De uns tempos para cá, tenho me interessado, de forma
gradativa, pelo fator regional quando escolho um vinho, quando degusto um
vinho. É a genuína expressão de seu terroir, da sua tipicidade, sem contar que
estimula conhecer outras culturas em uma espécie de escambo a cada taça
degustada, sem exageros. Como que apenas uma garrafa, fisicamente tão pequena
pode reverberar tanta história, uma longa e emblemática história. O vinho precisa
eclodir nas taças e fazer cada um de nós, simples enófilos, entender, ao menos
um pouco, sobre a história do povo que o concebeu. Mas infelizmente há algumas
regiões que não são tão conhecidas ou populares aqui no Brasil como os rótulos
alentejanos, durienses, de Bordeaux, Rioja, por exemplo, mas que, quando
degustamos e temos a satisfação e o prazer de nos surpreender positivamente,
nos perguntamos: como não degustamos vinhos dessa região ainda? Falo da região
de Beiras, em Portugal (Beira Interior). Após algumas poucas experiências, mas
surpreendentes e agradáveis com a linha D. João I tinto e branco (Leia as
análises aqui: D. João I tinto e D. João I branco, da Adega Cooperativa de Pinhel, retomo o meu caminho
redescobrindo a região com mais um rótulo deste produtor.
O vinho que degustei e gostei, vem, como disse da região de
Beira Interior, da Adega Cooperativa de Pinhel, e se chama Torre de Pinhel, das
castas Rufete e Tinta Roriz, não sendo safrado. E convém uma breve explicação
pelo fato do vinho não ser safrado. Esse rótulo é um “vinho de mesa”, termo bem
conhecido no Brasil que é usado pelos portugueses para designar um vinho
básico, de entrada, que não possui um denominação de origem (DOC ou Vinho
Regional) e que são produzidos com castas regionais, locais. Diferente do
conceito de “vinho de mesa” no Brasil, que são vinhos produzidos com castas não
viníferas, de uvas de mesa. Apesar de não possuírem denominações de origem, os
“vinhos de mesa” lusitanos podem ser considerados sim, vinhos com forte apelo
regional, pois trazem, como disse no início do texto, tipicidade e
características da região, do chão que nascem as videiras, é tudo uma questão,
também, de um certificado de qualidade, quando, em uma comparação meio
distante, uma empresa adquire um “ISO”. Antes de tecer meus comentários acerca
do vinho, falarei um pouco da sub-região de Beira, Pinhel.
Pinhel
Pinhel é uma cidade portuguesa pertencente ao distrito da
Guarda, na província da Beira Alta, região do Centro (Região das Beiras) e
sub-região das Beiras e Serra da Estrela, com aproximadamente 3 500 habitantes.
A origem da cidade de Pinhel é atribuída, sem grande certeza,
aos Túrdulos, por volta do ano 500 a.C. O concelho de Pinhel recebeu foral de
D. Sancho I em 1209, detendo funções de organização militar e jurisdição. Deve-se a D. Dinis a reedificação do Castelo de Pinhel,
constituído por duas torres, e a construção da histórica muralha que rodeava a
vila da época (atual zona histórica), constituída por seis portas: Vila,
Santiago, S. João, Marrocos, Alvacar e Marialva. Tornou-se sede de diocese e
cidade em 1770, durante o reinado de D. José I, por desanexação da Diocese de
Lamego, mas em 1881 a Diocese de Pinhel foi extinta pela Bula Papal de Leão
XIII e incorporada na Diocese da Guarda. Constitui uma zona de vinhos de
altitude, média de 650m. O seu clima é extremamente frio no inverno e quente e
seco no período do estio ou verão. O solo é arenoso de origem granítica e de
baixa fertilidade. A sub-região de vinhos de Pinhel é ideal para vinhos brancos
acídulos. No caso de vinhos tintos, se forem para envelhecimento podemos
encontrar grandes surpresas. Dado que as maturações são lentas, é extremamente
indicada para produção de espumantes. Os concelhos de Pinhel são: Celorico da
Beira, Guarda, Meda, Pinhel e Trancoso. As castas tintas predominantes são:
Bastardo, Marufo, Rufete e Touriga Nacional, no conjunto ou em separado, com um
mínimo de 80%, Baga, Tinta Carvalha, Pilongo e Trincadeira (Tinta Amarela). Já
as brancas são: Bical, Arinto (Pedernã), Fonte Cal, Malvasia Fina, Malvasia
Rei, Rabo de Ovelha, Síria (Roupeiro) e Tamarez, no conjunto ou em separado,
com um mínimo de 80%. Os tintos costumam ser vinosos, vivos e brilhantes
enquanto jovens, intensos e equilibrados, com raro bouquet quando estagiados e
envelhecidos. E os brancos são vinhos aromáticos, cheios e persistentes no
sabor.
Agora o vinho!
Na taça tem um vermelho rubi com reflexos violáceos com
lágrimas grossas e abundantes que dissipam com alguma lentidão das paredes do
copo.
No nariz traz uma explosão de aromas de frutas vermelhas
frescas, com toques de especiarias.
Na boca é frutado, meio seco, de leve para médio, com taninos
presentes, mas sedosos, com uma agradável acidez revelando frescor e
jovialidade, com um final de média persistência.
Um vinho simples, mas correto, bem feito e honesto Equilibrado
e harmonioso é macio e fácil de degustar. Não tem passagem por barricas de
carvalho, com 13% de teor alcoólico muito bem integrado.
Sobre o rótulo “Torre de Pinhel”:
O Castelo de Pinhel localiza-se na cidade, freguesia e
concelho de mesmo nome, no distrito da Guarda. O Castelo de Pinhel, juntamente
com o Pelourinho de Pinhel, são os símbolos mais importantes da região. A
primitiva ocupação humana de seu sítio remonta a um castro pré-histórico,
atribuído ora aos Túrdulos em 500 a.C., ora aos Lusitanos, posteriormente
romanizado, quando passou a vigiar a estrada romana que cruzava a região da
atual Pinhel. Após a queda do Império Romano do Ocidente, essa modesta
fortificação mergulhou na obscuridade. A época da Reconquista cristã da
Península Ibérica, com a afirmação da nacionalidade portuguesa, D. Afonso
Henriques (1112-1185) procedeu ao repovoamento e reforço das defesas de Pinhel.
O seu sucessor, D. Sancho I (1185-1211) deu prosseguimento a essa tarefa,
outorgando Carta de Foral a Pinhel (1189 segundo alguns, 1209 segundo outros),
de quando datará o início da construção do castelo medieval, concluído sob o
reinado de D. Afonso II (1211-1223), que lhe passou novo foral em 1217.
Integrante do território de Ribacôa, disputado ao reino de Leão por D. Dinis
(1279-1325), a sua posse definitiva para Portugal foi assegurada pelo Tratado
de Alcanizes (1297).
Sobre a Adega Cooperativa de Pinhel:
Desde tempos muito antigos que em Pinhel, e seu termo, se
praticava a cultura da vinha e se produziam vinhos de alta qualidade; já nos
princípios do ano 1500, o Rei D. Manuel I, o Venturoso, concedeu diversas
regalias e privilégios em favor dos vinhos de Pinhel. Em 1942 e 1943, houve
colheitas abundantes e não havia escoamento para a produção, foi então que a
Junta Nacional do Vinho, recentemente criada, como organismo de Coordenação
Económica, e que veio substituir a antiga Federação dos Vinicultores do Centro e Sul de Portugal,
instalou em Pinhel uma caldeira móvel de destilação, acionada por uma geradora
locomóvel, em que foram destilados milhões de litros de vinho e que veio
resolver a crise gravíssima, que afetava os lavradores da Região, que viviam
exclusivamente do rendimento do vinho. De todos os Organismos Corporativos,
criados pelo Estado Novo, a Junta Nacional do Vinho, era o mais querido, pelos
beneficias que trouxe a toda a região vitivinícola, por isso os vinicultores
depositavam toda a confiança esperançados que o organismo, quando necessário,
lhe resolvesse os problemas respeitantes ao vinho. Os vinhos desta área eram
tão bons que as aguardentes vínicas resultantes da destilação ficavam de
finíssima qualidade. Quando transportadas para os armazéns da Mealhada não eram
misturadas com outras provenientes de outras áreas ficando em depósitos
separados. Em 1945, a Junta Nacional do Vinho iniciou a instalação de duas
caldeiras fixas de destilação contínua, que trabalhavam de dia e de noite, só
paravam cada 15 dias para limpeza. Como era pena destilar vinhos de tão boa
qualidade, a Junta Nacional do Vinho, em colaboração com o Grémio da Lavoura de
Pinhel, pensou na criação da Adega Cooperativa, nas suas próprias instalações
que tinham sido compradas à Câmara Municipal de Pinhel e que tinham ficado
devolutas pela saída das Forças Militares, ali aquarteladas, e que se tinham
revoltado contra o Governo da Ditadura Militar.Em 1947, construíram-se 6
lagares em granito, no parque utilizado pelas viaturas militares e os tonéis
foram montados nas cavalariças depois de devidamente adaptadas. A primeira
laboração foi feita por processos artesanais, pois em Pinhel não havia energia
eléctrica com potência suficiente e a mesma era desligada à meia-noite; às
próprias bombas de trasfega, eram movidas por motores de explosão. Foram 33
sócios, a entregar as uvas nesse ano na Adega; embora com bastantes
dificuldades, estava criada e posta a funcionar a Adega Cooperativa. Dos
primitivos 33 cooperantes, atingiu-se os 2.300 atuais.
Maiores informações acesse:
Fontes:
Clube de Vinhos Portugueses, em: https://www.clubevinhosportugueses.pt/vinhos/a-sub-regiao-de-vinhos-de-pinhel/
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