Há vinhos e vinícolas que fazem parte de nossa vida enquanto
enófilo! Uma espécie de elo sentimental, algo afetivo que, como uma forte
corrente, nos une. Ah só quem degusta vinhos sabe o que estou dizendo. Alguns
vinhos, alguns rótulos foram e ainda são muito importantes, por exemplo, na
minha transição de vinhos suaves, aqueles doces de garrafão para os vinhos
finos, aqueles produzidos com castas vitiviníferas.
Está aí um momento de suma importância para qualquer enófilo
brasileiro. Atirem a primeira pedra quem não passou por esse momento na
história de degustação, de um bom e fiel apreciador da poesia líquida. Posso
aqui elencar alguns vinhos e produtores que foram essenciais em minha vida
nesse momento: Miolo, Almadén, foram sim, os vinhos brasileiros que me
iniciaram há mais de 20 anos atrás. Parece que foi ontem!
Mas não posso me esquecer de um produtor que praticamente vi
“nascer” para o mundo nas terras brasileiras, embora não seja genuinamente
brasileiro, mas sim de um grupo português de produtor de vinhos, mas que
praticamente desbravou e trouxe os preceitos técnicos e tecnológicos para o
Vale São Francisco que hoje se tornou uma realidade no que tange aos terroirs
brasileiros. Falo da Rio Sol!
Como disse apesar de estar em solo brasileiro a Rio Sol é um
projeto ousado e grandioso da Global Wines, um conglomerado português que se
instalou no Brasil do Velho Chico, os vinhos do Rio São Francisco que irrigam
os parreirais e que entregam, para nosso deleite, vinhos frescos, maravilhosos
e, ao mesmo tempo, dotados de uma marcante personalidade em todas as suas
propostas.
E dessa vez assumirei um novo estágio nas degustações dos
vinhos da Rio Sol, em uma nova nuance de proposta que terei o privilégio de
degustar: a linha Gran Reserva da Rio Sol. Não as encaro como a melhor pelo
fato de ser um “gran reserva” ou que, por esse motivo, seja mais caro. Vinho
bom não é vinho caro, e nada mais que uma nova proposta de degustação de um
rótulo que fez e faz parte da minha vida há mais de 20 anos e isso, por si só, já
é relevante!
Então sem mais delongas apresento o vinho que degustei e
gostei que veio do “eldorado” vitivinícola brasileiro, Vale do São Francisco,
no Brasil e se chama Rio Sol Gran Reserva Alicante Bouschet da safra 2015. E o
que mais me chama atenção neste vinho é a casta, sim, a casta! A casta, criada
em laboratório, se notabilizou na região do Alentejo, mas ganhou alguma
representatividade em terras brasileiras, sobretudo, claro, nas quentes terras
nordestinas, banhadas pelo Velho Chico. Será minha primeira experiência e como
está o coração? Cheio de alegria e expectativas! Mas antes de falar do vinho
falemos do Vale do São Francisco e da Alicante Bouschet.
Vale do São Francisco: os vinhos do Velho Chico
A vitivinicultura do semiárido brasileiro é uma
excepcionalidade no mundo, uma vez que está localizada entre os paralelos 8º e
9o S e produz, com escalonamento produtivo, uvas o ano todo totalizando duas
safras e meia em condições ambientais adversas como alta luminosidade,
temperatura média anual de 26oC, pluviosidade aproximada de 500mm, a 330m de
altitude, em solo pedregoso.
Seus vinhos possuem público crescente, porque são jovens
“vinhos do sol”, peculiares nos aromas e sabores, considerados como fáceis de
beber e apresentando boa relação comercial qualidade/preço. Aliado a essas
particularidades, diretamente associadas à produção de vinhos finos, o Vale é
ainda cenário de diversas belezas naturais, históricas e culturais. Estudos já
publicados permitem identificar que a região conta com diversas características
que comprovam o seu potencial turístico para o desenvolvimento da atividade,
como é o caso da sua história, riquezas ambientais e diversificada cultura
regional.
Esses fatores estão relacionados à diversidade observada na
região. Isso é notado, principalmente, em decorrência da sua extensão. A Bacia
do São Francisco é a terceira maior bacia hidrográfica do país e a única que
está totalmente inserida no território nacional. Nela estão localizados 506
municípios contando com, aproximadamente, 13 milhões de habitantes, que
representa 9,6% da população brasileira.
Bem antes do Vale do São Francisco se consolidar como polo de vitivinicultura, quem já exercia esse papel no Brasil era a região Sul. No século 19, o Rio Grande do Sul, mesmo com as condições climáticas desfavoráveis, passou a ser considerado um polo crescente nesse meio – e até hoje segue inserido no ramo. Mas, a chegada de imigrantes estrangeiros no país trouxe o conhecimento técnico e a noção de mercado, o que fez com que outras regiões brasileiras também mostrassem a sua capacidade produtiva.
É na década de 1960 que o Nordeste entra em cena e o Vale do São Francisco inicia a sua trajetória na produção de uvas e vinhos, com a implantação das primeiras videiras. Nos anos de 1963 e 1964, foram instaladas duas estações experimentais, nos municípios de Petrolina, no Sertão de Pernambuco e Juazeiro, na Bahia, onde seriam implantados, respectivamente, o Projeto Piloto de Bebedouro e o Perímetro Irrigado de Mandacaru.
Apesar da escassez de chuva, o clima quente e seco do
semiárido mostrou-se terreno fértil para a vitivinicultura e, na mesma década,
outras cidades do Sertão de Pernambuco passam a fazer parte da cadeia
produtiva. O pioneirismo da vitivinicultura no Nordeste é representado pelo
Sertão Pernambucano, que iniciou a sua trajetória na vitivinicultura na década
de 1960, produzindo vinhos base para vermutes, na cidade de Floresta, uvas de
mesa em Belém do São Francisco e em Santa Maria da Boa vista, localidade que na
época se chamava Coripós.
Entre os anos 1980 e 1990, a região banhada pelo Rio São
Francisco passa a ser conhecida também pela produção de vinhos finos, e em 1984
é produzido o primeiro vinho no Vale do Submédio São Francisco, com a marca
Boticelli. O fortalecimento da vitivinicultura no Vale do Submédio São
Francisco se deu com a instalação de vinícolas na Fazenda Milano, em Santa
Maria da Boa Vista – PE e Fazenda Ouro Verde, em Casa Nova, na Bahia, que
passaram a produzir vinhos finos.
Ao longo da década de 1990, ganha destaque a vitivinicultura
tecnificada e a produção de uvas sem sementes. É também nessa época, que cresce
o investimento de grupos empresariais na região. A instalação de uma
infraestrutura física, como construção de packing
houses, melhoria no sistema rodoviário e portuário, e, sobretudo, a
organização dos produtores em associações e cooperativas, desempenharam um
importante papel na consolidação das exportações de uvas de mesa do Vale do
Submédio São Francisco.
A partir dos anos 2000, a produção se fortalece ainda mais
com a implantação de outras vinícolas e vitivinícolas e também com as
iniciativas públicas. Ações governamentais e de ensino, pesquisa e inovação, a
partir do ano 2000, trouxeram novas tecnologias de produção e processamento de
uvas e o reconhecimento de atores internacionais. É nessa época que surge a
Escola do Vinho do Curso Superior de Tecnologia em Viticultura e Enologia, do
Instituto Federal do Sertão Pernambucano.
Estruturação de IG (Indicação Geográfica)
A estruturação da Indicação de Procedência Vale do São
Francisco para vinhos está vinculada a projeto financiado pelo MCT/Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tenológico - CNPq. A ação do projeto,
voltada para a estruturação da IG, tem as seguintes instituições de CT&I
como executoras: Embrapa Uva e Vinho (coordenação) em parceria com a Embrapa
Semiárido, Embrapa Clima Temperado, UCS, UFLA, UFP e IF Sertão. O setor
vitivinícola da região é representado pelo “Instituto do Vinho do Vale do São
Francisco” (Vinhovasf). O projeto conta, ainda, com outras instituições que
participam em diversas pesquisas para apoiar o desenvolvimento tecnológico da
vitivinicultura da região do Vale do São Francisco. Os produtos IP Vale do São
Francisco incluem os vinhos finos tranquilos brancos, rosados e tintos, o
espumante fino e o moscatel espumante.
Alicante Bouschet
O palco da uva tinta Alicante Bouchet é, sem dúvidas, a
região de Alentejo, em Portugal, onde esse tipo de uva faz grande sucesso. A
variedade é utilizada para adicionar corpo e estrutura aos rótulos produzidos
na região, bem como dar mais volume aos vinhos.
Criada em laboratório pelo Francês Henri Bouchet, no final de
1800, na região de Languedoc-Roussillon, a uva Alicante Bouchet é a união das
castas Petit Bouchet e Grenache. Apesar de ter sido criada na França, esse tipo
de uva é majoritariamente cultivado em Portugal, e os vinhos tintos que usam a
Alicante Bouchet são rótulos frutados de bom equilíbrio. A casta proporciona
enorme capacidade de envelhecimento para os exemplares, de forma que os vinhos
se tornem profundos, aromáticos e que se assemelhem a canela e pimenta.
Muito utilizada em vinhos de corte, a Alicante Bouchet dá
origem a vinhos excelentes que harmonizam de forma notável com pratos que levam
carnes vermelhas. Isso se deve à sua tanicidade, que contrasta muito bem com a
gordura, criando sensações memoráveis no paladar.
A uva Alicante Bouchet também é bastante utilizada na
elaboração de vinhos na Espanha e Croácia, regiões nas quais recebe diferentes
nomes. Na Croácia, por exemplo, a uva é conhecida como Dalmatinka ou Kambusa,
enquanto na Espanha é popularmente nomeada como Garnacha Tintorera, ainda que a
Organização da Vinha e do Vinho (OIV) não reconheça o sinônimo espanhol.
Sua polpa possui coloração intensa e avermelhada, e seus
bagos, dispostos em grandes cachos, são redondos de cor negra. Essas características
naturais fazem da uva Alicante Bouchet uma variedade de grande relevância na
intensificação da coloração de vinhos tintos.
A uva, apesar de não aparecer muito nos vinhedos da região
americana da Califórnia, já foi bastante representativa e de grande relevância
para a região. O maior destaque da uva Alicante Bouchet no país, entretanto,
deu-se na época da Lei Seca, em 1920, quando a fruta era utilizada para a
produção de suco de uva, uma vez que o governo norte americano havia proibido e
criminalizado o transporte, comercialização e consumo de bebidas alcoólicas.
E agora finalmente o vinho!
Na taça entrega um vermelho rubi vibrante, intenso, límpido
com reflexos violáceos com lágrimas grossas e em profusão que desenham as
bordas do copo.
No nariz é bem aromático e remetem a compota de frutas
vermelhas maduras, como cereja, framboesa e até morangos, com notas evidentes
da madeira, graças aos 9 meses em barricas de carvalho, porém bem integrados,
com leve tabaco e especiarias doces.
Na boca traz a fruta vermelha protagonizando também, como no
aspecto olfativo, tem personalidade marcante, por ter um bom volume de boca,
mas também elegante graças aos já sete anos de safra, um pouco alcoólico, mas
sem agredir, sem desequilíbrio, com taninos presentes, mas domados, a presença
discreta da madeira e um final agradável e de média persistência.
E já que eu falei de história e de afetividades, o Rio Sol
Gran Reserva já faz parte dela, da minha história e da minha humilde vida de
enófilo. Um vinho marcante, de personalidade, intenso, complexo, mas que, ao
mesmo tempo revela todo o frescor, as notas frutadas que faz com que este
rótulo exploda em versatilidade. Que venham mais vinhos da Velho Chico, que
venham mais vinhos da Rio Sol e que eles continuem a inundar a minha taça de
história viva e plena de grandes experiências sensoriais. Tem 13% de teor
alcoólico.
Sobre a Vinícola Santa Maria:
Localizada no Vale do São Francisco com 120 hectares de área
plantada, a Rio Sol produz 1,5 milhão de quilos de uva anualmente. Entre as
espécies plantadas estão uvas tintas como Cabernet Sauvignon, Syrah, Aragonês,
Touriga Nacional, Alicante Bouschet, Tempranillo e Merlot, além das brancas
Chenin Blanc, Viognier e Moscatel. Este é o único lugar do mundo que produz,
hoje, duas safras de uvas por ano, resultado das características naturais da
região e do conhecimento de seus produtores.
É no mesmo local onde se situa a indústria da Rio Sol, onde
toda a linha de produtos da empresa é produzida e engarrafada, seguindo os mais
modernos conceitos de qualidade. A empresa conta com modernos tanques com
controle de temperatura e pressão, sala de barricas para estágio dos vinhos em
barris de carvalho francês e uma linha de engarrafamento e rotulagem que utiliza
tecnologia importada, semelhante a utilizada nas outras vinícolas do grupo na
Europa.
Anualmente são produzidas, aproximadamente, 2 milhões de
garrafas, entre vinhos e espumantes, distribuídos para todo o Brasil. Toda essa
produção é acompanhada de perto pela equipe de qualidade da Rio Sol, que atua
tendo como foco a melhoria contínua da qualidade e a adequação dos produtos às
tendências de mercado, sempre visando a sustentabilidade e a segurança do
processo. A Rio Sol possui certificação internacional ISO 9001, que atesta os
rigorosos controles de qualidade da produção de uvas e elaboração de vinhos.
Sobre a Global Wines:
O Grupo Global Wines nasceu em 1990 no Dão, com o nome Dão
Sul. A sua missão era ser a maior empresa da mais antiga região de vinhos tranquilos
de Portugal, o Dão. Quando o objetivo foi atingido, partiram para outros
sonhos, outras aventuras, outras regiões e outros países. Ainda são a empresa
de vinhos líder do Dão. Mas também são uma empresa de vinhos da Bairrada, do
Alentejo, de Portugal e até o Brasil.
Tem atualmente 5 Espaços de Enoturismo, 3 dos quais com
restaurante, onde procuram conjugar o vinho e a gastronomia, despertando como
as melhores sensações, na experiência perfeita. Recebem, diariamente, pessoas
de todas as partes do mundo, a quem procuram dar a melhor experiência de vinho
e gastronomia. Atualmente estão presentes nos 5 continentes e as suas marcas
chegam a mais de 40 países.
Mais informações acessem:
https://www.vinhosriosol.com.br/principal/
https://www.globalwines.pt/#globalwines
Referências:
“Mistral”: https://www.mistral.com.br/tipo-de-uva/alicante-bouchet
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