sábado, 16 de janeiro de 2021

Terranova Brut

A vida é construída por elos emocionais. Embora soe um tanto quanto passional, a realidade é essa e, convenhamos, mais do que necessária! São nossos “carimbos históricos”, que conta um pouco do nosso percurso, da nossa vida com algo ou alguém. Um dos momentos emblemáticos da minha vida, como enófilo, sobretudo naquela transição de que todo brasileiro apreciador de vinho passa, que é do vinho de mesa para as uvas vitis vinífera, foi ter degustado alguns rótulos da vinícola Miolo. A Miolo, com seus rótulos, foram os primeiros vinhos nacionais que eu degustei quando as minhas estruturas sensoriais estavam sendo construídas para o vinho, fizeram e fazem parte da minha história. Mas, há muito tempo eu não degustava um vinho desse produtor que hoje é líder de mercado neste segmento e que ganhou o mundo graças a sua expertise e sua grande capacidade de saber fazer, com qualidade, grandes rótulos, de muita tipicidade expressando grandemente o nosso terroir. Eu havia deixado, meio lado, os seus rótulos nesses últimos anos, a adega estava vazia da Miolo. Não sei dizer o motivo, exatamente, talvez os valores altos, uma oportunidade, não sei. Não quero especular o que de fato não importa muito, porque, depois de muito tempo eis que surge em minha adega, em minhas mãos, em minha taça um vinho da Miolo, para rememorar os bons tempos de outrora nos dias de hoje.

E o vinho que degustei e gostei não poderia ser melhor: um espumante brasileiro! Um grande espumante que veio de terras inusitadas para o cultivo do vinho que hoje, é uma grata realidade, de terras banhadas pelas águas de nosso patrimônio natural: o Vale São Francisco, o Velho Chico, no Vale são Francisco, na Bahia: É o Terranova brut, produzido pelo método charmat, não safrado, com um blend composto pelas castas: Chenin Blanc, Sauvignon Blanc e Verdejo, um “Blanc des Blancs”, um corte bem interessante que faz do vinho muito especial, a assinatura da Miolo para a produção dos melhores espumantes brasileiros. E com esse rótulo, vem também as histórias para contar, as informações que, agregados a nossa vida, se transforma em conhecimento adquirido. O que significa “Blanc des Blancs”? O Vale são Francisco e sua história...Muito para se contar!

Branco dos brancos

O termo “blanc de blancs” encontrado nas garrafas e publicidades de espumantes, é um termo bastante utilizado na região de Champagne na França e posteriormente estendeu-se a diversas outras regiões do mundo, incluindo o Brasil. Mas o que significa “blanc de blancs”? Blanc de blancs significa: espumante branco elaborado somente de uvas brancas.

Um espumante pode ser branco e ser elaborado de uvas tintas, como classicamente da uva Pinot Noir ou de uvas brancas, como por exemplo, da uva Chardonnay. Pode também ser elaborado de uma mistura (assemblage, corte ou blend) de uvas brancas e tintas, mesmo sendo um vinho espumante branco. A indicação “blanc de blancs” serve para que o consumidor saiba, que aquele espumante, ou aquele champagne, se for oriundo da região de Champagne na França, foi elaborado apenas com uvas brancas.

Vale São Francisco: Os vinhos do sol

A vitivinicultura do semiárido brasileiro é uma excepcionalidade no mundo, uma vez que está localizada entre os paralelos 8º e 9o S e produz, com escalonamento produtivo, uvas o ano todo totalizando duas safras e meia em condições ambientais adversas como alta luminosidade, temperatura média anual de 26oC, pluviosidade aproximada de 500mm, a 330m de altitude, em solo pedregoso.

Cinturão dos vinhos

Seus vinhos possuem público crescente, porque são jovens “vinhos do sol”, peculiares nos aromas e sabores, considerados como fáceis de beber e apresentando boa relação comercial qualidade/preço. Aliado a essas particularidades, diretamente associadas à produção de vinhos finos, o Vale é ainda cenário de diversas belezas naturais, históricas e culturais. Estudos já publicados permitem identificar que a região conta com diversas características que comprovam o seu potencial turístico para o desenvolvimento da atividade, como é o caso da sua história, riquezas ambientais e diversificada cultura regional. Esses fatores estão relacionados à diversidade observada na região. Isso é notado, principalmente, em decorrência da sua extensão. A Bacia do São Francisco é a terceira maior bacia hidrográfica do país e a única que está totalmente inserida no território nacional. Nela estão localizados 506 municípios contando com, aproximadamente, 13 milhões de habitantes, que representa 9,6% da população brasileira.

Bem antes do Vale do São Francisco se consolidar como polo de vitivinicultura, quem já exercia esse papel no Brasil era a região Sul. No século 19, o Rio Grande do Sul, mesmo com as condições climáticas desfavoráveis, passou a ser considerado um polo crescente nesse meio – e até hoje segue inserido no ramo. Mas, a chegada de imigrantes estrangeiros no país trouxe o conhecimento técnico e a noção de mercado, o que fez com que outras regiões brasileiras também mostrassem a sua capacidade produtiva. É na década de 1960 que o Nordeste entra em cena e o Vale do São Francisco inicia a sua trajetória na produção de uvas e vinhos, com a implantação das primeiras videiras. Nos anos de 1963 e 1964, foram instaladas duas estações experimentais, nos municípios de Petrolina, no Sertão de Pernambuco e Juazeiro, na Bahia, onde seriam implantados, respectivamente, o Projeto Piloto de Bebedouro e o Perímetro Irrigado de Mandacaru.

Vale do São Francisco

Apesar da escassez de chuva, o clima quente e seco do semiárido mostrou-se terreno fértil para a vitivinicultura e, na mesma década, outras cidades do Sertão de Pernambuco passam a fazer parte da cadeia produtiva. O pioneirismo da vitivinicultura no Nordeste é representado pelo Sertão Pernambucano, que iniciou a sua trajetória na vitivinicultura na década de 1960, produzindo vinhos base para vermutes, na cidade de Floresta, uvas de mesa em Belém do São Francisco e em Santa Maria da Boa vista, localidade que na época se chamava Coripós. Entre os anos 80 e 90, a região banhada pelo Rio São Francisco passa a ser conhecida também pela produção de vinhos finos, e em 1984 é produzido o primeiro vinho no Vale do Submédio São Francisco, com a marca Boticelli. O fortalecimento da vitivinicultura no Vale do Submédio São Francisco se deu com a instalação de vinícolas na Fazenda Milano, em Santa Maria da Boa Vista – PE e Fazenda Ouro Verde, em Casa Nova, na Bahia, que passaram a produzir vinhos finos. Ao longo da década de 1990, ganha destaque a vitivinicultura tecnificada e a produção de uvas sem sementes. É também nessa época, que cresce o investimento de grupos empresariais na região. A instalação de uma infraestrutura física, como construção de packing houses, melhoria no sistema rodoviário e portuário, e, sobretudo, a organização dos produtores em associações e cooperativas, desempenharam um importante papel na consolidação das exportações de uvas de mesa do Vale do Submédio São Francisco. A partir dos anos 2000, a produção se fortalece ainda mais com a implantação de outras vinícolas e vitivinícolas e também com as iniciativas públicas. Ações governamentais e de ensino, pesquisa e inovação, a partir do ano 2000, trouxeram novas tecnologias de produção e processamento de uvas e o reconhecimento de atores internacionais. É nessa época que surge a Escola do Vinho do Curso Superior de Tecnologia em Viticultura e Enologia, do Instituto Federal do Sertão Pernambucano.

Estruturação de IG (Indicação Geográfica)

A estruturação da Indicação de Procedência Vale do São Francisco para vinhos está vinculada a projeto financiado pelo MCT/Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tenológico - CNPq. A ação do projeto, voltada para a estruturação da IG, tem as seguintes instituições de CT&I como executoras: Embrapa Uva e Vinho (coordenação) em parceria com a Embrapa Semiárido, Embrapa Clima Temperado, UCS, UFLA, UFP e IF Sertão. O setor vitivinícola da região é representado pelo “Instituto do Vinho do Vale do São Francisco” (Vinhovasf). O projeto conta, ainda, com outras instituições que participam em diversas pesquisas para apoiar o desenvolvimento tecnológico da vitivinicultura da região do Vale do São Francisco. Os produtos IP Vale do São Francisco incluem os vinhos finos tranquilos brancos, rosados e tintos, o espumante fino e o moscatel espumante.

E agora finalmente o vinho!

Na taça apresenta um amarelo palha, bem claro, mas com reflexos esverdeados e reluzentes, brilhantes. Tem perlage em profusão e bem finas.

No nariz tem um caráter frutado, frutas brancas e cítricas, tais como abacaxi, limão siciliano, maracujá, pera e melão e agradável e delicado toque floral, graças à Chenin Blanc, ressaltados graças a opção da taça: um pouco mais bojuda que privilegia, que ressalta os aromas.

Na boca tem um ótimo frescor e jovialidade graças a sua boa acidez, que acredito seja cortesia da Sauvignon Blanc, com um ótimo equilíbrio e leveza, além de um final frutado e retrogosto persistente.

Um espumante excepcional, que expressa, com veemência, as características mais marcantes de um terroir improvável, mas que, com expertise e arrojo por parte de empreendedores do vinho, fizeram acontecer, entregando aos enófilos vinhos frescos, jovens, mas vibrantes. E, depois de tantas histórias, conceitos e conhecimentos agregados, a minha história com a Miolo foi restabelecida, com um caminho longo, mas prazeroso, a se percorrer! Há de se ter mais vinhos, porque sou merecedor deles, como um enófilo, como um apreciador de vinhos. E por falar em merecimento e qualidade, esse Terranova brut é digno de sua história, de seu DNA: um vinho fresco, jovem, direto, mas com a personalidade de uma região que, a cada dia cresce, em estrutura e qualidade. Castas típicas da Espanha, França encontraram em terras brasileiras um cultivo ideal entregando, para nosso deleite, vinhos sensacionais, e que esse Terranova entrega maravilhosamente! Teor alcoólico de 12%.

Terranova Brut harmonizado com um belo queijo Gruyere

Sobre a Vinícola Terranova:

O Grupo Miolo, além de sua presença forte no Rio Grande do Sul, é dona também da Vinícola Terranova, em Casa Nova, na Bahia. Eles adquiriram a Fazenda Ouro Verde, onde hoje está a Vinícola Terranova, no ano 2000. Na época, já existia uma pequena vinícola em funcionamento no local, que foi totalmente restaurada e ampliada. A construção da nova vinícola começou em 2002 e levou dez anos para ser totalmente concluída. Hoje 10% da produção é destinada ao mercado internacional. Desde sua abertura para o público, eles recebem cerca de 2.500 visitantes por mês. São 683 hectares, área que compreenderia uma cidade de 30 mil habitantes. Desses, 200 hectares são dedicados ao plantio das uvas. É horizonte de parreiras a perder de vista.

Vinícola Terranova

Diferentemente da maioria dos vinhedos, a Terranova conta com até duas safras e meia de uvas por ano devido ao controle que faz do ciclo das parreiras. Ou seja, o ciclo normal que leva um ano na maior parte do mundo, ali leva apenas 4 meses. De um lado elas estão verdejantes e carregadas de uvas, do outro lado elas estão nascendo ou ainda na fase de poda. Esta é a região mais seca do Brasil. Anualmente contam com 3.100 horas de sol e apenas 400mm de chuvas anuais. O inverno nunca chega diferentemente da maioria das vinícolas ao redor do mundo (incluindo as brasileiras). O que causa tal milagre é a irrigação contínua e localizada por sistema de gotejamento do Rio São Francisco. A plantação é dedicada à uva perfeita para espumantes, vinhos jovens e frutados, e também do melhor suco de uva integral que você encontrará no mercado.

Sobre a Vinícola Miolo:

A história da família Miolo no Brasil começa em 1897. Entre os milhares de imigrantes italianos que vieram ao país em busca de oportunidades, estava Giuseppe Miolo, um jovem que já tinha nas veias a paixão pela uva e pelo vinho, vindo da localidade de Piombino Dese, no Vêneto. Ao chegar ao Brasil, Giuseppe foi para Bento Gonçalves, município recém-formado por imigrantes italianos. Entregou suas economias em troca de um pedaço de terra no vale dos vinhedos, chamado Lote 43. Já em 1897, o imigrante começou a plantar uvas, dando início a tradição vitícola da família no Brasil.

Na década de 70, a família foi pioneira no plantio de uvas finas, fazendo com que os netos de Giuseppe Miolo, Darcy, Antônio e Paulo, ficassem muito conhecidos na região pela qualidade de suas uvas. No final da década de 80, uma crise atingiu as cantinas dificultando a comercialização de uvas finas e forçando a família Miolo, a partir de 1989, a produzir o seu próprio vinho para a venda a granel para outras vinícolas. Surge a Vinícola Miolo, com apenas 30 hectares de vinhedos. Em 1992 a primeira garrafa assinada pela família foi um Merlot safra 1990, que na partida inicial teve 8 mil garrafas produzidas. Em 1994 é lançado o Miolo Seleção, que logo se torna o vinho mais distribuído da Miolo.

A paixão pela vitivinicultura e o desejo de levar mundo afora o vinho fino brasileiro foi o que inspirou a família Miolo a tomar a decisão de expandir o negócio. Inicia-se em 1998 o Projeto Qualidade. Desde então o crescimento da empresa foi significativo: com investimentos constantes na terra, tecnologia, recursos humanos e no próprio consumidor, iniciou-se também o Projeto de Expressão do terroir brasileiro.

Instalado na Estância Fortaleza do Seival, localizada no Sul do Brasil, no município de Candiota, próximo à divisa com o Uruguai, o “Projeto Seival”, nos anos 2000. Em 2001 a Família Miolo juntamente com a família Benedetti (Lovara) iniciam o projeto Terranova no Vale do São Francisco, adquirindo a antiga propriedade do Sr. Mamoro Yamamoto chamada Fazenda Ouro Verde. Em 2009 a Família Miolo, juntamente com a família Benedetti e a família Randon, adquirem a Vinícola Almadén pertencente a Pernod Ricard. Sendo também uma das mais importantes do segmento de vinhos no mercado nacional, introduzindo a colheita mecânica, pioneira no Brasil.

Mais informações acesse:

https://www.miolo.com.br/

Referências de pesquisa:

“Enoestilo”: https://www.enoestilo.com.br/dica-de-vinho-do-dia-blanc-de-blancs/

“Academia do Vinho”: https://www.academiadovinho.com.br/__mod_regiao.php?reg_num=BR04

“Revistas Unifacs”: https://revistas.unifacs.br/index.php/rde/article/viewFile/4017/2739

“Blog Vinho Tinto”: https://www.blogvinhotinto.com.br/destaquesdoblog/ja-conhece-os-vinhos-do-vale-do-sao-francisco/

“Enovírtua”: https://www.enovirtua.com/enoturismo/producao-de-uvas-e-vinhos-no-vale-do-sao-francisco-uma-historia-que-comeca-na-decada-de-1960/#:~:text=%C3%89%20na%20d%C3%A9cada%20de%201960,a%20implanta%C3%A7%C3%A3o%20das%20primeiras%20videiras.&text=Ao%20longo%20da%20d%C3%A9cada%20de,produ%C3%A7%C3%A3o%20de%20uvas%20sem%20sementes.

“Embrapa”: https://www.embrapa.br/uva-e-vinho/indicacoes-geograficas-de-vinhos-do-brasil/ig-em-estruturacao/vale-do-sao-francisco

“Site Terra”: https://chickenorpasta.com.br/2018/enoturismo-na-bahia-visitando-a-vinicola-terranova

 

 

 

 









 

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