domingo, 30 de abril de 2023

Rocca Nero di Troia 2019

 

E continuo pela minha agradável saga pela busca de novas experiências de degustações, de rótulos pouco badalados, de castas pouco populares em terras brasileiras, afinal novas percepções de aromas e sabores só enriquece o ato da degustação, fazendo desta algo prazeroso e agradável e não algo mecânico e banal.

Há algum tempo venho investindo em regiões e castas novas para mim, sobretudo aquelas castas que, embora muito popular em suas regiões autóctones, no Brasil ainda é pouco conhecida.

E assim você varia a sua adega, amplia seu conhecimento, exercita suas análises organolépticas. Enfim, muitos fatores no processo de degustação são positivamente impactados e, aliando isso tudo, a preços extremamente convidativos a seu bolso, em tempos bicudos e de incertezas, torna-se também essencial.

E a casta de hoje é da Itália e quando levantei referências sobre ela, descobri que até naquele país ela é pouco badalada, raramente vem em monovarietal, ou seja, somente ela protagonizando. E cá estou a degustar esse rótulo especial de um produtor igualmente importante e significativo, falo da Rocca Vini.

A propósito há algum tempo atrás, tive uma excelente, surpreendente experiência com a degustação do Rocca Trebbiano d’Abruzzo muito fresco, leve, saboroso, frutado, com uma agradável mineralidade.

E hoje será um “nero”, um tinto, um “rosso”! Então sem mais delongas vamos às apresentações! O vinho que degustei e gostei veio da região famosa de Puglia e se chama Rocca da casta Nero di Troia (100%) da safra 2019. O que dizer de degustar um Nero di Troia em sua versão varietal? Não preciso dizer do quão especial esse vinho foi, a cada taça servida.

Mas antes de tecer quaisquer comentários acerca do vinho, precisamos ser inundados de história, então vamos falar um pouco de Puglia e da casta Nero di Troia.

Puglia: “A terra dos vinhos”

Essa região italiana está localizada no sul da Itália, região que comumente chamamos de salto da bota, banhada pelo Mar Adriático e o Mar Jônico. É uma região italiana com tradição vitivinícola onde parte da produção do vinho era destinado ao norte para ser mesclado aos vinhos e vermute dessas regiões, inclusive da França.

Puglia

A introdução de videiras com técnicas eficientes de cultivo foi feita na região de Puglia desde a videira, porém a época de ouro foi durante a conquista dos romanos, onde os vinhos de Puglia época dos fenícios. Os gregos, no século VIII a.C., deram continuidade ao cultivo da alcançaram ainda mais fama por sua qualidade. Com a queda do Império Romano houve um declínio da atividade vitivinícola, mas não com grande comprometimento.

No século XVII houve um resgate de variedades autóctones, porém houve no final do século XIX, um outro baque na história da viticultura de Puglia, quando a Filoxera atingiu os vinhedos europeus. Na sequência, a recuperação dos vinhedos em Puglia foi marcada pelas replantações, dando preferência à quantidade de produção, mas do que a qualidade.

Filoxera

Atualmente os produtores de Puglia vem desenvolvendo outras estratégias apostando por exemplo, na diminuição da produção e buscando uma maior qualidade para seus vinhos. Como fruto desse trabalho há atualmente disponíveis no mercado, vinhos com qualidade.

A topografia da região é praticamente plana com paisagens belíssimas dos vinhedos. O clima é tipicamente mediterrâneo, quente, com sol boa parte do ano, pouca chuva, com presença de uma brisa marítima dando condições muito boas para a viticultura. O solo é argiloso e calcário com presença de depósitos de ferro.

As principais regiões da Puglia são:

Foggia: ao norte, encontramos tanto vinhos brancos como tintos bem simples produzidos a partir de Sangiovese, Trebbiano, Montepulciano, Aglianico, Bombino Bianco e Nero, etc.

Bari e Taranto: localizada na zona mais central. Destacamos os vinhos brancos mais encorpados de Verdeca.

Península de Salento: região onde são elaborados os vinhos mais interesantes de Puglia. Nessa zona as videiras se beneficiam dos ventos frescos provenientes do Mar Adriático e Jônico. As principais uvas dessa região são a Negroamaro, Primitivo e Malvasia Nera.

As uvas são cultivadas em toda a região. Faz parte da tradição local e o clima quente da região ainda ajuda, principalmente, as uvas roxas, já que as uvas verdes precisam de uma temperatura mais baixa.

No entanto, a Puglia produz vinhos tintos, rosés e brancos, especialmente de uvas nativas, como Bombino Bianco, Malvasia Bianca, Verdeca, Fiano, Bianco d’Alessano, Moscato Bianco e Pampanuto. Embora, a Chardonnay não seja nativa é a uva branca mais cultivada na região. O Negroamaro é a principal uva do Salento. No entanto, o Salento é uma das zonas vinícolas italianas mais importantes para a produção dos vinhos rosés. A Primitivo é a uva dominante na Terra di Bari. Enquanto a Uva di Troia, também chamada Nero di Troia, é a uva mais comum no norte da Puglia.

Quanto às Denominações de Origem a Puglia tem:

• 28 DOC (Denominação de Origem);

• 4 DOCG (Denominação de Origem Controlada e Garantida);

• 6 IGP (Indicação Geográfica Protegida).


Nero di Troia

Engana-se quem pensa que essa casta vem da mesma cidade da história do cavalo, o de Troia. A antiga cidade grega que levava esse nome, onde ocorreu a Guerra de Troia descrita na Ilíada, fica na Turquia. E o assunto aqui é uma uva considerada nativa da Itália, a Nero di Troia. O nome da uva vem da cidade de Troia, que fica na província de Foggia, em Puglia e que tem cerca de 7.000 habitantes.

Província de Foggia

Segundo a lenda, a cidade foi fundada pelo herói grego Diomedes, que lutou na Guerra de Tróia (e, que segundo a Eneida, de Virgílio, estava dentro do cavalo) e saiu e sagrou-se vencedor.

Claro que também existe sempre uma vasta confusão taxonômica com nomes que a todo instante mudam conforme os tempos e localidades, como:

·         Sumarello;

·         Uva di Canosa;

·         Uva di Barletta;

·         Tranese;

·         Uva della Marina.

A primeira vez que o termo Uva di Troia aparece em documentos oficiais está nos estudos ampelográficos do Professor Giuseppe Frojo em 1875. Ele era Diretor da Cantina Sperimentale di Barletta e era admirador da cultura neoclássica. Então Frojo rebatizou o então chamado Vitigno di Canosa como Uva di Troia. Depois o “Nero” foi incorporado ao nome.

Embora hoje existem muitos clones disponíveis da Nero di Troia, dois biótipos muito diferentes entre si são geralmente identificados hoje, a versão Barletta ou Ruvo e a versão Canosa. A Barletta tem cachos e bagos de grande porte, enquanto a Canosa traz bagos cilíndricos e menores.

A segunda possui cultivo mais complexo, principalmente graças ao longo período e maturação, que a deixa com o risco de ficar exposta a situações climáticas adversas. Por causa disso, a dificuldade do plantio tem propiciado uma, cada vez maior, escassez desta uva. É necessária muita paciência, paixão e recursos para conseguir produzir uma bebida de qualidade.

Mas a Nero di Troia é bastante resistente a uma ampla variedade de pragas comuns nos vinhedos. Ela é muito adaptada ao clima quente e seco da Puglia, mas está sendo cada vez menos cultivada. Muitos produtores, nos últimos anos, têm substituído seus vinhedos, plantando Negroamaro e Primitivo, consideradas mais rentáveis comercialmente.

Além disso, entre as três, a Nero di Troia é a que demora mais para amadurecer. Para dar um exemplo, por volta do ano 2000, a área cultivada era um quinto do que era dos anos 70, com cerca de 1700 hectares plantados.

Os aromas mais encontrados nos vinhos produzidos com esse tipo de uva são os de cereja preta madura, amora, tabaco, cacau, cassis, anis e notas florais de violetas.

Vinhos que utilizam a Uva di Troia em sua elaboração são vinhos profundos, complexos, de cor viva e rico em polifenóis, especialmente, os taninos.

Já os vinhos de corte produzidos com ela apresentam certa adstringência, típica, atenuada, que se evidencia, por exemplo, nos rótulos com a participação da uva Montepulciano. Outros tipos de uva utilizados com bastante frequência junto à Uva di Troia são as variedades Bombino Nero e Sangiovese.

Atualmente existe uma tendência de vinificar a Nero di Troia em vinhos varietais, em geral notáveis. E como que os enólogos lidam com tantos taninos, em vinhos varietais? Com temperaturas moderadas, com macerações mais curtas.

E agora finalmente o vinho!

Na taça revela um intenso e profundo rubi com halos granada, com alguma viscosidade e lágrimas grossas, lentas e em profusão que mancham as bordas do copo.

No nariz um ataque de frutas vermelhas e pretas bem maduras, em compota. Trouxe também no início algo doce, meio caramelizado, com alguma intensidade, depois se equilibrando no transcorrer da degustação, tendo ainda toques de terra molhada, tabaco doce, especiarias, muita rusticidade.

Na boca é cheio, volumoso, estruturado, alcoólico, mas macio e elegante, fácil de degustar dado o seu equilíbrio, com um residual de açúcar que não compromete. As notas frutadas, como no aspecto olfativo, também protagoniza, com discretos toques amadeirados, graças aos 15% do lote que passou cerca de 4 meses em barricas de carvalho, trazendo ainda algo de chocolate e especiarias. Tem taninos marcados, presentes, mas domados, com acidez pouco elevada, baixa e um final longo.

Notas do produtor: “Cerca de 15% do nosso Nero di Troia estagiou em barricas de carvalho por alguns meses, o restante em tanques de aço inox. O objetivo enológico da empresa é dar uma leve nota de baunilha picante, delicada e não muito invasiva”.

Um vinho volumoso, carnudo, intenso e complexo, mas que privilegiou cada característica da Nero di Troia e que valeu cada centavo! E que singular degustar uma casta, no formato varietal, que sequer na Itália, em Puglia, é popular, muito mal em blends. Apelo regional, cultural de uma casta nativa que entrega o que há de melhor em Puglia. Nada melhor que se aventurar em novas castas, novas percepções, novas experiências sensoriais. Tem 14% de teor alcoólico.

Sobre a Vinícola Rocca:

Antes de tudo na história da vinícola, ela começa no final do século XIX, iniciada por Francesco Rocca. Em seguida seu filho, Angelo, aprimora a produção em 1936 e finalmente a transforma em adega em Nardò, Apúlia.

Posteriormente, na década de 1960, Ernesto Rocca, filho de Angelo, comprou a primeira linha de engarrafamento e iniciou a distribuição de produtos sob a marca Rocca.

Depois que houve a compra de uma fazenda em Leverano em 1999, uma década mais tarde a Rocca Family se torna o principal acionista da vinícola histórica Dezzani, no Piemonte, realizando novas sinergias comerciais e produtivas.

Por conseguinte, Paolo, Marco, Luca e Matteo (filhos de Ernesto), compartilhando deveres e responsabilidades, administram os negócios da família, que inclui também uma empresa de construção e uma importante fazenda de cavalos de trote.

Por fim Emanuele e Ernesto Jr., filhos de Luca e Marco, respectivamente, representam hoje orgulhosamente a quinta geração do mundo do vinho.

Em outras palavras, em cinco gerações a família transmite a paixão pelo envelhecimento de vinhos em barris de carvalho, que hoje toca uma vinícola que exporta a produção para mais de 40 países.

Mais informações acesse:

https://roccavini.com/en/

Referências:

“Vinhos e Castelos”: https://vinhosecastelos.com/vinhos-de-puglia-italia/

“Brasil na Puglia”: https://www.brasilnapuglia.com/os-vinhos-da-puglia/

“Enologuia”: https://enologuia.com.br/regioes/277-puglia-terra-de-muitos-vinhos

“Tintos & Tantos”: http://www.tintosetantos.com/index.php/escolhendo/cepas/761-nero-di-troia

“Enologuia”: https://enologuia.com.br/uvas/259-uva-nero-di-troia-a-sulista-da-terra-da-bota

“Blog dos Vinhos”: https://blogdosvinhos.com.br/conheca-a-uva-nero-di-troia/

“Center Gourmet”: https://centergourmet.com.br/rocca-nero-di-troia-puglia-2019/

 

 














Nenhum comentário:

Postar um comentário