A Miolo, a vinícola brasileira Miolo, definitivamente está na
minha história e não digo isso agora, mas há algum tempo e com muito orgulho e
alegria. Falo com todo esse entusiasmo porque quando me fiz submeter à
transição dos vinhos de mesa, os famosos vinhos coloniais para os vinhos finos,
aqueles de uvas vitis viníferas, lá estava o Miolo e seus vinhos para me
oferecer seus préstimos.
A Miolo hoje é uma indústria de vinhos e a sua
representatividade mercadológica atesta isso e não é demérito para esse grande
produtor ser uma indústria, principalmente quando se confirma também quando
seus vinhos ainda fazem parte da vida de muitos e muitos enófilos espalhados
pelo Brasil e pelo mundo!
E a Miolo ainda tem muito a oferecer, mesmo que ao longo de
todo esse tempo em nosso mercado, e muita coisa nova, muitos novos rótulos
arrojados que podem trazer grandes novidades, mensagens edificantes e a
corroboração da saúde para aqueles que degustam bons vinhos, a qualidade de
vida, os fatores sustentáveis!
Por que digo tudo isso? O vinho de hoje, não preciso dizer
que é da Miolo, mas, direi mesmo assim, é da Miolo! E falo não apenas com um
sentimento saudoso, de nostalgia, mas também com um agradável vislumbre do
futuro, da capacidade desta vinícola de oferecer coisas novas, com aqueles
rompimentos de paradigmas que só eles são capazes de oferecer.
Não direi que esse vinho só traz novidades para mim, de fato
traz sim, muitas novidades, mas nem tanto, nem tanto, até porque já degustei,
nos primórdios um vinho deles que hoje assumiu, como disse, alguns novos
contornos seguindo, sobretudo, alguns anseios de uma camada socialmente,
ambientalmente responsável.
Sem mais delongas, vamos às apresentações! O vinho que
degustei e gostei veio da região brasileira da Campanha Gaúcha, mais precisamente
da Campanha Meridional, que, a cada dia, cresce a olhos vistos em qualidade e
tipicidade, mais precisamente da Campanha Meridional, dos vinhedos da Seival, e
se chama Miolo Wild Gamay da safra 2022.
Quando falei que nem tudo é novidade é porque, em um passado
razoavelmente distante, eu degustei, por duas vezes, a versão mais “antiga” do
Miolo Gamay que é um dos melhores rótulos brasileiros produzidos por esta
emblemática casta que se notabilizou em terras francesas.
E alguns detalhes, antes de entrar na história da Campanha
Gaúcha e da Gamay, merecem serem exaltados, detalhes esses que eu mencionei
como grandes novidades para mim: O Miolo Wild Gamay foi produzido por
intermédio do método ancestral de maceração carbônica de cachos inteiros e a
vinificar sem adição de sulfitos e sem adição de leveduras selecionadas,
passando a usar leveduras selvagens da uva de Gamay do Seival.
E por ter sido, esse rótulo, em março, aproximadamente, de
2022, pode este vinho, ser considerado o primeiro vinho do mundo a ser lançado
no ano de 2022! E de acordo com as palavras do enólogo Adriano Miolo, que
produziu este vinho juntamente com Henry Marionnet, reconhecido como o “Papa do
Gamay” no mundo, onde disse que “O Miolo Wild Gamay Safra 2022 vai ser a
primeira oportunidade que o consumidor terá de degustar a qualidade desta
safra. Estamos no meio da colheita deste ano, mas já podemos afirmar que é
espetacular e deverá ser mais uma safra lendária para a Miolo, como foi em 2018
e 2020”.
O inverno muito rigoroso e o verão extremamente quente e
seco, com temperatura que chegou a 44 graus em janeiro, determinaram a
performance das uvas. O frio intenso proporcionou uma brotação uniforme da
planta, porém tardia, que também refletiu na maturação tornando a colheita mais
tardia do que o usual.
Bem diante dessas credenciais vamos para mais histórias,
vamos de Campanha Gaúcha e da história da Gamay.
Campanha Gaúcha
Entre o encontro de rios como Rio Ibicuí e o Rio Quaraí,
forma-se o do Rio Uruguai, divisa entre o Brasil, Argentina e Uruguai. Parte da
Campanha Gaúcha também recebe corpo hídrico subterrâneo, o Aquífero Guarani
representa a segunda maior fonte de água doce subterrânea do planeta, dele
estando 157.600 km2 no Rio grande do Sul.
A Campanha Gaúcha se espalha também pelo Uruguai e pela
Argentina garante uma cumplicidade com os “hermanos” do outro lado do Rio
Uruguai. Os costumes se assemelham e os elementos locais emprestam rusticidade
original: o cabo de osso das facas, o couro nos tapetes, a tesoura de tosquia
que ganha novas utilidades.
No verão, entre os meses de dezembro a fevereiro, os dias
ficam com iluminação solar extensa, contendo praticamente 15 horas diárias de
insolação, o que colabora para a rápida maturação das uvas e também ajuda a
garantir uma elevada concentração de açúcar, fundamental para a produção de
vinhos finos de alta qualidade, complexos e intensos.
As condições climáticas são melhores que as da Serra Gaúcha e
tem-se avançado na produção de uvas europeias e vinhos de qualidade. Com o bom
clima local, o investimento em tecnologia e a vontade das empresas, a região
hoje já produz vinhos de grande qualidade que vêm surpreendendo a vinicultura
brasileira.
A mais de 150 anos, antes mesmo da abolição da escravatura, a
fronteira Oeste do Rio Grande do Sul já produzia vinhos de mesa que eram
exportados para os países do Prata (Uruguai, Argentina e Paraguai) e vendidos
no Brasil.
A primeira vinícola registrada do Brasil ficava na Campanha
Gaúcha. Com paredes de barro e telhado de palha, fundada por José Marimon, a
vinícola J. Marimon & Filhos iniciou o plantio de seus vinhedos em 1882, na
Quinta do Seival, onde hoje fica o município de Candiota.
E o mais interessante é que, desde o início da elaboração de
vinhos na região, os vinhos da Campanha Gaúcha comprovam sua qualidade
recebendo medalha de ouro, conforme um artigo de fevereiro de 1923, do extinto
jornal Correio do Sul de Bagé.
IP (Indicação de Procedência) da Campanha Gaúcha
Em 2020 a Campanha Gaúcha ganhou reconhecimento de Indicação
de Procedência (IP) para seus vinhos. Aprovada pelo Inpi na modalidade de I.P.,
a designação vem sendo utilizado pelas vinícolas da região a partir do ano de
2020 para os vinhos finos, tranquilos e espumantes, em garrafa.
A Indicação Geográfica (IG) foi o resultado de mais de 5 anos
de pesquisa, discussões e estudos de um grupo interdisciplinar coordenados pela
Embrapa Uva e Vinhos do Rio Grande do Sul.
Além disso, os vinhos devem ser elaborados a partir das 36
variedades de vitis viníferas permitidas pelo regulamento, plantadas em sistema
de condução em espaldeira e respeitando os limites máximos de produtividade por
hectare e os padrões de qualidade das frutas que seguirão para a vinificação. Finalmente,
os vinhos precisam ser avaliados e aprovados sensorialmente às cegas por uma
comissão de especialistas.
Esta é uma delimitação localizada no bioma Pampa do estado do
Rio Grande do Sul, região vitivinícola que começou a se fortalecer na década de
1980, ganhando novo impulso nos anos 2000, com o crescimento do número de
produtores de uva e de vinho, expandindo a atividade para diversos municípios
da região.
A área geográfica delimitada totaliza 44.365 km2. A IP
abrange, em todo ou em parte, 14 municípios da região: Aceguá, Alegrete, Bagé,
Barra do Quaraí, Candiota, Dom Pedrito, Hulha Negra, Itaqui, Lavras do Sul,
Maçambará, Quaraí, Rosário do Sul, Santana do Livramento e Uruguaiana.
A Campanha Gaúcha está situada entre os paralelos 29º e 31º
Sul e trata-se de uma zona ensolarada, com as temperaturas mais elevadas e o
menor volume de chuvas entre as regiões produtoras do Sul do Brasil.
Ao mesmo tempo, as parreiras – predominantemente plantadas em
sistema de espaldeira – foram estabelecidas em grandes extensões de planície
(altitude entre 100 e 360 m.) com encostas de baixa declividade, o que favorece
a mecanização das colheitas, reduz os custos e potencializa a escala produtiva.
Uma característica importante é o solo basáltico e arenoso, com boa drenagem,
que somada aos outros fatores propicia a ótima qualidade das uvas.
Esta foi uma conquista para a região, que pode refletir em
uma garantia da qualidade de seus produtos. Fica a torcida para que, após muito
tempo de consistência de qualidade e de uma real identificação da tipicidade, a
Campanha Gaúcha possa ter o reconhecimento de uma Denominação de Origem (DO).
Gamay
A Gamay é uma das principais uvas tintas da França, original
da região de Beaujolais, sul da Borgonha, e norte das Côtes du Rhône. É
responsável única pelo famoso vinho Beaujolais, um vinho leve, brilhante, suave
e muito saboroso. Na região vizinha de Mâcon, é usada na elaboração dos Mâcon
tintos, mas em combinação com Pinot Noir. Hoje está bem espalhada pelo mundo,
onde produz bons varietais, principalmente na Califónia, Brasil, África do Sul
e Austrália, Nova Zelândia, Canadá e Croácia.
Possuindo grande variação de nome pelo mundo, a uva Gamay
pode ser encontrada com diferentes denominações reconhecidas pela Organização
Internacional da Vinha e do Vinho. A casta pode ser identificada como Jurançon
Noir, Gamay Beaujolais ou Gamay Noir. Possuindo parentesco comprovado com a
casta Pinot Noir, a uva Gamay se contrapõe de forma elegante com a prima,
disputando o mesmo território. Entretanto, em países como a Suíça, é possível
encontrar vinhos onde a Gamay não é vinificada sozinha, como na França, e sim
em cortes com a sua parente, a cepa Pinot Noir.
Intimamente ligada aos famosos vinhos tintos franceses
Beaujolais, conhecidos por possuírem caráter leve, macio e repletos de aromas
de frutas tropicais e refrescante acidez, a uva Gamay costuma brotar e
amadurecer de forma precoce, sendo extremamente vigorosa e produtiva. Se
espalhando pela Côte d’Or em meados do século XIV, a origem do nome da cepa
Gamay provém de uma vila localizada no sul de Beaune, na região de Borgonha na
França.
A casta Gamay começou a ser utilizada em vinhos brasileiros
na década de 1970, especificamente no Rio Grande do Sul, na região de Viamão,
próxima a Porto Alegre, produzindo vinhos bastantes jovens possuidores de
excelente sabor.
A composição do solo onde ocorre o cultivo das vinhas de
Gamay influencia no tipo de aroma que será adquirido no processo de
vinificação. Caso o cultivo ocorra em solos granitados, a casta Gamay
propiciará ao vinho aromas de pimenta e framboesa.
Possuindo caráter bastante frutado, a uva Gamay possui
excelente estrutura no que se refere a acidez, além de baixa presença de taninos.
Os vinhos de caráter e estilo leve elaborados a partir da casta Gamay são
ideais para acompanhar pratos que possuam pescados, exaltando os aromas de
frutas e refrescante acidez da uva.
E agora finalmente o vinho!
Na taça revela um lindo vermelho rubi, com halos violáceos
bem brilhantes, com finas e discretas lágrimas que logo se dissipam do copo.
No nariz mostra uma exuberância aromática e muita tipicidade
por conta do processo de maceração carbônica, destacando-se as notas frutadas,
tais como maçã, cerejas, framboesa, morango, trazendo ao vinho um incrível
frescor e delicadeza, corroborados com toques florais.
Na boca é leve, fresco, com algo de despretensioso, sendo
muito saboroso e cheio na boca, conferindo-lhe também personalidade. Traz
também o protagonismo da fruta vermelha fresca, como no aspecto olfativo. Tem
taninos quase que imperceptíveis, ótima acidez e um curioso e agradável toque
herbáceo. Final prolongado, longo.
E diante de tantas novidades que esse rótulo me proporcionou,
bem como alguns momentos nostálgicos deliciosos, eu percebi hoje, degustando
esse belíssimo e solar vinho da Campanha Gaúcha, que a história é viva e
latente, não é estática e isso serve, sim, para o universo dos vinhos. Miolo
Gamay Wild é assim! É um vinho arrojado, mas que traz as características mais
marcantes da cepa é um vinho moderno, mas tradicional. É um vinho especial,
frutado, com a cara, com o DNA do Brasil e dos atuais dias quentes que tanto caracteriza
o nosso país. Tem 12% de teor alcoólico.
Sobre a Vinícola Miolo:
A paixão pelo mundo fascinante do vinho é facilmente
explicada pela história da família Miolo que, além de trabalhar na
vitivinicultura desde a chegada de Giuseppe no Brasil em 1897, inova ano após
ano. Uma das fundadoras do projeto Wines of Brasil, a Miolo Wine Group é a
maior exportadora de vinhos do Brasil e a mais reconhecida no mercado
internacional. A produção dentre as 4 vinícolas do grupo soma, em média, 10
milhões de litros por ano numa área cultivada de vinhedos próprios com
aproximadamente 1.000 hectares.
A Miolo exporta para mais de 30 países de todos os
continentes. É o maior exportador de vinhos finos do Brasil. De 30 hectares em
1989, a Miolo cultiva hoje, 30 safras mais tarde, cerca de 950 hectares de
vinhedos em quatro terroirs brasileiros: Vale dos Vinhedos (Serra Gaúcha),
Seival/Candiota (Campanha Meridional), Almadén/Santana do Livramento (Campanha
Central) e Terranova/Casa Nova (Vale do São Francisco), sendo a única empresa
do setor genuinamente brasileira com atuação em quatro diferentes regiões
produtoras.
Com uma produção anual de cerca de 10 milhões de litros, é a
marca que detém o maior portfólio de rótulos verde amarelos, exibindo centenas
de prêmios conquistados no mundo inteiro. O pioneirismo na elaboração dos
vinhos se estendeu para o enoturismo, onde a marca gera experiência,
aproximando e formando novos apreciadores da bebida. Assim é no Vale dos
Vinhedos com o Wine Garden Miolo, assim é no Vale do São Francisco com o Vapor
do Vinho pelo Velho Chico, onde a Miolo transformou o sertão em vinhedo. Este
mesmo espírito empreendedor que fez da pequena vinícola familiar a maior
produtora de vinhos finos do Brasil em apenas 30 safras, é que move gerações e
aproxima quem sonha de quem quer fazer.
Mais informações acesse:
Referências:
“Academia do Vinho”: https://www.academiadovinho.com.br/__mod_regiao.php?reg_num=CAMPANHA
“Vinhos da Campanha”: https://www.vinhosdacampanha.com.br/campanha-gaucha/
“Vinhos da Campanha”: https://www.vinhosdacampanha.com.br/ciclo-de-crescimento-da-uva/
“Tudo do Vinho”: https://tudodovinho.wordpress.com/2020/07/14/i-p-campanha-gaucha/
“Academia do Vinho”: https://www.academiadovinho.com.br/__mod_ela_uvas_mostra.php?num_uva=13
“Enologuia”: https://enologuia.com.br/uvas/196-uva-gamay-a-pequena-joia-do-beaujolais
“Mistral”: https://www.mistral.com.br/tipo-de-uva/gamay
“Embalagem Marca”: https://embalagemmarca.com.br/2022/03/miolo-wild-gamay-2022-chega-ao-mercado-ainda-em-marco/
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