismo, um
status global, exportando o nome de Portugal para o mundo.
E a garrafeira, como a adega é
chamada em Portugal, com isso, está sempre bem representada pelo Alentejo e
chegou a hora de degustar em especial que, intencionalmente deixei por algum
tempo nela para degustar em seu ápice e provar também, para mim mesmo, da
capacidade de longevidade que determinados rótulos dessa região pode alcançar e
com qualidade.
E o rótulo de hoje é de um
produtor que, por aqui em terras brasileiras, não me parece ser conhecido
chamado Ferreira Malaquias e que inclusive degustei uns rótulos, mas da região
do Dão, chamado Cova do Frade da emblemática casta portuguesa Touriga Nacional,
na versão básica e reserva. Ótimos e surpreendentes vinhos com uma ótima
relação preço X qualidade.
O alentejano de hoje também tem
uma ótima relação preço X qualidade e, quando foi finalmente desarrolhado
mostrou-se vivo, pleno, elegante e de personalidade, como tem de ser quando é
oriundo da região. O vinho que degustei e gostei chama-se Vinha Longa Reserva,
composto pelo blend Aragonez (60%), Touriga Nacional (20%) e Touriga Franca
(10%) da safra 2016. Seis anos de um vinho que tinha muito pela frente! Convém
lembrar que, antes de reforçar a minha predileção pelo Alentejo, transcrevendo
a sua história, já havia degustado a “versão” 2015 do Vinha Longa Reserva e,
claro, a experiência foi ótima!
Alentejo
Situado na zona sul de Portugal, o
Alentejo é uma região essencialmente plana, com alguns acidentes de relevo, não
muito elevados, mas que o influenciam de forma marcante. Embora seja
caracterizada por condições climáticas mediterrânicas, apresenta nessas
elevações, microclimas que proporcionam condições ideais ao plantio da vinha e
que conferem qualidade às massas vínicas. As temperaturas médias do ano variam
de 15º a 17,5º, observando-se igualmente a existência de grandes amplitudes
térmicas e a ocorrência de verões extremamente quentes e secos.
Mas, graças aos raios do sol, a
maturação das uvas, principalmente nos meses que antecedem a vindima, sofre um
acúmulo perfeito dos açúcares e materiais corantes na película dos bagos,
resultando em vinhos equilibrados e com boa estrutura. Os solos caracterizam-se
pela sua diversidade, variando entre os graníticos de "Portalegre",
os derivados de calcários cristalinos de "Borba", os mediterrânicos
pardos e vermelhos de "Évora", "Granja/Amarelega",
"Moura", "Redondo", "Reguengos" e
"Vidigueira". Todas estas constituem as 8 sub-regiões da DOC
"Alentejo".
História (Passado, presente e
futuro)
A história do vinho e da vinha no
território que é hoje o Alentejo exige uma narrativa longa, com uma presença
continuada no tempo e no espaço, uma gesta ininterrupta e profícua que poucos
associam ao Alentejo. Uma história que decorreu imersa em enredos tumultuosos,
dividida entre períodos de bonança e prosperidade, entrecortados por épocas de
cataclismos e atribulações, numa flutuação permanente de vontades, com longos
períodos de trevas seguidos por breves ciclos iluministas e vanguardistas.
É uma história faustosa e duradoura,
como o comprovam os indícios arqueológicos presentes por todo o Alentejo,
testemunhas silenciosas de um passado já distante, evidências materiais da
presença ininterrupta da cultura do vinho e da vinha na paisagem tranquila
alentejana. Infelizmente, por ora ainda não foi possível determinar com
acuidade histórica quando e quem introduziu a cultura da videira no Alentejo.
Mas ainda assim pode-se afirmar
que a história do Alentejo anda de mãos dadas com a história de Portugal e da
Península Ibérica, ex-hispânicos, assim como, pertencentes a época de
civilizações romana, árabe e cristãs. Em muitos lugares no Alentejo encontrar
provas da civilização fenícia existente há 3.000 anos atrás.
Fenícios, celtas, romanos, todos
eles deixaram um importante legado da era antes de Cristo, na região que é hoje
o Alentejo. Uma terra onde a cultura e tradição caminham lado a lado. Os
romanos deixaram nesta região o legado mais importante, escritos, mosaicos,
cidades em ruínas, monumentos, tudo deixado pelos romanos, mas não devemos
esquecer as civilizações mais antigas que passaram pela zona deixando legados
como os monumentos megalíticos, como Antas.
Após os romanos e os visigodos, os
árabes, chegaram a esta terra com o cheiro a jasmim, antes da reconquista, que
chegaram com a construção de inúmeros castelos, alguns deles construídos sobre
mesquitas muçulmanas e a construção de muralhas para proteger a cidade e as
cidades que foram crescendo. Desde essa altura até hoje, o Alentejo tem continuado
o seu crescimento, um crescimento baseado na agricultura, pecuária, pesca,
indústria, como a cortiça e desde o último século até aos nossos dias, com o
turismo com uma ampla oferta de turismo rural.
Os gregos, cuja presença é
denunciada pelas centenas de ânforas catalogadas nos achados arqueológicos do
sul de Portugal, sucederam aos fenícios no comércio e exploração dos vinhos do
Alentejo. Por esta época, a cultura da vinha no Alentejo, apesar de incipiente,
contava já com quase dois séculos de história. A persistência de uma cultura da
vinha e do vinho, desde os tempos da antiguidade clássica, permite presumir,
com elevado grau de convicção, que as primeiras variedades introduzidas no
território nacional terão arribado a Portugal pelo Alentejo, a partir das
variedades mediterrânicas.
É mesmo provável, se atendermos os
registros históricos existentes, que a produção alentejana tenha proporcionado
a primeira exportação de vinhos portugueses para Roma, a primeira aventura de internacionalização
de vinhos portugueses! A influência romana foi tão peremptória para o
desenvolvimento da viticultura alentejana que ainda hoje, dois mil anos após a
anexação do território, as marcas da civilização romana continuam a estar
patentes nas tarefas do dia-a-dia, visíveis através da utilização de
ferramentas do quotidiano, como o Podão, instrumento utilizado intensivamente
até há poucos anos. Mas foi no aproveitamento das talhas de barro, prática que
os romanos divulgaram e vulgarizaram no Alentejo, que a influência romana deixou
as suas marcas mais profundas e até hoje é difundida, dada a devida proporção,
por alguns abnegados produtores, e claro, a sua população.
Com a emergência do cristianismo,
credo disseminado quase instantaneamente por todo o império romano, e face à
obrigatoriedade da presença do vinho na celebração eucarística da nova
religião, abriram-se novos mercados e novas apetências para o vinho. A fé
católica, ainda que indiretamente, afirmou-se como um fator de desenvolvimento
e afirmação da vinha no Alentejo, estimulando o cultivo da videira na região.
Com tantas influências culturais o Alentejo sofreu com algumas crises e a primeira se deu exatamente entre os cristãos e muçulmanos. Embora os mulçumanos tenham se mostrando tolerante com os costumes dos povos conquistados, consentindo na manutenção da cultura da vinha e do vinho, sujeitando-a a duros impostos, mas autorizando a sua subsistência, logo nasceu uma intolerância crescente para com os cristãos e os seus hábitos, manifesta no cumprimento rigoroso e vigoroso das leis do Corão.
Inevitavelmente, a cultura do
vinho foi sendo progressivamente negada e a vinha gradualmente abandonada,
reprimida pelas autoridades zelosas das regiões ocupadas. Com a invasão
muçulmana a vinha sofreu o primeiro revés sério no Alentejo. A longa
reconquista cristã da península ibérica, riscada de Norte para Sul, geradora de
incertezas e inseguranças, com escaramuças permanentes entre cristãos e
muçulmanos, sem definição de fronteiras estáveis, maltratou ainda mais a
cultura da vinha, uma espécie agrícola perene que, por forçar à fixação das
populações, foi sendo progressivamente abandonada.
Foi só após a fundação do reino
lusitano, concorrendo através do poder real e das novas ordens religiosas, que
a cultura do vinho regressou com determinação ao Alentejo. Poucos séculos mais
tarde, já em pleno século XVI, a vinha florescia como nunca no Alentejo, dando
corpo aos ilustres e aclamados vinhos de Évora, aos vinhos de Peramanca, bem
como aos brancos de Beja e aos palhetes do Alvito, Viana e Vila de Frades.
Em meados do século XVII, eram os vinhos do Alentejo, a par da Beira e da Estremadura, que gozavam de maior fama e prestígio em Portugal. Desventuradamente, foi sol de pouca dura! A crise provocada pela guerra da independência, logo secundada por nova crise despertada pela criação da Real Companhia Geral de Agricultura dos Vinhos do Douro, instituída pelo Marquês de Pombal como justificação para a defesa dos vinhos do Douro em detrimento das restantes regiões, com arranques coercivos de vinhas em muitas regiões, deu matéria para a segunda grande crise do vinho alentejano, mergulhando as vinhas alentejanas no obscurantismo.
A crise foi prolongada. Foi
preciso esperar até meados do século XIX para assistir à recuperação da vinha
no Alentejo, com a campanha de desbravamento da charneca e a fixação à terra de
novas gerações de agricultores. Nasceu então mais uma época dourada para os
vinhos do Alentejo, período que infelizmente viria a revelar ser de curta
duração. O entusiasmo despertou quando se soube que um vinho branco da
Vidigueira, da Quinta das Relíquias, apresentado pelo Conde da Ribeira Brava,
ganhou a grande medalha de honra na Exposição de Berlim de 1888, a maior
distinção do certame, tendo sido igualmente apreciados e valorizados vinhos de
Évora, Borba, Redondo e Reguengos.
Pouco anos mais tarde, decorria o ano de 1895, edificou-se a primeira Adega Social de Portugal, em Viana do Alentejo, pelas mãos avisadas de António Isidoro de Sousa, pioneiro do movimento associativo em Portugal. Desafortunadamente, este período de glória viria a terminar abruptamente. Duas décadas passadas, já na primeira metade do século XX, sobreveio um conjunto de acontecimentos políticos, sociais e econômicos que contribuíram decidida e decisivamente para a degradação da viticultura alentejana.
Ao embate da filoxera, somou-se a
primeira das duas grandes guerras mundiais, as crises econômicas sucessivas, e,
sobretudo, a campanha cerealífera do estado novo que suspendeu e reprimiu a
vinha no Alentejo, apadrinhando a cultura de trigo na região que viria a
apelidar como "celeiro de Portugal". A vinha foi sendo sucessivamente
desterrada para as bordaduras dos campos, para os terrenos marginais em redor
de montes, aldeias e vilas, para as pequenas courelas em redor das povoações,
reduzindo o vinho à condição de produção doméstica para autoconsumo. Em poucos
anos o vinho no Alentejo, salvo raras exceções, desapareceu enquanto
empreendimento empresarial.
Foi sob o patrocínio solene da
Junta Nacional do Vinho, já no final da década de 1940, que a viticultura
alentejana ganhou a primeira oportunidade de recobro, ainda que de forma
titubeante.
O movimento associativo foi
preponderante para o ressurgimento da atividade vitícola no Alentejo. Em 1970,
sob os auspícios da Comissão de Planeamento da Região Sul, foi anunciado o
estudo "Potencialidades das sub-regiões alentejanas", coadjuvado dois
anos mais tarde pelo estudo "Caracterização dos vinhos das cooperativas do
Alentejo. Contribuição para o seu estudo", do professor Francisco Colaço
do Rosário, ensaios acadêmicos determinantes para o reconhecimento regional e
nacional do potencial do Alentejo. Associando várias instituições ligadas ao
setor e tirando proveito das sinergias criadas, o Alentejo conseguiu
estabelecer um espírito de cooperação e entreajuda entre os diversos agentes.
Com a criação do PROVA (Projeto de
Viticultura do Alentejo), em 1977, foram criadas as condições técnicas para a
implementação de um estatuto de qualidade no Alentejo, enquanto a ATEVA (Associação
Técnica dos Viticultores do Alentejo), fundada em 1983, foi arquitetada para
promover a cultura da vinha nos diferentes terroirs do Alentejo.
Em 1988 regulamentaram-se as primeiras
denominações de origem alentejanas, fundamento para o estabelecimento, em 1989,
da CVRA (Comissão Vitivinícola Regional Alentejana), garante da certificação e
regulamentação dos vinhos do Alentejo.
E agora finalmente o vinho!
Na taça revela um vermelho rubi
intenso, escuro, quase profundo, exibindo discretos tons violáceos, sendo
caudaloso, manchando as bordas do copo e com lágrimas finas, lentas e abundantes.
No nariz se mostra intenso para as
frutas vermelhas bem maduras, como ameixas, cerejas, com as notas amadeiradas
também predominando, graças aos 12 meses em barricas de carvalho, impondo um
tostado médio, com nuances especiadas, além de tabaco, couro, estrebaria, terra
molhada e baunilha.
Na boca é seco, estruturado, com
alguma robustez mesmo com seus 6 anos de safra, volumoso, cheio, untuoso,
alcoólico, mas saboroso, elegante e equilibrado, pois entrega uma sinergia
maravilhosa entre as frutas vermelhas maduras e a madeira, conferindo este
último toques de caramelo, defumado, chocolate. Taninos marcados e presentes, com
acidez correta e um final persistente e frutado.
Tão complexa e envolvente como a
história do Alentejo, que se confunde com a história rica do Portugal
vitivinícola, é igualmente complexo e especial o Vinha Longa Reserva! Um vinho
que expressa, em seu caráter e tipicidade, a história do Alentejo. Vivo e pleno
entrega frutas vermelhas maduras e o aporte da madeira traz a tal complexidade
de que esperamos de um alentejano com notas defumadas, de tosta média,
caramelo, chocolate e aquele toque terroso extremamente envolvente. Que venham
mais e mais rótulos do Alentejo para que se mantenha viva em nossas taças. Tem
14,5% de teor alcoólico.
Ah e aqui cabe um pouquinho de
curiosidade sobre o nome do vinho, “Vinha Longa”: O nome da gama de vinhos da
Ferreira Malaquias, Vinha Longa, é inspirado nas grandes expansões típicas do
Alentejo. Carrega Alentejo até no nome!
Sobre a Vinícola Ferreira
Malaquias:
A Ferreira Malaquias, foi fundada
em 1896, é uma empresa familiar, e está presente no negócio do vinho a quatro
gerações, e sempre soube ao longo da sua história renovar o seu compromisso e
dedicação, através de uma visão de longo prazo.
Fundada por José Ferreira
Malaquias em 1896, já no final do século XIX se afirmava como um comerciante e
exportador de vinhos de sucesso, com a sua atividade de comercialização de vinhos
de lote da região do Dão.
Num passado recente a Ferreira
Malaquias, cumpriu um vasto plano de investimento, com a visão de apresentar ao
mercado, nacional e exportação, vinhos de qualidade e caráter, com diferentes
estilos e absoluto respeito pelo “terroir” de origem.
Hoje têm no seu portfólio, as mais
reconhecidas regiões vitivinícolas de Portugal - Vinhos Verdes (Minho), Douro,
Alentejo e Tejo, e continuando a sua histórica ligação, que vem desde a sua
fundação, aos vinhos da região do Dão.
O ano de 2013, fica marcado pelo
reforço de investimento na enologia, com a entrada de um prestigiado grupo de
enólogos, que veio revolucionar com conhecimento, detalhe e tecnologia, todos
os vinhos da Ferreira Malaquias, expressão maior de toda a arte de construir os
melhores blends e revelar a personalidade de cada região.
Acrescentar diferencial na
qualidade em todas as suas marcas, tem sido confirmado, de forma sistemática,
pelo reconhecimento do mercado interno e exportação, e atribuição de múltiplos
prémios a nível internacional.
Mais informações acesse:
Referências:
“Clube dos Vinhos Portugueses”: https://www.clubevinhosportugueses.pt/turismo/roteiros/vinhos-da-sub-regiao-da-vidigueira-denominacao-de-origem-alentejo/
“Rota dos Vinhos de Portugal”: http://rotadosvinhosdeportugal.pt/enoturismo/alentejo-2/borba/
“Vinhos do Alentejo”: https://www.vinhosdoalentejo.pt/pt/vinhos/historia-dos-vinhos/
“Visita Alentejo”: https://www.visitalentejo.pt/pt/o-alentejo/cultura/historia/
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