domingo, 30 de julho de 2023

Alfacinha Fernão Pires (50%) e Arinto (50%) 2021

 

Definitivamente o vinho está ligado a história de seu povo, a história e cultura da região a qual foi concebido. É inacreditável, pelo menos é o que me parece, dissociar isso e também o enófilo dissociar isso de sua realidade e limitar-se a degustação.

Evidente que a degustação é o primordial e o ápice de quem aprecia a poesia líquida, mas nada melhor que trazer o “tempero” da história às degustações. E não se pode enganar que até as castas, os blends, tudo está ligado ao terroir, está ligado com a sua região.

O vinho de hoje, a degustação de hoje “harmoniza” perfeitamente com essa convergência entre o vinho e a sua degustação com a cultura e a história de seu povo e de sua forma de conceber os rótulos.

A começar pelo blend: Fernão Pires e Arinto. Não há como negar que esse corte de cepas típicas de todas as regiões lusitanas impera, claro, em todas as regiões e é um corte maravilhoso. Entrega e enaltece o que há de melhor nas características das duas uvas: frescor, leveza, boa acidez, entre outros.

Degustei do Tejo, degustei de Setúbal e definitivamente me arrebatou e agora vem de Lisboa o próximo rótulo. E esse é um tanto quanto famoso em nossas terras, talvez um dos mais vendidos lisboetas no Brasil e não preciso dizer que Lisboa entrou em minha enófila vida e com aquela intensidade.

Mas nesse rótulo não é só Lisboa, mas a história que cerca o povo dessa cidade, por isso que comecei esse texto com a questão da “harmonização” da história, cultura e vinho, bem como as suas manifestações comportamentais.

E sem mais delongas vamos às apresentações do vinho: O vinho que degustei e gostei veio, claro, de Lisboa e se chama Alfacinha, um branco composto por Fernão Pires (50%) e Arinto (50%) da safra 2021.

E por que o vinho se chama “Alfacinha”? Em Portugal, quem nasce na capital Lisboa é conhecido por “alfacinha”. Segundo alguns dos habitantes dessa cidade, o apelido se deve ao fato de eles serem pacíficos e pequenos. Outros falam que suas sacadas estão cheias da hortaliça.

Para ajudar na solução deste mistério, o Gabinete de Estudos Olisiponenses (olisiponense = de Lisboa) enviou um grupo de documentos de sua vasta biblioteca. Deles, podem-se tirar as seguintes explicações:

Os lisboetas comiam muita alface

Em 1943, Fernanda Reis publicou um artigo no Boletim do “Grupo Amigos de Lisboa” um artigo com o título “Alfacinhas”, em que saiu pela capital portuguesa perguntando sobre a razão do nome. “Explicaram-me que tal soubriquet (apelido) viera aos da capital por serem muito amigos de alfaces e pôr as comerem exageradamente”, escreveu ela.

As mulheres de Lisboa não se moviam muito, assim como a hortaliça

Diz Fernanda Reis, no mesmo texto: “Talvez se possa avaliar qualquer coisa de suas antepassadas que viviam como aves de estimação fechadas em casas-gaiola e só usavam de uma liberdade muito reduzida para ir à Igreja, para cumprir o dever de uma visita ou ainda para figurar na romaria devota de uma procissão”.

Os lisboetas gostavam de visitar o campo

Segundo a revista LX Metrópole, de maio de 2002, os portugueses gostavam de “ir às hortas (…) em busca de  frescura, da sombra das árvores e do folguedo”.

A alface era abundante 

Em um jornal de 1984, na coluna O Poço da Cidade, aparecem ainda outras explicações. “Há quem explique que nas colinas de Lisboa primitiva verdejavam já as plantas hortenses utilizadas na culinária, na perfumaria e na medicina, que dão pelo nome de alfaces. ‘Alface’ vem do árabe, o que poderá indicar que o cultivo da planta começou quando da ocupação da península pelos pelos fiéis de Alá”.

Os lisboetas já tiveram de viver só da hortaliça

Continua a coluna O Poço da Cidade: “Há também quem sustente que, num dos cercos que a cidade foi alvo, os habitantes da capital portuguesa tinham como alimento quase exclusivo as alfaces de suas hortas”.

Por sorte, as explicações acima não são conflitantes e pode-se concluir facilmente que os nascidos em Lisboa são chegados nessa folhinha verde.

Lisboa

A costa de Portugal é muito privilegiada para a produção vitivinícola graças à sua posição em relação ao Oceano Atlântico, à incidência de ventos, ao solo e ao relevo que constituem o local.

Entre as principais áreas produtoras podemos citar a região dos vinhos de Lisboa, antigamente conhecida como Estremadura, famosa tanto por tintos encorpados como por brancos leves e aromáticos.

Lisboa

Tem mais de 30 hectares de cultivo com mais de 9 mil aptas à produção de Vinho Regional de Lisboa e Vinho com Denominação de Origem Controlada. O nome passou em 2009 para Lisboa de forma a diferenciar da região de mesmo nome na Espanha, também produtora de vinhos.

O litoral da IGP Lisboa corre para o sul de Beiras a partir da capital de Portugal, onde o rio Tejo encontra o Oceano Atlântico. Suas características geográficas proporcionam certa complexidade à região, pois está situada climaticamente em zona de transição dos ventos úmidos e estios, com solo de idades variadas, secos, encostas e maciços montanhosos se contrapõem a várzeas e terras de aluvião.

Ainda sofre influência direta da capital do país localizada em um extremo da região. Uma de suas características determinantes é a grande variedade de solos, como terras de aluvião (sedimentar), calcário secundário, várzeas e maciços montanhosos, muitas vezes misturados. Cada um desses terrenos pode proporcionar às uvas características completamente diferentes.

Lisboa

Esta região possui boas condições para produzir vinhos de qualidade, todavia há cerca de quinze anos atrás a região de Lisboa era essencialmente conhecida por produzir vinho em elevada quantidade e de pouca qualidade. Assim, iniciou-se um processo de reestruturação nas vinhas e adegas.

Provavelmente a reestruturação mais importante realizou-se nas vinhas, uma vez que as novas castas plantadas foram escolhidas em função da sua produção em qualidade e não em quantidade. Hoje, os vinhos da Região de Lisboa são conhecidos pela sua boa relação qualidade/preço.

A região concentrou-se na plantação das mais nobres castas portuguesas e estrangeiras e em 1993 foi criada a categoria “Vinho Regional da Estremadura”, hoje "Vinho Regional Lisboa". A nova categoria incentivou os produtores a estudar as potencialidades de diferentes castas e, neste momento, a maior parte dos vinhos produzidos na região de Lisboa são regionais (a lei de vinhos DOC é muito restritiva na utilização de castas).

Entre as principais uvas cultivadas podemos citar as brancas Arinto, Fernão Pires (ambas naturais de Portugal) e Malvasia, e as tintas, Alicante Bouschet, Castelão, Touriga Nacional e Aragonez (como é chamada a Tempranillo na região).

Acredita-se que a elaboração de vinhos seja uma atividade desde o século 12, quando os monges da Ordem de Cister se estabeleceram na região. Uma de suas principais funções era justamente a produção da bebida para a celebração de missas.

A Região de Lisboa é constituída por nove Denominações de Origem: Colares, Carcavelos e Bucelas (na zona sul, próximo de Lisboa), Alenquer, Arruda, Torres Vedras, Lourinhã e Óbidos (no centro da região) e Encostas d’Aire (a norte, junto à região das Beiras).

DO Lisboa

A Região de Lisboa é constituída por nove Denominações de Origem: Colares, Carcavelos e Bucelas (na zona sul, próximo de Lisboa), Alenquer, Arruda, Torres Vedras, Lourinhã e Óbidos (no centro da região) e Encostas d’Aire (a norte, junto à região das Beiras).

As regiões de Colares, Carcavelos e Bucelas outrora muito importantes, hoje têm praticamente um interesse histórico. A proximidade da capital e a necessidade de urbanizar terrenos quase levaram à extinção das vinhas nestas Denominações de Origem.

A Denominação de Origem de Bucelas apenas produz vinhos brancos e foi demarcada em 1911. Os seus vinhos, essencialmente elaborados a partir da casta Arinto, foram muito apreciados no estrangeiro, especialmente pela corte inglesa. Os vinhos brancos de Bucelas apresentam acidez equilibrada, aromas florais e são capazes de conservar as suas qualidades durante anos.

Colares é uma Denominação de Origem que se situa na zona sul da região de Lisboa. É muito próxima do mar e as suas vinhas são instaladas em solos calcários ou assentes em areia. Os vinhos são essencialmente elaborados a partir da casta Ramisco, todavia a produção desta região raramente atinge as 10 mil garrafas.

A zona central da região de Lisboa (Óbidos, Arruda, Torres Vedras e Alenquer) recebeu a maioria dos investimentos na região: procedeu-se à modernização das vinhas e apostou-se na plantação de novas castas.

Hoje em dia, os melhores vinhos DOC desta zona provêm de castas tintas como, por exemplo, a casta Castelão, a Aragonez (Tinta Roriz), a Touriga Nacional, a Tinta Miúda e a Trincadeira que por vezes são lotadas com a Alicante Bouschet, a Touriga Franca, a Cabernet Sauvignon e a Syrah, entre outras. Os vinhos brancos são normalmente elaborados com as castas Arinto, Fernão Pires, Seara-Nova e Vital, apesar da Chardonnay também ser cultivada em algumas zonas.

A região de Alenquer produz alguns dos mais prestigiados vinhos DOC da região de Lisboa (tintos e brancos). Nesta zona as vinhas são protegidas dos ventos atlânticos, favorecendo a maturação das uvas e a produção de vinhos mais concentrados. Noutras zonas da região de Lisboa, os vinhos tintos são aromáticos, elegantes, ricos em taninos e capazes de envelhecer alguns anos em garrafa. Os vinhos brancos caracterizam-se pela sua frescura e carácter citrino.

A maior Denominação de Origem da região, Encostas d’Aire, foi a última a sofrer as consequências da modernização. Apostou-se na plantação de novas castas como a Baga ou Castelão e castas brancas como Arinto, Malvasia, Fernão Pires, que partilham as terras com outras castas portuguesas e internacionais, como por exemplo, a Chardonnay, Cabernet Sauvignon, Aragonez, Touriga Nacional ou Trincadeira. O perfil dos vinhos começou a alterar-se: ganharam mais cor, corpo e intensidade.

E agora finalmente o vinho!

Na taça traz um amarelo palha, bem brilhante, diria intenso e citrinos com reflexos esverdeados. Tem discretas e rápidas lágrimas finas.

No nariz é bem aromático, com a predominância das notas frutadas, frutas cítricas e tropicais, de polpa branca, como pera, maçã-verde, limão, com ênfase no abacaxi e diria pêssego, com toques florais agradáveis que denota frescor e uma mineralidade igualmente agradável.

Na boca protagoniza as frutas tropicais e cítricas, como no aspecto olfativo, trazendo o frescor e leveza igualmente percebida no olfato. O álcool é um tanto quanto perceptível, o que confirma o aparecimento das lágrimas no aspecto visual, mas que não compromete em nada o conjunto do vinho, tendo uma acidez correta, equilibrada e um final de média a alta persistência.

Cultura, história, sociedade, comportamento, tudo harmoniza maravilhosamente com o vinho e o faz ainda melhor! As características não são apenas do terroir, das suas cepas, mas também do seu povo, da sua história, da sua gente e Portugal faz dessa convergência a realidade de seus vinhos, o apelo regional é pleno, vívido e transborda, de forma latente, em nossas taças. Tem 12% de teor alcoólico.

Sobre a Quinta do Gradil (Parras Wines):

A Parras Vinhos de Luís Vieira nasce no ano de 2010, atualmente com sede em Alcobaça, onde também está instalada a unidade de engarrafamento do grupo. Cinco anos depois, com a empresa consolidada e voltada para o mercado internacional, surge a necessidade de se fazer um reposicionamento de marca e “vesti-la” de outra forma, mais atual.

É assim que no início de 2016 aparece a Parras Wines, mais jovem, mais flexível, e numa linguagem universal para que possa ser facilmente compreendida por todos, mesmo os que estão além-fronteiras.

Descendente de um pai e de um avô que sempre trabalharam com vinho, Luís Vieira é o único dono deste projeto. Aos cinco anos caiu num depósito de vinho e quase morreu afogado, não fosse um colaborador do avô na altura, que atualmente é seu, tê-lo salvo. Hoje, recorda com graça esse episódio e diz mesmo que simboliza o seu “batismo nestas andanças do vinho”.

A empresa começa então a formar-se com terra própria na Região Vitivinícola de Lisboa, mais exatamente na freguesia do Vilar, Cadaval, com duzentos hectares de propriedade em extensão, sendo que 120 são hoje de vinha plantada.

Na mesma região do país, um bocadinho mais acima, na zona de Óbidos, a Parras Wines é também responsável pela exploração de 20 hectares de vinha que dão origem aos vinhos Casa das Gaeiras. Com sede em Alcobaça, nas antigas instalações de uma fábrica de faianças, deu-se início a uma nova área de negócio – uma Unidade de Engarrafamento de Bebidas, que hoje serve também de sede à Parras Wines e que se chama Goanvi.

Cinco anos mais tarde, em 2010, constitui-se então a Parras Vinhos, hoje Parras Wines. Para além de terra na Região de Lisboa, o grupo começou paralelamente a produzir vinhos de outras regiões do país. Através de parcerias com produtores locais, a empresa consegue assim dar resposta às necessidades globais que iam surgindo do mercado, produzindo vinhos do Douro, Vinhos Verdes, Dão, Lisboa, Tejo, Península de Setúbal e Alentejo.

Mais informações acesse:

https://www.parras.wine/pt/

Referências:

“Blog Divvino”: https://www.divvino.com.br/blog/vinho-lisboa/

“Olhar Turístico”: https://www.olharturistico.com.br/regiao-dos-vinhos-de-lisboa/

“Belle Cave”: https://www.bellecave.com.br/vinhos-de-lisboa-saiba-mais-sobre-essa-regiao-produtora

“Infovini”: http://www.infovini.com/pagina.php?codNode=3901

“Veja”: https://veja.abril.com.br/coluna/duvidas-universais/por-que-os-habitantes-de-lisboa-sao-chamados-de-alfacinhas/#:~:text=Em%20Portugal%2C%20quem%20nasce%20na,sacadas%20est%C3%A3o%20cheias%20da%20hortali%C3%A7a.

  








sábado, 29 de julho de 2023

Miolo Single Vineyard Syrah 2020

 

Sempre tenho a alegria e o prazer de falar que a vinícola Miolo tem um lugar de destaque em meu coração. Há uma forte ligação afetiva, além, claro, da questão da qualidade que me une desde sempre.

Os vinhos da Miolo foram os grandes responsáveis por me iniciar nas degustações dos vinhos de variedades vitis vinífera, sobretudo os de entrada, que tinha um acesso monetário melhor, por ser barato, bem como as facilidades de compra, pois os encontrava e ainda encontra em vários supermercados e atualmente em sites específicos de compra de vinhos.

Ao longo dos anos novas possibilidades de opções de compra me apresentaram outros rótulos, de camadas de propostas distintas, descortinando um vastíssimo e qualificado portfólio de rótulos que também foram surgindo, graças ao crescimento mercadológico da vinícola que hoje atua fortemente em mercados exteriores, como a Inglaterra, por exemplo, com rótulos especiais para este país.

A Miolo hoje entrega uma linha de rótulos conhecidos como “Single Vineyard” que, a grosso modo, significa “vinhedos únicos”, de regiões emblemáticas com destaque para a Campanha Gaúcha, Vale de São Francisco e outros. Regiões que conquistaram suas indicações de procedências, o que valida a sua tipicidade, o seu terroir.

O meu primeiro rótulo degustado dessa linha foi o Miolo Single Vineyard Touriga Nacional da safra 2019 que dispensa comentários, e o segundo que degustei e também gostei é o Miolo Single Vineyard Syrah, do Vale de São Francisco, no nordeste brasileiro da “safra das safras”, 2020. Esse definitivamente foi mais um vinho que degustei e gostei dessa linha da Miolo Single Vineyard.

Miolo Single Vineyard: Vinhedos únicos da Miolo

A linha Miolo Single Vineyard surgiu há cerca de três anos, com a proposta de aguçar o que há de mais especial no portfólio Miolo: o vinhedo único e inigualável.

Com o custo de aproximadamente 60 reais por garrafa, eles carregam dentro de si a força do terroir, fato resultante de todo um trabalho de mapeamento de solos. O que se pode esperar disso tudo é a alta qualidade, típica de uma produção selecionada e especial. A linha é composta pelos rótulos Alvarinho e Riesling Johannisberg, Pinot Noir, Syrah e Touriga Nacional.

A linha Miolo Single Vineyard pretende unir com precisão o custo-benefício de cada produto, duas vertentes perfeitamente possíveis de coexistirem, a partir de um trabalho que buscou mapear as características de solos, analisando fatores como densidade do plantio e seu nível de exposição solar.

A casta Syrah

O Syrah possui origem Bahiana, do Vale do São Francisco, constituindo um vinho tinto, com características do solo Toca do Mandacaru. Trata-se de uma região semiárida, com temperaturas tão específicas, que fazem com que o vinhedo conte com a irrigação do rio, o que lhe confere o título de vinho tropical de identidade própria.

Vale do São Francisco: os vinhos do Velho Chico

A vitivinicultura do semiárido brasileiro é uma excepcionalidade no mundo, uma vez que está localizada entre os paralelos 8º e 9o S e produz, com escalonamento produtivo, uvas o ano todo totalizando duas safras e meia em condições ambientais adversas como alta luminosidade, temperatura média anual de 26oC, pluviosidade aproximada de 500mm, a 330m de altitude, em solo pedregoso.

Cinturão dos vinhos

Seus vinhos possuem público crescente, porque são jovens “vinhos do sol”, peculiares nos aromas e sabores, considerados como fáceis de beber e apresentando boa relação comercial qualidade/preço. Aliado a essas particularidades, diretamente associadas à produção de vinhos finos, o Vale é ainda cenário de diversas belezas naturais, históricas e culturais. 

Estudos já publicados permitem identificar que a região conta com diversas características que comprovam o seu potencial turístico para o desenvolvimento da atividade, como é o caso da sua história, riquezas ambientais e diversificada cultura regional.

Esses fatores estão relacionados à diversidade observada na região. Isso é notado, principalmente, em decorrência da sua extensão. A Bacia do São Francisco é a terceira maior bacia hidrográfica do país e a única que está totalmente inserida no território nacional. Nela estão localizados 506 municípios contando com, aproximadamente, 13 milhões de habitantes, que representa 9,6% da população brasileira.

Bem antes do Vale do São Francisco se consolidar como polo de vitivinicultura, quem já exercia esse papel no Brasil era a região Sul. No século 19, o Rio Grande do Sul, mesmo com as condições climáticas desfavoráveis, passou a ser considerado um polo crescente nesse meio – e até hoje segue inserido no ramo. Mas, a chegada de imigrantes estrangeiros no país trouxe o conhecimento técnico e a noção de mercado, o que fez com que outras regiões brasileiras também mostrassem a sua capacidade produtiva.

É na década de 1960 que o Nordeste entra em cena e o Vale do São Francisco inicia a sua trajetória na produção de uvas e vinhos, com a implantação das primeiras videiras. Nos anos de 1963 e 1964, foram instaladas duas estações experimentais, nos municípios de Petrolina, no Sertão de Pernambuco e Juazeiro, na Bahia, onde seriam implantados, respectivamente, o Projeto Piloto de Bebedouro e o Perímetro Irrigado de Mandacaru.

Vale do São Francisco

Apesar da escassez de chuva, o clima quente e seco do semiárido mostrou-se terreno fértil para a vitivinicultura e, na mesma década, outras cidades do Sertão de Pernambuco passam a fazer parte da cadeia produtiva. 

O pioneirismo da vitivinicultura no Nordeste é representado pelo Sertão Pernambucano, que iniciou a sua trajetória na vitivinicultura na década de 1960, produzindo vinhos base para vermutes, na cidade de Floresta, uvas de mesa em Belém do São Francisco e em Santa Maria da Boa vista, localidade que na época se chamava Coripós.

Entre os anos 1980 e 1990, a região banhada pelo Rio São Francisco passa a ser conhecida também pela produção de vinhos finos, e em 1984 é produzido o primeiro vinho no Vale do Submédio São Francisco, com a marca Boticelli. 

O fortalecimento da vitivinicultura no Vale do Submédio São Francisco se deu com a instalação de vinícolas na Fazenda Milano, em Santa Maria da Boa Vista – PE e Fazenda Ouro Verde, em Casa Nova, na Bahia, que passaram a produzir vinhos finos.

Ao longo da década de 1990, ganha destaque a vitivinicultura tecnificada e a produção de uvas sem sementes. É também nessa época, que cresce o investimento de grupos empresariais na região. A instalação de uma infraestrutura física, como construção de packing houses, melhoria no sistema rodoviário e portuário, e, sobretudo, a organização dos produtores em associações e cooperativas, desempenharam um importante papel na consolidação das exportações de uvas de mesa do Vale do Submédio São Francisco.

A partir dos anos 2000, a produção se fortalece ainda mais com a implantação de outras vinícolas e vitivinícolas e também com as iniciativas públicas. Ações governamentais e de ensino, pesquisa e inovação, a partir do ano 2000, trouxeram novas tecnologias de produção e processamento de uvas e o reconhecimento de atores internacionais. É nessa época que surge a Escola do Vinho do Curso Superior de Tecnologia em Viticultura e Enologia, do Instituto Federal do Sertão Pernambucano.

Indicação Geográfica (IG) do Vale do São Francisco

O Vale do São Francisco é a nova Indicação Geográfica (IG) do Brasil para vinhos finos, nobres, espumantes naturais e moscatel espumante. A região recebeu o selo na modalidade Indicação de Procedência (IP) e o registro foi publicado na Revista da Propriedade Industrial do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI).

A nova indicação geográfica valerá para as cidades de Lagoa Grande (PE), Petrolina (PE), Santa Maria da Boa Vista (PE), Casa Nova (BA) e Curaçá (BA) e a expectativa é que traga mais olhares e investidores para a região vitivinícola.

A busca pela Indicação Geográfica na região é antiga e nasceu em 2002 com o reconhecimento do Vale dos Vinhedos, já a vitivinicultura nasceu em 1960 com a organização da produção agrícola irrigada no Vale do Rio São Francisco. A irrigação permitiu que as terras com caatinga, até então consideradas improdutivas, se tornassem áreas verdes ao longo das margens do rio.

A região do Vale do Rio São Francisco possui características únicas para a viticultura e produção de vinho. Seu clima permite duas podas e duas safras anuais e o resultado é um vinho geralmente frutado, de baixo teor alcóolico e acidez moderada. No Vale do São Francisco os espumantes predominam com três milhões de litros produzidos anualmente contra 1,5 milhão de litros dos vinhos tranquilos.

A Indicação Geográfica Vale do São Francisco autoriza a produção de vinhos tranquilos brancos, rosés ou tintos e espumantes brancos ou rosés que podem ser bruts, demi-secs ou moscatéis. A uva para a produção do vinho tem que ser 100% proveniente da região delimitada e são autorizadas 23 castas diferentes.

E agora finalmente o vinho!

Na taça revela uma linda e brilhante coloração rubi intensa, escura, de tons violáceos, com lágrimas finas e lentas em profusão que desenham as bordas do copo.

No nariz explode em aromas de frutas vermelhas e pretas bem maduras, com destaque para ameixa, amora, cereja, com nuances defumadas e de especiarias, entregando algo como pimenta preta e ervas e um amadeirado presente, mas bem integrado ao vinho, dando o aporte de baunilha, café tostado e tabaco.

Na boca é quente, cheio, com alguma estrutura e complexidade e personalidade, mas é macio, redondo e equilibrado. As notas frutadas ganham protagonismo, como no aspecto olfativo, a madeira é mais discreta, mas dá o seu ar da graça, graças aos doze meses de passagem por barricas de carvalho, trazendo o chocolate, a baunilha. Tem taninos presentes e rústicos, mas afinados pela madeira, com uma acidez vibrante, salivante e um final persistente.

Além da tipicidade, da especificidade de um vinhedo único que lhe garante uma característica forte do terroir é também o privilégio de se degustar um vinho do nordeste brasileiro, de terras improváveis para o cultivo e que, graças ao “Velho Chico”, há vindimas em todos os períodos do ano o que torna essa região incrível. E nessa terra a Syrah ganhou representatividade, é bem cultivada. Que o Velho Chico nos traga novas experiências enosensoriais como essa. Tem 14% de teor alcoólico.

Sobre a Vinícola Miolo:

A paixão pelo mundo fascinante do vinho é facilmente explicada pela história da família Miolo que, além de trabalhar na vitivinicultura desde a chegada de Giuseppe no Brasil em 1897, inova ano após ano.

Uma das fundadoras do projeto Wines of Brasil, a Miolo Wine Group é a maior exportadora de vinhos do Brasil e a mais reconhecida no mercado internacional. A produção dentre as 4 vinícolas do grupo soma, em média, 10 milhões de litros por ano numa área cultivada de vinhedos próprios com aproximadamente 1.000 hectares.

A Miolo exporta para mais de 30 países de todos os continentes. É o maior exportador de vinhos finos do Brasil. De 30 hectares em 1989, a Miolo cultiva hoje, 30 safras mais tarde, cerca de 950 hectares de vinhedos em quatro terroirs brasileiros: Vale dos Vinhedos (Serra Gaúcha), Seival/Candiota (Campanha Meridional), Almadén/Santana do Livramento (Campanha Central) e Terranova/Casa Nova (Vale do São Francisco), sendo a única empresa do setor genuinamente brasileira com atuação em quatro diferentes regiões produtoras.

Com uma produção anual de cerca de 10 milhões de litros, é a marca que detém o maior portfólio de rótulos verde amarelos, exibindo centenas de prêmios conquistados no mundo inteiro. O pioneirismo na elaboração dos vinhos se estendeu para o enoturismo, onde a marca gera experiência, aproximando e formando novos apreciadores da bebida.

Assim é no Vale dos Vinhedos com o Wine Garden Miolo, assim é no Vale do São Francisco com o Vapor do Vinho pelo Velho Chico, onde a Miolo transformou o sertão em vinhedo. Este mesmo espírito empreendedor que fez da pequena vinícola familiar a maior produtora de vinhos finos do Brasil em apenas 30 safras, é que move gerações e aproxima quem sonha de quem quer fazer. 

Mais informações acesse:

https://www.miolo.com.br/

Referências:

“O Globo”: https://oglobo.globo.com/blogs/saideira/post/2022/11/vinhos-do-vale-do-sao-francisco-terao-indicacao-de-procedencia-entenda-a-conquista-e-conheca-rotulos-da-regiao.ghtml

“Revista Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/vale-do-sao-francisco-recebe-selo-de-indicacao-geografica.html

“Werle”: https://www.werlecomercial.com.br/linha-miolo-single-vineyard-review-completo








sexta-feira, 28 de julho de 2023

Quinta de São João Reserva 2019

 

Nada melhor do que garimpar, buscar novas experiências sensoriais. Novas castas, novas regiões vitícolas. Tem sido maravilhoso viajar nessas novas percepções organolépticas e tenho feito de forma ávida, intensa, mas não podemos negligenciar os clássicos. Nunca!

Até porque os clássicos atingiram tal condição por serem exatamente especiais! A tradição e a credibilidade põem a mesa, na expressão literal da palavra. Os clássicos certamente construíram a minha predileção pela poesia líquida. 

Quem não começou a degustar um Merlot, Cabernet Sauvignon, Malbec e nunca se encantou? Quem não degustou um vinho de uma região emblemática e não gostou? Isso dada as devidas proporções, afinal nem tudo é sempre unânime.

E quando falamos de Portugal, não há como esquecer do quão tradicionais são as suas regiões! O que dizer de Alentejo, Porto, Madeira, Lisboa...? Não há como dissociar essas regiões de nosso imaginário e adega. E outra região lusitana, que eu não degustava um rótulo a exatamente um ano, volta a figurar em minha humilde taça: o Tejo.

Preciso degustar mais rótulos dessa clássica e importante região para a vitivinicultura portuguesa como o Tejo. Tenho a impressão de que a oferta de vinhos do Tejo não é tão grande, expansiva quanto regiões como Alentejo, Vinhos Verdes aqui em nossas terras, por exemplo. Mas há algumas boas dicas de rótulos e a preços competitivos, atraentes.

E esse produtor, a quem degustarei o primeiro vinho, tem um pouco do Brasil em sua história. Parte dos seus donos atuais são brasileiros e é gratificante ver apaixonados por vinhos investirem em terras lusitanas. Falo da Pinhal da Torre.

Todos os vinhos, de todas as propriedades do Pinhal da Torre são mantidos e trabalhados na Quinta de São João, uma adega histórica construída entre 1946 e 1947, sendo a única adega na região do Tejo pela sua construção moderna e estilo arquitetônico.

E o vinho que degustei e gostei carrega o nome da antiga e tradicional adega: Quinta de São João Reserva, em um blend com as castas Touriga Nacional (40%), Touriga Franca (30%), Tinta Roriz (20%) e Syrah (10%) da safra 2019. E para não perder o costume vamos de história, vamos de Tejo.

Tejo

Partilhada com vilas e olivais, a região do Tejo está localizada bem no coração de Portugal. Essencialmente ligada à produção de vinhos de elevada categoria, esta região é feita de apaixonados produtores, conhecidos por todos os cantos do país pela sua energia e determinação.

Homenageada pelo rio que marca a sua paisagem, a região foi, até 2009, conhecida como Ribatejo. Atualmente, a viticultura estabeleceu as suas raízes de vez e um conjunto de terroirs determinam a economia da região.

A história da Região do Tejo se confunde com a das suas Terras. Sob o comando do rio Tejo, influenciando economia, paisagem e clima, trata-se de uma das mais antigas regiões produtoras de vinhos de Portugal, cujo patrimônio remonta à presença Romana na antiga Lusitana.

A Região Vitivinícola do Tejo está localizada no centro de Portugal, a pouca distância de Lisboa. O rio não é o que separa, mas o que liga um território vitivinícola com 12.500 hectares de vinhas distribuídos por 21 municípios. Largo e imponente, o Tejo é o maior rio de Portugal. Como elemento primordial da paisagem, moldou a história dos que lá vivem, criam e trabalham, influenciando o clima e o terroir.

Tejo


História

A arte de produzir vinho, nesta região, remonta a 2000 a.C., quando os Tartessos iniciaram a plantação da vinha junto às margens do rio que lhe dá o nome. Reza a História que já Afonso Henriques fez referência aos vinhos da região no Foral de Santarém, datado de 1170, e que o Cartaxo teria exportado 500 navios com tonéis de vinho que, em apenas um ano, atingira o valor de 12.000 reis.

As histórias continuam pela cronologia fora, com o ano de 1765 a destacar-se pelo desaparecimento da vinha nos campos do Tejo, como consequência de uma ordem imposta por Marquês de Pombal.

O primeiro rei de Portugal, D. Afonso Henriques, tem uma ligação especial com os Vinhos do Tejo. Reza a história que o mesmo referiu estas produções na Foral de Santarém, que data de 1170. Mais tarde, no século XIII, dá-se o culminar do comércio das produções, com 30.000 pipas a serem enviadas apenas para a Inglaterra.

Muitos anos depois, em 1989, as produções passam a ser regulamentadas com as Indicações de Proveniência Regulamentada para vinhos da região e, em 1997, a Comissão Vitivinícola Regional do Ribatejo é fundada. Esta comissão é substituída, em 2008, pela Comissão Vitivinícola Regional do Tejo e seguiu-se da criação da Rota dos Vinhos do Tejo.

Muitas das quintas produtoras pertencem às famílias nobiliárquicas. Cada uma com a sua história, em comum têm o objetivo de produzir vinhos de qualidade, que expressem as caraterísticas da região. Como resultado, os vinhos incorporam tradições (o pisa pé, método de esmagar as uvas com os pés), o entusiasmo e empenho das suas gentes, a natureza que predomina nas terras ribatejanas e as mais modernas tecnologias.

A região do Tejo, nos dias de hoje, constitui cerca de 17 mil hectares de terreno, representando uma produção anual de 650 mil hectolitros, 10% da produção no país. Destes valores, 110 mil hectolitros são alvo de certificação, 90% dos mesmos estando distinguidos com a Indicação Geográfica Protegida (IGP), enquanto que 10% têm Denominação de Origem Controlada (DOC).

O Tejo tem alguns dos mais vibrantes e acessíveis vinhos de Portugal, oferecendo uma gama diversificada e diferenciada de estilos, para todos os gostos, orçamentos e ocasiões. A produção anual, que cresce safra após safra, atingiu, no último ano, 2021, cerca de 23,3 milhões de litros.

Características do terroir

Pelo clima moderado e a versatilidade dos solos, os terroirs do Tejo possuem um alto grau de adaptabilidade. Se por um lado os solos xistosos e as areias na margem esquerda do rio sofrem de fraca produtividade, os solos de aluvião e os argilo-calcários vieram salvar este panorama.

Devido às planícies que, periodicamente, são inundadas pelo rio, os solos de aluvião são extremamente férteis. Por outro lado, é nos solos argilo-calcários que se reúne a maior parte das vinhas e olivais da região devido à irregularidade dos campos, fruto da alternância entre montanhas e planícies.

Vamos tornar o assunto ainda mais interessante ao lhe confidenciar que a região se divide em três zonas dedicadas a diferentes tipos de produção: a Charneca, o Bairro e o Campo.

Charneca

Apesar desta zona não ser a mais produtiva, devido às características secas do seu solo e às temperaturas elevadas, estes terrenos ainda têm potencial na produção de vinhos brancos e tintos.

Localizados na margem esquerda do Tejo, com direção a sul estendendo-se até ao Alentejo, os solos são essencialmente arenosos, o que se reflete na complexidade das uvas e, consequentemente, dos vinhos.

Bairro

Este terroir distingue-se no cultivo de castas tintas e localiza-se a norte do rio Tejo. Pela sua divisão em solos argilo-calcários e xistosos, as videiras são capazes de estabelecer as suas raízes no terreno a um nível mais profundo.

Para além disso, as terras são consideradas altas, compostas tanto por colinas como por vastas planícies, o que confere uma riqueza inigualável aos solos que as constituem.

Campo

Exatamente nas margens do rio Tejo, estes terroirs são alvo de um clima mais marítimo que influencia na frescura e na acidez dos vinhos aqui produzidos. Porém, o que mais caracteriza estes solos são as inundações periódicas que lhes conferem um alto índice de fertilidade. Ideal para a produção de vinhos brancos, estes terrenos em planície exigem uma viticultura extremamente precisa.

As principais castas

Na Região do Tejo, a legislação permite a utilização de diversas castas, tanto nacionais como internacionais. As brancas mais comuns são Chardonnay e Sauvignon Blanc. Entre as tintas destacam-se as Cabernet Sauvignon e Merlot.

As castas tintas nativas do Tejo incluem a Touriga Nacional, a casta portuguesa por excelência, bem como a Trincadeira, Castelão e Aragonês. O aromático Fernão Pires e o Arinto produzem alguns dos vinhos brancos mais refrescantes da região.

Estas castas autóctones prosperaram em climas quentes e solos complexos da Região do Tejo, mantendo a elevada acidez natural, para produzir vinhos equilibrados com características de frutas ricas.

A Região dos Vinhos do Tejo é composta por um total de 17 mil hectares de terreno vinícola, que produzem anualmente cerca de 650 mil hectolitros, o que representa cerca de 10% do total de vinho produzido em Portugal. Destes cerca de 110 mil hectolitros são certificados, dos quais 90% são vinhos com Indicação Geográfica Protegida (IGP) e 10% são vinhos com Denominação de Origem Controlada (DOC).

E agora finalmente o vinho!

Na taça traz um rubi vivo, intenso, praticamente escuro, mas com um incomum brilho, além de uma viscosidade que mancha a taça, bem como lágrimas finas, lenta e em profusão, denotando personalidade e estrutura.

No nariz inicialmente se mostrou tímido, mas com o tempo foi evoluindo para frutas vermelhas e pretas maduras, com destaque para ameixas, amoras, framboesas, cerejas, com fortes notas de especiarias como noz-moscada, cravo, pimenta, além de um floral, cortesia da Touriga Nacional, bem como a madeira presente, mas bem integrada, graças a passagem de doze meses em barricas de carvalho.

Na boca se revelou complexo, como no olfato, entregando personalidade e alguma estrutura, bem como frutado, a fruta protagoniza também no paladar, fazendo do vinho saboroso e volumoso, cheio, com as notas amadeiradas mais presentes, trazendo algo de chocolate, caramelo, baunilha. As especiarias aparecem também e os taninos ainda presentes, vivos, consistentes, assim segue a acidez que goza de plenitude. Tem final persistente, longo.

Novidades, garimpos, propostas arrojadas, moderno e clássico. Todos os quesitos são consistentes quando falamos em vinho! Tudo é válido para quem ama a poesia líquida! Um vinho de traços modernos, mas que respeita o terroir do Tejo, trazendo o inquestionável quesito da tradição que construiu e ainda constrói a história dessa emblemática região. Tem 13,5% de teor alcoólico.

Sobre a Pinhal da Torre:

A exaltação da vinha e do vinho define as origens da Pinhal da Torre, uma empresa familiar detida pela família Saturnino Cunha, que há várias gerações se dedica exclusivamente à criação de vinhos exigentes e sofisticados.

A Pinhal da Torre é uma produtora de vinhos premium, de alta qualidade, caráter distintivo e artesanal. A paixão pelo vinho e a experiência adquirida ao longo de várias gerações, conduziu-nos à compreensão da singularidade de cada casta e do nosso terroir.

A Pinhal da Torre, tem, por isso, conquistado o reconhecimento internacional das suas marcas e alavancado a sua expansão global em cumprimento com os seus valores fundamentais:

1-      Compromisso da mais alta qualidade;

2-      Cumprimento de rigorosas práticas vitícolas e procedimentos de vinificação sustentáveis;

3-      Seleção exigente de fornecedores e distribuidores;

4-      Design e inovação no packaging, com utilização da linguagem Braille nos seus rótulos;

5-      Promoção de uma cultura de responsabilidade social corporativa.

Mais informações acesse:

https://pinhaldatorre.com/

Referências:

“Viva o Vinho”: https://www.vivaovinho.com.br/mundo-do-vinho/regioes-vinicolas/regiao-do-tejo-terra-de-vinhos-e-tradicao/

“Comissão Vitivinícola Regional do Tejo”: https://www.cvrtejo.pt/historia-do-vinho-e-da-regiao

“Conceito Português”: https://www.conceitoportugues.com.br/artigo/regiao-do-tejo

“Wines of Portugal”: https://winesofportugal.com/pt/descobrir/regioes-vitivinicolas/tejo/

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 




sábado, 22 de julho de 2023

Ravanal Gran Reserva Cabernet Sauvignon 2018

 

Conhecida como a rainha das uvas tintas, a Cabernet Sauvignon hoje pode se considerar “senso comum”, algo óbvio nas degustações do inveterado enófilo, mas para mim sempre terá um contorno afetivo pela representatividade que está tem para a minha iniciação no mundo vínico.

Quando degustei meus primeiros vinhos encorpados lá estava a Cabernet Sauvignon para me mostrar o conceito dessa proposta de vinho, principalmente os rótulos chilenos, aqueles mais amadeirados, os gran reservas, principalmente.

Foi com os chilenos que eu descobri a Cabernet Sauvignon! Definitivamente são os melhores produtores da casta no Cone Sul! Poderia enumerar e me perder de vista de todos os grandes rótulos de grandes vinícolas que degustei e gostei que ajudaram a construir o meu apreciar pela Cabernet Sauvignon.

E ainda há, sem sombra de dúvida, espaço para novas experiências sensoriais, cujo produtor também é de “primeira viagem”. Então, sem mais delongas, vamos às apresentações do vinho! O vinho que degustei e gostei veio da emblemática Vale do Colchagua, no Chile, e se chama Ravanal Gran Reserva, um 100% Cabernet Sauvignon, da safra 2018.

E para não perder o costume, vamos de história! Vamos daquela que é para muitos, a mais prestigiada região produtora de vinhos da América do Sul: O Vale do Colchagua.

Vale do Colchágua

O Brasil mal acabara de ser descoberto e os chilenos já iniciavam a produção de vinho no ano de 1550, antes mesmo da Argentina, que também tem tradição no setor e começou o plantio das uvas sete anos depois.

Com quatro mil quilômetros de costa, o Chile é um país estreito e muito comprido, o que sugere uma rota turística, seguindo em frente, de norte a sul. Como não dá para percorrer tudo, a pedida é concentrar esforços no que pode dar mais prazer: o Vale do Colchágua, considerado a região vinícola de maior prestígio da América do Sul.

Encravado no coração da zona central, localizado a 150km da capital Santiago, o Colchágua é o ícone da produção da bebida no país e se caracteriza por vinícolas ambiciosas, que trabalham há décadas para criar uma bebida fina e elegante.

Está exatamente no centro do país, exatamente entre a Cordilheira dos Andes e o Pacífico. É cortado pelas águas do rio Tinguiririca, suas principais cidades são San Fernando e Santa Cruz, e possui algumas regiões de grande valor histórico e turístico como Chimbarongo, Lolol ou Pichilemu. Colchágua significa na língua indígena “lugar de pequenas lagunas”.

Valle do Colchágua

O terroir de seus vinhos é formado por alguns fatores importantes, como seu clima característico e por seu solo, banhados pela Cordilheira dos Andes. Outro fator importante é a agricultura, presente desde as civilizações mapuches.

Conta-se que no século XV, antes mesmo da chegada de colonizadores espanhóis, esse povo nativo da região já apresentava métodos de agricultura e irrigação sofisticados. No país, porém, não havia uvas ditas finas e que pudessem gerar bons vinhos.

Foi só no século XIX, com a chegada de cepas como Cabernet Sauvignon, Merlot, Carménère e Malbec que a região passou a produzir bebidas de qualidade. Seu terroir entre o oceano e as montanhas favoreceu a condição dos frutos, que se desenvolveram positivamente.

Clima

A fertilidade de suas terras, a pouca ocorrência de chuva e constante variação de temperatura possibilita o cultivo de mais de 27 vinhas, que, com o manejo certo nos grandes vinhedos da região e padrões elevados no processo de produção, faz com que os vinhos produzidos no vale sejam conhecidos internacionalmente, com alto conceito de qualidade.

Clima estável e seco (que evita as pragas), no verão, muito sol e noites frias, solo alimentado pelo degelo dos Andes e pelos rios que desaguam no Pacífico, o Vale de Colchágua é de fato um paraíso para o cultivo de uvas tintas e produção de vinhos intensos.

Em Colchágua, predomina o clima temperado mediterrâneo, com temperaturas entre 12ºC como mínima e 28ºC, máxima no verão e 12ºC e 4ºC, no inverno. Com este clima estável é quase nenhuma variação de uma safra para a outra; e a ausência de chuva possibilita um amadurecimento total dos vários tipos de uvas cultivadas na região.

A excelência dos vinhos se dá pela localização da região, que apresenta vários microclimas e terroirs (diversos tipos de terrenos), além de ser protegida das pragas por barreiras naturais (as cordilheiras, o deserto do Atacama e as geleiras). Essas condições fizeram do local um paraíso para vinhos reservas, gran reservas, premiuns e super premiuns.

Entre as principais variedades de uvas presentes no Vale de Colchágua estão as tintas Cabernet Sauvignon, Merlot, Carmenère, Syrah e Malbec, que representam grande parte da produção chilena.

O cultivo das variedades brancas, apesar de em plena ascensão, ainda se dá de forma bastante reduzida se comparada às tintas; as principais uvas brancas produzidas no vale são a Chardonnay e a Sauvignon Blanc. Ambas as variedades resultam vinhos premiados e cultuados por especialistas e amantes do vinho.

E agora finalmente o vinho!

Na taça revela um rubi intenso, escuro, vívido e brilhante, com halos granada, além de lágrimas grossas, lentas e de média intensidade.

No nariz explode em aromas de frutas vermelhas e pretas maduras, com destaque para amoras, ameixas e cerejas, com as notas amadeiradas bem presentes, graças aos 12 meses em barricas de carvalho, porém bem integradas, que entrega baunilha, carvalho, tosta, chocolate e torrefação. Traz ainda especiarias e um agradável herbáceo. Pimenta, pimentão, tabaco e terra molhada são perceptíveis.

Na boca é seco, macio, redondo, com alguma estrutura, personalidade, volumoso, cheio no paladar, revelando-se equilibrado. As notas frutadas ganham protagonismo, bem como a madeira, em uma perfeita sinergia que o torna equilibrado como no aspecto olfativo, trazendo igualmente a baunilha e o tostado. Tem taninos amáveis, domados, com uma acidez correta e um final de média persistência.

A cada degustação de um Cabernet Sauvignon chileno vai se tornando “o” Cabernet Sauvignon, dado o seu momento especial, aliado, claro, a fatores afetivos que foram construídas graças as essas experiências sensoriais tão especiais. Ravanal Gran Reserva traz, além das gratas experiências aqui mencionadas, um atrativo excepcional de qualidade X preço, fugindo da “normalidade” de alguns caros, mas não menos excelentes, gran reservas chilenos disponíveis no mercado consumidor de vinhos. Tem 13,5% de teor alcoólico.

Sobre a Viña Ravanal:

Com a palavra Mário Ravanal, fundador da Viña Ravanal:

Sou Mario Ravanal, proprietário e fundador da Viña Ravanal. Com mais de 90 anos, percorri um longo caminho para estar aqui a contar-vos a minha história, que é também a história desta vinha.

Nasci em Ligüeimo, uma pequena cidade agrícola, localizada no coração da região vinícola chilena, não sei a data exata do meu nascimento, minha mãe disse que foi em outubro de 1926, mas fui registrado no registro civil em 5 de maio de 1927.

Sou o mais velho de 8 irmãos, de pai agricultor, que desde muito novo me incutiu o amor pelo campo e pelas suas vinhas.

Estudei agronomia na Universidade do Chile e em 1960 continuei meus estudos de pós-graduação em Enologia e Viticultura na França nas Universidades de Montpellier e Bordeaux.

Em 1965, em visita aos meus pais, soube da venda de uma bela propriedade na comuna de Placilla. Motivado pelos vinhedos que já estavam em produção naqueles anos, comprei o que hoje é a Viña Ravanal, com o inestimável patrimônio de ter atualmente vinhedos com mais de cem anos.

Meus filhos, Carmen Paz, Pía e Mario Sebastián, enólogos que deram continuidade ao meu trabalho, amor e trabalho duro pelo vinho, agregaram juventude, força e inovação à Viña Ravanal. As vinhas ganharam em anos e em valor, tal como a nossa família de enologia e tradição enológica, trabalhando na produção de vinhos com os mais elevados padrões de qualidade e profissionalismo.

Os nossos vinhos têm esta história gravada no seu sabor, um terroir e microclima privilegiados geram vinhos finos, com sabores frutados e maturação muito lenta. A nossa zona é um verdadeiro paraíso, o contraste de temperaturas durante o dia e à noite permite que as uvas se desenvolvam de forma extraordinária, destacando-se os vinhos tintos robustos, de grande corpo e persistência, e os vinhos brancos de aromas intensos.

A minha história, como a da minha família, está indissociavelmente ligada a esta Vinha. Vivi meus últimos 60 anos intensamente entre esses vinhedos centenários. Nossa vinícola é uma das mais antigas do Vale de Colchagua. 

Nosso processo criteriosamente elaborado inclui colheita e seleção manual, somadas a tecnologias avançadas e estágio em barricas de carvalho francês e americano que resultam em vinhos excepcionais, sofisticados e elegantes, com grande caráter frutado, excelente corpo, complexidade e intensidade.

Convidou-os a degustar os nossos vinhos, resultado da conjugação perfeita entre a experiência enológica, a tradição familiar e o árduo trabalho diário de uma grande equipe.

Mais informações acesse:

https://www.ravanal.cl/es/

Referências:

“Correio Braziliense”: https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/turismo/2016/12/28/interna_turismo,562828/valle-do-colchagua-oferece-varias-atracoes-na-companhia-de-grandes-rot.shtml

“Blog Divvino”: https://www.divvino.com.br/blog/colchagua-chile/#:~:text=Hoje%2C%20o%20Valle%20do%20Colchagua,Melhor%20Regi%C3%A3o%20Vitivin%C3%ADcola%20do%20Mundo%E2%80%9D.

“Clube dos Vinhos” em: https://www.clubedosvinhos.com.br/um-passeio-pelo-vale-do-colchagua/





sexta-feira, 21 de julho de 2023

Rifugio del Vescovo Chianti Riserva Sangiovese e Merlot 2018

 

Definitivamente a Itália é o país dos vinhos clássicos! Não há nenhum outro centro vitivinícola que produz, em larga escala e com tanta qualidade, vinhos do naipe de um Barolo, Brunello di Montalcino, Amarone, Ripasso e tantos outros.

Vinhos longevos, vinhos de marcante personalidade, vinhos potentes, poderosos e de plenitude jamais vista, jamais sentida em taça. Incluiria entre esses nomes, porém fora da Itália, Bordeaux.

Vinhos que não precisam de demasiadas apresentações, tanto que muitos deles carregam o nome de sua região, típico do Velho Mundo. Não há a apresentação das suas clássicas castas, não há detalhes, não há quase nada, apenas as regiões ostentando em letras garrafais o seu nome, a sua tradição.

Porém atualmente, atendendo aos anseios do mercado consumidor mais jovem e que está se interessando por vinhos, alguns produtores dessas regiões têm divulgado as castas e trazendo um contorno mais “moderno” no primeiro contato que o enófilo tem pelo vinho: o visual.

Mas diante desse exército de clássicos que a Itália tem em seu front há outro, igualmente importante, que até hoje não goza de tanta reputação quanto os Brunellos e Barolos da vida. Falo do Chianti. O passado de guerras, de incertezas de seus criadores, de seus desbravadores, contornou a tortuosa, mas cativante história dos Chiantis.

O primeiro Chianti que tive o prazer de degustar foi o Castellani Chianti Riserva 2015 e logo depois o Poggio Al Casone Chianti Superiore 2019 também do tradicional produtor Castellani. Vinhos com excelente custo X benefício que desmistifica o histórico de Chiantis com altos valores e um tanto quanto inalcançável de se ter em adega. E não se enganem, são ótimos vinhos!

Mas não decidi parar por aqui! Gostaria de buscar novas experiências com os velhos Chiantis, conhecer novos rótulos e produtores e eis que, de forma totalmente despretensiosa, navegando no site de um famoso site de vendas de vinhos, observei, em destaque, um Chianti Riserva que estava na incrível faixa dos R$ 45! Não acreditei de imediato e decidi rever e sim, um Chianti Riserva por um ótimo preço.

Mesmo ainda com algum receio, afinal o preço estava muito baixo, decidi compra-lo, afinal, caso não gostasse dele o gasto, o “impacto” não seria tão alto no bolso já combalido de dinheiro. Mas decidi degusta-lo o quanto antes, estava tomado por uma incomum curiosidade e até mesclada a uma ansiedade.

Então sem mais delongas vamos às apresentações desse surpreendente vinho! Uma gratíssima surpresa a um valor avassalador, que se chama Rifugio del Vescovo, um Chianti Riserva, composto pelas castas Sangiovese e Merlot, da safra 2018. Para não perder o costume, vamos de história, vamos de Chianti.

Chianti, Toscana

Desde a queda de Roma até o Risorgimento, por volta de 1850, o esfacelamento dos estados italianos em pequenas repúblicas e reinos ditou a vida de sua população e também o tom de seus vinhos. Foi nesse longo período conturbado que nasceu um dos vinhos mais famosos da Itália, o Chianti.

Geograficamente falando, Chianti é uma terra montanhosa que se estende por cerca de 60 km a 70 km na sua extensão, cujo ponto mais alto é Monte San Michele, a 893 metros. Existem 5 rios que cruzam e definem a área com: os rios Pesa, Greve, Ombrone, Staggia e Arbia.

Chianti

O começo da história remonta ao século XIII, quando os Médici dominavam a cidade de Firenze (Florença), na Toscana, e lá criaram uma das repúblicas mais influentes de seu tempo – basta lembrar que eles foram patronos das artes que culminaram com o Renascimento. Em meados do século XIII, os fiorentinos eram uma potência e viviam guerreando com vizinhos.

Para garantir uma boa defesa de suas terras, eles as dividiram em ligas militares de cidades. Uma delas, criada em 1384, foi a Lega del Chianti, que compreendia as vilas de Radda, Gaiole e Castellina (até hoje o centro da região que se denomina Chianti Classico), e durou até 1774, atuando ativamente durante as batalhas entre Firenze e Siena.

Aliás, a principal lenda em torno do vinho de Chianti vem dessas longas disputas medievais entre fiorentinos e sieneses. Acredita-se que, um dia, cansados de guerrear, os governantes das duas cidades decidiram por um outro tipo de disputa para estipular sob qual bandeira ficaria a região.

Assim, concordaram que dois cavaleiros sairiam ao cantar do primeiro galo da madrugada, um partindo de Firenze em direção à Siena e o outro no sentido contrário. Onde eles se encontrassem, seria demarcado o limite dos domínios.

Assim nasceu a lenda do Gallo Nero, o galo negro que até hoje serve de emblema dos vinhos de Chianti Classico. Diz-se que os sieneses escolheram um belo e forte galo branco para dar o sinal ao seu cavaleiro. Já os fiorentinos teriam escolhido um galo negro raquítico, que ficou confinado sem comida.

Por isso, o galo de Firenze teria acordado mais cedo, ainda durante a noite, faminto, e começado a cantar, fazendo com que seu cavaleiro tivesse grande vantagem sobre o rival de Siena, cujo galo só acordaria para cantar já nos primeiros raios de sol da manhã.

Assim, dos pouco mais de 60 quilômetros que separam as duas cidades, o cavaleiro sienês conseguiu percorrer somente cerca de 12 antes de encontrar o oponente nas proximidades de Fonterutoli, pouco ao sul de Castellina.

Em 1716, Cosimo III de Médici delimitou a região para a produção dos vinhos de Chianti. Lendas à parte, a verdade é que a demarcação da área de Chianti como pertencente à Firenze ocorreu em um tratado de 1203. Na época, os fiorentinos eram leais ao Papa e Siena, ao Sacro-Império Romano.

Primeira Denominação de Origem

As primeiras documentações que tratam do vinho de Chianti remontam a 1398 e o descrevem como um vinho branco vendido pelo comerciante Francesco di Marco Datini. No entanto, o nome do vinho ficaria definitivamente gravado na história a partir de 1716, quando Cosimo III de Médici, o penúltimo de sua família a ser Grão-Duque da Toscana, apontou que as três cidades da Lega del Chianti, mais uma parte da Vila de Greve, estavam aptas a produzir o vinho de nome Chianti.

Francesco di Marco Datini

Esta teria sido a primeira demarcação territorial, ou seja, a primeira Denominação de Origem, conhecida no mundo (os portugueses, porém, alegam que a primeira DO teria sido instituída pelo Marquês de Pombal em 1756, quando estabeleceu os marcos pombalinos na região que produzia o Vinho do Porto).

Apesar de o reinado de Cosimo III ter sido desastroso para a região, que se viu diante de uma enorme crise econômica e social, a demarcação durou até 1932, quando a área foi gradualmente expandida (a última expansão seria em 1967).

No entanto, mesmo demarcado, sabe-se que o vinho de Chianti obedecia a poucas regras. Historiadores apontam que, na época, uma das principais uvas usadas na produção do vinho era a Canaiolo, a mais cultivada na região, juntamente com a Sangiovese, Mammolo e Marzemino. Seria somente durante o Risorgimento italiano no século XIX, que o vinho tomaria uma forma, muito próxima do que tem hoje.

O grande nome por trás do estabelecimento de Chianti e também um dos principais responsáveis pela unificação italiana em 1961 foi o barão Bettino Ricasoli, cuja origem familiar remonta aos tempos de Carlos Magno. O “Barão de Ferro” (alcunha conquistada por sua intransigência moral e econômica) foi um dos grandes pilares da unificação de seu país com sua atuação política no Ducado da Toscana. Não à toa, ele chegou a ser primeiro ministro italiano quando o rei Vitório Emanuele assumiu o poder.

Barão Bettino Ricasoli

Além de ser a criadora do Chianti, a família Ricasoli produz vinhos desde o ano 1141, quando adquiriu o legendário Castello de Brolio. Essa longa história faz da Barone Ricasoli a vinícola mais antiga da Itália e a segunda mais antiga do mundo. O Castello de Brolio estava em ruínas à época.

Determinado a dar novos rumos à produção local, o Barão de Ricasoli viajou para a França e a Alemanha, onde aprendeu novas maneiras de cultivo, além de importar variedades e experimentar maquinários. Assim, em 1872, ele teria criado a “fórmula” do Chianti e assim escreveu:

“Os resultados obtidos já nas primeiras experiências confirmam que o vinho recebe do Sangioveto a principal dose de seu perfume (o que eu particularmente procuro) e um certo vigor de sensação; do Canajuolo, a amabilidade que tempera a dureza do primeiro, sem tolher em nada seu perfume; a Malvagia, a qual se pode colocar menos nos vinhos destinados a envelhecer, tende a diluir o produto das duas primeiras uvas, não acrescenta sabor, e o torna mais leve e mais prontamente usável na mesa cotidiana”.

A “fórmula do Chianti” escrita na famosa carta endereçada ao professor Cesare Studiati da Universidade de Pisa, na qual exaltava os aromas e a estrutura da Sangiovese, a maciez da Canaiolo e a tendência da Malvasia a diluir o vinho, fez com que o Barão sugerisse que esta última uva não fizesse parte do corte dos vinhos de guarda da sua região. A receita do Barão era 70% Sangiovese, 15% Canaiolo e 15% Malvasia Bianca. Em 1967, sua “fórmula” foi ratificada pela regulamentação da DOC (com acréscimo da Trebbiano).

Renascimento

O Chianti então surgiu como uma versão do “clarete” francês – sem variedades internacionais, contudo. Foi durante o Risorgimento que ele alcançou a glória, quando Firenze se tornou capital da Itália e Ricasoli primeiro ministro.

No entanto, apesar dos esforços do barão, com o tempo, a fama do vinho tornou-se ruim, muito devido às condições econômicas precárias da região, especialmente depois das pragas que chegaram à viticultura em meados do século XIX e também muito devido ao contrato de uso das terras entre agricultores e os donos das propriedades.

A mezzadria (sistema feudal em que os camponeses dividiam a sua colheita com os senhores de terras) e a agricultura promiscua (diversas culturas em um mesmo terreno) perdurou na Toscana até praticamente os anos 1970 e atrasou o desenvolvimento do vinho na região – já que a colheita ia ser dividida, era melhor, para o agricultor, plantar mais quantidade do que pensar em qualidade.

Clante

A origem do nome Chianti é incerta. Para alguns, ela vem de clangor, que nada mais é do que o som dos instrumentos metálicos, mais especificamente das trombetas. No entanto, também pode designar o atrito entre objetos de metal, como espadas.

Daí, acredita-se que o nome possa ter surgido devido a esse barulho das trombetas de caça ou então das batalhas. Outra possibilidade, muito mais aceita, é o termo ter vindo da palavra etrusca clante, que significaria água (abundante na região) ou então seria apenas um nome de família muito comum na área.

Os “Super Toscanos”

O movimento dos vinhos “Super Toscanos” fez com que Chianti aprimorasse suas normas. Nos anos 1960, alguns produtores estavam desapontados com os rumos que Chianti havia tomado.

Apesar de a DOC ter finalmente estabelecido uma regra para seus vinhos em 1967 (e talvez por isso também), muitos passaram a experimentar com novas variedades, especialmente as francesas, no intuito de produzir um vinho melhor e mais caro (desde o fim da II Guerra Mundial, Chianti era considerado um vinho simples e barato).

Assim, entre o final dos anos 1960 e começo dos 1970, duas poderosas famílias decidiram fazer vinhos mesclando Sangiovese com variedades francesas. Tanto o Marquês Mario Incisa della Rochetta quanto seu sobrinho, Piero Antinori, lançaram respectivamente Sassicaia e Tignanello, os primeiros Super Toscanos de que se tem notícia, vinhos que mudariam para sempre o cenário na região.

Com esse fenômeno houve novas mudanças nas regras, com a introdução de variedades francesas no blend de Chianti. Dez anos depois, as variedades brancas foram proibidas em Chianti Classico, que já passava a aceitar Sangiovese “in pureza”, ou seja, 100%.

Hoje, além do Classico, Chianti possui outras sete sub-regiões, cada uma com regras específicas. As mudanças de regras foram constantes nos últimos 40 anos. As últimas modificações em Chianti Classico, por exemplo, ocorreram em 2013, quando, entre outras coisas, criou-se uma nova classificação, com um nível qualitativo acima dos Riserva: os Gran Selezione.

Os diferentes Chianti

O simples termo “Chianti” diz muito pouco sobre o vinho. Muito resumidamente, indica que se trata de um tinto italiano, produzido na região da Toscana, em uma área que se estende entre as cidades de Florença e Siena, a partir de, principalmente, Sangiovese. Ainda que Chianti seja uma Denominação de Origem Controlada e Garantida (DOCG) e, portanto, existam regulamentações tratando de sua produção, a variedade é grande.

Além da “denominação genérica” Chianti DOCG, há outras denominações específicas que levam em consideração a proveniência geográfica das uvas: Chianti Classico (a mais antiga, famosa e tradicional), Chianti Colli Aretini, Chianti Colli Fiorentini, Chianti Colline Pisane, Chianti Colli Senesi, Chianti Montalbano, Chianti Montespertoli e Chianti Rufina. Também, os termos Chianti Superiore (não permitido para Chianti Classico) e Chianti Riserva servem para nomear vinhos que tenham atendido períodos de envelhecimento determinados, dentre outros fatores.

E agora finalmente o vinho!

Na taça revela um rubi com intensidade, mas não é escuro, traz reflexos granada com algum brilho. Tem poucas lágrimas que bem finas e rápidas logo dissipam das paredes do copo.

No nariz é extremamente aromático, perfumado, que traz frescor, aos cinco anos o vinho ainda mostra toda plenitude, corroborado pelas notas frutadas, de frutas negras, com destaque para a amora, a ameixa. A madeira está igualmente presente, com toques vivos de carvalho, de baunilha, de leve tosta, os 15 meses em barricas faz o seu papel, porém bem integrado. Herbáceo, tabaco, couro, defumado, terra molhada faz jus a predominância da Sangiovese.

Na boca é seco, vivaz, com alguma intensa, complexidade, mas é sedoso, fácil de degustar, garantido pelo percentual da Merlot. É volumoso, cheio, entregando personalidade, que o torna também bem saboroso. As notas frutadas se faz presente, protagoniza em sinergia com a madeira, como no aspecto olfativo, com taninos gordos, presentes, mas domados, com uma instigante e salivante acidez. Tem um final persistente e de retrogosto frutado.

Tradição, história, mesmo que ao custo de guerras, sangue, mortes, disputas pelo poder político e econômico. As redenções pavimentadas por todos esses eventos e intenções. O vinho foi e é um veículo de tais manifestações da sociedade, independente do contexto e cronologia. O que nos resta, no entanto, é permitir contemplar e entender esses momentos históricos com o olhar crítico, mas separando-os do prazer, do deleite em degustar um bom e velho vinho, porque é um elixir ao corpo e a alma, sobretudo daqueles que o ama. Vinhos de extremo caráter regional e de personalidade, aliado a maciez e facilidade de degustação, dada a sua elegância. O Rifugio del Vescovo Chianti Riserva traz a complexidade e rusticidade do “Sangue de Júpiter”, como é chamada a Sangiovese, com a maciez da Merlot, chancelando Chianti como um dos vinhos mais emblemáticos da história. Tem 13% de teor alcoólico.

Sobre a Vinícola Cooperativa Colli Fiorentini:

A Adega Cooperativa Colli Fiorentini tem associados cerca de 350 famílias de agricultores que contribuem para o seu crescimento, tida como a maior produtora de vinhos Chianti do mundo.

A Adega Cooperativa Colli Fiorentini tem seu centro de produção no vale banhado pelo Riacho Virginio, no município de Montespertoli, na província de Florença. Todos os produtos da Cantina Sociale Colli Fiorentini são comercializados nos pontos de venda VALVIRGINIO localizados em toda a Toscana.

Foi a primeira vinícola cooperativa toscana a adotar desde 2011 medidas para proteger o contexto natural e o meio ambiente do qual é parte integrante, instalando um gerador fotovoltaico com potência de 318 kW dividido em duas seções.

Há quase 51 anos, desde 1972, conservam e protegem cerca de 1.500 hectares da paisagem toscana, mantendo viva as tradições desta importante região que distingue cada família toscana no seu território.

Após mais de 40 anos, mais de 850 empresas, localizadas nas áreas de produção de Chianti Classico DOCG, Tuscan IGT e Tuscan IGP Oil, entregam suas safras aos locais de produção da Cooperativa.

Mais informações acesse:

https://www.collifiorentini.it/index.html

Referências:

“Blog História com Gosto”: https://historiacomgosto.blogspot.com/2019/11/a-regiao-do-chianti-classico-toscana.html

“Revista Adega”: https://revistaadega.uol.com.br/artigo/todos-os-chianti_10196.html

“Blog Sonoma”: https://blog.sonoma.com.br/chianti/#:~:text=Chianti%20%C3%A9%20um%20tipo%20de,Chianti%20Cl%C3%A1ssico%20a%20mais%20famosa