É possível ser fã de um produtor de vinhos? A resposta é tão
objetiva quanto a pergunta: Sim! E quando você degusta os rótulos de todas as
propostas, de toda a linha e chega a essa conclusão é a prova contundente da
idoneidade e qualidade da vinícola.
Foi por intermédio da Adega de Cantanhede que descobri os
vinhos da Bairrada e do Beira Atlântico que, quando chega em nossas terras, em
pouca quantidade, em comparação, por exemplo, aos alentejanos, do Porto e por
aí vai, com um preço justo é melhor ainda. Degustar rótulos, degustar vinhos de
qualidade a um preço acessível a vários bolsos, o famoso custo X benefício.
E que me chama a atenção na Adega de Cantanhede, além, claro,
dos seus vinhos e rótulos, são as histórias e culturas do seu povo estampado nos
seus rótulos que muita explica a qualidade do vinho, o seu terroir.
E o vinho de hoje entrega todo esse “combo” de que falei e
revela aquela surpresa grata de um vinho de excelente custo, mas que entrega
muito mais do que valeu. O que era a assinatura de um vinho produzido por uma
vinícola de que sou fã, passou a ser também um belo rótulo, como disse,
surpreendente!
O vinho que degustei e gostei veio do Beira Atlântico, região
lusitana próxima à da emblemática Bairrada e se chama Praça dos Marqueses Escolha
composto por um interessante blend capitaneado pela casta tradicional da região
Baga (60%), Touriga Nacional (20%), Jaen (10%) e Castelão (10%) da safra 2018.
E aí vem aquela dúvida: Mas o que significa a palavra
“Escolha” que vem junto com o nome do vinho. Eu confesso que, até pouco tempo
atrás, eu não sabia o significado e consegui buscar a definição por intermédio
de algum produtor que não me recordo cujo vinho comprei e que carregava essa
nomenclatura no seu rótulo. “Escolha” é uma denominação de qualidade, tal como
reserva. Significa que obteve uma qualificação uns pontos acima do “normal”
regional, pelo organismo que certifica o vinho.
Bem depois dessa entrada e que já, previamente, define a
percepção positiva que tive do vinho o degusta-lo, sigamos com um pouco mais de
história e falemos um pouco sobre a região do Beira Atlântico, ainda um pouco
conhecida entre nós, enófilos brasileiros.
Beira Atlântico
A produção de vinho na região remonta ao tempo dos romanos,
fazendo disso prova os diversos lagares talhados nas rochas graníticas (lagares
antropomórficos), onde na época o vinho era produzido. Já nos reinados de D.
João I e de D. João III, respectivamente, foram tomadas medidas de proteção
para os vinhos desta área do país, dadas a sua qualidade e importância social e
econômica.
A tradição destes vinhos remonta ao reinado de D. Afonso
Henriques, que autorizou a plantação das vinhas na região, com a condição de
ser dada uma quarta parte do vinho produzido. Estendendo-se desde o Minho ate a
Alta Estremadura, e uma região de agricultura predominantemente intensiva e
multicultural, de pequena propriedade, aonde a vinha ocupa um lugar de destaque
e a qualidade dos seus vinhos justifica o reconhecimento da DOC
"Bairrada".
Os solos são de diferentes épocas geológicas, predominando os
terrenos pobres que variam de arenosos a argilosos, encontrando-se também, com
frequência, franco-arenosos. A vinha e cultivada predominantemente em solos de
natureza argilosa e argilo-calcaria. Os Invernos são longos e frescos e os
Verões quentes, amenizados por ventos de Oeste e de Noroeste, que com maior
frequenta e intensidade se faz sentir nas regiões mais próximas do mar.
A região da Bairrada situa-se entre Agueda e Coimbra,
delimitada a Norte pelo rio Vouga, a Sul pelo rio Mondego, a Leste pelas serras
do Caramulo e Bucaco e a Oeste pelo oceano Atlântico. E uma região de orografia
maioritariamente plana, com vinhas que raramente ultrapassam os 120 metros de
altitude, que, devido a sua planura e a proximidade do oceano, goza de um clima
temperado por uma fortíssima influencia atlântica, com chuvas abundantes e
temperaturas médias comedidas. Os solos dividem-se preponderantemente entre os
terrenos argilo-calcários e as longas faixas arenosas, consagrando estilos bem
diversos consoantes à predominância de cada elemento.
Integrada numa faixa litoral submetida a uma fortíssima
densidade populacional, a propriedade rural encontra-se dividida em milhares de
pequenas parcelas, com dimensões medias de exploração que raramente ultrapassam
um hectare de vinha, favorecendo a presença de grandes adegas cooperativas e de
grandes empresas vinificadoras, a par de um conjunto de produtores
engarrafadores que muito dignificam a região.
As fronteiras oficiais da Bairrada foram estabelecidas em 1867,
por Antônio Augusto de Aguiar, tendo sido das primeiras regiões nacionais a
adoptar e a explorar os vinhos espumantes, uma vez que na região, o clima
fresco, úmido e de forte ascendência marítima favorece a sua elaboração,
oferecendo uvas de baixa graduação alcoólica e acidez elevada, condição
indispensável para a elaboração dos vinhos espumantes.
E agora finalmente o vinho!
Na taça apresenta um vermelho rubi intenso, mas com bordas,
entornos violáceos brilhantes com algumas lágrimas finas de média persistência.
No nariz traz aromas de frutas vermelhas maduras, frutas
negras e frutas silvestres, algo de floresta, talvez um pouco de rusticidade
conferido pela Baga, com notas agradáveis florais.
Na boca é frutado, redondo, macio, tem estrutura leve para
média, é saboroso, com alguma elegância, um pouco alcoólico, mas que não
incomoda, não é algo desequilibrado, tem taninos macios e acidez correta, com
um final frutado e prolongado.
E falando em curiosidades e história, por que o nome do vinho
é “Praça dos Marqueses”? Lá vai a resposta: Em homenagem à Família Meneses,
Senhores de Cantanhede e titulares dos títulos nobiliárquicos de Cantanhede e
Marquês de Marialva, que aqui residiram ao longo de várias gerações,
contribuindo para o desenvolvimento da região, deixando património edificado de
grande relevo, nomeadamente a residência familiar Palácio dos Meneses, um
edifício quinhentista, hoje Paços do Concelho, localizado na principal Praça da
Cidade.
Esse mesmo palácio quinhentista que estampa o rótulo do
vinho. Degustemos história, cultura, a degustação traz o intercâmbio cultural,
o prazer da bebida, o terroir de uma região, o apelo regionalista evidenciado
pelas suas castas mais famosas, autóctones. Um vinho que não passa por barricas
de carvalho, que entrega as características mais genuínas de cada casta, traz o
vinho na sua gênese sem o mínimo de intervenção. Como diz o grande Didu Russo:
“Quer mensurar a qualidade de uma vinícola, deguste os seus vinhos mais
básicos”. Esse vinho entregou muito mais do que eu esperava e do que eu investi.
Excelente! Tem 13% de teor alcoólico.
Sobre a Adega de Cantanhede:
Fundada em 1954 por um conjunto de 100 viticultores, a Adega
de Cantanhede conta hoje com 500 viticultores associados ativos e uma produção
anual de 6 a 7 milhões de quilos de uva, constituindo-se como o principal
produtor da Região Demarcada da Bairrada, representando cerca de 40% da
produção global da região. Hoje certifica cerca de 80% da sua produção, sendo
líder destacado nas vendas de vinhos DOC Bairrada DOC e Beira Atlântico IGP.
Reconhecendo a enorme competitividade existente no mercado
nacional e internacional, a evolução qualitativa dos seus vinhos é o resultado
da mais moderna tecnologia, com foco na qualidade e segurança alimentar (Adega
Certificada pela norma ISO 9001:2015, e mais recentemente pela IFS Food 6.1.),
mas também da promoção das castas Portuguesas, que sempre guiou a sua
estratégia, particularmente das variedades tradicionais da Bairrada – Baga,
Bical e Maria Gomes – mas também de outras castas Portuguesas que encontram na
Bairrada um Terroir de eleição, como sejam a Touriga Nacional, Aragonez e
Arinto, pois acredita que no inequívoco potencial de diferenciação e
singularidade que este património confere aos seus vinhos.
O seu portfólio inclui uma ampla gama de produtos. Em tinto,
branco e rose os seus vinhos vão desde os vinhos de mesa até vinhos Premium a
que acresce uma vasta gama de Espumantes produzidos exclusivamente pelo Método
Clássico, bem como Aguardentes e Vinhos Fortificados. É um portfólio que,
graças à sua diversidade e versatilidade, é capaz de atender a diferentes
segmentos de mercado, com diferentes graus de exigência em qualidade, que
resulta na presença dos seus produtos em mais de 20 mercados.
A sua notoriedade enquanto produtor, bem como dos seus vinhos
e das suas marcas, vem sendo confirmada e sustentadamente reforçada pelos
prémios que vem acumulando no seu palmarés, o que resulta em mais de 750
distinções atribuídas nos mais prestigiados concursos nacionais e
internacionais, com destaque para Mundus Vini – Alemanha, Concours Mondial de
Bruxelles, Selections Mondiales du Vins - Canada, Effervescents du Monde –
França, Berliner Wein Trophy – Alemanha e Japan Wine Challenge. Sendo por
diversas ocasiões o único produtor da Bairrada com vinhos premiados nesses
concursos e, por isso, hoje um dos mais galardoados produtores da região. Em
2015 integrou o TOP 100 dos Melhores Produtores Mundiais, pela WAWWJ –
Associação Mundial dos Jornalistas e Críticos de Vinho e Bebidas Espirituosas.
Nos últimos 8 anos foi eleita “Melhor Adega Cooperativa” em Portugal por 3 vezes
pela imprensa especializada.
Mais informações acesse:
Referências:
“Mistral”: https://www.mistral.com.br/tipo-de-uva/baga
“Soul Wines”:
https://www.soulwines.com.br/uvas-de-vinhos/baga
“IVV”: https://www.ivv.gov.pt/np4/503/