Já li e ouvi muitas discussões, questionamentos e
problemáticas com relação a qualidade dos vinhos que ostentam, em seus rótulos,
as nomenclaturas “Reserva” e “Gran Reserva”.
E os questionamentos e discussões pairam em torno de uma
questão de suma importância para nós enófilos, mas que, para os “aristocratas
do vinho” pode se tornar um fato de segregação, que são os valores dos vinhos,
sobretudo aqueles valores baixos.
Gera-se uma discussão acerca dos valores baixos dos vinhos
reservas e gran reservas, principalmente os espanhóis, e sumariamente os
rejeita com um argumento que, penso, ser pouco contundente, de que não se pode
degustar tais vinhos com valores abaixo de R$50.
Eu confesso que fomentar essa “polêmica” é totalmente
desnecessário, haja vista que qualidade não se mensura, penso eu, pelo preço do
vinho, até porque o que precisamos levar em consideração é a proposta do vinho,
o que ele pode te entregar e principalmente o que você espera de um vinho para
o momento em que você deseja degustar um rótulo.
Me parece se tratar de um argumento totalmente segregador, de
que vinho bom é vinho caro, buscando nesse conceito ou pré-conceito, no vinho
como artigo de etiqueta social, excluindo aqueles da base da pirâmide social
desse nicho seletíssimo do vinho.
Mas não, não podemos pensar dessa maneira! Vinho é para todos
e para todos também tem de ser as diversas propostas, é o que o vinho nos
proporciona: propostas para as mais diversas situações e momentos. Não há um
vinho pior que outro.
Então pensando nisso decidi desbravar algumas regiões da já
mencionada por aqui, a Espanha. Sair um pouco ou simplesmente mudar o foco de
regiões tradicionais, emblemáticas e famosas como Rioja e Ribera del Duero, por
exemplo.
E há cerca de um ano atrás, aproximadamente, descobri um
rótulo em um famoso e-commerce de vinhos aqui no Brasil por um valor
espetacularmente baixo (R$39,90) de uma região chamada Navarra, um Gran
Reserva. Sim! Um Gran Reserva! Como degustar e comprar um Gran Reserva a esse
valor? Mesmo baixo decidi ousar e comprar.
Eu o comprei dois anos antes, 2019 e decidi degusta-lo em
2021, pois a safra era de 2011. Optei por desarrolhá-lo aos 10 anos de vida.
Era o Gran Villa Gran Reserva 2011. E a experiência foi arrebatadora, especial!
Decidi investir em novos rótulos dessa região.
Mas revisitando os meus “arquivos de degustação” encontrei um
que havia esquecido e que achei da forma mais despretensiosa do mundo em um
supermercado, praticamente jogado, esquecido e empoeirado no rodapé das
gôndolas: um branco da famosa casta Viúra ou Macabeo chamado El Lagar de la Aldea 2017, há um valor, pasmem, de R$19,90! E que vinho delicioso!
E em minhas incursões pela grande rede, pela internet,
encontrei outro de Navarra que, por uma grata coincidência, é do mesmo produtor
do Gran Villa Gran Reserva, desta vez um Reserva, da Bodegas Bornos.
Então sem mais delongas vamos às apresentações! O vinho que
degustei e gostei veio de Navarra, um espanhol chamado San Antolin Reserva composto
pelas castas Cabernet Sauvignon (60%), Graciano (35%) e Garnacha (5%) da safra
2012.
Ah e mais um com mais de dez anos de garrafa, 11 anos para
ser mais preciso! Essa aventura dos vinhos velhos, sobretudo os espanhóis, tem
me levado a experiências sensoriais incríveis e esse, para não perder o costume,
surpreendeu positivamente! E para não perder o costume também falemos dessa
bela região que, a cada dia, venho me aventurando: Navarra!
DO (Denominação de Origem) Navarra
A região de Navarra (DO Navarra) fica ao norte da região de
Rioja, entre a parte baixa dos Pirenéus, até o rio Ebro, apresentando cerca de
11.500 hectares ocupados por vinhedos, graças ao seu solo extremamente fértil e
propício para o cultivo de inúmeras castas.
A viticultura começou já no século II a. C quando os romanos
criaram as primeiras adegas. Por muitos anos, o vinho foi produzido pelos
monges dos inúmeros monastérios desta antiga área vitivinícola.
Na idade Média, Navarra era um reino poderoso, aliado à
França, o que ajudou o desenvolvimento da viticultura. O fato que fica no
Caminho de Santiago aumentou a demanda, os vinhos de Navarra sendo recomendados
aos romeiros.
As videiras foram devastadas pela praga filoxera em 1892,
eliminando quase 98% das vinhas na época. No início do século XX, foram
replantadas vinhas com raízes do Novo Mundo. Produtores formaram cooperativas e
produziram vinho em grande quantidade, exportado a granel. Somente nos anos
1980, vinícolas privadas começaram a fazer vinhos de qualidade. A Denominación de Origen, originalmente
aprovada em 1933, foi modificada para refletir a transição de vinhos de massa
para vinhos de qualidade.
A região produz cerca de 89 milhões de litros de vinho por
ano, dos quais 30% são exportados. Apesar dos vinhos brancos da região fazerem
bastante sucesso e agradarem aos exigentes paladares da crítica especializada,
é a produção de vinhos tintos que se destaca em Navarra. Em decorrência disso,
70% da produção da área espanhola é constituída de vinhos tintos, sendo os
outros 25%, destinados a produção de vinhos brancos e rosés.
Diversas variedades de uva são cultivadas na região, como as
da casta Moscatel, Chardonnay, Mazuelo, Graciano, Merlot, Cabernet Sauvignon e
Viura. Entretanto, as uvas de maior sucesso da região de Navarra são a Garnacha
e a Tempranillo. Por muitos anos, a Garnacha foi de longe a variedade de uva
mais plantada nas vinhas, intercaladas com as fazendas de frutas e vegetais
pelas quais Navarra é tão famosa. Até pouco tempo atrás, as vinhas velhas de
Garnacha, dominavam o território.
Tempranillo ultrapassou Garnacha como a variedade mais
plantada, com Cabernet Sauvignon chegando em terceiro lugar. Os resultados são
muito respeitáveis, se muito raramente são excepcionais. As bodegas de Navarra
foram capazes de investir em carvalho francês para suas uvas francesas.
Consideravelmente auxiliados por um programa de pesquisa do
governo local, eles fizeram uma avaliação cuidadosa de variedades de uvas:
Cabernet Sauvignon, Merlot, Chardonnay e, especialmente, Tempranillo - que
agora produz alguns vinhos finos e concentrados, tipicamente envelhecidos em
carvalho americano.
Navarra tem clima continental, com verão seco e quente, e
invernos bem frios. Tem uma influência marítima vendo do mar Atlântico,
moderando as temperaturas durante a maduração das uvas, e a noite, as
temperaturas caiem no fim de agosto. A grande diversidade dos vinhos de Navarra
reflita a influência da confluência dos climas das 2 principais zonas de
produção da região, situação excepcional na península ibérica: atlântico na
Tierra Estella e na Baja Montaña; mediterrâneo na Ribera Alta e na Ribeja Baja.
Na década de 1980 a região começou a passar por grandes
mudanças, com a renovação de mentalidade trazida por produtores jovens e
inquietos, que culminou com a redescoberta e valorização das castas mais
tradicionais e de seus vinhedos de vinhas velhas. Como os preços médios ainda
permanecem mais baixos que os da Rioja, os vinhos de Navarra tornaram-se opções
muito interessantes.
E agora finalmente o vinho!
Na taça revela um lindo e instigante vermelho rubi intenso,
escuro com halos evoluídos, de cor atijolada denotando seus 11 anos. Tem
lágrimas em profusão, grossas, lentas e que mancham o bojo.
No nariz traz um bouquet exalando frutas pretas maduras, onde
se destacam amoras e cereja preta, com notas amadeiradas, graças aos seus 24
meses em barricas de carvalho francês, bem integradas ao conjunto do vinho,
além de baunilha, couro, tabaco, estrebaria, chocolate e baunilha,
conferindo-lhe complexidade.
Na boca é seco, de estrutura mediana, cheio, untuoso e
alcoólico, mas com muita elegância graças aos seus 11 anos de garrafa.
Replicam-se as percepções amadeiradas, trazendo a torrefação, tosta e algo de caramelo e mentolado e frutadas como no aspecto olfativo, com
taninos persistentes, porém redondos e marcantes, com baixa acidez e um final
de média persistência e retrogosto frutado.
Um misto de sentimentos me tomou de assalto quando degustei o
San Antolin Reserva: o prazer de degustar um vinho com 11 anos de vida, o que,
convenhamos não é cotidiano, e pelo fato de carregar, de ostentar o título de
“Reserva”, um reserva espanhol que traz todo o rigor da famosa “Lei 24/2003, de 10 de julho, sobre vinha e vinho”.
Sobre a Bodega Señorio de Sarría:
Embora a adega tenha sido fundada em 1953, muitos séculos de
história contemplam estas terras como zona de cultivo de vinha. Diz a história
que o Senhor de Sarría desde a Idade Média, por intermédio de crônicas da
época, acompanhou o rei Sancho El Fuerte na batalha de Las Navas de Tolosa em
1212.
Séculos depois, no século XVI, a história do Señorío e
Navarra se confunde ainda mais, já que o então senhor de Sarría (Juan de
Azpilicueta), irmão de San Francisco Javier (atual patrono de Navarra), pagou
seus estudos em Paris, com os rendimentos obtidos na pecuária e exploração
agrícola desta fazenda. O manuscrito no qual San Francisco Javier agradece a
seu irmão por esta ajuda ainda é preservado hoje.
E foi muitos anos depois, em 1953, quando o renomado
empresário navarro Don Félix Huarte comprou o Señorío, realizou as novas
plantações de vinhedos e construiu a vinícola, passando a produzir e
comercializar vinhos com a marca Señorío de Sarría.
Posteriormente, em 1981, a adega separou-se da família Huarte
e iniciou uma nova etapa, que teve um importante renascimento em 2001, dando
início a um novo e ambicioso projeto de renovação de instalações e vinhas, de
forma a estar na vanguarda do panorama nacional e internacional mercado.
Situado em Puente La Reina, no coração do Caminho de
Santiago, o Señorío de Sarría está localizado em uma área que oferece condições
de clima e solo imbatíveis, o que permite a produção de uma gama de vinhos da
mais alta qualidade.
100 hectares de vinhas de múltiplas variedades estão
espalhados pelas encostas e espreguiçadeiras de Puente La Reina, Olite e
Corella. Cada planta, cada vinha, cada parcela, recebe um cuidado primoroso e
um acompanhamento particular para produzir vinhos magníficos desde a sua
origem. Cada casta foi cuidadosamente selecionada e cultivada no local mais
adequado, tendo em conta as condições de luz, humidade e temperatura exigidas
em cada caso.
Mais informações acesse:
https://www.bodegadesarria.com/
Referências:
“Premium
Wines”: https://www.premiumwines.com.br/_regiao_olha.php?reg=72
“Vindame”: https://www.vindame.com.br/navarra
“Bella Cave”: https://www.bellecave.com.br/vinhos-de-navarra-na-espanha
“Mistral”: https://www.mistral.com.br/regiao/navarra