sexta-feira, 7 de julho de 2023

Panamera Tempranillo e Merlot 2020

 

Quando se descobre uma região produtora de vinhos e por ela se enamora, passa a gostar, em uma espécie de doce obsessão buscamos informações e novos rótulos avidamente.

Depois que passei a valorizar tais quesitos, como a região, o terroir, as castas, os produtores e tudo o mais, as degustações se tornaram melhores e mais agradáveis, reforçando também a identificação por alguns vinhos e propostas.

E assim tem sido com algumas regiões da Espanha, por exemplo. Saindo um pouco das emblemáticas regiões como Rioja e Ribera del Duero, constata-se que este país é um dos grandes produtores de vinho do planeta. São infindáveis as regiões produtoras.

E uma vem ganhando o meu coração a cada experiência enosensorial: falo de Navarra. As poucas degustações foram preponderantes e decisivas para nascer uma predileção.

Não consigo esquecer rótulos como Gran Villa Gran Reserva 2011 ou ainda San Antolin Reserva 2012 e só tem fomentado o interesse por buscar novos rótulos de Navarra.

E falando nessas novas buscas eu encontrei uma que parecia improvável quando se fala de custo X benefício. Bem pelo menos que a proposta que o vinho entrega e o valor que me parecia desproporcional e isso me chamou muito a atenção.

E quando constatei que era de Navarra, me tomou de assalto, me deixando, ainda mais, curioso. Sim, pasme, o vinho custou R$ 34,90 e isso não deixa de ser um atrativo, embora não seja o único quesito. E pelo baixo preço não hesitei muito e o comprei, mas com o intuito de degustar o quanto antes, até porque estava curioso, confesso.

E tomado por uma empolgação iniciei os trabalhos fazendo uma viagem enológica por Navarra, na Espanha. E não é que o vinho surpreendeu?? Incrível o quanto um vinho de custo tão baixo possa oferecer tamanha tipicidade!

Então sem mais delongas vamos às apresentações do vinho! O vinho que degustei e gostei veio, como disse, da região espanhola de Navarra e se chama Panamera, com um inusitado corte de Tempranillo e Merlot da safra 2020. Embora seja um corte pouco “usual”, parece ser normal na região, fundir em blends, castas autóctones e francesas mais famosas, como Cabernet Sauvignon e Merlot, por exemplo.

Então antes de tecer comentários sobre o vinho, falemos um pouco da história da região espanhola de Navarra.

DO (Denominação de Origem) Navarra

A região de Navarra (DO Navarra) fica ao norte da região de Rioja, entre a parte baixa dos Pirenéus, até o rio Ebro, apresentando cerca de 11.500 hectares ocupados por vinhedos, graças ao seu solo extremamente fértil e propício para o cultivo de inúmeras castas.

A viticultura começou já no século II a. C quando os romanos criaram as primeiras adegas. Por muitos anos, o vinho foi produzido pelos monges dos inúmeros monastérios desta antiga área vitivinícola.

Na idade Média, Navarra era um reino poderoso, aliado à França, o que ajudou o desenvolvimento da viticultura. O fato que fica no Caminho de Santiago aumentou a demanda, os vinhos de Navarra sendo recomendados aos romeiros.

Navarra

As videiras foram devastadas pela praga filoxera em 1892, eliminando quase 98% das vinhas na época. No início do século XX, foram replantadas vinhas com raízes do Novo Mundo. Produtores formaram cooperativas e produziram vinho em grande quantidade, exportado a granel.

Somente nos anos 1980, vinícolas privadas começaram a fazer vinhos de qualidade. A Denominación de Origen, originalmente aprovada em 1933, foi modificada para refletir a transição de vinhos de massa para vinhos de qualidade.

A região produz cerca de 89 milhões de litros de vinho por ano, dos quais 30% são exportados. Apesar dos vinhos brancos da região fazerem bastante sucesso e agradarem aos exigentes paladares da crítica especializada, é a produção de vinhos tintos que se destaca em Navarra. Em decorrência disso, 70% da produção da área espanhola é constituída de vinhos tintos, sendo os outros 25%, destinados a produção de vinhos brancos e rosés.

Diversas variedades de uva são cultivadas na região, como as da casta Moscatel, Chardonnay, Mazuelo, Graciano, Merlot, Cabernet Sauvignon e Viura. Entretanto, as uvas de maior sucesso da região de Navarra são a Garnacha e a Tempranillo.

Por muitos anos, a Garnacha foi de longe a variedade de uva mais plantada nas vinhas, intercaladas com as fazendas de frutas e vegetais pelas quais Navarra é tão famosa. Até pouco tempo atrás, as vinhas velhas de Garnacha, dominavam o território.

A Tempranillo ultrapassou Garnacha como a variedade mais plantada, com Cabernet Sauvignon chegando em terceiro lugar. Os resultados são muito respeitáveis, se muito raramente são excepcionais. As bodegas de Navarra foram capazes de investir em carvalho francês para suas uvas francesas.

Consideravelmente auxiliados por um programa de pesquisa do governo local, eles fizeram uma avaliação cuidadosa de variedades de uvas: Cabernet Sauvignon, Merlot, Chardonnay e, especialmente, Tempranillo - que agora produz alguns vinhos finos e concentrados, tipicamente envelhecidos em carvalho americano.

Navarra tem clima continental, com verão seco e quente, e invernos bem frios. Tem uma influência marítima vendo do mar Atlântico, moderando as temperaturas durante a maduração das uvas, e a noite, as temperaturas caiem no fim de agosto.

A grande diversidade dos vinhos de Navarra reflita a influência da confluência dos climas das 2 principais zonas de produção da região, situação excepcional na península ibérica: atlântico na Tierra Estella e na Baja Montaña; mediterrâneo na Ribera Alta e na Ribeja Baja.

Na década de 1980 a região começou a passar por grandes mudanças, com a renovação de mentalidade trazida por produtores jovens e inquietos, que culminou com a redescoberta e valorização das castas mais tradicionais e de seus vinhedos de vinhas velhas. Como os preços médios ainda permanecem mais baixos que os da Rioja, os vinhos de Navarra tornaram-se opções muito interessantes.

E agora finalmente o vinho!

Na taça revela um vermelho intenso, quase escuro, com entornos granada, além de lágrimas finas, de alguma profusão e lentas que desenham as bordas do copo.

No nariz mostrou-se tímido nos aromas no início, mas em taça se abriu e entregou notas de frutas vermelhas, com destaque para groselha, cereja e até framboesa, com um toque delicado de baunilha e madeira, graças aos quatro meses de passagem por barricas de carvalho.

Na boca apresenta corpo leve para médio, é seco, com muita elegância, uma textura aveludada garantida pelas notas frutadas e também pela Merlot, com a Tempranillo trazendo um pouco da personalidade do vinho. As especiarias, a madeira, ganham a sua presença, como no aspecto olfativo, com destaque para o chocolate, para a baunilha, para um defumado. Os taninos, apesar de presentes, estão domados e a acidez é saliente. Tem um final persistente.

Uma miscelânea de bons sentimentos me tomou de assalto quando degustei o Panamera: o corte inusitado e que se “harmonizou” maravilhosamente, ter degustado novamente um rótulo da região da Navarra que, a cada dia, me ganha por completo. O Panamera vem de vinhas velhas e revela o quão complexo e elegante o vinho se apresenta, se revela. Um vinho de incrível custo X benefício como pouco tem se visto ultimamente. Que Navarra venha em profusão transbordando em minha humilde e reles taça. Tem 13% de teor alcoólico.

Sobre a Bodegas Manzanos:

A história da Bodegas Manzanos é a história de uma família, do seu esforço, da sua perseverança e do seu know-how. A família Fernández de Manzanos cultiva vinhas e produz vinhos há mais de um século.

Foi exatamente em 1890 que a primeira geração desta família fundou em Azagra uma pequena adega com uma capacidade de produção de 50.000 litros de vinho.

Na década de 1940, inauguraram uma nova instalação que ampliou a sua capacidade para 350.000 litros, evidenciando a tradição vitivinícola desta zona. Entre os anos 50 e 60 consolidaram seu projeto vinícola, com a criação da vinícola Viña Marichalar, a primeira anexa à Denominação de Origem Qualificada Rioja com capacidade para mais de 1,5 milhão de litros.

Na década de 1990, Víctor Fernández de Manzanos Pastor, a quarta geração, ingressou na empresa familiar, depois de estudar Engenharia Química e obter o Mestrado em Viticultura e Enologia pela Escola Superior Técnica de Engenheiros Agrônomos da Universidade Politécnica de Madri. É o primeiro membro da família com formação em viticultura e enologia.

Víctor então construiu a vinícola Marqués de Butrago e decidiu realizar seu projeto de vida, a construção da Bodegas Manzanos.

Hoje, os rostos visíveis da Bodegas Manzanos são os dos irmãos Víctor e David Fernández de Manzanos, junto com Laura Mateo, esposa do primeiro. Em 2010, esses jovens empreendedores assumiram as rédeas da vinícola e transformaram Bodegas Manzanos em um negócio próspero e moderno, equipado com as últimas tecnologias do setor, que conseguiu preservar o antigo sabor da tradição; do legado recebido.

Mais informações acesse:

https://bodegasmanzanos.com/

Referências:

“Premium Wines”: https://www.premiumwines.com.br/_regiao_olha.php?reg=72

“Vindame”: https://www.vindame.com.br/navarra

“Bella Cave”: https://www.bellecave.com.br/vinhos-de-navarra-na-espanha

“Mistral”: https://www.mistral.com.br/regiao/navarra

 

 

 

 





terça-feira, 4 de julho de 2023

Pêra Doce Reserva tinto 2020

 

Não é uma grande novidade dizer que os vinhos da gigante e emblemática Alentejo é a minha preferida em Portugal. Não é novidade dizer também que, quando tive os primeiros contatos com os rótulos portugueses, foi com o Alentejo que a cortina da vitivinicultura lusitana se deu.

O carinho e a predileção não são apenas com a região, com os seus vinhos e tipicidade, com o seu terroir, mas criou-se um vínculo afetivo, até por ter sido os primeiros a inundar as minhas humildes taças.

Evidente que a participação de mercado dos alentejanos no Brasil é grande e a possibilidade de um primeiro contato com esses vinhos é grande, porém, a continuidade das degustações configura-se em predileção, em carinho para com a ensolarada região alentejana.

E o que dizer do caráter de regionalidade? O apelo regional dos seus vinhos é imenso e os produtores parecem fazer questão de evidenciar isso, principalmente pelo fato de ter seus rótulos exportados para todo o mundo. São vinhos locais que ganharam o mundo e não tenha dúvida de que uma condição acarreta na outra.

E o vinho de hoje retrata, além da força da tradição de seu nome, mas também do apelo regional, uma definição clara de um vinho que tem bem definido a essência de sua região, falo do Pêra Doce, do Grupo Parras Wines.

Eu tive a surpresa positiva e a alegria de ter degustado o seu branco de entrada, o Pera Doce branco da safra 2021, que me surpreendeu pelo seu frescor, leveza, mas com alguma personalidade trazendo a acidez gostosa da Arinto e a personalidade da típica alentejana Antão Vaz.

Agora vem a versão tinta e reserva da Pera Doce, um dos mais populares e tradicionais rótulos do Alentejo, com um excepcional custo x benefício. Então as apresentações do vinho que degustei e gostei já foi feita e com alegria! O Pera Doce Reserva, do Alentejo, é feito com as castas Aragonez (40%), Syrah (30%) e Trincadeira (30%) da safra 2020. Vamos de histórias, vamos de Alentejo.

Alentejo

Situado na zona sul de Portugal, o Alentejo é uma região essencialmente plana, com alguns acidentes de relevo, não muito elevados, mas que o influenciam de forma marcante.

Embora seja caracterizada por condições climáticas mediterrânicas, apresenta nessas elevações, microclimas que proporcionam condições ideais ao plantio da vinha e que conferem qualidade às massas vínicas.

As temperaturas médias do ano variam de 15º a 17,5º, observando-se igualmente a existência de grandes amplitudes térmicas e a ocorrência de verões extremamente quentes e secos.

Alentejo

Mas, graças aos raios do sol, a maturação das uvas, principalmente nos meses que antecedem a vindima, sofre um acúmulo perfeito dos açúcares e materiais corantes na película dos bagos, resultando em vinhos equilibrados e com boa estrutura. Os solos caracterizam-se pela sua diversidade, variando entre os graníticos de "Portalegre", os derivados de calcários cristalinos de "Borba", os mediterrânicos pardos e vermelhos de "Évora", "Granja/Amareleja", "Moura", "Redondo", "Reguengos" e "Vidigueira". Todas estas constituem as 8 sub-regiões da DOC "Alentejo".

História (Passado, presente e futuro)

A história do vinho e da vinha no território que é hoje o Alentejo exige uma narrativa longa, com uma presença continuada no tempo e no espaço, uma gesta ininterrupta e profícua que poucos associam ao Alentejo. Uma história que decorreu imersa em enredos tumultuosos, dividida entre períodos de bonança e prosperidade, entrecortados por épocas de cataclismos e atribulações, numa flutuação permanente de vontades, com longos períodos de trevas seguidos por breves ciclos iluministas e vanguardistas.

É uma história faustosa e duradoura, como o comprovam os indícios arqueológicos presentes por todo o Alentejo, testemunhas silenciosas de um passado já distante, evidências materiais da presença ininterrupta da cultura do vinho e da vinha na paisagem tranquila alentejana. Infelizmente, por ora ainda não foi possível determinar com acuidade histórica quando e quem introduziu a cultura da videira no Alentejo.

Mas ainda assim pode-se afirmar que a história do Alentejo anda de mãos dadas com a história de Portugal e da Península Ibérica, ex-hispânicos, assim como, pertencentes a época de civilizações romana, árabe e cristãs. Em muitos lugares no Alentejo encontrar provas da civilização fenícia existente há 3.000 anos.

Fenícios, celtas, romanos, todos eles deixaram um importante legado da era antes de Cristo, na região que é hoje o Alentejo. Uma terra onde a cultura e tradição caminham lado a lado. Os romanos deixaram nesta região o legado mais importante, escritos, mosaicos, cidades em ruínas, monumentos, tudo deixado pelos romanos, mas não devemos esquecer as civilizações mais antigas que passaram pela zona deixando legados como os monumentos megalíticos, como Antas.

Após os romanos e os visigodos, os árabes, chegaram a esta terra com o cheiro a jasmim, antes da reconquista, que chegaram com a construção de inúmeros castelos, alguns deles construídos sobre mesquitas muçulmanas e a construção de muralhas para proteger a cidade e as cidades que foram crescendo. Desde essa altura até hoje, o Alentejo tem continuado o seu crescimento, um crescimento baseado na agricultura, pecuária, pesca, indústria, como a cortiça e desde o último século até aos nossos dias, com o turismo com uma ampla oferta de turismo rural.

Os gregos, cuja presença é denunciada pelas centenas de ânforas catalogadas nos achados arqueológicos do sul de Portugal, sucederam aos fenícios no comércio e exploração dos vinhos do Alentejo. Por esta época, a cultura da vinha no Alentejo, apesar de incipiente, contava já com quase dois séculos de história.

A persistência de uma cultura da vinha e do vinho, desde os tempos da antiguidade clássica, permite presumir, com elevado grau de convicção, que as primeiras variedades introduzidas no território nacional terão arribado a Portugal pelo Alentejo, a partir das variedades mediterrânicas.

É mesmo provável, se atendermos os registros históricos existentes, que a produção alentejana tenha proporcionado a primeira exportação de vinhos portugueses para Roma, a primeira aventura de internacionalização de vinhos portugueses!

A influência romana foi tão peremptória para o desenvolvimento da viticultura alentejana que ainda hoje, dois mil anos após a anexação do território, as marcas da civilização romana continuam a estar patentes nas tarefas do dia-a-dia, visíveis através da utilização de ferramentas do quotidiano, como o Podão, instrumento utilizado intensivamente até a poucos anos. Mas foi no aproveitamento das talhas de barro, prática que os romanos divulgaram e vulgarizaram no Alentejo, que a influência romana deixou as suas marcas mais profundas e até hoje é difundida, dada a devida proporção, por alguns abnegados produtores, e claro, a sua população.

Com a emergência do cristianismo, credo disseminado quase instantaneamente por todo o império romano, e face à obrigatoriedade da presença do vinho na celebração eucarística da nova religião, abriram-se novos mercados e novas apetências para o vinho. A fé católica, ainda que indiretamente, afirmou-se como um fator de desenvolvimento e afirmação da vinha no Alentejo, estimulando o cultivo da videira na região.

Com tantas influências culturais o Alentejo sofreu com algumas crises e a primeira se deu exatamente entre os cristãos e muçulmanos. Embora os mulçumanos tenham se mostrando tolerante com os costumes dos povos conquistados, consentindo na manutenção da cultura da vinha e do vinho, sujeitando-a a duros impostos, mas autorizando a sua subsistência, logo nasceu uma intolerância crescente para com os cristãos e os seus hábitos, manifesta no cumprimento rigoroso e vigoroso das leis do Corão.

Inevitavelmente, a cultura do vinho foi sendo progressivamente negada e a vinha gradualmente abandonada, reprimida pelas autoridades zelosas das regiões ocupadas. Com a invasão muçulmana a vinha sofreu o primeiro revés sério no Alentejo. A longa reconquista cristã da península ibérica, riscada de Norte para Sul, geradora de incertezas e inseguranças, com escaramuças permanentes entre cristãos e muçulmanos, sem definição de fronteiras estáveis, maltratou ainda mais a cultura da vinha, uma espécie agrícola perene que, por forçar à fixação das populações, foi sendo progressivamente abandonada.

Foi só após a fundação do reino lusitano, concorrendo através do poder real e das novas ordens religiosas, que a cultura do vinho regressou com determinação ao Alentejo. Poucos séculos mais tarde, já em pleno século XVI, a vinha florescia como nunca no Alentejo, dando corpo aos ilustres e aclamados vinhos de Évora, aos vinhos de Peramanca, bem como aos brancos de Beja e aos palhetes do Alvito, Viana e Vila de Frades.

Em meados do século XVII, eram os vinhos do Alentejo, a par da Beira e da Estremadura, que gozavam de maior fama e prestígio em Portugal. Desventuradamente foi sol de pouca dura! A crise provocada pela guerra da independência, logo secundada por nova crise despertada pela criação da Real Companhia Geral de Agricultura dos Vinhos do Douro, instituída pelo Marquês de Pombal como justificação para a defesa dos vinhos do Douro em detrimento das restantes regiões, com arranques coercivos de vinhas em muitas regiões, deu matéria para a segunda grande crise do vinho alentejano, mergulhando as vinhas alentejanas no obscurantismo.

A crise foi prolongada. Foi preciso esperar até meados do século XIX para assistir à recuperação da vinha no Alentejo, com a campanha de desbravamento da charneca e a fixação à terra de novas gerações de agricultores. Nasceu então mais uma época dourada para os vinhos do Alentejo, período que infelizmente viria a revelar ser de curta duração. 

O entusiasmo despertou quando se soube que um vinho branco da Vidigueira, da Quinta das Relíquias, apresentado pelo Conde da Ribeira Brava, ganhou a grande medalha de honra na Exposição de Berlim de 1888, a maior distinção do certame, tendo sido igualmente apreciados e valorizados vinhos de Évora, Borba, Redondo e Reguengos.

Pouco anos mais tarde, decorria o ano de 1895, edificou-se a primeira Adega Social de Portugal, em Viana do Alentejo, pelas mãos avisadas de António Isidoro de Sousa, pioneiro do movimento associativo em Portugal. Desafortunadamente, este período de glória viria a terminar abruptamente. Duas décadas passadas, já na primeira metade do século XX, sobreveio um conjunto de acontecimentos políticos, sociais e econômicos que contribuíram decidida e decisivamente para a degradação da viticultura alentejana.

António Isidoro de Sousa

Ao embate da filoxera, somou-se a primeira das duas grandes guerras mundiais, as crises econômicas sucessivas, e, sobretudo, a campanha cerealífera do estado novo que suspendeu e reprimiu a vinha no Alentejo, apadrinhando a cultura de trigo na região que viria a apelidar como "celeiro de Portugal".

A vinha foi sendo sucessivamente desterrada para as bordaduras dos campos, para os terrenos marginais em redor de montes, aldeias e vilas, para as pequenas courelas em redor das povoações, reduzindo o vinho à condição de produção doméstica para autoconsumo. Em poucos anos o vinho no Alentejo, salvo raras exceções, desapareceu enquanto empreendimento empresarial.

Foi sob o patrocínio solene da Junta Nacional do Vinho, já no final da década de 1940, que a viticultura alentejana ganhou a primeira oportunidade de recobro, ainda que de forma titubeante.

O movimento associativo foi preponderante para o ressurgimento da atividade vitícola no Alentejo. Em 1970, sob os auspícios da Comissão de Planeamento da Região Sul, foi anunciado o estudo "Potencialidades das sub-regiões alentejanas", coadjuvado dois anos mais tarde pelo estudo "Caracterização dos vinhos das cooperativas do Alentejo.

 Contribuição para o seu estudo", do professor Francisco Colaço do Rosário, ensaios acadêmicos determinantes para o reconhecimento regional e nacional do potencial do Alentejo. Associando várias instituições ligadas ao setor e tirando proveito das sinergias criadas, o Alentejo conseguiu estabelecer um espírito de cooperação e entreajuda entre os diversos agentes.

Com a criação do PROVA (Projeto de Viticultura do Alentejo), em 1977, foram criadas as condições técnicas para a implementação de um estatuto de qualidade no Alentejo, enquanto a ATEVA (Associação Técnica dos Viticultores do Alentejo), fundada em 1983, foi arquitetada para promover a cultura da vinha nos diferentes terroirs do Alentejo.

Em 1988 regulamentaram-se as primeiras denominações de origem alentejanas, fundamento para o estabelecimento, em 1989, da CVRA (Comissão Vitivinícola Regional Alentejana), garante da certificação e regulamentação dos vinhos do Alentejo.

E agora finalmente o vinho!

Na taça revela um vermelho rubi intenso, escuro, com halos granada, com bela profusão de lágrimas finas e letas que desenham as bordas do copo.

No nariz traz aromas de frutas vermelhas bem maduras, como cerejas, amoras e morangos, além de inusitados aromas de frutas letras, lembrando até um Porto, em alguns momentos, com discretos toques de chocolate, talvez pelo curto tempo estagiado em barricas de carvalho, cerca de três meses e toques de baunilha.

Na boca é aveludado, seco, mas com alguma complexidade, personalidade por ter um bom volume de boca, com protagonismo das frutas bem maduras, como no aspecto olfativo, além de taninos presentes, mas domados, acidez ainda vibrante e final de média persistência.

A história sendo revelada a cada dia, a cada safra, a cada rótulo, a cada casta. O terroir traz a tipicidade, o “DNA” da região, a cultura corrobora a vitivinicultura. O Pera Doce é uma reserva de história, é a certeza de que o Alentejo, mesmo diante de modernismos tecnológicos, não faz questão de dissociar-se de suas tradições, de seu passado, de suas influências culturais. O vinho é a poesia engarrafada, mas também a explosão de história. Tem 13,5% de teor alcoólico.

Sobre a Quinta do Gradil (Parras Wines):

A Parras Vinhos de Luís Vieira nasce no ano de 2010, atualmente com sede em Alcobaça, onde também está instalada a unidade de engarrafamento do grupo. Cinco anos depois, com a empresa consolidada e voltada para o mercado internacional, surge a necessidade de se fazer um reposicionamento de marca e “vesti-la” de outra forma, mais atual.

É assim que no início de 2016 aparece a Parras Wines, mais jovem, mais flexível, e numa linguagem universal para que possa ser facilmente compreendida por todos, mesmo os que estão além-fronteiras.

Descendente de um pai e de um avô que sempre trabalharam com vinho, Luís Vieira é o único dono deste projeto. Aos cinco anos caiu num depósito de vinho e quase morreu afogado, não fosse um colaborador do avô na altura, que atualmente é seu, tê-lo salvo. Hoje, recorda com graça esse episódio e diz mesmo que simboliza o seu “batismo nestas andanças do vinho”. A empresa começa então a formar-se com terra própria na Região Vitivinícola de Lisboa, mais exatamente na freguesia do Vilar, Cadaval, com duzentos hectares de propriedade em extensão, sendo que 120 são hoje de vinha plantada.

Na mesma região do país, um bocadinho mais acima, na zona de Óbidos, a Parras Wines é também responsável pela exploração de 20 hectares de vinha que dão origem aos vinhos Casa das Gaeiras. Com sede em Alcobaça, nas antigas instalações de uma fábrica de faianças, deu-se início a uma nova área de negócio – uma Unidade de Engarrafamento de Bebidas, que hoje serve também de sede à Parras Wines e que se chama Goanvi.

Cinco anos mais tarde, em 2010, constitui-se então a Parras Vinhos, hoje Parras Wines. Para além de terra na Região de Lisboa, o grupo começou paralelamente a produzir vinhos de outras regiões do país. Através de parcerias com produtores locais, a empresa consegue assim dar resposta às necessidades globais que iam surgindo do mercado, produzindo vinhos do Douro, Vinhos Verdes, Dão, Lisboa, Tejo, Península de Setúbal e Alentejo.

Mais informações acesse:

https://www.parras.wine/pt/

Referências:

“Clube dos Vinhos Portugueses”: https://www.clubevinhosportugueses.pt/turismo/roteiros/vinhos-da-sub-regiao-da-vidigueira-denominacao-de-origem-alentejo/

“Rota dos Vinhos de Portugal”: http://rotadosvinhosdeportugal.pt/enoturismo/alentejo-2/borba/

“Clube dos Vinhos Portugueses”: https://www.clubevinhosportugueses.pt/turismo/roteiros/vinhos-da-sub-regiao-da-vidigueira-denominacao-de-origem-alentejo/

“Rota dos Vinhos de Portugal”: http://rotadosvinhosdeportugal.pt/enoturismo/alentejo-2/borba/

“Vinhos do Alentejo”: https://www.vinhosdoalentejo.pt/pt/vinhos/historia-dos-vinhos/

 

 

 

 

 

 

 

 

  














Pinta Negra Aragonez (60%) e Castelão (40%) 2016

 

Sou um grande fã dos vinhos da região de Lisboa, da capital de Portugal, isso é fato! Todavia um vinho, em especial, me fez trazer à tona algumas lembranças perdidas. Eu explicarei! Quando no período da transição dos vinhos de mesa para os vinhos de uvas vitivinícolas, aquela transição que todos os simples enófilos nascidos no Brasil fazem, eu não tinha aquela preocupação em ter noção ou conhecimento dos rótulos que degustava, aqueles requintes de detalhes tais como: castas, regiões, passagem ou não por barricas de carvalho etc.

Degustava os vinhos sem ter a preocupação com esses detalhes. Então alguns rótulos, talvez por conta dessa falta de preocupação ou ainda por inexperiência, passavam despercebidos, não adquiria a famosa memória fotográfica ou coisa similar. 

Porém, quando eu assistia a um dos poucos programas de TV direcionados ao mundo vinho, que tem transmissão no Canal Globosat, da TV Globo, chamado “Um Brinde ao Vinho” que dedicou uma temporada as regiões mais emblemáticas de Portugal e, claro que Lisboa estava na rota do programa.

E quando a apresentadora do programa Cecília Aldaz esteve em uma jovem vinícola chamada AdegaMãe mostrando alguns dos seus rótulos e, por um relance, mostrou um rótulo que havia degustado há muito tempo atrás e que tinha caído no esquecimento, me trouxe um lampejo de lembrança, de uma ótima lembrança, pois tinha degustado um rótulo surpreendentemente bom! Falo da linha “Pinta Negra”.

O rótulo em questão, o tinto, era da safra 2015. Então fui a busca de um novo rótulo desta linha para “rememorar” os bons momentos e encontrei a safra 2016 e como foi satisfatório degustar esse vinho novamente.

Pinta Negra 2016

Depois de algum tempo, de forma um tanto quanto inusitada, a caminhar pela rua, parei, por um instante e olhei para o chão e havia um encarte de supermercado e logo reconheci um rótulo: era o Pinta Negra branco! Sim! O Pinta Negra branco, composto por Arinto e Fernão Pires da safra 2019 estava em uma promoção excelente, na faixa dos R$ 29,90! Incrível! Como estava por perto não hesitei, fui ao supermercado e comprei! Que estupendo branco, com certa estrutura para a sua proposta e valor!

Mas eu pensei: Não irei para por aqui neste belo branco, vou continuar a degustar mais rótulos dessa linha da AdegaMãe, afinal, essa sequência de boas degustações não poderia ser coincidência, claro!

E fazendo aquelas compras triviais em um pequeno mercado próximo a minha casa, qual vinho eu vejo nas gôndolas, para minha surpresa? O Pinta Negra tinto! Ah não hesite e comprei! E decidi não demorar muito para degusta-lo e que grata experiência sendo repetida.

O vinho que degustei e gostei veio de Lisboa, Portugal, e se chama Pinta Negra, um rótulo com um blend tipicamente lusitano com as castas Aragonez (60%) e Castelão (40%) da safra 2021. Antes de tecer detalhes do vinho, vamos às histórias de Lisboa.

Lisboa

A costa de Portugal é muito privilegiada para a produção vitivinícola graças à sua posição em relação ao Oceano Atlântico, à incidência de ventos, ao solo e ao relevo que constituem o local. Entre as principais áreas produtoras podemos citar a região dos vinhos de Lisboa, antigamente conhecida como Estremadura, famosa tanto por tintos encorpados como por brancos leves e aromáticos.

Lisboa

Tem mais de 30 hectares de cultivo com mais de 9 mil aptas à produção de Vinho Regional de Lisboa e Vinho com Denominação de Origem Controlada. O nome passou em 2009 para Lisboa de forma a diferenciar da região de mesmo nome na Espanha, também produtora de vinhos.

O litoral da IGP Lisboa corre para o sul de Beiras a partir da capital de Portugal, onde o rio Tejo encontra o Oceano Atlântico. Suas características geográficas proporcionam certa complexidade à região, pois está situada climaticamente em zona de transição dos ventos úmidos e estios, com solo de idades variadas, secos, encostas e maciços montanhosos se contrapõem a várzeas e terras de aluvião.

Ainda sofre influência direta da capital do país localizada em um extremo da região. Uma de suas características determinantes é a grande variedade de solos, como terras de aluvião (sedimentar), calcário secundário, várzeas e maciços montanhosos, muitas vezes misturados. Cada um desses terrenos pode proporcionar às uvas características completamente diferentes.

Lisboa

Esta região possui boas condições para produzir vinhos de qualidade, todavia há cerca de quinze anos atrás a região de Lisboa era essencialmente conhecida por produzir vinho em elevada quantidade e de pouca qualidade. Assim, iniciou-se um processo de reestruturação nas vinhas e adegas.

Provavelmente a reestruturação mais importante realizou-se nas vinhas, uma vez que as novas castas plantadas foram escolhidas em função da sua produção em qualidade e não em quantidade. Hoje, os vinhos da Região de Lisboa são conhecidos pela sua boa relação qualidade/preço.

A região concentrou-se na plantação das mais nobres castas portuguesas e estrangeiras e em 1993 foi criada a categoria “Vinho Regional da Estremadura”, hoje "Vinho Regional Lisboa". A nova categoria incentivou os produtores a estudar as potencialidades de diferentes castas e, neste momento, a maior parte dos vinhos produzidos na região de Lisboa são regionais (a lei de vinhos DOC é muito restritiva na utilização de castas).

Entre as principais uvas cultivadas podemos citar as brancas Arinto, Fernão Pires (ambos naturais de Portugal) e Malvasia, e as tintas, Alicante Bouschet, Castelão, Touriga Nacional e Aragonez (como é chamada a Tempranillo na região).

Acredita-se que a elaboração de vinhos seja uma atividade desde o século 12, quando os monges da Ordem de Cister se estabeleceram na região. Uma de suas principais funções era justamente a produção da bebida para a celebração de missas.

Lisboa DO

A Região de Lisboa é constituída por nove Denominações de Origem: Colares, Carcavelos e Bucelas (na zona sul, próximo de Lisboa), Alenquer, Arruda, Torres Vedras, Lourinhã e Óbidos (no centro da região) e Encostas d’Aire (a norte, junto à região das Beiras).

As regiões de Colares, Carcavelos e Bucelas outrora muito importantes, hoje têm praticamente um interesse histórico. A proximidade da capital e a necessidade de urbanizar terrenos quase levaram à extinção das vinhas nestas Denominações de Origem.

DO Lisboa

A Denominação de Origem de Bucelas apenas produz vinhos brancos e foi demarcada em 1911. Os seus vinhos, essencialmente elaborados a partir da casta Arinto, foram muito apreciados no estrangeiro, especialmente pela corte inglesa. Os vinhos brancos de Bucelas apresentam acidez equilibrada, aromas florais e são capazes de conservar as suas qualidades durante anos.

Colares é uma Denominação de Origem que se situa na zona sul da região de Lisboa. É muito próxima do mar e as suas vinhas são instaladas em solos calcários ou assentes em areia. Os vinhos são essencialmente elaborados a partir da casta Ramisco, todavia a produção desta região raramente atinge as 10 mil garrafas.

A zona central da região de Lisboa (Óbidos, Arruda, Torres Vedras e Alenquer) recebeu a maioria dos investimentos na região: procedeu-se à modernização das vinhas e apostou-se na plantação de novas castas.

Hoje em dia, os melhores vinhos DOC desta zona provêm de castas tintas como, por exemplo, a casta Castelão, a Aragonez (Tinta Roriz), a Touriga Nacional, a Tinta Miúda e a Trincadeira que por vezes são lotadas com a Alicante Bouschet, a Touriga Franca, a Cabernet Sauvignon e a Syrah, entre outras. Os vinhos brancos são normalmente elaborados com as castas Arinto, Fernão Pires, Seara-Nova e Vital, apesar da Chardonnay também ser cultivada em algumas zonas.

A região de Alenquer produz alguns dos mais prestigiados vinhos DOC da região de Lisboa (tintos e brancos). Nesta zona as vinhas são protegidas dos ventos atlânticos, favorecendo a maturação das uvas e a produção de vinhos mais concentrados. Noutras zonas da região de Lisboa, os vinhos tintos são aromáticos, elegantes, ricos em taninos e capazes de envelhecer alguns anos em garrafa. Os vinhos brancos caracterizam-se pela sua frescura e carácter citrino.

A maior Denominação de Origem da região, Encostas d’Aire, foi a última a sofrer as consequências da modernização. Apostou-se na plantação de novas castas como a Baga ou Castelão e castas brancas como Arinto, Malvasia, Fernão Pires, que partilham as terras com outras castas portuguesas e internacionais, como por exemplo, a Chardonnay, Cabernet Sauvignon, Aragonez, Touriga Nacional ou Trincadeira. O perfil dos vinhos começou a alterar-se: ganharam mais cor, corpo e intensidade.

E agora finalmente o vinho!

Na taça apresenta um rubi vibrante, quase fechado com discretos entornos violáceos, com lágrimas finas, lentas e em média quantidade que desenham o bojo.

No nariz trazem aromas frutados, um mix de frutas vermelhas e pretas, como amora, ameixa, cerejas, morango e groselha. Tem nuances de menta, especiarias, pimenta e ervas.

Na boca é seco, macio, redondo, afinal o clima atlântico, bem como o corte de Aragonez e Castelão traz elegância e suavidade ao vinho, além do protagonismo das notas frutadas, percebidas no aspecto olfativo. Traz taninos amáveis, domados, com acidez equilibrada e um final de média persistência.

O passado revisita o presente e ajuda a construir um futuro na minha vida de enófilo e me faz observar e entender que, além do maravilhoso exercício da análise sensorial, a história do vinho, como seu terroir, sua história, sua região, pode ser sim, sem sombra de dúvida, um aditivo para a construção de sua percepção perante o rótulo. Pinta Negra é um vinho básico, para o dia a dia, mas que entrega muito além da sua proposta, definitivamente sempre será uma grata surpresa. Tem 13,5% de teor alcoólico.

Sobre a AdegaMãe:

A AdegaMãe pertence ao grupo Riberalves, empresa familiar portuguesa, que é a maior produtora de bacalhau do mundo – 30 mil toneladas por ano, o equivalente a 10% de todo o bacalhau pescado no mundo! É uma homenagem da família à sua matriarca, Manuela Alves. Em 2009, investindo na paixão pelo vinho, a família inaugurou a vinícola, que fica próxima da sede da empresa. 

A vinícola fica em Torres Vedras, que faz parte da CVR Lisboa (Comissão Vitivinícola da Região de Lisboa), antiga Estremadura, zona com grande influência atlântica, devido à proximidade com o oceano, com solos calcários, terroir propício para a produção de vinhos bastante minerais e com acidez marcante.

A AdegaMãe tem um projeto lindíssimo e Diogo, juntamente com Anselmo Mendes, enólogo consultor, entrou desde o começo da concepção da adega, no projeto das vinhas, de forma a definir as melhores variedades para a região, tanto que as vinhas velhas que ali estavam foram arrancadas, pois não eram boas o suficiente para os vinhos que pretendiam fazer. Mas é possível ver a vinha mãe da adega exposta como obra de arte, em uma das paredes da vinícola.

A Norte de Lisboa e a um passo da costa oceânica, a AdegaMãe potencia um terroir fortemente influenciado pelas brisas marítimas predominantes, destacando-se pelos seus vinhos de inspiração atlântica, plenos de carácter, frescos e minerais, premiados a nível nacional e internacional.

Referida pela arquitetura exclusiva, e pela forma como se harmoniza com a fantástica paisagem envolvente, a AdegaMãe foi desenhada de raiz para integrar a melhor experiência de visita, assumindo-se como uma referência no enoturismo da Região de Vinhos de Lisboa.

Mais informações acesse:

https://adegamae.pt/
















 


domingo, 2 de julho de 2023

Trifula Dolcetto 2021

 

Quando nos lembramos da Itália imediatamente associamos aos clássicos! Aqueles rótulos com sisudez, austeridade, aqueles vinhos carnudos, opulentos, encorpados, de longevidade, de potência mesmo.

Rótulos aristocráticos, com brasões, mostrando tradição, história e até mesmo luxo e poder. Mas não se enganem que a Itália tem produzido alguns rótulos mais descontraídos, com uma abordagem estética descontraída, bem como também na concepção do seu vinho.

Se para alguns e diria muitos sejam vinhos simplórios e ordinários, uma versão “bonitinha” e solar para vinhos ruins, enganam-se retumbantemente. São vinhos simples, mas sem depreciar, porque essa é a proposta: de vinhos jovens, frutados, frescos e descomplicados.

É também uma proposta os vinhos austeros, encorpados, complexos. O que não se pode pensar e disseminar uma cultura intolerante contra as propostas dos vinhos, fazendo incutir na mente das pessoas a sua torta percepção.

E hoje a Itália que se descortina em minhas retinas será descontraída, solar, com frescor, vivacidade e muito leve, na sua versão estética e do vinho propriamente dito. É com alegria e satisfação que anuncio o vinho que degustei e gostei que veio do Piemonte e se chama Trifula, um 100% Dolcetto da safra 2021.

Mas o que significa “Trifula”?

Trifula é um cão sagaz que vive neste terroir inspirador. Trifula raramente experimenta algo especial, até que um belo dia descobre uma legítima trufa branca enterrada na sua árvore favorita, em Alba.

A trufa é vendida por um milhão de dólares na famosa Feira Internacional de Trufas da região, tornando Trifula mundialmente conhecido e digno de receber uma homenagem em rótulos que inspiram sua história e trazem a leveza e descontração encontrada nos vinhos.

E na sequência de histórias vamos agora com a tradição do Piemonte e a sua casta mais leve, fresca e frutada: Dolcetto.

Piemonte: a filha pródiga dos vinhos italianos

A região do Piemonte disputa com Toscana a primazia de produzir os melhores vinhos de seu país. Situado na porção mais ocidental da Itália, fazendo fronteira com a França, também foram os gregos que deram início à produção de vinhos.

Absorvido mais tarde pelo Império Romano, a zona teve um grande desenvolvimento nas atividades vitivinícolas, que só foram prejudicadas mais tarde, já na Era Cristã, durante a invasão de povos bárbaros oriundos do norte da Europa.

A nobreza medieval se encarregou de retomar o plantio das uvas e a elaboração do vinho, já nessa época surgem menções a uva emblemática da região, a Nebbiolo. Devido a forte influência francesa (a região foi, por séculos, dominada pela Casa de Savóia), por muito tempo seu vinho se assemelhou ao clarete, que era a moda na Europa de então.

Foi somente a partir do século XVIII, quando ocorreu um grande processo de renovação vinícola, que surgiu o Barolo, vinho de grande caráter e símbolo da região, para fazer sua fama. O Piemonte produz atualmente cerca de 300 milhões de litros de vinho por ano em sua área de 58 000 ha. plantada de vinhedos.


Piemonte

Como o próprio nome indica, a região está situada ao pé da montanha - no caso, os Alpes - sendo, portanto, uma região muito acidentada. A maior parte de Piemonte está constituída por colinas e montanhas, mas sobram cerca de 26% de terras planas.

Além dos Alpes, outra cordilheira, o Apenino Ligúrio, invade também seu território. Os rios Pó e Tanaro cruzam suas terras, onde se encontram as cidades de Torino (capital), Alba, Alessandria, Asti e Novara, dentre outras. Seu solo é muito variado, com faixas de calcário e areia, outras de giz e manchas de granito e argila. Ao longo dos rios há presença de solos aluviais.

O clima é Continental, com estações bem marcadas, invernos rigorosos e verões quentes. O índice de chuvas é de cerca de 1.000 mm/ano. As uvas tintas representam dois terços da produção da zona. Além da Nebbiolo, vamos também encontrar as Barbera (a variedade mais plantada em toda a Itália), Brachetto, Dolcetto, Grignolino, Freisa e, em menor escala, algumas cepas francesas, como a Cabernet Sauvignon.

As principais castas brancas são a Arneis, Cortese, Moscato Bianco, Malvasia, Erbaluce a Chardonnay. O Piemonte produz cinco vinhos DOCG (Vinhos de Denominazione di Origine Controllata e Garantita), a elite dos vinhos italianos, são eles: Barolo, Barbaresco, Gattinara, Asti, Brachetto D' Acqui. Além desses, também saem da região 42 vinhos DOC (Denominazione di Origine Controllata) e vários Vini da Tavola de boa qualidade.

As sub-regiões do Piemonte

As sub-regiões do Piemonte diferem bastante entre si e possuem muitas DOC. São elas:

Monferrato

É uma vasta região de colinas, que pode ser dividida em duas partes bem diferentes:

Basso Monferrato - (Raciocinar ao inverso) é a parte mais setentrional e de maiores altitudes, com a base pelos 350m e os picos em 700m, um território muito apropriado para os vinhedos. Aqui predominam a Barbera e a Grignolino, em vinhos macios e fáceis de beber se comparados aos demais tintos piemonteses. Em Chieri se produz um Freisa DOC.

DOC: Albugnano, Cisterna d´Asti, Colline Torinesi, Dolcetto d`Asti , Freisa di Chieri, Gabiano, Grignolino d`Asti, Grignolino del Monferrato, Malvasia di Casorzo d`Asti, Malvasia di Castelnuovo Don Bosco, Monferrato, Rubino di Cantavenna , Ruché di Castagnole Monferrato

DOCG: Barbera d`Asti, Barbera del Monferrato,

Alto Monferrato - Ainda raciocinando invertido, aqui estão altitudes menores, e curiosamente o terreno é mais acidentado, com encostas mais íngremes e vales mais profundos. Esta conformação estranha tem seu efeito na viticultura, inicialmente pelo plantio de Barbera e Moscato, seguido das uvas autóctones como a Cortese, que aqui tem sua melhor expressão, na DOCG Gavi. Em seguida vem a Dolcetto, com ótimos resultados no entorno de Acqui e Ovada ambas DOCs. A terceira menção é a Brachetto, muito difundida no passado, mas hoje restrita a 50 hectares em Strevi. O Alto Monferrato costuma ser dividido em Monferrato Casalese e Monferrato Astigiano, por suas diferenças de território.

DOC: Dolcetto d`Acqui, Cortese Dell`Alto Monferrato, Dolcetto d`Alba, Loazzolo,

DOCG: Asti, Bracchetto d`Acqui (Acqui), Moscato d’Asti, Gavi (Cortese di Gavi).

Langhe

Tem seu principal centro vitícola em Alba, mas a fama mundial desta província veio de dois centros menores, Barolo e Barbaresco. É neste local que a Nebbiolo, já qualificada em outras sub-regiões, se exprime ao nível mais alto, nestes ícones italianos. Aqui também se produzem os qualificados Moscato d’Asti, os ótimos Nebbiolo, o Barbera d’Alba e quatro Dolcettos, sendo o melhor o Dogliani. Para acolher os vinhos menos portentosos, mas muito bons, existe a DOC Langhe.

DOC: Barbera d`Alba, Dolcetto delle Langhe Monregalesi, Dolcetto di Dogliani, Dolcetto di Ovada, Dolcetto delle Langhe Monregalesi, Langhe, Nebbiolo d`Alba, Verduno Pelaverga (Verduno),

DOCG: Barbaresco, Barolo, Dolcetto delle Langhe Superiore, Dolcetto di Diano d`Alba (Diano d’Alba), Dolcetto di Ovada Superiore (Ovada)

Roero

É um distrito situado na margem oposta a Alba, tendo como centros Bra e Canale. Aqui também se planta Nebbiolo, mas as brancas Arneis e Favorita, que no passado eram usadas em cortes, hoje produzem ótimos varietais.

DOC: Roero e Roero Arneis

Colline Astigniame

Compreendem uma área de vinicultura de grande interesse, situadas entre Canelli e Nizza, onde se produzem Moscato d`Asti e Barbera d`Asti. Aqui se diz ter sido inventado o espumante, há mais de um século e que tem aqui seu maior centro produtivo.

Colli Tortonesi

Estão entre o Alto Monferrato e o Pavese e possuem características ambientais e culturais típicas do Piemonte. As variedades principais são a Barbera eCortese, mas têm-se trabalhado outras uvas. Recentemente foi descoberta a variedade branca Timorasso.

DOC: Colli Tortonese

Colli Saluzzesi

Engloba 9 comunidades em Cuneo nas colinas suaves vale do rio Po. Aqui se cultivam Barbera e Nebbiolo, e também as variedades Pelaverga e Quagliano, das quais se produzem varietais.

DOC: Colline Saluzzesi, Pinerolese

Cavanese

Está na região a nordeste de Torino, com duas regiões vinícolas de importância:

A primeira está centrada no município de Caluso, se estendendo até as colinas de Ivrea. Aqui predomina a variedade autóctone branca Erbaluce, que produz um vinho passito tradicional e um branco delicado.

A segunda é a zona de Carema, com vinhedos em terraços com muros de pedra e pérgolas, cultivando a Nebbiolo.

DOC: Erbaluce di Caluso, Caluso Passito, Cavanese, Carema

Colli Novaresi e Colli Vercellosi

Estão situadas a noroeste, perto do lago Maggiore, nas províncias de Biella, Novara e Vercelli, abrigando diversas DOCs, algumas de alto nível. A mais prestigiada é o Gattinara, tinto famoso desde a corte de Carlos V, que hoje foi elevada a DOCG, e também a DOC Ghemme.

DOC: Boca, Bramaterra, Colline Novaresi, Coste della Sesia, Fara, Lessona, Sizzano,

DOCG: Gattinara, Ghemme



Dolcetto

Nem só das uvas Nebbiolo e Barbera são feitos os italianos clássicos do Piemonte, região noroeste da Itália. Muitas vezes subestimados, os Dolcettos (em italiano, 'ligeiramente doces' ou 'docinhos'), produzidos com a 'eterna' terceira uva do Piemonte são belos vinhos, mais frutados e macios e dificilmente apresentam caráter doce que seus poderosos conterrâneos, os Barolos e Barbarescos, feitos a partir da Nebbiolo, e os Barberas. Os Dolcettos são bastante tânicos, frescos e secos.

No Piemonte, as três uvas fazem parte de uma equação que determina a paisagem. Nebiollos só amadurecem em locais bem ensolarados, Barberas, embora menos exigentes, também têm lá suas suscetibilidades, a Dolcetto, ao contrário, é uva fácil de cultivar e que amadurece rapidamente, por isso ocupa os locais menos ensolarados dos vinhedos, muitas vezes os mais altos. Tradicionalmente, a Dolcetto produzia vinhos que podiam ser consumidos muito jovens, e muito antes das outras duas, o que ajudava a equilibrar o cash flow das vinícolas.

Sendo uma das uvas mais alegres da região de Piemonte, a casta Dolcetto é levemente fermentada no processo de vinificação, tal processo é realizado por produtores de renome que conhecem extremamente bem as características e propriedades da uva Dolcetto. A leve fermentação da uva faz com que seja extraído da casta a quantidade ideal de taninos para a elaboração de vinhos tintos secos maravilhosos.

Dolcetto

Utilizada em deliciosos e espetaculares vinhos tintos, a casta Dolcetto da região de Alba produz um dos melhores vinhos provenientes da casta. A Dolcetto D´Alba, cultivada em uma comuna do Piemonte, é considerada DOCG (Denominação de Origem Controlada e Garantida), sendo 80% dos exemplares de vinhos elaborados com a casta consumidos no próprio país de origem. Os rótulos produzidos a partir da cepa Dolcetto D´Alba possuem caráter rústico com taninos bastante leves e coloração rubi.

Além de Alba, um pequeno lugarejo, localizado na mesmo província de Cuneo, escapa à essa lógica de produção tradicional: Dogliani, uma comuna minúscula situada perto de Turim. Lá, a Dolcetto reina absoluta e ocupa todos os melhores espaços dos vinhedos. Por conta disso, Dogliani tem sua própria DOCG desde 2005, garantia de qualità superiore.

Muitos dizem que os Dolcettos são vinhos italianos com jeito de vinhos do Novo Mundo. E, de certa forma, isso se explica. Ainda que o nome remeta a um sabor adocicado, a uva Dolcetto produz vinhos muito tânicos e de baixa acidez, com alto teor alcoólico, mas que ainda assim são perfeitos para serem consumidos no dia a dia.

Ao contrário da realeza italiana da região piemontesa, que pede obras de arte gastronômicas para uma harmonização digna, caem como luvas ao acompanhar os pratos clássicos de massa da Itália, como spaghettis com molho bolonhesa ou polpettas.

Conhecida também como Ormeasco na região da Liguria, a uva Dolcetto vem conquistando muitos admiradores no mundo do vinho, ganhando bastante espaço em países do Novo Mundo com exemplares bastante potentes, secos e com graduação alcóolica elevada.

E agora finalmente o vinho!

Na taça um claro e brilhante rubi com entornos violáceos que lembra um Pinot Noir, com poucas e finas lágrimas que, afastadas, logo desaparecem do bojo do copo.

No nariz extremamente aromático, remetendo a frutas vermelhas bem frescas, com destaque para ameixas, framboesas e morangos, com notas herbáceas, algo de hortelã, além de especiarias.

Na boca é leve, fresco, saboroso, com as notas frutadas protagonizando como no aspecto olfativo, com algo mineral, terroso, de terra molhada mesmo, além de taninos macios, elegantes e delicados, com acidez média e um final persistente e frutado.

Um Dolcetto super gastronômico, com notas de frutas vermelhas frescas, nuances florais, além da acidez vivaz que dá vida a vinhos frescos e saborosos. O estágio em tanques de aço inox contribui para preservar as características primárias de aromas e sabores, que encantam no primeiro gole! E viva a leveza! Tem 13% de teor alcoólico.

Sobre a Mondo del Vino:

A Mondo del Vino possui vinícolas de última geração mostrando seu compromisso dinâmico com a inovação e a sustentabilidade. Seu objetivo é oferecer aos enófilos um ótimo produto, mas também seguro e justo. Uma forma de fazer isso é medir o impacto ambiental de seus processos e produtos, bem como a conscientização sobre o impacto de sua produção.

Desde 2016, a MDV começou a pesar e medir seu impacto ambiental com a Avaliação do Ciclo de Vida (ISO 14040-44:2006) adotando o que a Comissão da UE promove: a Pegada Ambiental da Organização (OEF) e a Pegada Ambiental do Produto (PEF). Ao fazer isso, estão na vanguarda da análise de desempenho ambiental, com base em uma ferramenta científica, sendo a primeira vinícola da Europa a adotar a política ecológica da UE.

Combina solidez produtiva, paixão pelas pessoas e responsabilidade pelos ecossistemas, buscando ser, no mundo, um ponto de referência da cultura e excelência do vinho italiano, dando sua contribuição tangível à sua história milenar, para que a Itália se torne o primeiro produtor no mundo por volumes e, sobretudo por valores.

Mais informações acesse:

https://www.mondodelvino.com/en/

Referências:

“Academia do Vinho”: https://www.academiadovinho.com.br/__mod_regiao.php?reg_num=PIEMONTE

“Revista Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/piemonte-grandiosa-regiao-italiana_8360.html

“RBG Vinhos”: https://www.rbgvinhos.com.br/blog/dolcetto-uma-uva-nada-doce-e-cheia-de-potencial

“Mistral”: https://www.mistral.com.br/tipo-de-uva/dolcetto