segunda-feira, 29 de junho de 2020

Viña Brava Parellada e Garnacha Blanca 2014


Estava eu em uma das minhas inúmeras incursões aos supermercados para garimpar algum vinho interessante cujo preço não impacte tanto no bolso já combalido. Na realidade estava querendo alguma novidade também em termos de proposta de vinho. Algo novo e diferente em meu simples e humilde currículo de enófilo, talvez uma casta pouco conhecida, uma região pouco comentada, um vinho que me entregasse algo pouco usual tão comum nos supermercados. E, olhando um pouco mais de detalhe achei, jogado na parte mais baixa da gôndola, entregue a própria sorte, um vinho empoeirado, com um preço até atrativo, em torno dos seus R$ 19,00 e, nesse quesito já me chamou a atenção. Tomei o mesmo em minha mãos e olhando um pouco mais percebi que era de uma vinícola tradicional da Espanha, de uma região que nunca havia degustado um vinho sequer e duas castas que nunca tinha ouvido falar. Pronto! Era tudo o que eu precisava! Atendia as minhas necessidades de momento! Levei!

Não demorei muito para abri-lo e quando o desarrolhei fiquei preocupado, receoso, afinal, a safra era um tanto quanto “antiga” para um vinho, 2014, talvez se justificasse o preço por esse motivo, mas quando o servi na taça e levei à boca me surpreendi de uma forma que jamais esperaria! Fantástico vinho, incrível rótulo! O vinho que degustei e gostei veio, como disse da Espanha, da região da Catalunha, e se chama Viña Brava um corte das castas Parellada e Garnacha Blanca. Mas antes de falar entusiasticamente do vinho, falarei um pouco dessas castas “novas” para mim, bem como da região da Catalunha.

Parellada

A uva Parellada, nativa da Catalunha, é cultivada exclusivamente em sua região de origem e participa da composição do prestigiado vinho espumante Cava. Conhecida também como Montonec ou Montonega, essa variedade de uva é cultivada nas montanhas do Alto Penedès, a 600 metros acima do nível do mar. A Parellada atinge o ápice qualitativo quando cultivada em grandes altitudes, onde as baixas temperaturas favorecem sua acidez natural e necessita de um período maior de tempo para desenvolver todos os seus compostos aromáticos. Essa variedade é utilizada, principalmente, na fabricação de alguns dos melhores espumantes espanhóis, o Cava, ao lado das uvas Xarel-lo e Macabeo. A Parellada, considerada a uva mais elegante e refinada entre as três variedades, é responsável por adicionar acidez e frescor aos exemplares. Os vinhos elaborados a partir da uva Parellada apresentam aromas florais e cítricos, além de serem exemplares extremamente delicados, ricos em acidez, aromáticos, com coloração brilhante e contam com a presença de um baixo teor alcoólico.

Garnacha Blanca

Nativa do norte da Espanha, a Grenache Blanc é mais conhecida por fazer parte da composição de excelentes vinhos brancos franceses, em especial, o tradicional vinho Chateauneuf-du-Pape. Conhecida como Garnacha Branca na Espanha, ela é uma variante branca da casta Grenache Noir e já foi uma das castas mais importantes da França, até perder o posto de quarta uva mais plantada no país para a Sauvignon Blanc (atrás da Ugni Blanc, Chardonnay e Sémillon). Essa variedade dá origem a vinhos com coloração dourada e está sendo cada vez mais utilizada na elaboração de excelentes varietais, no entanto, encontramos a Grenache Blanc com maior facilidade em blends, por ser uma uva extremamente aromática, exibindo aromas frutados de maçã verde e melão e adicionando características típicas do ambiente em que foi cultivada ao resultado final de qualquer vinho.

Catalunha

A região da Catalunha, no norte da Espanha, é a área vinícola com maior número de DOs (Denominação de Origem) do país. Entre as mais importantes encontram-se Costers del Segre, Montsant e Penedès, além da reputada DOC Priorato, a segunda mais reconhecida na Espanha. Lar do famoso espumante espanhol Cava, a região da Catalunha possui solos chamados de 'licorella' e apresenta um baixo índice pluviométrico, fazendo com que as videiras apresentem baixa produtividade e as uvas tornem-se muito concentradas. Consequentemente, os vinhos elaborados na região possuem coloração tinta profunda, excelente textura e taninos finos.

Catalunha

É em Penedès Central, na região espanhola de Sant Saurndí d’Anoia, que ocorre a elaboração do famoso Cava, vinho espumante produzido pelo método tradicional com, no mínimo, nove meses de contato com as leveduras. Diferentes uvas podem integrar a composição do vinho Cava, classificando os exemplares entre os estilos branco ou rosado, que também variam em nível de doçura. Apesar de utilizarem-se métodos de produção similares, o sabor encontrado no Cava é diferente do Champagne, principalmente pela distinção das uvas utilizadas: enquanto um é produzido a partir das uvas Pinot Meunier, Chardonnay e Pinot Noir, o Cava é elaborado com as castas Parellada, Macabeo e Xarel-lo. Já a região do Priorato é conhecida por ter recebido o título máximo de denominação espanhola, elaborando vinhos com castas autóctones cultivadas na Catalunha. Outra região vinícola importante é Montsant, lar de alguns dos melhores e mais renomados produtores da Espanha e a denominação de origem mais nova da Catalunha, regulamentada somente em 2001.

E finalmente o vinho!

Na taça apresenta um amarelo com reflexos dourados, vivo e brilhante com pouca incidência de lágrimas.

No nariz, apesar da safra “antiga” para um vinho branco com essa proposta, ainda estava pleno e vivo, apresentando frescor e muito frutado, com notas de abacaxi, maça verde e pera.

Na boca é muito fresco, com notas joviais e muita elegância, se mostrando redondo e equilibrado, reproduzindo a fruta com evidência para maçã verde e abacaxi, com acidez correta e um final longo e persistente.

Um vinhaço muito bem produzido e mostrando a relevância tradicional da Família Torres na Espanha. Harmoniza muito bem com carne branca, peixes e frituras ou simplesmente sozinho. Um vinho descontraído, informal e ainda muito jovem. Acho que o degustei no tempo certo. Tem 11,5% de teor alcoólico.

Sobre a Familia Torres:

Falar da vinícola Torres é falar de um império que impõe respeito no mundo dos vinhos. Com mais de 1.300 hectares de território plantado, a Torres é hoje a maior vinícola da Espanha. Sua reputação lhe conferiu inúmeras premiações, como a de melhor vinícola européia do ano, promovida pela revista “Wine Enthusiast” em 2006. A Família Torres administra também a Miguel Torres no Chile e a Marimar Estate nos Estados Unidos. Fundada em 1870, em Penedés, a nordeste da Espanha, a vinícola Torres nasceu de uma parceria entre dois irmãos de uma família que desde o século XVII cultivava vinhas, mas sem apelo comercial. Jaime Torres era o irmão que dominava o comércio com as Américas, enquanto Miguel Torres dominava a produção de vinhos. Juntos começaram o negócio familiar focados no mercado externo, vendendo seus vinhos em barris, sem imaginar a dimensão que a Torres tomaria. A vinícola logo começou a ganhar visibilidade e recebeu ilustres visitas em sua sede, como a do rei Afonso XIII em 1904. Poucos anos depois, já na segunda geração da família, nasceu a primeira marca da Família Torres: a Coronas, marca que deu fama mundial à vinícola e que é reconhecida até os dias de hoje. Essa mesma geração foi também responsável pelo início da produção de brandies, o vinho fortificado da Torres. Tamanha fora sua aceitação e sucesso no mercado externo que tornou a Torres a maior exportadora de brandy do país. Os negócios iam bem, até que veio a guerra civil espanhola e em 1939 a vinícola foi parcialmente destruída por um bombardeio. Ao fim da guerra, iniciou-se a reconstrução da vinícola e os vinhos passaram a ser vendidos pela primeira vez em garrafas. Nos anos seguintes, nasceram marcas como Sangre de Toro, produto de entrada da Torres produzido a partir de Garnacha e Cariñena, e Viña Sol, feito a partir das castas Parellada e Garnacha Blanca com uma proposta de frescor. Próximo ao centenário, a vinícola aderiu à vitivinicultura moderna, começou a cultivar variedades estrangeiras, como a Cabernet Sauvignon e a Chardonnay e a utilizar tanques de inox para a fermentação. Em 1979, a Torres expandiu seus negócios para outros territórios. Nasceu a Miguel Torres no Chile e alguns anos depois, a Marimar Estates em Sonoma, nos Estados Unidos. Seus vinhos traduzem a tradição e o conhecimento da família aliados à riqueza do terroir dessas regiões. Na Espanha, a Torres ampliou seu negócio para outras terras e está hoje em regiões como Ribera Del Duero, Rioja, Jumilla, Toro, Rueda, Priorato e Penedés, produzindo uma variedade de castas autóctones, como Tempranillo, Monastrell, Garnacha e Cariñena e castas internacionais, como Syrah, Merlot, Sauvignon Blanc e Riesling. Sua produção chega a atingir mais de 40 milhões de litros por ano e seus vinhos estão presentes em mais de 140 países. Reputação deste império que é a vinícola Torres a tornou um ponto turístico muito procurado por amantes do vinho de diversos países, chegando a receber mais de 130.000 visitantes por ano somente na sede de Penedés. Se você estiver na Espanha e tiver a oportunidade de visitar, vale gastar algumas horas desfrutando de seus vinhos, ampliando seu conhecimento sobre esta marca histórica e apreciando a natureza incrível no entorno de suas sedes. São três os locais que permitem visitação: a sede de Penedés (Parcs Del Penedés), principal local de visitação, a vinícola de El Lloar no Priorato e o Castelo de Milmanda, em Conca de Barberà.
Mais informações acesse:


Fontes pesquisadas sobre as castas e a região:

Mistral, em:


Degustado em: 2019

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